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Sistemas Mistos Proteínas do Soro do Leite – Polissacarídeos

1.1 Propriedades Gelificantes das Proteínas

1.4 Influência de Polissacarídeos nas Propriedades Gelificantes das Proteínas

1.4.1 Sistemas Mistos Proteínas do Soro do Leite – Polissacarídeos

Vários autores têm-se dedicado ao estudo da influência de polissacarídeos nas propriedades funcionais e, mais concretamente, nas propriedades gelificantes das proteínas do soro do leite. De um modo geral, k-carragenina (Mleko et al, 1997; Tziboula e Horne, 1999; Eleya e Turgeon, 2000a,b; Turgeon e Beaulieu, 2001), goma xantana (Bryant e McClements, 2000) e pectinas (Turgeon e Beaulieu, 2001; Ibanoglu, 2005) têm sido os polissacarídeos de eleição para o estudo de sistemas mistos.

Turgeon e Beaulieu (2001) realizaram trabalhos em sistemas mistos contendo PSL/k- carragenina e PSL/pectinas.

Nos sistemas PSL/ k-carragenina, observaram-se dois tipos de comportamento em função da concentração de polissacarídeo: adicionando uma pequena concentração de k- carragenina (0.1%), os géis resultantes eram semelhantes aos obtidos para PSL, enquanto que para concentrações superiores de polissacarídeo (1%) e na presença de sais, os géis mistos exibiam um comportamento de dureza e de deformação à fractura semelhante aos géis de k-car. Face aos resultados obtidos, os investigadores consideraram que provavelmente, para baixas concentrações, a k-carragenina seria compatível com as PSL, sendo o polissacarídeo distribuído uniformemente na rede tridimensional proteica. No entanto, para concentrações de polissacarídeo mais elevadas (1%), o comportamento da k- carragenina era o factor determinante das propriedades de textura dos géis obtidos. Por aquecimento, PSL e k-carragenina tornavam-se incompatíveis, resultando por isso, em géis bifásicos com notável separação de fases.

Para além da concentração do polissacarídeo, outros factores influenciam fortemente o comportamento dos sistemas mistos. Trabalhos realizados por Mleko et al. (1997) mostraram que o efeito da k-carragenina na gelificação das PSL é também dependente do valor de pH do sistema, sendo a temperatura de gelificação menor para valores de pH compreendidos entre 6 e 7.

No caso das misturas de PSL com pectinas, as propriedades dos géis formados são também altamente dependentes do pH do sistema. Turgeon e Beaulieu (2001) demonstraram que a gelificação destes sistemas ocorre via separação de fases com a formação de uma rede proteica tridimensional contínua, que suporta o gel, a qual possui inclusões de

polissacarídeo. A separação de fases depende do comportamento de cada biopolímero em solução, previamente à formação do gel, sendo as repulsões PSL/pectina mais fortes do que as repulsões médias entre PSL/PSL e pectina/pectina, o que permite a ocorrência de separação de fases. Estes autores verificaram igualmente que, no caso de ambos os polímeros possuírem carga negativa, como a pH 8, existe separação de fases antes da gelificação das PSL e, nestas condições, a estrutura dos géis mistos é essencialmente formada por agregados esféricos de PSL.

Trabalhos realizados por Bryant e McClements (2000) evidenciam o efeito da goma xantana nas características físicas dos géis de PSL desnaturadas. Para estes autores, a utilização dos benefícios das interacções entre PSL e a goma xantana permitem desenvolver formulações alimentares com uma grande variedade de características texturais e com aparências variáveis. Quantidades pequenas de goma xantana, tais como 0.1%, causam um apreciável incremento na velocidade de gelificação das PSL e na rigidez do gel e uma alteração de cor do gel final obtido. Mais uma vez se verifica que o mecanismo físico-químico responsável por tais efeitos é a incompatibilidade termodinâmica entre a goma xantana e as PSL, a qual conduz à separação de fases.

Neste trabalho mostrou-se ainda o efeito da força iónica nos sistemas mistos PSL/goma xantana: sem adição de sais, a separação de fases desencadeou a formação de duas camadas, o que é determinante para a qualidade do produto final. Na presença de sais, a separação de fases conduziu à formação de uma região rica em goma xantana inserida num gel de PSL, evitando-se assim um sistema formado por duas camadas distintas.

