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O sistema renina angiotensina (SRA) corresponde a um complexo sistema hormonal cujo papel fundamental está relacionado com o controle da pressão arterial e homeostasia hidroeletrolítica do organismo (MENARD, 1993). Sua cascata de ativação inclui várias interações enzima substrato que resultam na produção de vários peptídeos biologicamente ativos (DE GASPARO at al., 2000; FERRARIO at al., 1998). A formação da angiotensina II, o principal componente do sistema, é realizada usualmente via duas etapas seqüenciais de proteólise limitada. Inicialmente, a renina, uma aspartil-protease liberada pelo aparelho justaglomerular,

37 cliva o angiotensinogênio liberado pelo fígado no decapeptídeo angiotensina I, que é relativamente inerte até sua conversão no octapeptídeo angiotensina II pela enzima conversora da angiotensina (ECA), uma metaloprotease que cliva a ligação “Phe- His” da angiotensina I (DE GASPARO at al., 2000). Esse sistema humoral tem sua atividade aumentada principalmente por redução do fluxo sangüíneo renal, estimulação simpática e redução da carga filtrada de sódio (DE GASPARO at al., 2000; FERRARIO at al., 1998).

Em resumo, o rim libera grande quantidade de renina, que esta, age sobre o angiotensinogênio liberando angiotensina I. A angiotensina I possui pequeno efeito hemodinâmico ou metabólico. Esta é transformada por uma dipeptidase, a enzima conversora da angiotensina I (ECA), em angiotensina II (figura 1) (CONN e MELMED, 1997).

Figura 1. Esquema sistema renina angiotensina

3.4.1. Angiotensinogênio

Esta substância corresponde a uma 2 globulina que circula em quantidades abundantes no plasma. O angiotensinogênio humano contém 452 aminoácidos e é sintetizado, basicamente, no fígado, embora o RNAm que codifica a proteína também seja abundante no tecido gorduroso, em determinadas regiões do sistema nervoso central (SNC) e nos rins (CAMPBELL e HABENER, 1986; CASSIS et al., 1988). A síntese do angiotensinogênio é estimulada por vários hormônios, incluindo

38 glicocorticóides, hormônio tireoideano e pela própria Angiotensina II (BEM-ARI e GARRISON, 1988).

3.4.2. Renina

O principal determinante da taxa de produção de Angiotensina II é a quantidade de renina liberada pelos rins. A renina é sintetizada, armazenada e secretada na circulação arterial renal pelas células justaglomerulares granulares situadas nas paredes das arteríolas aferentes. Vale ressaltar que outros órgãos como cérebro, coração e útero podem produzir renina. A forma ativa da renina é uma glicoproteína que contém 340 aminoácidos.

A secreção de renina pela células justaglomerulares é controlada por três mecanismos, dois que agem predominantemente no rim, e o terceiro, que age através do SNC e é mediado pela liberação de noradrenalina pelos nervos noradrenérgicos renais.

Estes três mecanismos que regulam a secreção de renina estão interligados constituindo rede fisiológica. Elevações da secreção de renina aumentam a formação de Angiotensina II que, interagindo com seus receptores renais, inibe, nas células justaglomerulares, a liberação de renina. Este sistema foi denominado mecanismo de “feedback” negativo de alça curta. Além disso, aumentos da pressão sanguínea inibem a liberação de renina: a) ativando os baroceptores carotídeos e aórticos, portanto reduzindo o tônus simpático renal; b) aumentando a pressão nos vasos pré-glomerulares; e c) reduzindo a reabsorção de NaCl para a mácula densa (JACKSON e GARRISON, 1995).

3.4.3. Enzima Conversora de Angiotensina (ECA)

A ECA converte a Angiotensina I em Angiotensina II na circulação pulmonar. Embora a ECA tenha sido descrita pela primeira vez na década de 50, somente em 1970 ela foi considerada idêntica à cininase II. Essa enzima, em humanos contém 1278 resíduos de aminoácidos e possui dois domínios homólogos, cada um com um local catalítico e com uma região para ligação do Zn2+ (BERNSTEIN et al., 1989). Ela é inespecífica e cliva unidades de dipeptídeo de substratos com diferentes

39 seqüências de aminiácidos. Várias substâncias podem ser hidrolizadas pela ECA, tais como encefalinas, neurotensina e substância P (SKIDGEL et al., 1987) .

