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O FANDOM DE ANIMES E O FANSUBBING: DA PRODUÇÃO CASEIRA À BASE DE MEDIAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO GLOBAL

SITE BITTORRENT – OMDA FANSUBS

BitTorrent administrado pelo grupo brasileiro OMDA Fansubs (FONTE: http://bt.omda-fansubs.com/browse.php – 2012)

77 Diante todo o exposto, cremos que está se tornando bastante difícil para os

fansubbers regularem as práticas em suas comunidades on-line bem como a distribuição de

seus trabalhos na rede para os demais fãs. Nossa aposta é que um novo tipo de comunidade

fansubber está se formando atualmente. Em termos comportamentais, observa-se que as

dinâmicas contemporâneas dessas comunidades assemelham-se bastante àquelas encontradas no universo dos Multiuser Massive Online Role Playing Games (MMORPG). No entanto, uma diferença substancial aí se impõe: apesar de se constituírem socialmente como as comunidades de MMORPG, em termos de competitividade, os fansubbers criam produtos finais que podem ser utilizados, reutilizados e re-produzidos ao fim do “jogo” para além de fronteiras lingüísticas e nacionais (DENISON, 2011).

2.3 – A produção fansubber: da tradução à distribuição na rede

A prática fansubber se configura num processo altamente especializado e diversificado e que, prioritariamente, necessita dos usos de tecnologias e competências humanas para ganhar forma. Naturalmente, para que a atividade tenha seu êxito, as etapas de produção são previamente planejadas, seguindo uma lógica compartilhada, em boa medida, entre os grupos que atuam em diversos países, mas não só isso.

Diferentemente das séries televisuais americanas, que possuem conteúdo e linguagem popularizados no Brasil e no mundo, os textos de mídia japoneses carregam uma série traços, valores e sentidos próprios pouco conhecidos pelo grande público. Por isso, o conhecimento da cultura e língua japonesa para a mediação e decodificação desses textos é deveras valorizado na comunidade fansubber. No decorrer do processo, esses textos de mídia recebem um tratamento diferenciado pela tradução fansubber. Devido à barreira do idioma ser maior do que a da do inglês e maioria dos idiomas ocidentais, indo desde a escrita e até a pronúncia e pelas diferenças culturais muitas vezes necessárias para compreensão de uma fala ou atitude de um personagem, as traduções bem como as legendas criadas pelos fansubs podem ser tomadas como “especiais”, em detrimento à noção da “tradução e/ou legenda profissional”. Como Ferrer Simó (2005) demonstra em artigo pioneiro, existem diferenças substanciais quanto às características que distinguem a legenda fansubber da legendagem profissional São elas: 1) Uso de fontes diferentes através

78 do mesmo programa; b) Uso de cores para identificar os diferentes personagens; 2) A utilização de mais subtítulos com mais de duas linhas (até quatro linhas); 3) Utilização de notas lineares na parte superior da tela; 4) Utilização de efeitos no corpo das legendas; 5) A posição de legendas varia na tela (scenetiming); g) Karaokê nas aberturas e encerramentos; 6) Adição de informações sobre os grupos e, por fim, 7) Tradução dos créditos de abertura e encerramento (FERRER SIMÓ, 2005, p. 30) .

Em estudos anteriores localizados na área da tradução audiovisual encontramos descrições de suma importância quanto à organização das etapas de trabalho o que nos permite entrever as competências requeridas para o processo de concepção dessas legendas amadoras. Os pesquisadores espanhóis Jorge Díaz Cintas e Pablo Muñoz Sánchez (2006) vão postular a existência de etapas de produção que se traduzem nas seguintes tarefas: aquisição de fonte (raw), começando com a obtenção dos vídeos originais em sites P2P64, tradução, sincronismo, typesetting, edição, codificação, distribuição e karaokê para as seqüências de aberturas e encerramento dos animês (DIAZ E SÁNCHEZ, 2006, p. 40-42). Após a revisão textual, o grupo disponibiliza na rede. Essas tarefas são divididas entre membros do grupo e por muitas vezes um membro pode fazer várias tarefas. Quanto ao tempo requerido, há que se dizer que depende deveras das habilidades das pessoas envolvidas. Tofusensei, membro do fansub americano Live-eviL também comenta sobre esse processo, em detalhes:

Inicialmente, nós temos que obter as raws. O que vem de uma variedade de fontes – para compramos alguns títulos em DVD’s, cheguei ao ponto de viver no Japão para capturar os shows para minha televisão – mas principalmente nós adquirimos a partir de sites japoneses de peer-to-peer, às vezes as pessoas usam o bitorrent, mas principalmente nós usamos sites japoneses de peer-to-peer, onde um novo show será exibido normalmente algumas horas após a transmissão.