No que se refere a sistemas mistos contendo polissacarídeos neutros, é encontrado um menor número de trabalhos. Estudos envolvendo amilopectinas (Olsson et al, 2000) e maltodextrinas (Manoj et al., 1997) são encontrados na literatura. Devido à larga utilização das GM a nível industrial encontram-se também alguns estudos acerca do efeito da GM nas propriedades gelificantes das PSL.

Tavares e Lopes da Silva (2003) analisaram o comportamento reológico de misturas aquosas de PSL/GA, a pH neutro e a pH próximo do pI da proteína, tendo verificado que as propriedades viscoelásticas dos sistemas mistos PSL/GA, assim como o efeito global do

polissacarídeo neutro na gelificação das PSL, era dependente do pH do sistema, e consequentemente, do tipo de organização estrutural da rede tridimensional proteica. A pH neutro, a presença da GA apresentou um efeito global positivo na formação de géis de PSL, sugerindo a ocorrência de uma rede proteica contínua, onde as cadeias de polissacarídeo se acomodam. Esta observação resulta numa diminuição da temperatura de gelificação e da concentração crítica de proteína para a formação de um gel, assim como no aumento significativo da rigidez dos géis obtidos. Resultados semelhantes foram descritos para outros sistemas mistos PSL-polissacarídeos (Zasypkin et al., 1996; Bryant & McClements, 2000; Turgeon e Beaulieu, 2001). Por outro lado, a pH próximo do pI do sistema proteico (pH=5), foram encontrados diferentes efeitos do polissacarídeo em função da concentração proteica no sistema. Para baixas concentrações de PSL (5%) observou-se um efeito negativo resultante da adição da GA, com um consequente aumento do tempo e temperatura de gelificação, diminuição de rigidez do gel e aumento do carácter viscoso do sistema. No entanto, para concentrações proteicas mais elevadas verificou-se que a presença de GA não desencadeia alterações significativas no comportamento viscoelástico dos sistemas. O efeito distinto da adição de GA a pH 5 e pH 7 foi atribuído aos diferentes mecanismos de gelificação das PSL, para os dois valores de pH considerados.

Gonçalves et al. (2004) analisaram o efeito de galactomananas provenientes do endosperma de sementes de Cassia javanica, uma fonte não tradicional de GM, na gelificação das PSL, a pH 7. Os resultados obtidos mostraram que a adição desta goma às soluções de PSL modificava o perfil de gelificação das proteínas, assim como as propriedades reológicas dos géis finais, sendo o efeito da goma dependente da razão PSL/GM. Estes autores justificaram tais resultados com base nos processos de separação de fase que ocorrem durante o tratamento térmico. Assim, tal como Tavares e Lopes da Silva (2003), Gonçalves et al (2004) verificaram que o polissacarídeo contribui para a viscoelasticidade dos sistemas mistos e as diferenças observadas entre a gelificação das soluções de PSL e das misturas de PSL/GM, resultavam de modificações inerentes à agregação das PSL e à estrutura do gel, em consequência da presença do polissacarídeo neutro.

No seguimento do trabalho descrito, Tavares et al. (2005) dedicaram o seu estudo ao efeito das propriedades estruturais do polissacarídeo, nomeadamente, à influência do grau de ramificação (razão M/G) de galactomananas, com diferentes origens e/ou enzimaticamente modificadas, no comportamento reológico e microestrutura dos géis mistos PSL/GM, a pH neutro e baixa força iónica.

Na gama de concentrações de polissacarídeo estudada, o efeito da adição de GM foi equivalente ao descrito no trabalho anteriormente mencionado, tendo-se demonstrado que o efeito de GM era tanto mais pronunciado quanto menor o grau de ramificação. A nível de microestrutura, os géis mistos aparecem como sistemas bifásicos, onde moléculas de polissacarídeo se encontram dispersas na matriz contínua proteica, para baixas concentrações de GM, e com uma progressiva inversão de fases à medida que aumenta a concentração de polissacarídeo, especialmente para amostras com menores razões M/G. Dos resultados obtidos concluiu-se que o grau de ramificação de galactomananas influencia a microestrutura e a viscoelasticidade dos géis, sendo no entanto esse efeito limitado para um curto intervalo de razões M/G.