A Enzima Conversora de Angiotensina pode ser encontrada no plasma bem como em diversos tecidos orgânicos. Pode ser encontrada no endotélio vascular, cérebro, placenta, intestino e nos túbulos renais. Além de estar presente em grande quantidade nos vasos sanguíneos pulmonares (RYAN, et al.,1976; SCHULZ, et al., 1988).

3.4.4. Angiotensina II

Este octapeptídeo até pouco tempo foi considerado o único hormônio biologicamente ativo do SRA. Atualmente acredita-se que vários metabólicos deste sistema apresentam atividade biológica e sejam responsáveis por vários dos efeitos anteriormente atribuídos apenas à Angiotensina II, que continua sendo, sem dúvida, a principal substância ativa do SRA. Seus efeitos na regulação cardiovascular são múltiplos e de grande importância:

• Tem ação vasoconstritora direta,

• Potencializa os efeitos da noradrenalina liberada pelas terminações nervosas; inibe a captação neural, aumentando a concentração do neurotransmisor na fenda sináptica,

• Potencializa a transmissão ganglionar,

• Aumenta a síntese e a liberação de aldosterona pelo córtex adrenal resultando em aumento da reabsorção de sódio pelos túbulos renais, • Estimula diversas regiões do SNC, o que provoca aumento do tônus

simpático do coração, vasos e na medula adrenal, aumentando a liberação de catecolaminas (JACKSON e GARRISON, 1995).

No SNC a Angiotensina II estimula a secreção de vasopressina contribuindo para o aumento da volemia; deprime também o funcionamento do próprio reflexo pressorreceptor, reduzindo sua sensibilidade e tornando-o menos apto a tamponar as oscilações de pressão arterial. A angiotensina II é ainda um potente fator trófico, determinando a longo-prazo, hipertrofia e crescimento da musculatura lisa vascular (MOUW et al., 1971; SANTOS et al., 1995; ITOH et al, 1993).

40 3.5. GENE DA ECA E DESEMPENHO FÍSICO

O polimorfismo I/D da ECA tem atraído considerável atenção a respeito de sua associação com o desempenho físico humano. Como a Enzima Conversora de Angiotensina (ACE) está envolvida no metabolismo de substâncias que afetam o remodelamento vascular, estas podem influenciar no condicionamento cardiorespiratório individual e em diferenças individuais em resposta ao exercício (BASSET & HOWLEY, 2000).

O gene da ECA (21 Kbp) está localizado no cromossomo 17 q23 e é composto de 26 éxons (COATES, 2003). Uma variante genética comum no gene da ECA foi descrito e consiste na ausência (deleção ou alelo “D”) ou presença (inserção ou alelo “I”) de 287 pares de base no íntron 16 (RANKINEN at al, 2000), como mostra a figura 2. O alelo D está associado com níveis circulatório e tecidual aumentados de ECA (COSTEROUSSE, 1993; DANSER, 1995). Estudos demonstraram que o alelo I é mais freqüente em atletas de resistência, enquanto que o alelo D, em atletas de força e explosão muscular (MYERSON at al, 1999; HAGBERG at al, 1998). Esse fato pode ser explicado por um estudo de Zhang et al. (2003), pois os autores, após biópsia do músculo vasto lateral de 41 indivíduos sedentários, verificaram uma associação entre os genótipos da ECA e a distribuição percentual de fibras I, IIa e IIb. Indivíduos com genótipo II quando comparados com o genótipo D/D apresentaram maior média percentual de fibras do tipo I (~50% vs. ~30%, respectivamente) e menor média percentual de fibras do tipo IIb (~16% vs. ~32%, respectivamente). Não houve diferença entre os genótipos para os valores de média percentual para as fibras do tipo IIa.

41 Nesse sentido, pesquisas têm se voltado para confirmar a participação do gene da enzima conversora de angiotensina sobre o desempenho físico. No entanto, são encontrados na literatura resultados bem conflitantes, com vários tipos de delineamentos de pesquisa, o que impossibilita, até o momento, uma real conclusão sobre a influência desse gene tanto em altos índices de VO2max como para melhores respostas sobre o exercício físico.

