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As redes sociais não são blocos monolíticos, possuem suas próprias subdivisões Ou seja, é possível encontrar contrastes em termos de experiências

Considerações finais

II) As redes sociais não são blocos monolíticos, possuem suas próprias subdivisões Ou seja, é possível encontrar contrastes em termos de experiências

entre os indivíduos que participam de uma rede social. Cada indivíduo ou grupo terá um nível específico de inserção e, consequentemente, acesso aos benefícios e limites oferecidos por uma determinada rede formada de acordo com o acúmulo de experiências e de capital simbólico de que disponha. Como um dos propósitos deste trabalho era analisar possíveis contrastes referentes à experiência de homens e mulheres no pentecostalismo, irei utilizar as diferenças de gênero para identificar parte da diversidade interna destas redes.

Redes sociais e experiências de gênero

Quanto às redes extra-religiosas, tenho salientado ao longo das discussões e descrições que a experiência de gênero implica num modo específico de viver o bairro, onde homens e mulheres estabelecem seus circuitos de sociabilidade de maneiras diferentes. Utilizando a constatação empírica e a conclusão teórica de Michel Agier (1998) sobre o bairro da Liberdade, defendi que este modelo de compreensão pode ser estendido aos bairros populares como um todo, dada a similaridade de seus processos formativos. Quanto aos homens, identifiquei os grupos de pares como estando na base desta delimitação espacial da ocupação do bairro. No caso das mulheres, salientei o papel das redes familiais como processos de mediação da experiência feminina entre a família e o espaço do bairro como um todo.

Em se tratando das redes intra-religiosas algo similar irei salientar aqui. As experiências de gênero implicam no modo específico de viver no interior das redes religiosas. No capítulo anterior relatei a existência de uma continuidade entre os modelos de divisão das tarefas domésticas na família pentecostal e o modelo de divisão sexual do trabalho religioso da igreja. Quero aqui chamar a atenção para o fato de que as redes religiosas compostas por homens e mulheres que pude rastrear e identificar em campo têm seguido o mesmo modelo que suas experiências de gênero. Ou melhor, seria mais apropriado dizer que, em grande medida, as experiências de gênero no pentecostalismo assumem tais características por se darem no interior de redes religiosas que possuem tais características. O que estou

pretendendo dizer aqui é que não só os homens e as mulheres possuem experiências que remontam a representações de gênero no interior do pentecostalismo, mas as redes que os comportam na igreja se organizam geralmente segundo este princípio.

Pode-se dizer então que, desconsiderando os fatores que mobilizam sua formação, em geral, as redes masculinas e femininas atuam em complementaridade, reproduzindo o modelo geral de família no pentecostalismo. Como foi possível ver ao longo das descrições do trabalho, as redes femininas são as principais responsáveis pela condução de indivíduos à religião. Os processos de conversão se dão muitas vezes sob influência, de mulheres, já que estas reaproveitam antigos laços de parentesco, vizinhança e afinidade para constituir um campo permanente de influência do evangelho. Por outro lado, as redes masculinas atuam de maneira diferente. É no interior das redes que as lideranças masculinas são constituídas a partir de uma experiência de aprendizado. Sendo que geralmente os homens ocupam os cargos mais altos da igreja, as relações de cooperação entre eles acabam se confundindo com relações de cooperação entre as igrejas, como é o caso dos convites feitos para os novatos pregarem nos diferentes templos – o que se constitui como um modo de aprendizado da liderança masculina oferecido pela cooperação mútua das igrejas nas redes em que se inserem. Posso então encerrar estas considerações salientando uma das principais diferenças entre as redes femininas e masculinas, tal qual tenho notado.

Observando do ponto de vista das redes sociais, posso salientar a existência de um contato entre as diferentes denominações a partir de critérios diferentes nos bairros populares de Salvador (podendo estender para outros contextos, certamente). Por via das redes femininas, o contato entre as diferentes denominações se dá geralmente a partir de um trânsito intra-religioso e extra-religioso, orientado por relações pessoais de afinidade – mulheres convidam homens e, principalmente outras mulheres para visitarem suas congregações. Por outro lado, por via das redes masculinas, o contato entre as diferentes denominações se dá em última instância a partir do contato institucional das igrejas – o contato intra-religioso é mais preponderante. Assim como na organização da família pentecostal, onde a mulher realiza distintas tarefas (inclusive administrativas), mas o homem é considerado o

líder do grupo, respondendo formalmente pela casa; do mesmo jeito, na organização do grupo religioso, as mulheres desenvolvem diferentes tarefas (algumas inclusive administrativas), mas os homens são considerados os líderes últimos do grupo, respondendo formalmente pela igreja. É evidente que não podemos identificar aqui “a rede” masculina ou “a” feminina, pois estamos falando de um processo complexo composto por vários agentes em relação. Porém, o modo de organização destas redes identificadas segue um modelo calcado nas experiências de gênero de seus integrantes, tendo a vida no bairro e na religião como contexto mais imediato.

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O tema e objetivo central que guiou este trabalho foi a compreensão de processos de ascensão de mulheres ao pastorado, o que fiz tentando elucidar elementos gerais da religião bem como as especificidades mais características da manifestação deste fenômeno. A temática das redes sociais é um elemento que não poderia deixar de ser abordado de uma forma ou de outra, pois estas constituíram em grande medida a base destes fenômenos sociológicos.

As discussões realizadas e conclusões alcançadas aqui neste trabalho não exaurem a riqueza do processo de disseminação do pentecostalismo nos bairros populares em geral. Antes, lançam apenas alguns flashes de luz na superficialidade translúcida dos fenômenos, tornando um pouco visível a sua complexidade. Acredito que este trabalho possa acrescentar novas perguntas às já existentes, tornando ainda mais necessária a insistência nos estudos sobre o pentecostalismo e suas peripécias no campo religioso brasileiro.

Referências

ALMEIDA, Cláudio Roberto dos Santos de. Rabelo, Miriam Cristina C.; Mota Sueli. Cultivating the Senses and Giving in to the Sacred: Notes on Body and Experience Among Pentecostal Women in Salvador, Brazil. Journal of Contemporary Religion, Vol 24, num 1, January 2009.

_______ O Culto Pentecostal como Ritualização Narrativa. Seminário 15 anos de ECSAS, Salvador outubro de 2008.

________ Entre a Costela de Adão e o Púlpito Sagrado: Discutindo mecanismos

de contra-hegemonia feminina entre evangélicos na periferia de Salvador. Seminário

de Pós-Graduação em Ciências Sociais, UFBa. Salvador, setembro de 2008.

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Demonização da Dor e Sacralização da Cura:

Dicutindo percursos de