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3. O CAMPO DO CONHECIMENTO DA BIOLOGIA

3.1 O subcampo da Biologia Molecular

A Biologia Molecular pode ser entendida como um subcampo que está inserido dentro do campo da Biologia. Essa área do conhecimento é de grande importância para a formação de indivíduos críticos e capazes de participar de discussões contemporâneas. Isso porque os conhecimentos em BM são aplicados em diversas áreas, tais como a agricultura, melhorando a produção de alimentos, e medicina, contribuindo para a compreensão do funcionamento dos diferentes organismos e para a prevenção e controle de doenças. Em busca de respostas, a BM produz avanços tecnológicos nos meios de produção, na saúde, na medicina preventiva e na manipulação gênica. Dentre essas áreas, algumas envolvem questões éticas, que exigem dos indivíduos conhecimentos específicos nesse subcampo, de modo que sejam capazes de participar e contribuir em discussões contemporâneas, como as questões de manipulação gênica e seus riscos e benefícios para a saúde humana e do meio ambiente.

Visando um dos principais objetivos da CNE/98, que estabelece que é necessário formar jovens capazes de participar com suas opiniões e escolhas, individuais e coletivas, sobre assuntos que envolvam o subcampo social de conhecimento da BM, conduzidos por conhecimentos biológicos aprendidos na escola, é que esse subcampo desponta como indispensável na formação de cidadãos críticos. Segundo o Currículo do Estado de São Paulo, conhecimentos na área de Biologia e uma visão científica são fatores indispensáveis para o exercício de uma cidadania consistente e racional, uma responsabilidade atribuída a escola, da qual esta não pode abrir mão.

O campo de conhecimento Biologia, como já foi descrito na seção anterior, engloba diferentes subcampos sociais, os quais abordam diferentes áreas de conhecimento e concentrações. Dessa forma, o ensino da BM é tratado nessa pesquisa como um subcampo de conhecimento que exige dos alunos capital cultural suficiente para a compreensão dos conceitos

relacionados a esse tema. Para garantir o ensino e a compreensão dos conceitos envolvidos nessa área do conhecimento é que Currículo do Estado de São Paulo estabelece o tema “A receita da vida e o seu código: tecnologias de manipulação do DNA” como um dos tópicos a serem abordados no decorrer do EM, mais especificamente, no segundo ano (São Paulo, 2011). No que se refere ao tema “A receita da vida e seu código - tecnologias de manipulação do DNA”, denominado e descrito pelo Currículo do Estado de São Paulo, o conteúdo trabalhado está relacionado à caracterização que atribui unidade aos seres vivos. Um exemplo é o programa genético, responsável por controlar as funções vitais dentro das células, que permite aos alunos formar uma base para posteriormente compreender melhor as tecnologias de manipulação do material genético, como é o caso dos transgênicos. Debater sobre a ética e a influência ambiental dos transgênicos permite desenvolver nos alunos a habilidade de avaliar os riscos e benefícios de tais manipulações para a saúde humana e do meio ambiente, possibilitando ainda que os alunos sejam capazes de participar de debates que abordam questões éticas, morais, políticas e econômicas relacionadas à manipulação gênica.

Sem dúvidas, os conhecimentos no subcampo da Biologia Molecular são muito abrangentes, podendo ser aplicados nas mais diferentes áreas. Assim, para garantir o ensino e a compreensão de conceitos básicos no tema que permitam a participação crítica dos cidadãos nas questões da área que o Currículo do Estado de São Paulo (São Paulo, 2011, p. 87-88), ver anexo B, define como base no ensino de BM os seguintes conteúdos:

3º Bimestre

DNA – A receita da vida e seu código

O DNA em ação – estrutura e atuação • Estrutura química do DNA

• Modelo de duplicação do DNA e história de sua descoberta • RNA – a tradução da mensagem

• Código genético e fabricação de proteínas

4º Bimestre

DNA – Tecnologias de manipulação

Tecnologias de manipulação do DNA – Biotecnologia

• Tecnologias de transferência do DNA – enzimas de restrição, vetores e clonagem molecular

• Engenharia genética e produtos geneticamente modificados – alimentos, produtos médico-farmacêuticos, hormônios

• Riscos e benefícios de produtos geneticamente modificados – a legislação brasileira