Em estudos que tiveram por objetivo fazer uma associação entre o gene da ECA com a capacidade e potência aeróbia têm mostrado resultados adversos. Myerson et al. (1999) observaram maior freqüência do alelo I entre corredores de elite de longa distância quando comparados com indivíduos sedentários saudáveis. Mais interessante foi o fato de que a análise de 91 corredores de nível olímpico revelou tendência linear e crescente na freqüência do alelo I: 0,35 0,53 e 0,62 nas especialidades 200m (n = 20), 400-3.000m (n = 37) e 5.000m (n = 34), respectivamente. O fato de a presença desse alelo mostrar-se mais freqüente à medida que cresce a distância da prova percorrida sugere que o desempenho de atletas de resistência esteja, pelo menos em parte, na dependência de sua presença. Gayagay et al. (1998) ao avaliar 64 remadores nacionais australianos, em comparação com uma população não atleta, relataram uma alta prevalência do alelo I do gene da ECA nos atletas, demonstrando que esse genótipo pode ser associado com excelência atlética. Hagberg et al. (1998), ao associar o VO2max com o polimorfismo ID do gene da ECA em idosas pós-menopausadas, hipotetizaram que este polimorfismo afetaria o VO2max devido a variações no volume de ejeção e no débito cardíaco. No entanto, esta hipótese não foi comprovada. Mas, houve relação do VO2max com a diferença arterio-venosa de oxigênio (a-vDO2), ou seja, entre diferença do conteúdo de O2 do sangue arterial e do sangue venoso, sendo que o grupo portador do genótipo I/I apresentou maior VO2max e maior a-vDO2 quando comparado ao grupo de genótipo D/D. Em 2000, Alvarez et al. genotiparam sessenta atletas profissionais, sendo eles, 25 ciclistas, 20 corredores de longa distância, e 15 jogadores de handebol, e 400 controles saudáveis. Os autores relataram que o alelo I ocorreu significativamente com maior freqüência em atletas em comparação com os controles. Em um estudo com atletas Russos de quatro modalidades diferentes (nadadores, esquiadores, triatletas e corredores de pista e de campo), estratificados em curta, média e longa distância, o alelo I do gene da ECA foi encontrado com

42 maior freqüência nos atletas de média distância (NAZAROV et al, 2001). Collins et al. (2004) desenvolveram um estudo com triatletas participantes do Ironman Sul- africano, no qual foi observada uma maior freqüência do alelo I do gene da ECA dentre os 100 primeiros atletas sul-africanos a completar a prova, quando comparados ao grupo controle composto por 166 sul-africanos.

Por outro lado, alguns estudos têm encontrado associação entre o genótipo D/D da ECA e esportes de curta duração. Myerson et al, (1999) ao analisarem 91 corredores de 100m, relataram uma alta frequencia do alelo D nesses atletas. Nazarov et al (2001) além de encontrarem uma maior frequencia do alelo I em atletas de meia distância, também relataram uma maior prevalência do alelo D nos atletas de curta distância. Woods et al. (2001) observaram a freqüência dos alelos I e D em nadadores que competiam em diferentes distâncias. Estes autores verificaram um excesso do alelo D dentre nadadores velocistas de elite quando comparados ao grupo controle, composto por nadadores que não eram de elite, os quais realizam provas de 400m ou menos. Também em nadadores, Tsianos, et al. (2004) com o intuito de observar a frequencia alélica do gene da ECA, analisou 35 atletas recrutados no Campeonato Mundial Aberto de Natação em Sharm-el-Shiekh, divididos em curta e longa distância. Os autores observaram uma maior freqüência significativa do genótipo D/D nos nadadores de curta distância. Cam et al (2005) estudaram 88 atletas turcos com estímulos semelhantes de treinamento, e após aplicarem testes de curta distância (60metros) e média distância (200metros), observaram uma maior freqüência do genótipo D/D do gene da ECA nos sujeitos que apresentaram os melhores resultados nas provas de média distância. Kasikcioglu et al (2004) objetivando verificar a freqüência alélica do gene da ECA em um esporte com característica de força e potência, nas variáveis hipertrofia ventricular esquerda e VO2max, verificaram em uma amostra de 29 lutadores comparando-os com 51 indivíduos sedentários, que o grupo com genótipo D/D apresentou tanto uma maior massa do ventrículo esquerdo quanto um maior VO2max em relação aos genótipos I/I e I/D.