O próximo ponto importante é conseguir fazer a tradução. Isso é a primeira coisa que precisa acontecer para que toda a gente possa começar a trabalhar, por isso o tradutor tem de fazer a bola rolar. Assim, a primeira coisa que fazemos é obter para um tradutor o arquivo e é tão simples como traduzindo o show em um arquivo de texto e indo de lá. Existem alguns passos diferentes, de ter alguém a ir a tradução para ter alguém a hora no arquivo de texto para o vídeo. O programa que normalmente usávamos era chamado SubStation Alpha, mas o software que tem sido usado é chamado AegiSub, que é um

pacote de legendagem de ciclo livre.

Em seguida, há a edição do script ficando tudo cronometrado, com fonte bonita, karaokê, tudo isso. Temos uma equipe de pessoas especializadas nesse ramo – assim você vai ter alguém que é um editor, alguém que é um temporizador. E então todos nós juntos, fazemos uma verificação de qualidade – grupos diferentes têm maneiras diferentes de fazer as coisas,

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No decorrer das entrevistas com Aracraud, do Ryussei Fansub cheguei a esses dois sites que disponibilizam raws: http://leopard.raw-providers.net/ e http://yousei-raws.org/

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nós temos um grupo dedicado de pessoas que se voluntariou para assistir os shows várias vezes e examinar tudo. A última etapa é a distribuição, que, atualmente, é uma fatia do bolo; não é como era há 5-6 anos atrás. Se você tiver um bom tradutor e pessoas qualificadas, o típico episódio será completado e liberado em torno de 12 a 20 horas (BERTSCHY, 2008, online).

Portanto, assemelha-se bastante a um sistema de linha de montagem, onde cada etapa depende da outra para a obtenção do resultado desejado. Basicamente, as funções que cada fansubber desempenha no decorrer do processo de produção são: 1) Raw hunter: fã que realiza uma pesquisa para aquisição do arquivo do anime, é o provedor da matéria prima original; 2) Tradutor: responsável pela tradução do texto (inglês/japonês para o português); 3) Typesetter: fã que opera na marcação de legendas, cria créditos e logotipos, placas e notas explicativas de termos; 4) Revisor: verifica possíveis erros ortográficos no texto já traduzido; 4) Timer, atua na sincronização entre legenda e áudio e; 5) Karaokê

maker, responsável pelo karaokê das músicas de abertura e de encerramento dos animês; 6) Encoder, sua função é juntar o anime sem legenda (a raw fornecido pelo raw-hunter) com

os scripts, gerando o arquivo final. 7) Quality-checker, responsável por assistir o anime completo em busca de erros, ajudando a corrigi-los. O final da cadeia destes produsers é o

uploader, que divulga o resultado final na internet (SILVA, 2009, p. 11). Mais do que

produzir legendas, os fansubbers também criam novos elementos para o animês, outros adereços, além da própria legenda das falas, como é o caso das notas explicativas, dos logotipos (alguns, animados) dos grupos e das assinaturas eletrônicas dos membros do projeto (figura 05).

Programas de edição como Adobe After Effects, Aegisub, MeGUI, MKV tools estão entre os mais utilizados pelos fansubbers ao longo do processo de confecção das legendas. O conhecimento prévio dessas ferramentas consiste num dos principais requisitos para adentrar e atuar nos fansubs atualmente. Até mesmo daqueles membros que atuam mais pontualmente, por exemplo, como tradutores e revisores, é desejável (porem, não obrigatório) o aprendizado no manuseio dessas ferramentas de edição. A explicativa reside numa premissa básica criada ao longo da existência da atividade por seus próprios membros de que o trabalho não deva ser centralizado, ou seja, as etapas que envolvem a produção fansubber devem ser compartilhadas (e entendidas) por todos. O objetivo, portanto, é que na medida do possível os membros dos fansubs possam acumular outras competências enquanto atuantes na referida comunidade, ou seja, em suas funções nos grupos em que atuam.

80 FIGURA 05

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