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2.2 CAMINHOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

2.2.5 Situando o “campo”: as pesquisas selecionadas

Diz-se pesquisa de campo, aquelas que lançam mão de procedimentos metodológicos que transpõem o reducionismo do empirismo, mas busca interpretar a realidade a partir de pressupostos teóricos, sem pretensão de desvelar “verdades” integrais, e configura-se, sobretudo, como uma tentativa de aproximação: “[...] de conhecer

qualquer fenômeno constituinte dessa realidade [...], visto sua complexidade e dinâmica dialética” (PIANA, 2009).

Usamos como título “campo”, pois, aqueles que realizam pesquisas que se caracterizam como estado da arte, levantamento e análise de produção, o “campo” da pesquisa são os documentos, teses, dissertações, dentre outros, onde o pesquisador mergulha por meses ou anos.

E, para situar nosso campo, inicialmente, vamos tecer algumas considerações acerca do perfil das pesquisadoras – as autoras das dissertações –, que compuseram nosso corpus de análise.

Quanto às opões metodológicas das pesquisas, entre as dissertações analisadas, algumas se detiveram a uma descrição detalhada do percurso metodológico, explicitando as ferramentas. Das 13 dissertações selecionadas nenhuma se configura como estado da arte, nem como levantamento de produção, as 13 pesquisas realizaram a pesquisa diretamente com as crianças, as professoras ou com as famílias no contexto da educação infantil.

Três dissertações definiram-se enquanto estudos do tipo etnográfico, com os seguintes nomes: etnográfica, inspirado no método etnográfico e estudo com nuances etnográficas. Duas dissertações classificaram-se como pesquisa ação, encontramos ainda dois estudos exploratórios e uma análise de conteúdo. Encontramos duas pesquisas do tipo estudo de caso, outra que se caracteriza enquanto uma análise crítico-reflexiva da própria realidade vivida. Por fim, uma das dissertações não explicitou qual tipo de pesquisa adotou, todavia trouxe uma densa descrição dos processos metodológicos.

Os principais procedimentos metodológicos explicitados nas dissertações são: observação participante, registos fílmicos e fotográficos, caderno de campo, entrevista semi-estruturadas e questionários. Muitos dos procedimentos e ferramentas metodológicas se assemelham com pequenas distinções nos modos como são chamados pelas pesquisadoras.

Grande parte das pesquisas manifestou a preocupação de utilizar ferramentas metodológicas que ajudassem a se aproximar dos pontos de vistas das crianças e chamam a atenção para a importância dos pesquisados em legitima-las enquanto partícipes da pesquisa, muitas das dissertações manifestaram o cuidado em aproximar-se das crianças de forma respeitosa.

De acordo com Buss-Simão (2007) reservar esse direito às crianças que estão envolvidas nas pesquisas é basal para a consolidação das crianças como sujeito de direitos, pois, em muitas perspectivas

somente o consentimento dos adultos responsáveis é o suficiente para a realização da pesquisa. Nessa perspectiva, podemos destacar a partir dos estudos analisados, que tem optado por alternativas metodológicas comprometidas em ir até a creche, ouvir e/ou auscultar as crianças pequenas, com olhar sensível mediante aos modos comunicacionais dos bebês, a seus pontos de vistas, como um esforço de conhecê-las e, também as relações educativas que envolvem esse contexto.

Para tanto, as ferramentas metodológicas explicitadas nos estudos parece-nos alternativas profícuas para estudos com crianças, para conhecer sua infância e a sua educação. De acordo com Jobim e Souza e Castro (2008, p.53, grifo no original):

Na medida em que a criança não é vista apenas como um objeto a ser conhecido, mas como sujeito com um saber que deve ser reconhecido e legitimado, a relação que se estabelece com ela, no contexto da pesquisa, começa a ser orientada e organizada a partir dessa visão. Nessa perspectiva, em vez de pesquisar a criança, com o intuito de melhor conhece-la, o objetivo passa a ser pesquisar com a criança as experiências sociais e culturais que ela compartilha com as outras pessoas de seu ambiente, colocando-a como parceira do adulto-pesquisador, na busca de uma permanente e mais profunda compreensão da experiência humana.

Na esteira dessa discussão, Buss-Simão (2007) e explica-nos que os estudos da Sociologia da Infância têm sugerido que as pesquisas sejam feitas com as crianças e não somente sobre elas, realizando-as a partir da perspectiva das crianças e compreendo que são sujeitos da pesquisa e não meros objetos, com vistas a:

[...] dar-lhes legitimidade e outorgar-lhes o direito conquistado de sujeito de direitos e de se constituírem partícipes na e da produção do conhecimento. É importante ressaltar que as pesquisas que se configuram a partir da perspectiva das crianças se caracterizam por focalizar as crianças para o estudo das realidades das infâncias (BUSS-SIMÃO, 2007, p.186, grifo no original).

