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Sphagneticola trilobata

No documento UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ (páginas 38-43)

3 REVISÃO DA LITERATURA

3.2 Sphagneticola trilobata

A planta S. trilobata (L.) Pruski (1996) primeiramente denominada (basônimo) Silphium trilobatum L. (1759), pertence à família Asteraceae e possui dentre as demais sinonímias Acmella brasiliensis e Wedelia paludosa (TROPICOS, 2010). É espécie nativa do Brasil, encontrada crescendo de forma espontânea em regiões litorâneas, especialmente nos estados de Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, São Paulo e Santa Catarina (BATISTA et al., 2009; KISSMANN; GROTH, 1992). Segundo informações do Jardim Botânico de Missouri, há uma ocorrência maior de registros da planta em países da América Central (TROPICOS, 2010).

A S. trilobata é conhecida popularmente por pseudo-arnica, margaridão, picão da praia, Vedélia, pingo d’ouro, mal-me-quer-do-brejo, entre outros (BATISTA et al., 2009; BLOCK, 1997; CECHINEL FILHO, 2000; CORRÊA, 1984). No Pacífico, mais precisamente na Austrália, é conhecida popularmente como Singapore daisy (DA SILVA et al., 2012; MEENA et al., 2011) e está adaptada às áreas úmidas, tolerando um certo grau de sombreamento. Cresce de modo a formar um colchão verde e uniforme (Figura 2), apresentando vistosas flores amarelas durante quase todo o ano, dependendo da intensidade da irradiação solar que receber. Produz excelente efeito ornamental (KISSMAN; GROTH, 1992). É utilizada popularmente para combater problemas respiratórios, processos infecciosos, inflamações e dores (CORRÊA, 1984). Como tintura é utilizada para combater hematomas, machucaduras e inflamações em geral (MICHALAK, 1997).

O uso popular refere-se ainda ao emprego da espécie como analgésico, febrífugo, antisséptico, para o tratamento de amenorréia, mordidas, parto, tosse, disenteria, febre, gripe, gastrosis, infecção, nefrose, dor, picada de cobra, ferimentos e dor de dente (DUKE, 2009). Além disso, na medicina popular, S. trilobata é utilizada para tratar dor nas costas, cãibras musculares, reumatismo, feridas persistentes, inchaços e dor nas articulações artríticas (ARVIGO; BALIK, 1993). O

uso da infusão aquosa de S. trilobata em parte do sul do Brasil no manejo da diabetes foi investigada por Kade e colaboradores (2010) em estudos pré-clínicos.

Figura 2: Partes aéreas da Sphagneticola trilobata (L.) Pruski

Fonte: FERREIRA1

Estudos realizados anteriormente com extratos obtidos de todas as partes da planta, indicaram alguns compostos como prováveis responsáveis pelos efeitos versados pelo uso popular. Dentre estes estão o ácido ent-caur-16-en-19-óico (ácido caurenoico, Figura 3a) (ROQUE et al., 1987), identificado através de métodos espectroscópicos usuais em fração hexano do extrato etanólico da planta inteira (raízes e partes aéreas) (BLOCK et al., 1998a), o ácido grandiflorênico (Figura 3c) (BATISTA et al., 2009), assim como o composto 5,7,3’,4’-tetrahidroxi flavona (luteolina, Figura 3b) identificado na fração de diclorometano de extrato etanólico, sendo este isolado pela primeira vez da S. trilobata (BLOCK et al., 1998a).

Figura 3 - Estrutura química a) ácido caurenoico; b) luteolina e c) ácido grandiflorênico

Fonte: b) BLOCK et al.,1998a; a) e c) BATISTA, et al., 2009.

Para avaliar melhor a constituição fitoquímica da S. trilobata, a presença dos compostos acima citados foi pesquisada em extratos produzidos a partir das diversas partes da planta, separadamente. Todos os extratos mostraram a presença

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de esteroides, terpenoides, e compostos fenólicos (flavonoides) e ausência de alcaloides (BLOCK et al., 1998b). Os resultados encontrados sugerem que o ácido caurenoico (AC) está presente em todas as partes da planta, mas é o composto majoritário nas raízes (BLOCK et al., 1998b; BRESCIANI; CECHINEL FILHO; YUNES, 2000), sofrendo variação sazonal e tendo sua concentração aumentada durante o outono (BRESCIANI et al., 2004). A luteolina está presente nas flores e folhas, mas em pequena quantidade e o estigmasterol encontra-se em todas as partes da planta em baixa concentração (BLOCK et al., 1998b).

A análise fitoquímica ainda indicou que as flores produzem diferentes flavonoides, que não são encontrados nas outras partes. Um destes flavonoides foi identificado como a chalcona coreopsina (CHECHINEL FILHO, 2000). Foram identificados dois ácidos caurânicos (ácido 3α-tigloiloxicar-16-en-19-óico, e ácido 3α- cinamoiloxicar-16-en-19-óico, Figuras 4a e 4b) (VIEIRA; TAKAHASHI;

BOAVENTURA; 2001); estigmasterol, uma mistura de 3βO-β-D-

glicopiranosilsitosterol e 3β-O-β-D-glicopiranosilestigmasterol, uma mistura de três ésteres 3β-O-aciloleanoicos (CARVALHO et al., 2001) e uma nova lactona eudesmanolide, a paludolactona (CECHINEL FILHO et al., 2004) (Figura 4c).

Figura 4 - Estrutura química a) ácido 3α-tigloiloxicar-16-en-19-óico; b) ácido 3α-cinamoiloxicar-16-en- 19-óico; c) paludolactona.

