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3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA

3.1.3 Delineamento e escolha das variáveis da pesquisa

3.1.3.2 Sobre a escolha do método etnográfico

A pesquisa adotou como eixo condutor o método etnográfico cuja modalidade de investigação naturalista teve por base a observação participante e a descrição das comunidades em estudo. Uma descrição que se elaborou numa relação de observação espontânea e dialógica, onde a cotidianidade das pessoas constituiu o campo de observação direta do fenômeno. Para Mattos (2001), o interesse da etnografia reside no estudo das variações de determinado caso e das relações entre estas variações e as variações próprias do contexto maior em que este caso está inserido. Estas variações passam a ser percebidas através da técnica da observação participante que é o que o observador apreende, vivendo com as pessoas e partilhando as suas atividades.

De acordo com Lapassade (2001), a expressão “observação participante” tende a designar o trabalho de campo no seu conjunto, desde o momento em que o investigador chega ao campo da investigação, quando inicia as negociações que lhe darão acesso, até o momento em que, após uma longa estada, o abandona.

A abordagem etnográfica se destacou como eixo metodológico pelo fato de responder e contribuir com o campo das pesquisas qualitativas que se interessam pelo estudo das desigualdades e exclusões sociais. De acordo com Mattos (2001), esta abordagem traz uma análise dialética da cultura, que é percebida como um sistema de significados mediadores entre estruturas sociais e ações humanas. E também enfatiza o processo participativo, principalmente “por introduzir os atores sociais com uma participação ativa e dinâmica no processo modificador das estruturas sociais” (MATTOS, 2001, p. 2), tendo sido, portanto, o método apropriado para a realização de grande parte desta pesquisa.

Por se tratar de leituras elaboradas a partir da cotidianidade dos sujeitos do lugar, o método etnográfico permitiu que o “objeto de pesquisa” se transformasse em sujeito indispensável – os atores sociais - na ação de dar sentido às contradições sociais e, por conseguinte, no avanço epistêmico da pesquisa. Esta transformação em sujeito passou a

ocorrer pelo simples fato de ter nas pessoas do lugar a oportunidade de percebê-las através da sua forma de olhar, de conceber o mundo e a sociedade da qual fazem parte. Esta observação tornou-se instrumento básico para a interpretação, valorização, concepção, profundidade teórica e prática sobre a resiliência socioecológica e as suas relações com a sustentabilidade e o desenvolvimento local sustentável.

Na perspectiva de atuar mais como observador e ouvinte aliado ao processo de vivências para a extração da leitura do lugar, foi permitida uma maior aproximação do contexto local, o que favoreceu uma melhor percepção sobre as relações. Relações estas que permeiam e compõem o significado cotidiano existente no interior de uma comunidade, de um dado lugar.

O desafio consistiu em responder como adentrar, mergulhar no “universo” que é do “outro”, estar com o outro sem ser o outro. Em reconhecer que o sujeito histórico, aquele que faz a ação social, contribui para significar o universo pesquisado exigindo uma constante reflexão e reestruturação do processo de questionamento por parte do pesquisador.

Ressalta-se que a experiência empírica direta – o trabalho de campo – constitui-se oportunidade de sensibilização por parte dos “atores participantes” do processo em estudo possibilitando o reconhecimento do outro como portador de uma cultura igualmente respeitável. Os atores sociais e institucionais locais e a equipe de pesquisadores formaram o quadro dos “atores participantes” porque fizeram parte do universo observador-observado onde através dos diálogos estabelecidos, o “observado” passou a ser “observador” e contributivo com a elaboração dos dados extraídos através de suas informações, suas leituras específicas sobre o contexto local, seus significados e concepções.

Foram estes momentos que subsidiaram de forma efetiva no avanço metodológico e epistêmico da resiliência socioecológica. Neste universo observador-observado, a equipe de pesquisadores - “sujeito observador”- exerceu sua capacidade de interpenetrar e interpretar os fatos e em função disto pôde contribuir, enquanto pesquisadores, com o constructo teórico em investigação; tornou-se observado por ser a fonte principal da sistematização das leituras elaboradas em campo e na revisão bibliográfica. Leituras estas reavaliadas, em parte, pelos atores sociais locais nos momentos em que o pesquisador ou a equipe de pesquisadores passou a consultar estes mesmos atores para avaliar suas interpretações a respeito do que foi observado em campo. Esses momentos possibilitaram ao pesquisador rever suas interpretações e vivenciar o papel de ser “observado” em sua capacidade de interpretar.

A pesquisa partiu do entendimento de que a resiliência socioecológica está diretamente relacionada à capacidade de um sistema complexo se desenvolver mantendo sua

capacidade de ser sustentável. Isto significa dizer que o desenvolvimento local para que seja sustentável passa necessariamente pela boa conservação da resiliência desses sistemas e de como as relações entre suas variáveis se estabelecem. Tornou-se necessário inserir-se no contexto mais amplo das relações humanas e aproximar-se do assunto a ser investigado sem uma teoria a ser testada, mas pelo contrário, aproximar-se para compreender uma determinada situação, entender como seus participantes atuam em seu cotidiano e por que uma dada situação ou fatos se configuram desta ou daquela forma.

Durante a vivência em campo, os dados recolhidos foram provenientes de fontes diversas, a exemplo das conversações ocasionais relacionadas ao estudo, através de documentos “oficiais”, ou, sobretudo, de documentos pessoais, nos quais os moradores locais revelaram os seus pontos de vista sobre a sua vida numa apreensão mais ampla ou sobre eles próprios, enquanto universo restrito no plano do indivíduo que também se reelabora e passa por mudanças.

Foram observadas as percepções dos moradores locais e as relações intrínsecas a essas percepções no campo funcional, entendido como processo e sistema de significações, e no campo estrutural entendido como mecanismos do pragmatismo vivenciado no cotidiano da comunidade. A pesquisa, à luz de Adger (2000, 2007), focalizou suas observações e percepções no contexto das relações que firmam as dimensões do sistema de crenças, das formas de manejo das práticas produtivas, das mudanças na biodiversidade e do sistema de governança da localidade em estudo. Todas estas variáveis formam o campo das relações que por sua vez se interconectam e utilizam outras variáveis para formar as redes estruturais e funcionais de cada sistema socioecológico.

3.1.3.3 Sobre a escolha de atributos e critérios de análise das variáveis da resiliência