Portanto, esses achados ainda não são conclusivos, pois em contra partida outros estudos não demonstraram associação entre gene da enzima conversora de angiotensina com fenótipo do desempenho físico humano. Já em 1999, TAYLOR et al. não demonstraram associação entre os genótipos da ECA após compararem 81

43 homens e 39 mulheres atletas de diferentes esportes com predomínio aeróbio com um grupo controle composto por indivíduos saudáveis não atletas. Rankinen et al (2000) estudaram 192 atletas de resistência, também em diferentes esportes, e não encontraram diferenças nas freqüências genotípicas do polimorfismo I/D do gene da ECA entre atletas e indivíduos não atletas saudáveis. Scott et al (2005) com o objetivo de verificar a associação entre a variação genética da ECA e atletas de resistência Africanos foram obtidas amostras de DNA de 221 corredores nacionais quenianos com os melhores desempenhos em provas de longas durações. Os autores concluíram que seus resultados não suportam a hipótese de que a variação genética da ECA está associada com o desempenho físico em corredores quenianos. Day et al (2007) investigaram a relação entre o polimorfismo I/D do gene da ECA e a atividade plasmática da ECA com a potência aeróbia, utilizando uma amostra de 62 mulheres caucasianas com aproximadamente 25 anos de idade. Após realização de teste incremental máximo na esteira, não foram observadas correlações entre a atividade da ACE circulante e o VO2max. Assim como visto para a atividade da enzima, também não houve associação entre o genótipo do polimorfismo ID e a potência aeróbia. Previamente, em um estudo do grupo, Leite, et al. (2008) ao verificar associação entre os polimorfismos do gene da ECA e a potência aeróbia, medida por um teste ergoespirométrico, em mulheres idosas brasileiras também não encontrou resultados significativos em nenhum dos genótipos.

No entanto, em busca de melhores respostas da verdadeira influência do genótipo sobre o fenótipo do desempenho físico, estudos têm se voltado a utilizarem delineamentos de pesquisas que demonstrem associações dos genes em resposta ao treinamento físico, para que fique elucidado se diferenças genotípicas respondem diferentemente ao exercício físico. Entretanto, a literatura também traz resultados divergentes sobre essas respostas.

Em um estudo, positivisando o tema, Williams et al. (2000) estudaram em 58 indivíduos saudáveis (sexo masculino) (I/I, n=35 e D/D, n=23) a eficiência contrátil muscular avaliada em cicloergômetro, antes e após 11 semanas de um programa de treinamento físico. A energia utilizada por unidade de potência, não mostrou ser diferente entre os genótipos I/I e D/D (24,5% e 24,9%, respectivamente) no período pré-treinamento; no entanto, em resposta ao treinamento, essa variável aumentou

44 significativamente entre os indivíduos com genótipo I/I. Essa diferença representa aumento na eficiência, relativa ao período pré-treinamento, de 8,62% para o genótipo I/I e –0,39% para o genótipo D/D. Os autores desconhecem os mecanismos pelos quais o alelo I estaria potencializando a eficiência mecânica em indivíduos treinados. No entanto, fundamentaram seus achados na baixa atividade enzimática da ECA no genótipo I/I que poderia melhorar a função contrátil na musculatura cardíaca e esquelética via melhora na eficiência da oxidação mitocondrial, fator este mediado pelo aumento local na concentração de óxido nítrico (ZHAO at al, 1999).

Em oposição, Sonna, et al. (2001) ao verificar os efeitos de 8 semanas de treinamento aeróbio e de força na capacidade aeróbia sobre o gene da ECA em 62 homens e 85 mulheres recrutas militares, não encontrou diferenças entre os genótipos. Também, Alves (2007) com o objetivo de investigar a influência do polimorfismo da enzima conversora da angiotensina (ECA) e do angiotensinogênio na hipertrofia cardíaca e no ganho de capacidade funcional provocados pelo treinamento físico em indivíduos jovens e saudáveis, utilizou uma amostra de 83 policiais militares (26± 4,5 anos) que treinaram 17 semanas de treinamento físico aeróbio (50 a 80% VO2pico). O autor, apesar de observar melhoras significativas no VO2pico após a intervenção, não observou diferenças em relação aos diferentes genótipos da ECA, concluindo assim, que o polimorfismo da ECA e do angiotensinogênio não influenciaram o ganho de capacidade funcional provocado pelo treinamento físico, assim como, não influenciou a hipertrofia do ventrículo esquerdo provocada pelo treinamento físico.

45 4. MATERIAIS E MÉTODOS

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