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O estudo clínico a partir de imagens de cintilografia da perfusão miocárdica é comumente utilizado no diagnóstico de doença arterial coronariana (DAC). Entretanto, este estudo também é importante no diagnóstico de infarto agudo do miocárdio (IAM), estratificação de risco após o infarto e avaliação do miocárdio viável frente à fibrose em pacientes com DAC crônica (THRALL et al, 2003).

Os estudos de perfusão miocárdica podem ser realizados utilizando diferentes radiofármacos, sendo os mais utilizados, o 99mTc–sestamibi, o 201Tl, o 99mTc-tetrofosfim e o 99mTc-teroboxime. Os traçadores marcados com 99mTc apresentam pequenas diferenças entre si na biodistribuição (relação hepato-renal) e pequenas diferenças técnicas (marcação a quente X marcação a frio). As imagens são praticamente indistinguíveis. Na rotina clínica, os traçadores marcados com 99mTc são mais utilizados por apresentarem características físicas mais adequadas à câmara de cintilação de NaI(Tl), pela sua maior disponibilidade e menor custo operacional. Apenas em situações específicas, como na avaliação da presença de viabilidade miocárdica em pacientes com miocardiopatia isquêmica, o estudo com 201Tl, com protocolo de redistribuição tardia, apresenta sensibilidade superior ao estudo convencional utilizando radiofármacos marcados com 99mTc.

A dosimetria favorece os radiofármacos marcados com 99mTc devido às suas características, sendo as principais, a curta meia-vida física de 6,02 h e a emissão de fótons gama “puro” (89%) em seu decaimento no estado metaestável.

2.2.1 Protocolos de Aquisição de Imagens de Perfusão Miocárdica

Cada instituição pode desenvolver seus próprios protocolos de aquisição de imagens, contudo, existem orientações específicas, denominados guidelines, para os estudos em cardiologia nuclear e para orientação da interpretação médica das imagens. Tais orientações são publicadas pelo Colégio Americano de Cardiologia (American College of Cardiology), Sociedade de Medicina Nuclear (Society of

Nuclear Medicine), Sociedade Americana de Cardiologia Nuclear (American Society of Nuclear Cardiology) e pela Organização Mundial de Saúde (World Health Organization).

No caso específico das imagens de perfusão miocárdica com o traçador 99mTc–sestamibi, podem ser realizados estudos planos ou utilizando a técnica tomográfica (SPECT).

Para a aquisição de uma imagem de perfusão miocárdica plana, costuma-se administrar uma atividade em torno de 370 MBq (10 mCi) ao paciente, de forma a obter uma contagem estatisticamente adequada (750 k a 1 M por imagem), mesmo com um colimador de alta resolução. As imagens da fase do repouso são adquiridas de 60 a 90 minutos após a administração do radiofármaco, nas incidências anterior, oblíquo anterior esquerda (350 a 400), oblíquo anterior esquerda de 600 a 700 e lateral esquerda. As altas taxas de contagens fornecidas pelos agentes marcados com 99mTc permitem a aquisição da imagem acoplada simultaneamente ao eletrocardiograma (ECG), isto é, gatilhada pelo ECG (gated scintigraphy). A grande vantagem da imagem gatilhada é a possibilidade de avaliar a função do miocárdio pela análise de motilidade da parede miocárdica e pela medida de seu espessamento (THRALL et al, 2003).

Protocolos têm sido desenvolvidos para realizar estudos tomográficos de perfusão miocárdica em estresse e em repouso, que podem ser realizados em um ou dois dias. Nos exames realizados em um único dia, mais comuns, o primeiro estudo costuma ser realizado com 370 MBq (10 mCi) e o segundo, 3 horas a 4 horas depois, com 740 MBq (20 mCi) a 1110 MBq (30 mCi). Algumas instituições preferem primeiramente realizar o estudo de esforço (estresse), enquanto outras realizam primeiramente o exame em repouso. Se o estudo de estresse é realizado inicialmente, o estudo de repouso pode ser evitado, no caso do resultado do primeiro

ser normal, diminuindo a dose no paciente. A interpretação deve levar em conta a atividade residual do exame anterior.

Existem variações nas configurações do sistema para a aquisição que determinam a qualidade final das imagens. São elas: o tipo de colimador utilizado, a escolha da aquisição contínua ou descontínua, o comprimento do arco percorrido e o formato da órbita de aquisição.

