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3.3 DISCUSSÃO

5.1.4 Stresse oxidativo

Em interacções planta-patogéneo, a activação dos mecanismos de defesa da planta frequentemente conduz a uma rápida produção de espécies reactivas de oxigénio (ROS), tais como o peróxido de hidrogénio (H2O2), o ião superóxido (O2•-) e, em menor escala

o radical hidroxilo (OH•) (Mehdy et al., 1996; Lamb & Dixon, 1997). Este choque ou stresse oxidativo tem vindo a ser observado em plantas que estiveram em contacto com vários tipos de microrganismos patogénicos, incluindo fungos, bactérias e vírus, e ainda em cultura de células sujeitas a eliciadores, tais como paredes celulares de agentes patogénicos (Wojtaszek, 1997).

A produção de ROS é um processo que ocorre normalmente no metabolismo celular e não somente após imposição de um stresse biótico ou abiótico (Tabela 5.2). A sua produção pode ocorrer directa ou indirectamente como resultado de várias reacções celulares, estando todos os compartimentos da célula implicados na sua geração (Neill

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levando à formação de vários intermediários reactivos, pode ser representado da seguinte forma:

O2 O2•- H2O2 OH• H2O

Tabela 5.2 Mecanismos responsáveis pela produção e remoção de espécies reactivas de oxigénio (ROS)

em plantas (adaptado de Mittler, 2002).

(Apo - apoplasto; Cit - citosol; Cl - cloroplasto; Mit - mitocôndria; MP - membrana plasmática; Per - peroxissoma; PC - parede celular; PS - fotossistema; TE - transporte de electrões; Vac – vacúolo).

A imposição de um stresse biótico ou abiótico leva ao aumento dos níveis de ROS, pelas mesmas vias atrás referidas e também por vias enzimáticas, tais como, (i) NADPH oxidase, localizada na membrana plasmática, (ii) pelas peroxidases, localizadas nos espaços apoplásticos e ligadas covalentemente ou ionicamente à parede celular, e (iii) pela xantina oxidase e amina oxidase (Neill et al., 2002; Apel & Hirt,

Mecanismo Localização celular ROS produzida/removida

Produção

Fotossíntese, TE e PSI ou PSII Respiração, TE

Glicolato oxidase Clorofila excitada NADPH oxidase

Β-oxidação dos ácidos gordos Oxalato oxidase Xantina oxidase Peroxidases, Mn2+ e NADH Amina oxidase Cl Mit Per Cl MP Per Apo Per PC Apo O2- O2- H2O2 O21 O2- H2O2 H2O2 O2- H2O2, O2- H2O2 Remoção Superóxido dismutase Ascorbato peroxidase Catalase Glutationa peroxidase Peroxidases Tiorredoxina peroxidase Ácido ascórbico Glutationa α-Tocoferol Carotenóides

Cl, Cit, Mit, Per, Apo Cl, Cit, Mit, Per, Apo Per

Cit

PC, Cit, Vac Cl, Cit, Mit

Cl, Cit, Mit, Per, Apo Cl, Cit, Mit, Per, Apo Membranas Cl O2- H2O2 H2O2 H2O2, ROOH H2O2 H2O2 H2O2, O2- H2O2 ROOH, O21 O21 e- e- e- e-

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2004; Torres et al., 2006). Na interacção compatível, imediatamente após a infecção pelo patogéneo ocorre um aumento transiente de ROS (fase I), o qual parece corresponder a uma reacção biológica inespecífica. Na interacção incompatível, esta fase de produção é seguida por uma outra (fase II), de maior duração e intensidade, entre as 2-3 até 5-6 horas após a infecção. Esta segunda fase de produção é acompanhada algumas horas mais tarde pelo desenvolvimento da resposta hipersensível (HR) que se traduz pela morte das células em redor do local de infecção (Baker & Orlandi, 1995; Lamb & Dixon, 1997). Deste modo, a presença de ROS parece ser essencial para o controlo da infecção, desempenhando um papel importante na morte do agente patogénico, no cross-linking de glicoproteínas da parede celular (prevenindo a invasão e a propagação do patogéneo), na HR e na indução SAR (Mehdy et al., 1996; Lamb & Dixon, 1997; Torres et al., 2006). Uma outra função destas espécies químicas é a de constituírem segundos mensageiros, responsáveis pela activação de genes associados à patogénese e genes envolvidos na biossíntese de fitoalexinas (Inzé & Van Montagu, 1995; Torres et al., 2006).