Boa parte dos trabalhos apresenta ainda, uma perspectiva de colaboração e diálogo disciplinar, importante movimento que se

expressa por meio das pesquisas da área e reitera a complexidade que envolve a infância e seus processos educativos. Entre as áreas sinalizadas, podemos destacar as contribuições da Educação, Antropologia, Filosofia, História, Psicologia e, em menor número, diálogo com a Sociologia da Infância.

Dentre os muitos autores utilizados para os diálogos disciplinares, podemos citar as contribuições de autores da área da Psicologia: Donald Winiccott, Jacques Lacan, Henri Wallon, Lev Vygotsky, Alexander R. Luria, Alexis N. Leontiev, Jean Piaget.

Já no âmbito da Filosofia aparecem: Jean-Jacques Rousseau, Karl Marx, John Dewey, Mikhail Bakhtin, Walter Benjamin. E os mais contemporâneos Walter Kohan e Jorge Larrosa. Os principais autores citados na área da Sociologia da Infância foram Manuel Sarmento, Alan Prout e Peter Moss.

No âmbito da Educação as principais referências utilizadas foram: Maurice Tardif, Bernadete Gatti, Ana Beatriz Cerisara, Maria Malta Campos, Sônia Kramer, Fúlvia Rosemberg, Eloisa Rocha, Tizuko Morchida Kishimoto, Fernanda Carolina Dias Tristão, Alessandra Arce17, Lígia Márcia Martins, Maria Carmen Silveira Barbosae Maria Clotilde Rossetti-Ferreira. Para situar a história da educação infantil o principal autor utilizado foi Moysés Kuhlmann Jr.

As contribuições da educação das italianas também apareceram num significativo número de trabalhos, as quais são: Susanna Mantovani, Anna Bondioli e Lella Gandini.

Importante salientar que todas são pesquisadoras, e, dentre as 13 dissertações, 9 pesquisadoras se dizem professoras de bebês, professoras de educação infantil ou pedagogas. Grande parte das pesquisadoras explicita, ao apresentar a trajetória profissional e motivações, que suas questões e inquietações originaram-se justamente na prática pedagógica com grupos de bebês.

Deste modo, podemos afirmar que, a grande maioria das pesquisadoras são professoras de bebês que buscam, por meio da pesquisa, tecer reflexões e produzir conhecimento acerca da própria profissão. A feminilidade que demarca a profissão vem se constituindo historicamente, logo, refletem-se também nas pesquisas da área, que são significativamente produzidas por mulheres, pedagogas: professoras- pesquisadoras.

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Alessandra Arce e Ligia M. Martins organizaram um livro cujo objeto de preocupação é a educação das crianças na faixa etária de zero a três anos, com o nome Ensinando aos pequenos de zero a três anos (2009).

Cerisara (2002) já havia assinalado este quadro e indica-nos que o perfil das profissionais da educação infantil se constitui entrelaçado com o feminino. Embora, destaque a necessidade de considerar as mulheres em seu contexto sociocultural, o que inclui a existência de contradições sociais:

Sem pretender uma definição acabada do perfil das profissionais de educação infantil, pode-se afirmar que elas têm sido mulheres de diferentes classes sociais, de diferentes idades, de diferentes raças, com diferentes trajetórias pessoais e profissionais, com diferentes expectativas frente à sua vida pessoal e profissional, e que trabalham em uma instituição que transita entre o espaço publico e o espaço doméstico, em uma profissão que guarda traços de ambiguidade entre a função materna e a função docente (CERISARA, 2002, p.25-26).

É importante considerar a discussão e o aprofundamento acerca do gênero na constituição da profissão, pois, significa apreender o conceito de gênero que se faz persente não somente na experiência doméstica, mas também nos sistemas econômicos, políticos ou de poder: “Não pode ser considerada apenas uma variável a mais a ser constatada, mas uma categoria de análise fundamental par a compreensão da identidade dessa profissão e dessas profissionais [...]” (CERISARA, 2002, p.31).

Segundo Batista (2013) ao atribuir às profissionais da educação infantil um caráter de legalidade da denominação “professora” traz implicações que sugerem uma valorização. Tendo em vista que esta denominação é historicamente carregada de um status de cientificidade – que advém da perspectiva escolar, o que desloca o papel da professora de substituição das mães na educação das crianças pequenas. Para termos uma definição mais clara do papel das professoras de educação infantil, que se distingue das professoras das séries iniciais, será preciso que a especificidade do trabalho junto aos bebês e crianças pequenas seja amplamente compreendida, pois, “[...] as práticas dessas profissionais são práticas que se mesclam com as práticas domésticas e de maternagem, as quais são socialmente desvalorizadas” (CERISARA, 2002, p.107).