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2.2 Surgimento da Internet: todos unidos contra a guerra

No documento arthurmazzucatto (páginas 39-44)

Assim, apesar de tudo, a capacidade de manipulação das noticias pela mídia é agora, sem dúvida, muito menor e mais limitada do que em 1991 [Guerra do Golfo]. Como explicar a diferença? Simples: ao longo dos últimos dez anos, houve uma rearticulação profunda e monumental dos movimentos sociais e organizações de trabalhadores em todo o mundo [...] (ARBEX JR, 2003, p.16-17)

Conforme trecho acima, Arbex Jr mostra que houve uma grande mudança no jeito como a sociedade se organizou frente às duas Guerras no Iraque. E que mudança foi esta? Uma inovação tecnológica trouxe o fim da hegemonia no controle dos meios de comunicação, dando voz a uma opinião pública internacional contrária à única potência mundial. A Internet, uma tecnologia relativamente nova, transformou a maneira como comunicávamos e permitiu que as pessoas se organizassem globalmente, apenas apertando um botão. Isto deu o poder para que as pessoas contestassem os meios de comunicação.

O jornalista americano Jonathan Katz (apud BRITO, 2006, p.117) descreve sobre o surgimento do cibercidadão e de uma nova conversação política e social através da internet:

Na rede, no último ano [1996], eu vi o renascimento do gosto pela liberdade nos media [sic]. Eu vi a multidão repleta de pessoas inteligentes, educadas e politicamente apaixonadas, que – em contraste discordante do mundo offline – se dispunham a expressar suas opiniões cívicas, participar em debates e até lutar por seus ideais políticos. Eu observei as pessoas aprendendo novas maneiras de se comunicarem politicamente. Eu vi informações viajando por grandes distâncias e voltei para minha casa com a mente marcada pelas pessoas engajadas e mobilizadas em todos os lugares do mundo. Eu vi posições desanimadas mudarem, quando as pessoas de repente puderam ser capazes de conversar diretamente umas com as outras, sem a intermediação dos jornalistas, políticos ou ideologias mercenárias.

Eu vi o surgimento inicial de um novo tipo de nação - a nação digital – e a formação de uma nova filosofia pós-política, Esta ideologia nascente, confusa e difícil de ser definida, sugere a combinação de

alguns dos melhores valores resgatados dos dogmas antigos e enfadados – o humanismo do liberalismo, a oportunidade econômica do conservadorismo, maus um forte senso de responsabilidade e a paixão pela liberdade.

O livro Carteles Contra una Guerra (2003), nos mostra como a internet dá um novo impulso para o ativismo anti-bélico, através de uma coletânea de imagens feitas por

artistas no mundo todo contra a guerra do Iraque em 2003. Em sua introdução, Nicolas Lampert (apud MANN JR, 2003) faz uma reflexão sobre a crescente desconfiança sobre os políticos e corporações multinacionais que faz com que a população comece a se organizar e protestar. No dia 15 de fevereiro de 2003, o “Dia mundial de protesto contra a guerra do Iraque”, houve a maior manifestação anti-bélica de todos os tempos, onde saíram às ruas entre 10 e 13 milhões de pessoas, em mais de 600 cidades em todo o mundo, para expressar seu desagrado referente ao ataque preventivo de Bush e Blair. Lampert ressalta que estes números são ainda mais surpreendentes se considerarmos que esta manifestação foi realizada antes mesmo de qualquer arma ter sido disparada. Nos conflitos anteriores estes tipos de manifestações só aconteceram após o início das guerras. Ao mesmo tempo, na Internet, se criava um espaço para divulgação de um grande número de obras gráficas contra o conflito, como fotografias, banners, vídeos e cartazes, que estão facilmente disponíveis para consultas e reprodução de qualquer pessoa que tenha acesso a um computador conectado à internet.

