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TÉCNICA DE ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO

No documento 2018ArianedaRosaFerreiraCaporal (páginas 72-76)

No que concerne às técnicas de análise e interpretação, a pesquisa é permeada pelos estudos sobre identidade e cultura de Stuart Hall (2006, 2014), em relação à formação de processos culturais da cidade de São Borja; também os postulados de Michel de Certeau (2012) acerca de questões culturais e identitárias, de modo a compreender de onde a sociedade são- borjense obtém a base de sua apreensão e fantasia. Pierre Bourdieu (1989) permite apreender o poder simbólico do próprio Rio Uruguai, fazendo referência aos festivais e festas que ocorrem em seu entorno e que estão estruturados como instrumentos de conhecimento e comunicação daquela comunidade, tendo em vista que a representatividade do Rio Uruguai nos corpora está

ancorada nos processos culturais e nas formações sócio-históricas que se entrelaçam com os sistemas simbólicos e imagéticos representados nessa sociedade, nessa comunidade.

Os pressupostos de análise estão alinhados no escopo da Análise do Discurso de linha francesa, de cunho sócio-histórico, propostos por Dominique Maingueneau (2008a, 2008b). Com base nos conceitos da semântica global, aí também contempladas bases teóricas sobre cena enunciativa, cenografia e ethos discursivo é que se delimita o esquema analítico desenvolvido na sequência.

A análise dos corpora partirá da semântica global que comporta os sete planos constitutivos do discurso, os quais permitem tomar o texto numa visão global, isto é, evidenciar nos corpora essas instâncias e as possibilidades semânticas na multiplicidade das dimensões discursivas. Não serão analisados linearmente nos corpora os sete planos constitutivos do discurso; elegeremos os que mais se evidenciam na materialidade linguístico-discursiva que subjaz no fio discursivo das canções e dos poemas objeto da análise que se realizará. Nossa análise tomará, logo de início canções, por conseguinte, poemas. Porém, no decorrer do processo analítico retomaremos tanto as primeiras quanto os segundos, conforme a necessidade de respaldo exemplificador.

A priori, verificamos que os seguintes planos constitutivos da semântica global podem ser priorizados, partindo do enfoque da centralidade que exercem na construção da cenografia e do ethos discursivo que se mostram nas letras das canções e dos poemas que constituem os

corpora de pesquisa. São eles:

a) Intertextualidade: essa categoria será analisada a partir da relação que os corpora possuem com outros campos, como o da história, da cultura e da identidade.

b) Vocabulário: a esse, daremos mais ênfase, pois acreditamos ser a mais influente categoria neste trabalho. Como se trata de produções literárias de cunho regional, a carga semântica dos vocábulos, recaem com forte carga semântica na materialidade discursiva. Compreender a articulação do vocabulário na construção do sentido e na constituição da cultura e da identidade, bem como esses discursos demarcam a representatividade do Rio Uruguai.

c) Os temas: analisaremos, portanto, esse plano constitutivo mediante informações que preconizam temáticas voltadas à tradição, simplicidade, identidade social e cultural, que organizam a realidade e representam um dado povo, no caso o são-borjense.

d) Estatuto do enunciador e do destinatário: entendemos que cada discurso determina o estatuto que o enunciador deve se atribuir e que deve atribuir a seu destinatário para validar o que se diz. O enunciador – o gaúcho, o poeta, o cancioneiro – é mobilizado por uma subjetividade da

linguagem, para que seu coenunciador – o público, a plateia, o leitor - seja compartilhador dessas fontes de saberes.

e) Dêixis Enunciativa: observaremos nesse plano que o Rio Uruguai está como lócus da cultura e identidade, atualizando o que é dito em relação ao aqui e agora.

f) Modo de enunciação: a maneira de dizer, no discurso aparente nas canções e poemas, dá vida ao Rio Uruguai.

A partir dos percursos e marcas discursivas, a análise ainda consiste nos estudos das cenas enunciativas, ao passo que é a cenografia que constrói o ethos discursivo, como imagem de si, doravante a representatividade do Rio Uruguai em canções e poemas de produções literárias são-borjenses. Assim, sob o amparo dos estudos de Maingueneu (2008b), a cena enunciativa é composta por três cenas: a englobante, a cena genérica e a cenografia. No intento de pontuamos uma análise a partir dessas cenas, podemos adiantar como será acolhida essas noções no capítulo dedicado à análise.

A primeira confere a uma cena que corresponde ao tipo de discurso, temos então uma cena englobante que se enquadra na tipologia discursiva concernente ao discurso literário. Tal cena é responsável por ajustar, por assim dizer, o discurso de modo a situar o público sobre o que sugere o referido discurso. A segunda cena (genérica) diz respeito ao gênero ou subgênero do discurso, no caso desse estudo, canção e poema. A terceira e última, a cenografia, é sobre a qual nos debruçaremos com mais atenção.

A cenografia confere à cena de fala em que aspectos sociais e culturais se manifestam, que é arquitetada a partir dos planos constitutivos do discurso e também pode ser determinada pelos tipos de discursos e gêneros que podem sugerir cenas enunciativas já pré-estabelecidas e/ou consolidadas. As canções e poemas também mobilizam uma cenografia com referência ao belo, ao sensível, a aspectos que repercutem a subjetividade. Se a cenografia é a própria enunciação, de onde vem o discurso, podemos de antemão dizer que o discurso, que tem como objeto o Rio Uruguai, vem de uma constituição cultural, ao mesmo tempo que é histórica, representada por artifícios literário-artísticos simbolicamente constituídos. Dessa forma, da cenografia é depreendida um ethos discursivo que é a imagem de si, a representatividade do Rio Uruguai construída nas produções literárias são-borjenses, o rio que emana uma imagem de inspirador, misterioso, romântico, acolhedor, a que nos propomos a dar ênfase na análise, assim como a cenografia, e a concentrar nosso estudo, portanto, no ethos discursivo como imagem de si.

Descritos os aspectos teórico-metodológicos que estruturam esta pesquisa, elaboramos um esquema representativo do percurso metodológico que rege os conceitos teóricos e sua

aplicabilidade, como um dispositivo (Figura 17) que orienta o percurso a ser percorrido no movimento analítico que se efetivará na materialidade discursiva presente nos corpora.

Figura 17: Dispositivo metodológico de análise

O esquema representativo metodológico (Figura 17) serve para retomar conceitos e noções que são basilares nesta dissertação. Os planos constitutivos do discurso, recortados para fins de análise, implicam o universo discursivo de modo que possibilitam na construção de cenas enunciativas. As cenas já nos fornecem a natureza do tipo de discurso, bem como os gêneros aos que estamos indo ao encontro. A cenografia é um aparato, incontestavelmente, fundamental para o trabalho de análise. Ela fornece um arcabouço metodológico nos quais estão imbricados o ethos, a imagem de si como simbolismo representativo do Rio Uruguai em um contexto demarcado pelos processos identitários e culturais, numa tessitura de percursos e marcas enunciativo-discursivas.

Por fim, para que se faça o aporte analítico que atenda aos requisitos necessários, apresentamos na seção seguinte os corpora que serão o meio pelo qual se propõe nossa análise.

No documento 2018ArianedaRosaFerreiraCaporal (páginas 72-76)