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Sub-rogação nos Contratos

No documento Arrendamento do estabelecimento empresarial (páginas 96-99)

5 DO ARRENDAMENTO DO ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL

5.3 Efeitos Obrigacionais do Arrendamento do Estabelecimento

5.3.2 Sub-rogação nos Contratos

Conforme já afirmado anteriormente, o estabelecimento empresarial é uma universalidade de fato e, assim, compõem o estabelecimento apenas os bens, excluindo-se quaisquer relações jurídicas.

Ocorre que, com o intuito de preservar a dinâmica da vida jurídica do estabelecimento cedido, é indispensável que a legislação confira ao cessionário a titularidade de algumas relações obrigacionais, sob pena de esvaziamento do contrato firmado entre as partes.

Isso porque os contratos são elementos fundamentais no desempenho da atividade empresarial, e sua transmissão ao novo titular é imprescindível para manutenção da idoneidade funcional do estabelecimento empresarial.

Sobre a importância dos contratos para o exercício da atividade empresarial, assim dispõe Marcelo Andrade Feres:

Nesse contexto, o papel econômico-social de uma empresa (atividade) é definido por suas avenças, seja com seus fornecedores, seja com os seus consumidores. A sua posição no mundo jurídico decorre da convergência de seus contratos. Sabe-se, desse modo, em que medida uma empresa (atividade) interfere no contexto social em que está inserida, por exemplo, partindo-se de suas manifestações negociais, podem ser conhecidas a qualidade e a quantidade de seus empregados, seus consumidores, seus fornecedores e seus parceiros.236

E continua o autor:

Os ordenamentos que imprimem relevância à continuação da empresa (atividade) sob a titularidade do adquirente da azienda devem regular a entrega de relações contratuais a este. A subtração dos contratos do âmbito de transferência do trespasse, no mais das vezes, torna desinteressante o negócio.

A sorte das avenças do alienante do estabelecimento também constitui fator decisivo do preço a ser atribuído ao trespasse e, em alguns episódios, pode se revelar como determinante para a sua consumação.237

235 Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas

obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.

236 FÉRES, Marcelo Andrade. Op. cit., p. 63. 237 FÉRES, Marcelo Andrade. Op. cit., p. 63-64.

O ordenamento jurídico pátrio, reconhecendo a relevância dos contratos para a continuação e sucesso do exercício da atividade empresarial, disciplinou, através do artigo 1.148 do Código Civil, a sub-rogação contratual em caso de transferência de titularidade do estabelecimento:

Art. 1.148. Salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub- rogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal, podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante.

A sub-rogação dos contratos prevista no dispositivo supra citado aplica-se tanto ao trespasse, quanto ao arrendamento ou mesmo usufruto do estabelecimento empresarial. Isso porque, a sub-rogação dos contratos é essencial para a continuação do exercício da atividade empresarial, ou seja, caso não haja sub- rogação, os negócios jurídicos objetivando a circulação do estabelecimento empresarial para uso e gozo deste tornam-se inócuos.

Assim, haverá sub-rogação também para o arrendamento do estabelecimento empresarial, que passa a ser analisado abaixo.

Pela leitura do dispositivo supra, percebe-se que haverá sub-rogação do adquirente nos contratos em caso de cessão do estabelecimento empresarial se: (i) não houver no contrato firmado entre as partes estipulação em contrário; (ii) tratarem-se de contratos exploracionais, ou seja, para exploração do estabelecimento; (iii) os contratos sejam impessoais, ou seja, não possuam caráter personalíssimo.

Contratos exploratórios são aqueles firmados pelo empresário com o objetivo de explorar a atividade objeto da empresa238. A classificação decorre do caráter funcional dos contratos, ou seja, todos aqueles contratos que se revestem de funcionalidade quanto à exploração do estabelecimento são considerados contratos exploratórios.

