• Nenhum resultado encontrado

TELETRABALHO NO ÂMBITO DO PODER JUDICIÁRIO

De acordo com a Constituição Federal (BRASIL, 1988), o Estado Brasileiro é composto por três poderes independentes e harmônicos entre si: Executivo, Legislativo e Judiciário. Cada uma dessas esferas tem atribuições específicas e a função do Poder Judiciário é garantir os direitos individuais, coletivos e sociais e resolver conflitos entre cidadãos, entidades e Estado. Para isso, tem autonomia administrativa e financeira garantidas pela Constituição Federal e é composto pelos seguintes órgãos: Supremo Tribunal Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça (STJ), Tribunais Regionais Federais (TRF), Tribunais e Juízes do Trabalho, Tribunais e Juízes Eleitorais, Tribunais e Juízes Militares e os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.

A Constituição Federal estabelece como princípios norteadores da realização das atividades estatais, dentre tantos outros, a eficiência e a celeridade processual, o que tem gerado a adoção de novas tecnologias e de novos arranjos laborais no âmbito do Poder Judiciário, com o intuito de agilizar a prestação jurisdicional (BRASIL, 1988).

É nesse contexto de inovações e transformações que surge o processo judicial eletrônico e o teletrabalho. A celeridade processual, portanto, integra a base sobre a qual o paradigma tecnológico (CASTELLS, 2002), que se organiza em torno da tecnologia da informação e tem o seu crescente conjunto de desenvolvimentos e aplicações na esfera jurisdicional. Assim, no atual contexto de crescente judicialização e de abarrotamento do Poder Judiciário, o teletrabalho e seu propalado aumento de produtividade vão ao encontro dos princípios da eficiência e da celeridade, criando um cenário favorável à expansão dessa modalidade na esfera da administração pública.

A implantação do processo judicial eletrônico para a automação do Poder Judiciário, em 2011, propiciou o surgimento do teletrabalho. Porém, foi apenas em 2016 que o Conselho Nacional de Justiça emitiu a Resolução 227 (CNJ, 2016), destinada a regulamentar essa modalidade de trabalho no âmbito do Poder Judiciário.

Em seu texto, a Resolução 227 do CNJ justifica a adoção do teletrabalho na esfera do Poder Judiciário a partir dos seguintes argumentos: importância do princípio da eficiência para a Administração Pública; aprimoramento da gestão de

pessoas enquanto um dos macro desafios do Poder Judiciário (o que compreende a necessidade de motivar e comprometer as pessoas, bem como buscar a melhoria do clima organizacional e da qualidade de vida dos servidores); possibilidade de trabalho remoto ou à distância gerada pelo avanço tecnológico; vantagens e benefícios diretos e indiretos resultantes do teletrabalho para a Administração, para o servidor e para a sociedade; possibilidade de equiparação dos efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos e experiência bem-sucedida nos órgãos do Poder Judiciário que já adotaram tal medida, a exemplo do Tribunal Superior do Trabalho, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (CNJ, 2016).

A Resolução 227 também estabelece como sendo objetivos do teletrabalho: o aumento da produtividade e a qualidade de trabalho dos servidores; a promoção de mecanismos para atrair servidores, motivá-los e comprometê-los com os objetivos da instituição; a economia de tempo e a redução de custo de deslocamento dos servidores até o local de trabalho; contribuição para a melhoria de programas socioambientais, com a diminuição de poluentes e a redução no consumo de água, esgoto, energia elétrica, papel e de outros bens e serviços disponibilizados nos órgãos do Poder Judiciário; ampliação da possibilidade de trabalho aos servidores com dificuldade de deslocamento; aumento da qualidade de vida dos servidores; promoção da cultura orientada a resultados, com foco no incremento da eficiência e da efetividade dos serviços prestados à sociedade; estimulação do desenvolvimento de talentos, o trabalho criativo e a inovação; respeito à diversidade dos servidores e consideração da multiplicidade das tarefas, dos contextos de produção e das condições de trabalho para a concepção e implemento de mecanismos de avaliação e alocação de recursos (CNJ, 2016).

Determina ainda a Resolução 227 os deveres do servidor em regime de teletrabalho: cumprir, no mínimo, a meta de desempenho estabelecida, com a qualidade exigida pela chefia imediata e pelo gestor da unidade; atender às convocações para comparecimento às dependências do órgão, sempre que houver necessidade da unidade ou interesse da Administração; manter telefones de contato permanentemente atualizados e ativos nos dias úteis; consultar diariamente a sua caixa de correio eletrônico institucional; manter a chefia imediata informada acerca da evolução do trabalho e de eventuais dificuldades que possam atrasar ou prejudicar o seu andamento; reunir-se periodicamente com a chefia imediata para apresentar

resultados parciais e finais e obter orientações e informações, de modo a proporcionar o acompanhamento dos trabalhos; retirar processos e demais documentos das dependências do órgão, quando necessário, somente mediante assinatura de termo de recebimento e responsabilidade, e devolvê-los íntegros ao término do trabalho ou quando solicitado pela chefia imediata ou gestor da unidade; preservar o sigilo dos dados acessados de forma remota, mediante observância das normas internas de segurança da informação e da comunicação, bem como manter atualizados os sistemas institucionais instalados nos equipamentos de trabalho. Estabelece que as atividades deverão ser cumpridas diretamente pelo servidor em regime de teletrabalho, sendo vedada a utilização de terceiros, servidores ou não, para o cumprimento das metas estabelecidas (CNJ, 2016).

