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1 SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA: O MUNDO DO TRABALHO EM REESTRUTURAÇÃO

1.5 Taylorismo e fordismo: estratégias para reprodução e controle do capital

Em função da luta interna própria do capitalismo, a cada estratégia organizativa colocada pelo capital no interior da empresa, corresponde uma manifestação de resistência dos trabalhadores, organizada ou não. Tal resistência impulsiona o capital a repensar sua organização, forjando novas respostas no âmbito da produção (OLIVEIRA, 2000). Essa dinâmica explica o movimento de administração científica do trabalho que teve início no final do século XIX, com o propósito de ajustar o trabalhador às necessidades do capital (BRAVERMAN, 1980).

Frederick Taylor (1856-1915) – em princípio como operário, mais tarde como chefe de turma e, finalmente, como engenheiro na Midvale Steel Works, nos Estados Unidos – destacou-se como estudioso dos processos de trabalho. Em seu livro, Princípios da

administração científica, relatou os experimentos por ele realizados sobre os fundamentos da organização e controle do trabalho. O estudo exerceu forte impacto em todo o âmbito da administração de empresas, ficando o conjunto de suas idéias conhecido como taylorismo (AUGUSTO, 2004).

Segundo os pressupostos tayloristas, o controle tornava-se uma necessidade imperiosa para a gerência, a qual precisava impor rigorosamente a forma com que o trabalho devia ser executado. Houve assim uma cisão entre o planejamento e a execução do trabalho. À gerência caberia supervisionar o processo de trabalho, garantindo a aplicação da metodologia adequada para alcançar o rendimento máximo. Os trabalhadores deveriam ser treinados para executar o trabalho, numa seqüência de tempo e movimento previamente elaborada, evitando o desperdício operacional, com vistas a assegurar a mais elevada produtividade. Assim foi estabelecido o planejamento científico, o que materializou a chamada organização racional

do trabalho. Dessa forma, ao retirar do trabalhador qualquer poder de decisão sobre o método e o ritmo do trabalho, levando-o a cumprir mecanicamente suas atividades, a administração científica do trabalho, em nome da racionalidade científica, constituiu-se em um conjunto de regras destinado a maximizar o lucro do capitalista.

Por meio da aplicação dos princípios tayloristas, o empresário estadunidense, Henry Ford (1863-1947), ajustou ainda mais o trabalhador às formas de trabalho projetadas pelo capital, ao introduzir a esteira rolante na Ford Motor Company, por volta de 1914. Ao verticalizar intensamente a produção, Ford fixou o operário, o qual realizava apenas uma parcela da atividade, montando os veículos que se movimentavam nas esteiras rolantes. A nova organização do trabalho, conhecida como fordismo, consagrou a linha de montagem por propiciar o aceleramento da produtividade. Na medida em que o operário se tornava fixo, passava a ser praticamente um componente da engrenagem, a realizar movimentos mecânicos, quase automáticos. O resultado, além da intensificação do trabalho, se revelou no próprio processo de desqualificação operária.

O modelo fordista de produção foi responsável pelo desenvolvimento econômico ocorrido nos Estados Unidos e em parte da Europa Ocidental, na chamada Era de Ouro do capitalismo (aproximadamente entre 1950 e 1973). Após a Segunda Grande Guerra, o mundo conheceu a bipolarização típica do período chamado de Guerra Fria. Capitalismo e Socialismo se enfrentavam política, econômica e ideologicamente, dividindo o planeta em áreas de influência e interesse. No bloco capitalista, sobretudo europeu, houve o desenvolvimento do chamado Estado do bem-estar social que, frente ao crescimento das experiências exitosas do socialismo, transformou em direitos sociais muitas reivindicações históricas do movimento

organizado dos trabalhadores. Apesar da vida da classe trabalhadora ter transcorrido em condições inegavelmente mais confortáveis no cenário de bem-estar social, não ocorreu a eliminação das relações sociais de produção próprias do capitalismo, as quais se assentam na exploração e alienação do trabalho.

No que diz respeito aos Estados Unidos da América, deve-se assinalar que, durante a Segunda Guerra, por não vivenciar a devastação provocada pelo conflito mundial, os investidores daquele país colheram lucros volumosos. No pós-guerra, através do Plano Marshall, foram lançadas intensas somas de investimento privado norte-americano na Europa, “colocando os fundamentos para as corporações transnacionais que, de forma crescente, vieram dominando a economia mundial” (OLIVEIRA, 2000, p.37). O Grande Salto Adiante, assim nomeado pelo historiador inglês, Hobsbawm (1995), tendo à frente o modelo industrial americano, ocorria em meio à reestruturação da produção e ao avanço da internacionalização da economia.

Foi nesse contexto que o Estado, nos países capitalistas desenvolvidos, assumiu atuação significativa no controle da conjuntura econômica, a partir das idéias do economista britânico John Maynard Keynes, conforme se mostrou anteriormente através do paralelo estabelecido por Moraes (2004). Procurava-se manter o crescimento da demanda em paridade com o aumento da capacidade de produção de forma a garantir o chamado pleno emprego. Ao atuar como agente central, o Estado de bem-estar estabelecia e administrava o macroacordo social, viabilizando as próprias condições de reprodução do capitalismo. Assim, na conjugação do modelo fordista de organização do trabalho com a política estatal keynesiana, produção e consumo de massa atingiram marcas exorbitantes, predominando as expectativas de que o progresso econômico e social teria continuidade, sem maiores sobressaltos.

Entretanto, cabe ressaltar, compreender o modelo fordista como uma forma revolucionária de produção e consumo de mercadorias é ficar nos limites de uma visão economicista de todo esse processo. As práticas fordistas extrapolaram os muros da fábrica e manifestaram-se, sobretudo, como um jeito de viver em sociedade, ao sinalizarem o aparecimento de novos hábitos a que o homem se submeteria a partir de então. Efetivava-se, por esse viés, a disciplinarização da força de trabalho para cumprir os propósitos do capital.

Gramsci (1988), nessa linha de raciocínio, enfatiza que o fordismo deve ser compreendido como fundante de uma nova sociedade, tendo sido necessário produzir um novo tipo de homem solicitado pela racionalização da produção e do trabalho, “pois os novos métodos de trabalho estão indissoluvelmente ligados a um determinado modo de viver, de pensar e de sentir a vida” (p. 396). Assim, foram transformados até mesmo aspectos

subjetivos das relações dos trabalhadores entre si, dos trabalhadores com a empresa e com a sociedade, por meio da mistura de repressão, cooptação e cooperação, influenciando e moldando pensamentos e sentimentos. Dessa forma, atingia-se a sociedade como um todo e não apenas o local de trabalho. Ao educar os trabalhadores, seria possível conquistar seu consentimento para esse novo modelo de trabalho e de vida.

Contudo, no final dos anos 1960, a etapa de ouro do capitalismo começou a passar por deterioração em função do esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista, que se apoiara na produção em massa, demandando um mercado consumidor também em contínua expansão. A desaceleração no crescimento da produtividade do trabalho; a elevação dos custos das matérias-primas de modo geral, acompanhada da pressão internacional dos países produtores de petróleo pela elevação dos preços; altas taxas de inflação e a intensa concorrência internacional comprimiam a taxa tendencial de lucro. Simultaneamente, assistia- se a uma rearticulação dos movimentos trabalhistas, em boa parte do mundo, em sucessivos enfrentamentos às estratégias de dominação do capital.