Fonte: a) e b) Vieira, Takahashi e Boaventura, 2001; c) Cechinel Filho et al., 2004

Os estudos já realizados para avaliar a atividade farmacológica dos compostos indicaram que a atividade antinociceptiva da planta se deve a compostos polares e apolares. O efeito mais pronunciado foi observado com as frações mais apolares (hexano e diclorometano) de extratos de S. trilobata (BLOCK et al., 1998a). Este aspecto sugere que os responsáveis por esta atividade possam ser compostos como o AC, que é um conhecido diterpeno com diferentes atividades biológicas, tais como

antifúngica (SARTORI et al., 2003), antibacteriana, larvicida, tripanocida e como um potente estimulador das contrações uterinas (BLOCK et al., 1998a).

Bresciani e colaboradores (2004) mostraram que maior concentração de AC está nas raízes e caules durante o outono e os autores sugerem que este componente seja responsável, ao menos em parte, pelo potencial hipoglicemiante desta planta. A atividade anti-inflamatória tópica do AC foi demonstrada por De Carli e colaboradores (2009). Assim como, o composto 5,7,3’,4’-tetrahidroxi flavona (luteolina, Figura 3b) exibe efeitos antioxidantes. Ambos os compostos foram submetidos a modelos de avaliação de atividade antinociceptiva e demonstraram grau significante de inibição para o modelo de contração abdominal induzida por ácido acético (BLOCK et al., 1998a). Choi e colaboradores (2011) demonstraram a resposta do AC em modelos in vitro e in vivo de inflamação. Para os modelos in vitro foram utilizadas linhagens de macrófagos estimulados com LPS (lipopolissacarídeo de membrana de Escherichia coli), e in vivo utilizaram o modelo de edema de pata induzido pela injeção subcutânea de carragenina 1%. Os resultados alcançados sugeriram que o AC poderia ser utilizado contra colites, artrite reumatoide, asma e gastrite.

Outros pesquisadores buscaram demonstrar os efeitos citotóxicos e genotóxicos de compostos presentes na S. trilobata. Foram observados os efeitos do AC sobre a taxa de crescimento embrionário em ovos de ouriço do mar. Nestes ensaios, embriões expostos a doses de 10 μM de AC apresentaram redução na taxa de diferenciação celular. Enquanto que doses na faixa 30 – 300 μM demonstraram efeito destrutivo sobre as células embrionárias. O AC foi aplicado em modelos de células tumorais humanas (células mamárias, de cólon e leucêmicas), cujos resultados demonstraram seu efeito citotóxico e antiproliferativo (COSTA-LOTUFO et al., 2002). Cavalcanti e colaboradores (2006) utilizaram células V79 (fibroblastos de pulmão de cobaia) para avaliar o potencial genotóxico do AC e seus resultados sugerem dose dependência e aumento significativo do dano celular quando o AC está na faixa de concentração de 30 – 60 μg/mL. A presença de AC e ácido grandiflorênico na fração diclorometano do extrato de S. trilobata foram apontados como causadores dos efeitos citotóxicos observados no teste de toxicidade sobre Artemia salina (BATISTA et al., 2009).

Visando o possível desenvolvimento de um novo fitoterápico, Baccarin e colaboradores (2009) realizaram a análise morfoanatômica das partes aéreas da S. trilobata, estabelecendo os critérios para controle de qualidade macro e microscópico da planta. O método analítico utilizado para quantificação de AC no derivado vegetal (extrato mole) foi desenvolvido e validado por Zanella e colaboradores (2006). Empregou-se um método por CLAE, isocrático, com fase móvel composta por acetonitrila:metanol:água acidificada (pH 3,5) com ácido fosfórico (40:45:15), com fluxo de 1 mL/min, utilizando uma coluna C18, mantida a 35 °C. Foi demonstrada a linearidade no intervalo de 10-80 μg/mL com boa sensibilidade e limite de quantificação de 3,8 μg/mL. A exatidão do método foi adequada permitindo recuperações médias de 100,4% de AC, pelo método de adição de padrão nos extratos e de 111,3% em creme de polietilenoglicol contendo 3,0 % de extrato mole de S. trilobata.

Lucinda-Silva e colaboradores (2011) estudaram o manejo e cultivo da S. trilobata de modo a avaliar o perfil químico sazonal. Avaliaram o teor de flavonoides totais por UV e o teor AC, por CLAE, usando método isocrático (ZANELLA et al., 2006) e realizaram ensaios de atividade anti-inflamatória, utilizando o modelo de edema de orelha em camundongos. Puderam concluir que os lotes de S. trilobata cultivados no sol renderam conteúdos mais elevados de flavonoides e de AC, comparado com o cultivo sombreado (uso de sombrite). O verão e outono, com tempo de rebrota de 3 meses, foram as melhores estações para colheita da planta rendendo maior concentração de AC nos extratos.

A otimização e a padronização do processo de obtenção dos extratos de S. trilobata na forma hidroalcoólica foram estudados por Baccarin (2007). Esses extratos moles hidroalcoólicos foram incorporados em formas farmacêuticas semissólidas e sua atividade anti-inflamatória foi confirmada (CZEPULA, 2006). Prevendo a necessidade de um aumento de escala na produção do derivado vegetal, foi desenvolvido o processo de obtenção de extratos secos de S. trilobata (FUCINA et al., 2011) cuja técnica foi posteriormente repassada a empresa Anidro do Brasil Extrações (Botucatu, SP) para a ampliação de escala de produção do derivado vegetal suficiente para as demais etapas do desenvolvimento do fitoterápico. Tais estudos propiciaram o depósito conjunto de uma patente nacional, fruto da parceria entre a UNIVALI e o Laboratório Farmacêutico Elofar (Florianópolis, SC), o qual foi publicado recentemente (CECHINEL et al., 2011).

No documento UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ (páginas 38-43)