A manutenção intracelular dos níveis normais de ROS é de extrema importância; caso contrário, poderá ocorrer a morte celular derivado da elevada toxicidade exibida pelas ROS. Um balanço regulado entre a produção e a destruição de ROS mantém a eficiência e função metabólica durante as condições normais e de stresse (biótico ou abiótico), permitindo igualmente regular as vias de sinalização, uma vez que as ROS podem funcionar como moléculas sinalizadoras (Mittler, 2002). As plantas desenvolveram vários mecanismos de defesa, enzimáticos e não enzimáticos, que regulam a concentração intracelular ou que minimizam a toxicidade destes radicais de oxigénio (Tabela 5.2). Os antioxidantes não enzimáticos são geralmente pequenas moléculas que podem ser hidrofílicas, tais como o ascorbato (vitamina C) e a glutationa, ou lipofílicas, como α-tocoferol (vitamina E) e os carotenóides (Apel & Hirt, 2004). As poliaminas e os flavonóides também oferecem protecção contra as espécies reactivas (Gaspar et al., 2002).

Os mecanismos antioxidantes enzimáticos são constituídos por enzimas com a capacidade de remover ou neutralizar os radicais livres. Nestes mecanismos incluem-se a enzima superóxido dismutase (SOD), responsável pela eliminação do O2•-, e as

enzimas ascorbato peroxidase (APX), catalase (CAT), glutationa peroxidase (GPX), glutationa redutase (GR), monodesidroascorbato redutase (MDHAR) e desidroascorbato

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redutase (DHAR), participando todas elas na decomposição do H2O2 (Asada, 1999;

Mittler, 2002; Apel & Hirt, 2004).

A SOD é responsável pela dismutação do anião superóxido em peróxido de hidrogénio, eliminando assim uma espécie reactiva mas conduzindo à produção de uma outra igualmente nociva (Mittler, 2002). A remoção do H2O2 pode ser efectuada pela

CAT, que catalisa a decomposição directa do H2O2 em água e oxigénio. A acção

combinada de SOD e CAT resulta na conversão de radicais potencialmente perigosos como H2O2 e O2•- em água e oxigénio, evitando possíveis danos celulares (Scandalios,

1993).

Como a CAT se encontra confinada aos peroxissomas, a remoção do H2O2 nos

cloroplastos e outros compartimentos subcelulares, nomeadamente no citosol e mitocôndrias, é efectuada por um outro conjunto de enzimas que protagonizam uma série de reacções que compõem o designado ciclo do ascorbato-glutationa (Figura 5.5) (Jiménez et al., 1997; Asada, 1999; Mittova et al., 2000; Mittler, 2002).

Figura 5.5 Ciclo do ascorbato-glutationa. Vias do sistema de defesa antioxidante, evidenciando enzimas

antioxidantes (representadas a vermelho) e antioxidantes não enzimáticos. O ciclo do ascorbato-glutationa encontra-se sombreado a amarelo (adaptado de Bray et al., 2000).

Superóxido dismutase Catalase Ascorbato peroxidase Monodesidroascorbato redutase Desidroascorbato redutase Glutationa redutase Desidroascorbato Espontânea Espontânea Radical mono- desidroascorbat Ascorbato Vitamina E carotenóides Reacção Mehler Reacções redox

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De acordo com este ciclo, o H2O2 é reduzido pelo ascorbato a água, numa reacção

catalizada pela APX, ocorrendo a concomitante geração de radicais de monodesidroascorbato (MDHA) (Figura 5.5). Por sua vez, o radical MDHA pode ser convertido espontaneamente em ascorbato e desidroascorbato (DHA) ou, alternativamente, ser reduzido pela ferrodoxina ou pela NAD(P)H numa reacção catalizada pela MDHAR. De forma a regenerar o ascorbato, a enzima DHAR utiliza a glutationa para reduzir o DHA. A glutationa oxidada é então regenerada pela GR utilizando equivalentes redutores do NADPH (Mittler, 2002).

