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CAPÍTULO II – O DISPERSO NO CONTEXTO EUROPEU: CASOS DE ESTUDO 61 

2.2. Casos de estudo 66 

2.2.2. Suíça 74 

2.2.2.1. O disperso na Suíça

Face à bibliografia consultada, as estruturas de povoamento territorial na Suíça também variam de cantão para cantão. Detém três áreas metropolitanas, Genève / Lausanne, Bâle, e Zurich, com a formação das respectivas coroas. Nas zonas montanhosas, onde a expansão se produziu de forma linear, surge agora o povoamento avulso com a proliferação dos chalets de montanha de fim de semana. Nas cidades localizadas junto aos lagos verifica-se um espraiamento até onde a topografia permite. Face ao relatório de 2005 do Département Fédéral de l’Environnement, des Transports, de l’Energie et de la Communication65, três quartos da população suíça vivem em aglomerações urbanas que se estendem sobre o campo. Esta evolução originou vastas zonas periféricas pouco estruturadas, misturando áreas de construção de baixa densidade com pedaços agrícolas, loteamentos de moradias unifamiliares, zonas de industria e artesanato, pólos comerciais e hipers com gigantescos parques de estacionamento. O espaço rural continua caracterizado por

(onde se têm localizado os ramos produtivos com alto valor e com forte capacidade de inovação) e pela importância reconhecida aos factores naturais e paisagem.

Neste documento evidenciam-se as seguintes tipologias: vilas e aglomerações; espaço rural péri – urbano (existem 3 categorias em função da acessibilidade por transporte público; e identificação dos centros rurais périurbanos de 5000 a 10000 hab); centros turísticos alpinos (divididos entre os que se inserem em aglomerações e os que estão fora de aglomerações); e o espaço rural periférico (2 categorias em função dos 500 habitantes por comuna; e distinção dos centros por n.º de habitantes – de 2000 a 5000, e de 5000 a 10000).

Os principais problemas identificados no espaço rural suíço são: o controle da dispersão da edificação ao longo das vias; compatibilizar a estabilidade económica das regiões, sobretudo as mais vocacionadas para o turismo, com a salvaguarda dos espaços naturais; a capacidade de subsistência a longo termo das comunas menos populosas e mais afastadas, e da preservação dos empregos e da capacidade estatal para garantir as infra-estruturas regionais. São nestes espaços que residem 1.6 milhões de habitantes e de 660 000 activos, entre explorações agrícolas e PME. O ritmo de construção da urbanização é o equivalente a 1m2 por segundo, tendo sido constatado que um terço desta nova área se destina a moradias individuais. Dados de 2002 comprovam que 13% dos projectos de construção em curso se localizam fora dos perímetros urbanos, os quais permanecem com folga suficiente para a expansão demográfica e construtiva.

As modificações dos comportamentos de mobilidade tiveram fortes incidências no ordenamento do território. Entre 1960 e 2000, por exemplo, houve uma explosão da mobilidade, com a duplicação da frequência dos comboios e quintuplicado o tráfego rodoviário, tendo como referência um substancial agravamento após 1994, altura onde o lazer se tornou o principal motivo para as deslocações, e com elas o aumento das externalidades negativas (ruído, poluição atmosférica, descaracterização dos lugares naturais e construídos). As aglomerações, em particular Zurich, Bâle, Berne, Lausanne e Genève, viram reforçadas as suas capacidades de centros de gravidade de movimentos pendulares, cujo aumento se deve a pessoas que habitam na periferia e trabalham na cidade. A dinâmica e aposta na rede rodoviária permite que cada aglomerado esteja, no máximo, a uma hora de distância do mais próximo. A acessibilidade em transportes públicos é excelente, pese embora os tempos de percurso tenham aumentado (com excepção dentro das grandes áreas metropolitanas onde houve um investimento maior na criação de várias modalidades de transporte público). Apenas o sistema ferroviário não acompanhou tal evolução. Em comparação com as metrópoles estrangeiras a mobilidade suíça é excelente.

A população urbana representa 67,5% do total. O território é fortemente urbanizado às custas das zonas húmidas, saneadas em cerca de 90%, e da extensão florestal, circunscrita a um quarto da superfície territorial. Apenas 9 cidades ultrapassam a fasquia dos 100 mil habitantes, acolhendo mais de um terço da população suiça. No registo cantonal existem as cidades que acolhem os principais serviços (com 30 a 80 mil

hab) e as pequenas (15 a 30 mil hab). A fixação dispersa, típica das realidades de montanha e amplamente difundida na região alpina, é representada por propriedades fundiárias e pequenos núcleos rurais. Existe um eficiente sistema de transportes (rodoviário e ferroviário) que permite uma ligação relativamente rápida entre cantões e à grande rede viária.

