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2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3 ECOCARDIOGRAFIA DOPPLER TECIDUAL

2.3.3 Strain Rate (SR)

A técnica do strain rate (SR), também derivada da ecocardiografia tecidual, representa a deformação de um tecido mediante a aplicação de determinada força

(HO et al., 2009). Representa e expressa a dinâmica local do desempenho miocárdico (SILVA, 2007).

O SR é uma modalidade da ecocardiografia tecidual que permite avaliação quantitativa da movimentação de determinada região da parede miocárdica (MINOSHIMA et al., 2009). Estudos recentes sugerem que o strain e o SR refletem tanto a função sistólica quanto a função diastólica (KATO et al., 2004). A principal vantagem do SR é que ele elimina a influência da movimentação dos tecidos sadios adjacentes durante a mensuração (CHETBOUL et al., 2007) e possui menor influência dos movimentos de translação e de tração (WESS et al., 2010a).

Diferentemente do Doppler tecidual, o SR fornece informações sobre a medida instantânea local da taxa de compressão ou expansão do miocárdio, independente do movimento de translação cardíaco (HO et al., 2009). Enquanto o Doppler tecidual quantifica a velocidade de movimentação de um ponto do miocárdio em relação ao transdutor, o SR quantifica a velocidade de movimentação de um ponto do miocárdio em relação a outro ponto adjacente, localizado a dada distância do primeiro (SILVA, 2007). Sua importância baseia-se no fato de que, embora a contratilidade miocárdica seja muitas vezes considerada o principal componente da função sistólica ventricular, a excursão da base ventricular em direção ao ápice é de aproximadamente 1,5 a 2,0 cm na sístole, enquanto o espessamento da parede não ultrapassa 0,5 cm. O SR equivale ao gradiente de velocidade, sendo útil na identificação de disfunções miocárdicas regionais (KATO et al., 2007).

O miocárdio é considerado um tecido incompressível, ou seja, a sua deformação longitudinal é inversamente proporcional às alterações observadas na sua espessura (TESKE et al., 2007). Portanto, quanto mais o músculo se alonga, menor a sua espessura e quanto mais ele se encurta, maior a espessura (SILVA, 2007). Isto permite inferir o grau de contratilidade pela mensuração do alongamento da fibra miocárdica. O SR avalia o gradiente de velocidade entre dois pontos próximos do miocárdio, quantificando o alongamento/encurtamento da fibra, e, indiretamente, o seu espessamento. Assim, pode ser definido como a medida da velocidade de deformação do miocárdio, definido pela fórmula (V2-V1)/d, onde V2 e V1 são as velocidades de encurtamento do miocárdio (cm/s) em dois pontos separados por uma distância d em cm. Esta medida fornece o gradiente intramiocárdico de velocidades por unidade de tempo e representa o grau de deformidade da fibra (SILVA, 2007).

O Doppler tecidual utilizado nos cortes paraesternais transversos avalia o componente radial da contratilidade miocárdica (circunferencial); enquanto que quando se utilizam os cortes apicais, avalia-se o componente longitudinal da contração miocárdica (REDDY et al., 2007; SILVA, 2007).

Na avaliação do componente longitudinal de contratilidade (cortes apicais), a presença de uma curva de SR negativa indica encurtamento da fibra ou contração; e quando positiva indica distensão ou alongamento. Por outro lado, ao avaliar o componente radial da contratilidade da parede posterior (corte paraesternal transverso), a presença de espessamento é expressa por uma curva positiva de SR; enquanto que o relaxamento é representado por uma curva negativa (TESKE et al., 2007). Ao avaliar a contratilidade do septo, deve-se tomar cuidado, pois o mesmo é composto por fibras de ambos os ventrículos, orientadas em sentidos diferentes. Como o gradiente intramiocárdico de velocidade representa a diferença de velocidade entre dois pontos dividida pela distância entre eles, sua unidade é s-1 [(cm/s)/cm] (SILVA, 2007).

A medida do gradiente intramiocárdico de velocidade pode ser expressa por meio de uma curva de deformidade do músculo no eixo das ordenadas pelo tempo (um ciclo cardíaco) no eixo das abscissas; ou por meio de um mapa de cores, onde a contração é expressa em amarelo, o relaxamento em azul, e a ausência de deformação em verde (SILVA, 2007).

Segundo Silva (2007), vários trabalhos demonstraram que o SR parece ser melhor para a avaliação de alterações locais na contratilidade do que a medida isolada da velocidade com o Doppler tecidual. O SR não apresenta influência da movimentação dos tecidos sadios adjacentes (tethering), que é uma das limitações do Doppler tecidual (HO et al., 2009; WESS et al., 2010a).