Graças aos programas de edição de imagens e scanners, qualquer indivíduo podia

criar uma obra visual. Não se tratava mais de ações de um pequeno grupo de conhecidos artistas politicamente comprometidos, e sim de um movimento de massa. Muitos destes trabalhos contra a Guerra do Iraque foram disponibilizados na internet, livre de direitos

autorais, para que pudessem ser distribuídos e impressos em formas de cartazes e folhetos.

Esta nova tecnologia desempenhou um papel crucial no ressurgimento do ativismo antibélico, levando milhares de pessoas à ação, de diversas partes do mundo, sendo que muitas delas nunca haviam participado de movimentos ativistas antes, agora podiam se contatar, comunicar-se e colaborar uns com os outros de uma maneira nunca antes imaginada. Para se ter uma idéia da dimensão deste movimento anti-bélico, apenas o site Wake the World recebeu mais de 80.000 visitas semanais durante o auge do conflito, enquanto o Miniature Gigantic bateu o recorde com aproximadamente 18.000 visitas em um dia, quando as forças americanas invadiram Bagdad. (LAMPERT apud MANN JR, 2003, pp.10-11).

Adam Faja, criador do site Miniature Gigantic (www.miniaturegigantic.com), ao ser perguntando sobre o que aconteceria com o site, agora que havia sido proclamado o final da guerra, respondeu:

Figura 8 – Cartaz de protesto contra o

interesse de grandes corporações na guerra do Iraque.

Figura 9 – Cartaz de protesto contra o

“É certo que o presidente Bush e os meios de comunicação assim o declararam, mas a guerra ainda não terminou. Seguem morrendo pessoas a cada dia e os argumentos que foram dados para justificar o ataque estão mal contados. Enquanto houver algo a dizer sobre a guerra, suas causas e seus efeitos, o site continuará oferecendo lugar para a expressão. Quando tiverem fim os combates, e o Iraque esteja em paz, o site permanecerá como um monumento aos homens, mulheres e crianças que perderam a vida neste conflito”. (p.13, tradução nossa)

Segundo Leo Scheer (apud BRITO, 2006, pp.118-119), o cidadão só é reconhecido na sociedade à medida que participa da sua história, que possua interesse e relação com a política e com os que dela falam, com orientação para um destino comum. No exercício da cidadania é essencial que os cidadãos sejam coadjuvantes e que suas intervenções tenham efeitos concretos. O que vemos com o fortalecimento da Internet é que a “praça pública”, palco de debates e articulação política entre cidadãos e Estado, agora dá espaço para os meios digitais.

Qual é o futuro desta nova mídia? Será que este veículo é imune às tentativas de subversão e continuará sendo sempre uma poderosa ferramenta para que a democracia seja exercida? Infelizmente parece que a transparência e a capacidade de ter uma opinião pública livre das garras das grandes corporações e Estado já dão sinais de fragilidade na Internet.

Por mais que o controle das atividades virtuais ainda seja difícil, já vemos muitas tentativas de regulamentar a Internet. Em maio de 2002 a Justiça americana autorizou o FBI a “investigar preventivamente” sites da internet e e-mails, entre outros, como medida contra o terrorismo. Inclusive, foi criado um “escritório de inteligência” para centralizar as informações colhidas no país inteiro e estreitar as relações com a CIA (ARBEX JR, 2003, p.29). Um outro exemplo, é o controle do governo chinês sobre o conteúdo disponibilizado para a população, através de um acordo com o gigante Google, que filtra em seus resultados páginas que possam conter informações e opiniões contrárias ao governo da China.

Para Brito (2006, p.120), a garantia de privacidade do cidadão está no fato que seus dados pessoais não estejam acessíveis de forma não autorizada a terceiros,

organizações ou governos. Na Internet, toda transação é registrada, ou seja, sempre há rastros digitais deixados pelo usuário com conseqüente possibilidade de vigilância da sua liberdade de se expressar. Estes rastros podem se tornar instrumento contra o próprio cidadão, facilitando com que – da mesma maneira que as mídias tradicionais – formem parte de monopólios dos detentores da informação.

CAPÍTULO III – NOVAS TECNOLOGIAS DE

No documento arthurmazzucatto (páginas 39-44)

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