2.2.2.2. A estrutura administrativa

A Suíça é uma República Federal composta por 26 estados, que correspondem aos cantões com os mesmos nomes (à excepção dos semi-cantões de Basileia cidade e Basileia campo, que formam o cantão de Basileia; Ausser Rhoden e Inner Rhoden, formam o de Appenzell; e Obwalden e Nidwalden o de Unterwalden), dando lugar à repartição tradicional em 23 cantões. Cada estado está dotado de Assembleia (Grande Conselho) e Governo (Conselho de Estado) próprios.

Existem três níveis de governação: o nacional ou confederado; 26 cantões e 2889 comunas. Cabe à confederação a coordenação das actividades nacionais e a participação no planeamento dos cantões. A Constituição Federal de 1874 estabelecia responsabilidade federal para assuntos relacionados com a defesa, comércio e assuntos legais. Com a reformulação da Constituição em 1999 os cantões detêm todos os poderes não especificamente delegados à confederação. O estado federal é motivado, entre outras razões, pela existência de uma forte heterogeneidade étnica e cultural, quatro grupos linguísticos e duas religiões. Existem quatro áreas bem delimitadas: a alemã (centro e nordeste: Berna, Zurique...), a francesa (ocidental: Genebra, Vaud, Friburgo, Neuchâtel, Jura), a italiana (Ticino) e a romanche (Grissons). Desta forma, e face às inúmeras influências históricas, linguísticas e religiosas que caracterizam a diversidade cultural Suíça, cada cantão desenvolve as suas regras.

No contexto desta dissertação optou-se pelo estudo do sistema jurídico relacionado com o ordenamento do território em quatro cantões, cada um deles proveniente das quatro áreas de influência distinta supra mencionadas: Berna, na área de influência do direito alemão; Genéve, na área de influência do direito francês; Grissons, único cantão de influência romanche; e Ticino, único cantão com influência do direito italiano.

Em termos de ordenamento do território esta estrutura adquire o seguinte desenho: 1. Âmbito Nacional:

a. atribui-se ao governo a elaboração e aprovação das leis de aplicação nacional (semelhante às leis de bases) e dos planos nacionais e regionais para o desenvolvimento territorial 2. Âmbito Regional:

a. os Cantões têm competência para a criação e escolha dos instrumentos de planeamento e urbanismo;

b. compete-lhes a elaboração de planos regionais para definir as medidas de protecção do meio ambiente, determinar as infra-estruturas e integrar as políticas sectoriais;

3. Âmbito Intermunicipal:

a. uma boa parte dos cantões, pela sua dimensão, dispensam a intermunicipalidade;

b. existem cidades, sobretudo as maiores, que resultam da aglomeração de comunas pelo que a sua gestão pode ser encarada intermunicipal face à existência de um conselho; c. existe a figura de associações para fins específicos, utilizada para garantia da eficiência

das redes infra-estruturais e de equipamentos. 4. Âmbito Municipal:

a. compete aos Municípios a operacionalização das disposições dos planos superiores e a elaboração de planos municipais, bem como a respectiva gestão urbanística;

Esta regionalização por cantões abrange áreas territoriais de intermédia dimensão, entre os 5 000 Km2, o que lhes permite ter uma boa noção da eficiência das redes de infra-estruturação. Existe um esforço significativo de monitorização do território que permite a correcção de políticas públicas, prestado por agências governamentais como a ARE – Office Fédéral du Devellopment Territorial.

As comunas são de pequena dimensão e tendem a focalizar a sua atenção para a escala micro. Debatem-se com sérios problemas de autonomia e sobrevivência económica, pelo que se tem vindo a registar um decréscimo do número de comunas desde 2004, em prol da aglutinação de umas por outras. Em 2006 registavam-se 2889, em 2009 apenas 2636.66 De acordo com o secretário da Associação de Comunas Suiças, o tamanho das maior parte das comunas é tão pequeno que não conseguem ter corpo administrativo e económico para fazer face às suas obrigações públicas. O sistema de administradores das comunas por

voluntariado já não é compatível com a análise de processos e áreas técnicas mais complexas como desemprego, serviços sociais vários, economia urbana, análise jurídica.