Para as imagens SPECT de perfusão miocárdica recomenda-se utilizar um colimador de alta resolução ou de propósito geral. A aquisição descontínua (step and

shoot), na qual a câmara apenas adquire contagens em posições fixas, costuma ser

a mais utilizada. Em relação ao arco de aquisição, a configuração mais utilizada é o arco de 1800, para câmaras de uma ou duas cabeças (detectores a 900 entre si), com este arco iniciando em 45o na posição oblíqua anterior direita, e terminando em 135o, na oblíqua posterior esquerda. Uma vantagem da utilização desta configuração é o maior conforto, devido à possibilidade de o paciente posicionar o braço esquerdo sobre a cabeça durante o exame, também evitando a interferência da coluna na imagem. O tempo de aquisição é de 20 a 25 minutos, sendo a movimentação por desconforto do paciente a principal causa de degradação do SPECT cardíaco. Em relação ao tipo de órbita, a órbita não-circular, limitada pelo contorno do corpo ou elíptica, deveria ser utilizada para manter o detector mais próximo do paciente. Este tipo de órbita aumenta a resolução espacial, que é degradada quanto maior a distância do alvo-detector. Porém, na prática, a órbita circular com o coração no centro de rotação é a mais comumente utilizada nos serviços (THRALL et al, 2003).

Em relação à estatística de contagem no miocárdio, para estudos com 99mTc, a contagem máxima por pixel na região do ventrículo esquerdo deve ser maior do que 200 (HOLLY et al, 2010).

O SPECT sincronizado com o ECG, ou estudo gatilhado, possibilita o estudo da motilidade da parede do miocárdio de forma global a regional, também permitindo observar os batimentos cardíacos em modo dinâmico (cine). O ciclo cardíaco é normalmente dividido em 8 ou 16 imagens (frames). Os dados são adquiridos gatilhados com a onda R do ECG, sendo os batimentos arrítmicos filtrados a partir dos ciclos adquiridos. As imagens gatilhadas têm proporcionalmente menor número de contagens por imagem, devido ao número de imagens por ciclo cardíaco, mas a alta taxa de contagem e os sistemas com mais de uma cabeça tornam estes estudos

viáveis. O estudo gatilhado permite o cálculo da fração de ejeção do ventrículo esquerdo, a medida do espessamento da parede e uma melhor análise da distribuição do radiotraçador, além de permitir a visualização tridimensional do miocárdio. (THRALL et al, 2003).

2.2.2 Análise das Imagens

Após a aquisição das imagens, descrita nas seções 2.1 e 2.2, é imprescindível que haja avaliação das projeções (raw data) em modo dinâmico (cine) para a verificação da ocorrência de eventos que podem gerar artefatos na imagem reconstruída, tais como movimentos voluntários e involuntários do paciente, atenuação causada pelo diafragma e atividade visceral abdominal. Estas situações devem ser evitadas, pois podem causar artefatos nas imagens reconstruídas, como mostram a Figura 7(a) e Figura 7 (b).

(a) (b)

Figura 7: (a) Cortes tomográficos de SPECT cardíaco, onde ocorreu atenuação diafragmática e, (b) Cortes tomográficos de SPECT cardíaco, onde ocorreu atenuação devido à mama. As setas nas

imagens indicam algumas áreas que sofreram atenuação.

Após esta verificação, quando não há evidências de problemas de aquisição, as projeções podem ser processadas utilizando algoritmos de reconstrução (seção 2.1.2) definidos pelos serviços de MN.

A análise do estudo e avaliação qualitativa das imagens de perfusão do miocárdio costuma ser realizada após a reorientação dos eixos de visualização dos cortes tomográficos. Os planos de análise do miocárdio são apresentados na Figura

8 (a), bem como os cortes reconstruídos nestes planos em uma imagem SPECT, na Figura 8 (b).

(a) (b)

Figura 8: (a) Esquema dos planos de cortes de um exame de SPECT cardíaco. (b) Imagem dos cortes de um exame de SPECT de um paciente normal nos diferentes planos em estresse.

Fonte: FRANZ, 2006: Modificada pela autora.

Além disso, geralmente os cortes são analisados comparando-se as aquisições em repouso e estresse (Figura 9).

Figura 9: Cortes tomográficos nas fases de repouso e estresse em estudo de SPECT do miocárdio, para comparação.

A avaliação de estudos de SPECT cardíaco pode ser realizada de forma quantitativa e semi-quantitativa, através do cálculo da fração de ejeção ou da análise da captação em diferentes segmentos do mapa polar nas regiões do ventrículo esquerdo (HOLLY et al, 2010).

A aplicação de métodos de correção de atenuação permite a melhoria da acurácia nas análises quantitativas em SPECT cardíaco. Para avaliar tais métodos de correção e testar o desempenho dos sistemas de aquisição das imagens, são

utilizados modelos, também denominados phantoms, que representam as características físicas e geométricas da anatomia humana. Em modelos físicos, usualmente confeccionados em acrílico, são inseridas atividades variáveis de um radionuclídeo com água em diferentes compartimentos, simulando a biodistribuição do radiofármaco no corpo humano (O’CONNOR, M.K et al, 2002 & SKIADOPOULOS, S. et al, 2009). Modelos matemáticos também são utilizados com a mesma finalidade (SEGARS et. al, 2007; LJUNGBERG, M., STRAND, S. E. and KING, M. A, 1998; ZAIDI, H. & SGOUROS, G., 2003).