A regulamentação estatui que o servidor é responsável por providenciar e manter estruturas física e tecnológica necessárias e adequadas à realização do teletrabalho. Há também previsão de que os tribunais promoverão o acompanhamento e a capacitação de gestores e servidores envolvidos com o regime de teletrabalho (CNJ, 2016).

Recentemente, a Resolução 227 foi alterada pela Resolução 298 do CNJ, de 22 de outubro de 2019. Dentre as principais inovações trazidas pela nova regulamentação, tem-se a autorização expressa do teletrabalho no exterior desde que no interesse da Administração, bem como uma alteração em relação à meta de desempenho (CNJ, 2019).

Com a Resolução 298/2019 do CNJ (art. 6º, § 2º), a meta de desempenho estipulada aos servidores em regime de teletrabalho será superior à dos servidores que executam mesma atividade nas dependências do órgão, sem comprometer a proporcionalidade e a razoabilidade, e sem embaraçar o direito ao tempo livre. Dentro do artigo 9º, que estabelece os deveres do servidor que atua em regime de teletrabalho, a nova Resolução inseriu um inciso que determina mais um dever para o servidor: realizar exame periódico anual, de acordo com as regras do órgão competente de saúde do tribunal. Também houve a inclusão de mais dois parágrafos nesse artigo: o § 4º exige que o servidor disponha de espaço físico, mobiliários e equipamentos próprios e adequados para a prestação do teletrabalho, já o § 6º estatui que o tribunal possa vistoriar o local de trabalho, que deverá permanecer adequado durante todo o período de realização do teletrabalho (CNJ, 2019).

No âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o teletrabalho é regulado pela Resolução nº 134, de 12 de dezembro de 2016. Essa Resolução define o teletrabalho como atividade laboral executada, em parte ou em sua totalidade, em local diverso daquele estabelecido pela administração para a realização do trabalho presencial atribuído à unidade de lotação, mediante a utilização de tecnologias de informação e de comunicação (TRF4, 2016).

Seguindo os moldes da Resolução 227 do CNJ, a Resolução 134 estabelece vedações e prioridades em relação ao trabalho remoto e também estatui algumas diretrizes, exigindo que a meta de desempenho do servidor em regime de teletrabalho seja até 10% (dez por cento) superior àquela estipulada para os servidores que executam as mesmas atividades nas dependências da Justiça Federal de 1º e 2º Graus (TRF4, 2019).

No âmbito do Poder Judiciário, há ainda a Instrução Normativa 74, de 19 de fevereiro de 2019, a qual dispõe sobre a realização de teletrabalho por servidores do Conselho Nacional de Justiça, fundamentando-se também na Lei 13.467/2017. De modo similar à Resolução 227 do CNJ, a Instrução Normativa 74/ CNJ determina que compete exclusivamente ao servidor providenciar, às suas expensas, as estruturas física e tecnológica necessárias à realização do teletrabalho, mediante o uso de equipamentos ergonômicos e adequados, assim como prevê acompanhamento e capacitação de gestores e servidores envolvidos com o regime de teletrabalho (CNJ, 2019).

A partir dos referenciais legislativos apresentados, observa-se que as determinações institucionais vão se atualizando à medida que o teletrabalho vai se desenvolvendo e mostrando a necessidade de regulamentações específicas, o que denota que a recenticidade desse novo arranjo na esfera do Poder Judiciário não permite um conhecimento prévio e amplo de todos os seus desdobramentos.

Importa ainda ressaltar que, na gestão pública, a modalidade de trabalho remoto apresenta características peculiares, menos vinculadas à precarização dos direitos trabalhistas, posto que o servidor público goza de estabilidade no cargo, os salários são regulamentados de forma equitativa, o teletrabalho é regulamentado via Resoluções, a estipulação de metas deve seguir parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade. Além disso, a utilização do teletrabalho é de adesão facultativa, pautada pelos critérios da conveniência e da oportunidade do gestor da unidade, não se constituindo, portanto, direito ou dever do servidor. Logo, o teletrabalho não se

configura como uma obrigação, podendo ter sua pertinência reavaliada a qualquer tempo, conforme estipula o art. 4º da Resolução 227 (CNJ, 2016). Assim, o trabalhador que opta por essa modalidade também é o sujeito que escolhe, definindo uma participação ao nível da produção que permite integrar, à sua condição de sujeito, a construção de uma resposta sobre a adesão ou não a essa modalidade de trabalho.

Documentos relacionados