Quadro 10: Cantões suíços estudados

Âmbito Área (km2) Pop. (hab.) República Federal Cantões (26) Berna 5 959 950 209 Genéve 282 419 254 Grissons 7 105 186 105 Ticino 2 812 314 563

Associação de Comunas para fins específicos

Municípios / Comunas (2 636) 50 a 200* 500 a 2 300* as cidades

atingem 180.000* *valores médios ou intervalos de valores

2.2.2.3. Os diplomas relativos ao ordenamento do território

A Confederação Helvética tem tradições muito antigas: remontam ao séc. XIII as intervenções legislativas para a protecção das florestas, em 1914 criam-se os parques nacionais e áreas protegidas. Em 1966 saiu a Lei Federal sobre a protecção da natureza e da paisagem, em 1968 a lei federal sobre a caça, a protecção dos mamíferos e a da fauna ornitológica. É essencialmente desenvolvida pelo Ministério do Interior.

Existem quatro áreas bem delimitadas: a alemã (centro e nordeste: Berna, Zurique...), a francesa (ocidental: Genebra, Vaud, Friburgo, Neuchâtel, Jura...), a italiana (Ticino) e a romanche (Grissons). Todas estão abrangidas pela Loi fédérale sur l’aménagement du territoire (LAT), de 1979, onde se destacam os temas relacionados com a conservação da paisagem, a contenção dos perímetros, e com critérios racionais de implantação da construção. Contudo, analisando com um pouco mais de detalhe, os cantões de influência alemã, como Berna, privilegiam a regulação da construção (Loi sur les Constructions, e Ordonnance sur les

Constructions, ambas de 1985) onde estabelecem as regras urbanísticas de aplicação cantonal. As múltiplas

751.11 – Loi sur l'entretien et sur l'aménagement des eaux (LAE), de 1989), e da definição de regras complementares para as comunas rurais que não tem regras específicas (RSB 723.13 - Décret concernant le

règlement-norme sur les constructions, de 10Fev1970), onde se definem maiores afastamentos para as

fachadas com maior exposição solar – art. 12º; limitando cerceas em apenas dois pisos, r/c +1 – art. 17º; e fazendo múltiplas referências à paisagem como condicionante da construção.

O cantão de Genéve, de influência francesa, denota a importância das vias no ordenamento do território. A

Loi sur l'extension des voies de communication et l'aménagement des quartiers ou localités, de 1929, ainda

em vigor, determina o conteúdo dos plan localisé de quartier sempre que seja necessário garantir a execução ou manutenção de uma via (art. 3º), o conteúdo dos planos de utilização do solo (art. 15ºB) e a contribuição dos proprietários confinantes com as vias na sua execução ( art. 19º). A evolução legislativa ocupou-se, gradualmente, em conferir maior substância ao conteúdos dos planos (Règlement d'application de la loi

générale sur les zones de développement, de 1978, onde se aprofunda a contribuição dos privados na

realização de equipamentos e infra-estruturas; e na Loi d'application de la loi fédérale sur l'aménagement du

territoire, de 1987, na qual se tipificam os instrumentos de gestão urbanísticas e se integram alinhamentos

das leis das estradas e da água – art. 13º, e os plan localisés agricoles (art. 20º) que organizam os espaços rurais agrupando as construções).

A identificação e pequenas notas sobre o conteúdo dos principais diplomas suíços encontra-se no Anexo I – Quadro 2.

2.2.3.4. Os instrumentos de gestão territorial

Para facilitar a comparação com os restantes exemplos de estudo, a caracterização de cada instrumento foi sistematizada de acordo com o seguinte quadro, e as tabelas resultantes constam do Anexo 2.

Sigla e designação do Instrumento de Gestão Territorial

1. Natureza do instrumento (estratégica, programática, regulamentar); 2. Responsabilidade pela elaboração do instrumento;

3. Vinculo;

4. Principais objectivos; 5. Escala de publicação;

6. Enquadramento legal que o sustenta.

A diversidade de planos existentes nos quatro cantões estudados permite-nos apenas, e com segurança, adiantar a existência de:

- Planos Directores Cantonais, onde se sublinha a natureza estratégica do documento elaborado à escala 1:50 000 (com similitudes aos nossos planos regionais mas para áreas semelhantes às nossas associações de municípios);

- Planos Directores Comunais, com expressão idêntica aos nossos Planos Directores Municipais mas não vinculativos para os particulares;

- Planos de Urbanização (para utilizar a nossa designação face à variedade encontrada nos cantões), que sustentam a gestão urbanística dentro do solo urbano mas ineficazes perante a proliferação de edificação em solo rural.