Sobre os contratos exploratórios, Giuseppe Ferri afirma sobre sobre a disposição italiana (art. 2558 do Codice Civile) similar à nossa disposição pátria:

Deve-se tratar de contratos em curso de execução, isto é, de contratos destinados a produzir ainda os seus efeitos característicos, e que sejam objetivamente inerentes ou, como preferem, pertinentes ao exercício da empresa. Compreendem-se assim tanto os atos em que se concretiza o exercício da atividade econômica como aqueles que se atêm à organização da empresa.239

Assim, em se tratando de estabelecimento empresarial, consideram-se exploracionais todos os contratos firmados para o fim do exercício da atividade empresarial, tais como o contrato de locação, franquia, de know-how, de consórcio, de transporte, de trabalho, de consumo, de compra e venda empresarial, etc.240

Pela leitura do supracitado artigo 1.148 do Código Civil, em caso de cessão do estabelecimento empresarial, não se aplica a sub-rogação aos contratos de caráter pessoal, ou personalíssimos. Isso porque os contratos intuitu personae são realizados levando-se em consideração a pessoa da parte contratada. Baseiam-se, geralmente, na confiança que o contratante tem no contratado. Não admite, portanto, adimplemento contratual por outra pessoa que não a que firmou a avença.

Também não haverá sub-rogação dos contratos nos casos em que o contratante, existindo justa causa, no prazo de noventa dias a contar da publicação de transferência, optar por não continuar a execução contratual.

Justa causa, segundo Modesto Carvalhosa, seria “uma razão objetivamente apreciável que lhe estimule a extinguir o vínculo obrigacional.”241

Escrevendo sobre a justa causa, o doutrinador italiano Giuseppe Ferri afirma que:

Uma justa causa de recesso se determina cada vez que, por efeito da substituição do alienante pelo adquirente, se verifica uma mudança na situação objetiva tal que o contraente não teria estipulado o contrato ou o teria estipulado em condições diversas. Enquanto o caráter pessoal do contratado é intrínseco ao próprio contrato, a justa causa depende de elementos extrínsecos e precisamente de uma modificação da situação objetiva existente ao momento de sua conclusão.242

239 No texto original: Si deve trattare di contratti in corso in esecuzione, e cioè di contratti destinati a

produrre ancora il loro effetti caractteristici, e che siano obiettivamente inerenti o, come altri preferisce, pertinenti all’esercizio dell’impresa. Vi rientrano così tanto gli atti in cui si concreta l’esercizio dell’attività economica come quelli che attengono alla organizzazione dell’impresa.

(FERRI, Giuseppe. Manuale di diritto comerciale. Torino: UTET, 1993. p. 233)

240 FÉRES, Marcelo Andrade. Op. cit., p. 73. 241 CARVALHOSA, Modesto. Op. cit., p. 657.

242 Tradução livre de: Una giusta causa di recesso si determina ogni volta che per effecto dela

sostituzione dell’acquirente all’alienante, si verifica un mutuamento nella situazione obbietiva tale che il contraente non avrebbe addirittura stipulato il contratto o l’avrebbe stipulato a condizioni diverse. Mentre il carattere personale del contratto è intrinseco al contratto stesso, azione obbietiva esistente al momento della sua conclusione (FERRI, Giuseppe. Op. cit., 1993. p. 233).

Assim, no caso de cessão do estabelecimento empresarial, sempre que a substituição do cedente pelo cessionário acarretar situação diversa da combinada ou mesmo das expectativas para as execuções pendentes, caberá a terceira parte a opção, pelo prazo de noventa dias, de não continuar com o contrato.

Tendo em vista a especificidade da relação bem como da legislação, passa- se a uma análise quanto à sub-rogação dos contratos de trabalho.

A Consolidação das Leis Trabalhistas, em seu artigo 448, determina que “a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.”

Quando do estudo da transferência das obrigações trabalhistas, a mudança da titularidade, mesmo que secundária, é entendida como uma alteração na estrutura da empresa.

Desse modo, ocorrendo o arrendamento do estabelecimento empresarial e consequente transferência da titularidade secundária da azienda, os contratos de trabalho permanecem válidos e eficazes, assumindo o novo titular do estabelecimento o outro polo na relação de emprego.243

No documento Arrendamento do estabelecimento empresarial (páginas 96-99)