5.1.5 Objectivos

À semelhança do observado para a interacção incompatível planta-patogéneo, a indução de mecanismos de resposta de defesa na planta hospedeira face à inoculação com fungos ectomicorrízicos e saprófitas tem vindo a ser sugerida. O esclarecimento destes processos de defesa permitirá, no caso dos fungos ectomicorrízicos, elucidar o envolvimento de ROS na regulação do desenvolvimento simbiótico e averiguar o papel dos fungos saprófitas como agentes causadores de stresse na planta. Neste trabalho, foi pretendido o estudo da interacção entre raízes de Castanea sativa e o fungo ectomicorrízico Pisolithus tinctorius ou o fungo saprófita Hypholoma fasciculare, em termos de resposta de defesa dos organismos intervenientes (planta e fungo).

Na interacção estabelecida entre C. sativa - P. tinctorius foi avaliada:

- A capacidade de adesão das hifas de P. tinctorius às raízes de castanheiro, evidenciada por microscopia electrónica de varrimento;

- Alterações de produção de ROS (H2O2 e O2•-) e de enzimas de stresse oxidativo

(catalase e superóxido dismutase), em raízes de castanheiro durante as primeiras 48 horas de interacção com P. tinctorius;

- A resposta de P. tinctorius face à presença de extractos radiculares de castanheiro eliciados pelo mesmo fungo, com diferentes tempos de contacto raiz-fungo. Esta resposta foi avaliada em termos de capacidade de crescimento de micélio.

Na interacção estabelecida entre C. sativa – H. fasciculare foi avaliada:

- A capacidade de adesão das hifas de H. fasciculare às raízes de castanheiro, evidenciada por microscopia electrónica de varrimento;

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- Modificações estruturais nas raízes do castanheiro decorrentes da inoculação com H. fasciculare, assim como o aparecimento de sintomas indicadores de situações de stresse/doença;

- Alterações de produção de ROS (H2O2 e O2•-) e de enzimas de stresse oxidativo

(catalase e superóxido dismutase), em raízes de castanheiro durante as primeiras 48 horas de interacção com H. fasciculare;

- O possível envolvimento de hidrofobinas de H. fasciculare no processo de adesão às raízes de castanheiro. Este estudo foi iniciado pela identificação e caracterização de um gene codificante de hidrofobina, estando ainda em progresso a avaliação da sua expressão no decurso da interacção C. sativa –

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5.2 RESULTADOS

O estudo da interacção entre raízes de Castanea sativa e o fungo ectomicorrízico

Pisolithus tinctorius ou o fungo saprófita Hypholoma fasciculare foi realizado em

plantas com cerca quatro meses, crescidas em sistema hidropónico, e que apresentavam um sistema radicular bem desenvolvido (Figura 5.6).

Figura 5.6 Cultivo de plântulas de Castanea sativa em cultura hidropónica.

Sementes, desinfectadas superficialmente com hipoclorito de sódio [5% (p/v) cloro activo], sob agitação (100 rpm) (A), foram estratificadas em tabuleiros, entre camadas de areia de quartzo (B). Após germinação, as sementes foram de novo desinfectadas superficialmente, em hipoclorito de sódio [2,5% (p/v) cloro activo] (C), tendo sido removido a porção apical da radícula com 4 cm. Após a poda radicular, as sementes foram depositadas sobre uma rede de plástico, previamente inserida nos frascos de cultura (D) e as culturas foram mantidas no escuro, a 19ºC (E). Após o aparecimento das primeiras folhas e de um sistema radicular desenvolvido, as culturas de plântulas foram submetidas a um fotoperíodo de 16h, à mesma temperatura.

A B

C D

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Alíquotas de micélio de P. tinctorius ou H. fascicular, correspondentes a 4 g de peso fresco, foram transferidas para frascos contendo as plântulas de C. sativa (Figura 5.7). Os controlos foram efectuados, utilizando o mesmo procedimento, mas sem adicionar micélio.

Figura 5.7 Inoculação de plântulas de castanheiro com Pisolithus tinctorius ou Hypholoma fasciculare.

Plântulas de castanheiro cultivadas em sistema hidropónico, sob fotoperíodo de 16h, a 19ºC (A) foram eliciadas com micélio de Hypholoma fasciculare (B) ou de Pisolithus tinctorius (C) crescidos em meio MMN, no escuro, a 23-25ºC. Após a inoculação com o fungo (D), as plântulas foram mantidas nas mesmas condições.

A

B C

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