Valores de referência para as técnicas de SR e strain foram estabelecidos, no homem, por Kowalski et al. (2001). Tais autores verificaram que, apesar de existência de um gradiente de velocidade decrescente, no sentido basoapical do septo e paredes de ventrículo esquerdo, os valores de SR e strain são semelhantes em todas as regiões das referidas estruturas. Portanto, demonstrou-se que a deformação miocárdica ocorre de maneira homogênea no ventrículo esquerdo. Contudo, este estudo demonstrou, ainda, que o mesmo não se aplica ao ventrículo direito, onde se verificou um padrão heterogêneo de deformação em sentido inverso ao gradiente de velocidade (ápico-basal ao invés de basoapical).

As principais limitações do SR são relacionadas à técnica. A grande quantidade de ruído dificulta a avaliação; e o frame rate utilizado pelos equipamentos iniciais era muito baixo (de 50 a 70 quadros por segundo), o que tornava o intervalo entre a coleta e a informação longo (SILVA, 2007). Outra limitação da técnica é a resolução espacial, que ainda é baixa, levando à perda na resolução lateral. Além disso, a dependência do ângulo na técnica do SR é ainda maior que no Doppler tecidual, já que a deformação do miocárdio se faz em três dimensões (SILVA, 2007).

2.3.4 Strain

O strain é a integral do SR, ou seja, enquanto o SR mede a velocidade de

deformação do tecido cardíaco, o strain quantifica o percentual de deformação. Desta forma, a avaliação da contratilidade miocárdica pode ser feita sob a forma de uma medida (SR) ou por meio de uma porcentagem (strain) (SILVA, 2007).

O strain permite a avaliação quantitativa direta das funções miocárdicas

regionais sistólicas e diastólicas. É um método sensível para quantificar a função sistólica regional em diversas afecções cardíacas (WESS et al., 2010a). Permite a avaliação da deformidade cardíaca regional em diferentes segmentos miocárdicos nas direções radial, longitudinal e circunferencial (TESKE et al., 2007), o que o torna um método ideal para caracterizar a heterogeneidade da função miocárdica presente nas cardiomiopatias (HO et al., 2009; WESS et al., 2010a).

A curva do strain é mais limpa (sem ruídos) que a do SR (Figuras 8 e 9) e, portanto, provavelmente apresente uma menor variação interobservador durante as interpretações (SILVA, 2007). As curvas de strain são facilmente adquiridas e reproduzidas; e normalmente os valores obtidos são homogêneos em todos os segmentos do miocárdio, sendo o strain radial aproximadamente o dobro do longitudinal.

Fonte: Serviço de Cardiologia do VCM/HOVET-USP. Responsável: Profa. Dra. Maria Helena Matiko Akao Larsson

Figura 8 - Curvas de strain obtidas na região basal do septo interventricular em corte apical quatro câmaras.AVC: fechamento da valva aórtica; AVO: abertura da valva aórtica; IV: interventricular; StS: onda de strain sistólica; 4CSB: corte apical quatro câmaras na região de base do septo interventricular

Fonte: Serviço de Cardiologia do VCM/HOVET-USP. Responsável: Profa. Dra. Maria Helena Matiko Akao Larsson

Figura 9 - Curvas de strain obtidas na região endocárdica e epicárdica da parede livre do ventrículo esquerdo em corte transversal (à altura dos músculos papilares). AVC: fechamento da valva aórtica; AVO: abertura da valva aórtica; StS: onda de strain sistólica; PAP: corte transversal à altura dos músculos papilares

Deve-se ter cuidado ao avaliar o strain radial. No corte paraesternal transversal, deve-se medir apenas os segmentos médios do septo e da parede posterior. Já no corte longitudinal do ventrículo esquerdo, podem-se avaliar também os segmentos basais das duas paredes. Além disso, deve-se ressaltar que o septo

apresenta fibras de ambos os ventrículos, e isto pode mascarar e alterar as medidas (SILVA, 2007).

Segundo Silva (2007), as limitações do strain são as mesmas de todos os métodos derivados do Doppler: são altamente dependentes do ângulo do feixe de ultrassom. Portanto, deve-se ter muito cuidado ao avaliar os segmentos apicais, já que é difícil obter um ângulo inferior a 30 graus.

Segundo Wess et al. (2010a), o strain pode ser utilizado para a avaliação da função cardíaca sistólica em gatos, apresenta boa repetibilidade e é um método que pode ser facilmente empregado na rotina.