No entanto, embora seja objetivo do Currículo do Estado de São Paulo (São Paulo, 2011) estabelecer os conteúdos mínimos de BM a serem ministrados aos estudantes que cursam o 2º ano do EM, notamos que existe uma incoerência na distribuição do conteúdo segundo esse documento. Diante da disposição dos conteúdos acima apresentados, podemos observar que o

histórico da descoberta do DNA, que deveria ser abordado logo na introdução do conteúdo, de modo a localizar historicamente os alunos dentro do contexto no qual se deu o uso e a descoberta do DNA e sua função e, inclusive, demonstrar a eles que a ciência não é algo acabado, mas que está em constante processo de descoberta, não é abordado no momento adequado. O histórico da descoberta do DNA está previsto para ser lecionado após a apresentação da estrutura do DNA. Ou seja, antes mesmo de saber como se deram os estudos e a descoberta do DNA, introdução esta que poderia instigar os alunos a querer aprender mais sobre a utilização e os estudos do DNA, o currículo inicia o conteúdo abordando a estrutura do DNA, uma parte do conteúdo que é repleta de nomes difíceis e que tendem a desmotivar os alunos a aprender, que iniciam o conteúdo acreditando que se trata de uma subárea do conhecimento chato e cheio de nomes a serem memorizados.

Segundo o Art.26 da LDB/96, o currículo voltado para a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, deve apresentar uma Base Nacional Comum, que pode ser complementada por cada sistema de ensino e suas unidades escolares, de modo a garantir que adaptações sejam feitas, levando em consideração as características regionais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos (BRASIL, 1996).

Dessa forma, o conteúdo base para o ensino das diferentes disciplinas e suas áreas de concentração é garantido por lei, através da LDB/96, em seu artigo 26. Por esse motivo, o Estado de São Paulo, por meio de seu currículo, define os conteúdos e conceitos a serem lecionados em cada área do conhecimento. Na BM, a base do ensino nessa área que deve ser garantida aos alunos é definida pelo Currículo do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2011), como foi descrito acima. Porém, adaptar, reorganizar e aprofundar ou não os conhecimentos fica a critério do professor. Este, por sua vez, deve conhecer as características individuais e coletivas de seus alunos, assim como seu meio social e cultural, de forma que consiga aproximar o conteúdo da realidade dos discentes, permitindo que estes se envolvam com o processo de ensino e aprendizagem e consigam apoderar-se dos conceitos e aplicações que são feitos nessa área. No entanto, embora o professor tenha flexibilidade para organizar a forma como irá trabalhar os diferentes assuntos, acreditamos que a falha apresentada pelo Currículo do Estado de São Paulo (2011) em organizar a disposição dos conteúdos, como discutido acima, reforça a ideia do sucateamento da educação pública, que inicia sua indiferença em relação à qualidade no ensino em seus documentos norteadores dos conteúdos básicos a serem lecionados.

O Ensino Médio, especialmente por se tratar da última etapa da Educação Básica, considerada importante na vida dos indivíduos, é a fase em que forças devem ser somadas em prol de um ensino de qualidade, que garanta uma fundamentação teórico-prática mais sólida. É nessa fase do ensino que os alunos serão preparados para prosseguir nos estudos e no convívio em sociedade, sendo necessário que uma base tenha se construído ao longo da vida escolar, permitindo a aprendizagem dos principais conceitos e fundamentos de Genética e Biologia Molecular (BRASIL, 2000). Souza, Silva e Dottori (2005), e Nascimento e Alvetti (2006), concluem que o conhecimento deve proporcionar a formação de alunos capazes de se posicionar de forma crítica diante da sociedade e dos temas complexos do dia a dia, no que se refere ao conhecimento biológico.

Contudo, o ensino de BM ainda é um desafio para os professores e para os alunos, e tem preocupado bastante os pesquisadores da área. Prova disso é o crescente número de trabalhos que buscam compreender as dificuldades enfrentadas e as possibilidades no ensino de Genética e Biologia Molecular. A importância de pesquisas nessa área torna-se visível e preocupante quando surgem nos cursos de formação continuada de docentes temas que introduzem discussões relacionadas ao ensino de Genética e Biologia Molecular como situações que exigem atenção imediata (SCHEID; FERRARI, 2006). Segundo os autores, os resultados de tais pesquisas são alarmantes, pois relatam que os estudantes no final da etapa da educação básica no EM não conseguem compreender conceitos básicos de Genética e Biologia Molecular, como, por exemplo, a relação entre gene e cromossomo, o que faz com que a área de pesquisa em ensino de Genética e BM cresça a cada dia mais.

Segundo São Paulo (2011, p.70 - 71), a área de conhecimento da Biologia, no geral, conta com a curiosidade e o interesse apresentados pelos alunos, que tendem a se interessar naturalmente por subáreas da disciplina, tais como seu próprio corpo, os seres vivos e o ambiente. Isso porque muitos criam animais em casa e estão o tempo todo assistindo ou lendo matérias divulgadas pela mídia sobre curiosidades do mundo animal e vegetal, doenças, vacinas, entre outras. Porém, é muito comum que as aulas de Biologia não atendam às expectativas dos alunos, principalmente quando esta assume um caráter descritivo, com muitos nomes, conceitos e fenômenos a serem decorados/memorizados. Dessa forma, a desmotivação e o desinteresse toma conta dos alunos, e o processo de ensino e aprendizado tende a não obter sucesso. O currículo sugere que contextualizar e aproximar os conteúdos da realidade dos alunos pode ser uma chave para romper com o desinteresse e a desmotivação, muito comuns entre os alunos, e que estão fortemente relacionados ao insucesso escolar.

Melo e Carmo (2009), associam as limitações e dificuldades de se ensinar BM com o grau de abstração do conhecimento apresentado por este subcampo, e acreditam que contextualizar os conhecimentos dispostos nesse subcampo e associá-los a atividades práticas e que sejam passíveis de serem realizadas na escola pode ser uma alternativa com relação à produção de conhecimento por intermédio da prática.

Longden (1982) e Thomas (2000), também acreditam que boa parte dos problemas apresentados no processo de ensino e aprendizagem de BM é decorrente da não compreensão ou da compreensão incorreta das terminologias, e defendem que tais problemas podem estar relacionados ao fato do ensino ser descontextualizado e fundamentar-se na memorização. Segundo Camargo e Infante-Malachias (2007), existe uma grande quantidade de pesquisas na área que relatam ter alcançado o sucesso no ensino de BM ao contextualizar os conteúdos.

Para Giordan e Vecchi (1996), embora boa parte dos estudantes tenham algo a dizer sobre esse assunto, eles ainda apresentam uma visão obscura sobre os conceitos envolvidos nesse subcampo de conhecimento, de modo que confundem o sentido de diferentes termos, característica esta denominada pelos autores de pseudo-saber. Acreditamos que essa confusão feita pelos alunos, ao tentar definir diferentes conceitos, se dá graças à tendência de se valorizar a memorização dos conteúdos ao invés da aprendizagem contextualizada e efetiva. Rodrigues e Mello (2005), acreditam que essa condição faz com que os alunos queiram adquirir os conhecimentos de forma superficial, com um único objetivo, o de conseguir boas notas em uma prova ou ser aprovado em um concurso, sem se preocupar com a construção sólida do conhecimento. Os autores apontam a problematização do conteúdo como uma estratégia que pode possibilitar o desenvolvimento e motivação dos alunos.

Conforme Scheid e Ferrari (2006), outro fator que pode intervir de forma negativa no ensino de BM é abordar a Ciência como uma verdade absoluta e acabada, o que pode dificultar a compreensão do universo científico que está em constante mudança, desmotivando assim os alunos. Segundo Krasilchik (2004), no geral, o campo de conhecimento da Biologia aparenta apresentar a ciência completa ou em partes, desprendida de relações e aplicações que podem ser associadas ao dia a dia dos estudantes, o que tira dos alunos a chance de pensar sobre seu meio a partir dos novos conhecimentos produzidos em sala.

De qualquer forma, é importante que o professor compreenda que o objetivo de se ensinar Biologia Molecular não é transformar os alunos em especialistas nesta área do conhecimento, mas ajudá-los a compreender melhor como se dá a dinâmica da Ciência e da

Tecnologia atual, para que possam se posicionar diante de questões relativas a essas áreas que podem surgir ao longo de suas vidas (SMITH; SCHARMANN, 1999).

Contudo, podemos perceber que o subcampo de conhecimento da BM é muito extenso e carrega consigo dificuldades inerentes ao próprio conteúdo, que precisam ser estudadas e amenizadas, em busca de um ensino de qualidade que garanta que os objetivos de se ensinar esse conteúdo sejam atingidos. Assim, embora o número de pesquisas na área esteja crescendo, ainda há a necessidade de que novas análises sejam feitas, em busca de soluções que amenizem as dificuldades e limitações apresentadas por esse subcampo do conhecimento.