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PARTE I DENTRO

3. CAPÍTULO III DA AÇÃO HUMANA

3.3. DAS CATEGORIAS DA AÇÃO

3.3.1. Do tempo

O tempo não pode ser compreendido como um fenômeno externo observável, visto que somente dentro de uma análise da realidade material externa concebida mentalmente como forma de organização da sucessividade dos acontecimentos concernentes à matéria ele é categorizado. O tempo per se não flui, não é objeto real material, mas uma consequência do fluxo da energia e da

136 It is one of Mises’s greatest achievements to have shown precisely that there are insights implied in this

psychologically speaking trivial axiom of action that were not themselves psychologically self-evident as well; and that it is these insights which provide the foundation for the theorems of economics as true a priori synthetic propositions. It is certainly not psychologically evident that with every action an actor pursues a goal, and that whatever the goal may be, the fact that it was pursued by an actor reveals that he must have placed a relatively higher value on it than on any other goal of action that he could have thought of at the start of his action. It is not evident that in order to achieve his most highly valued goal an actor must interfere or decide not to interfere (which is also an intentional interference) at an earlier point in time in order to produce a later result, nor is it obvious that such interferences invariably imply the employment of some scarce means—at least those of the actor’s body, its standing room, and the time absorbed by the action. It is not self-evident that these means must also have value for an actor—a value derived from that of the goal—because the actor must regard their employment as necessary in order to effectively achieve the goal; and that actions can only be performed sequentially and always involve the choice of taking up that one course of action which at some given time promises the most highly valued results to the actor and excluding at the same time the pursual of other, less highly valued goals. It is not automatically clear that as a consequence of having to choose and give preference to one goal over another—of not being able to realize all goals simultaneously—each and every action implies the incurrence of costs (forsaking the value attached to the most highly ranking alternative goal that cannot be realized or whose realization must be deferred) because the means necessary to attain it are bound up in the production of another, even more highly valued goal. Finally, it is not evident that at its starting point every goal of action must be considered worth more to the actor than its cost and capable of yielding a profit (a result whose value is ranked higher than that of the foregone opportunity), and that every action is also invariably threatened by the possibility of a loss if an actor finds in retrospect that contrary to his expectations the actually achieved result has a lower value than the relinquished alternative would have had. All of these categories which we know to be the very heart of economics - values, ends, means, choice, preference, cost, profit and loss—are implied in the axiom of action. Like the axiom itself, they are not derived from observation. Rather, that one is able to interpret observations in terms of such categories requires that one already knows what it means to act. No one who is not an actor could ever understand them, as they are not “given,” ready to be observed, but observational experience is cast in these terms as it is construed by an actor. Further, while they and their interrelations are not obviously implied in the action axiom, once it has been made explicit that and how they are implied, one no longer has any difficulty recognizing them as being a priori true in the same sense as the axiom itself is. Any attempt to disprove the validity of what Mises has

reconstructed as implied in the very concept of action would have to be aimed at a goal, requiring means, excluding other courses of action, incurring costs, subjecting the actor to the possibility of achieving or not achieving the desired goal, and leading to a profit or a loss. Thus, it is manifestly impossible to dispute or falsify the validity of Mises’s insights. In fact, a situation in which the categories of action would cease to have a real

existence could itself never be observed or spoken of, as making an observation or speaking are also actions. HOPPE, Hans-Hermann. The Economics and Ethics of Private Property: Studies in Political Economy and Philosophy, 2nd ed. Alabama: Ludwig Von Mises Institute, 2006, p. 34. Tradução nossa. Grifo nosso.

matéria. O que se concebe como tempo é apenas uma categorização arbitrária e mental do caminho de composição, decomposição e recomposição da matéria. Esta realidade formal do tempo e do espaço deixa intata a seguridade do conhecimento experimental, porque estamos igualmente certos desse conhecimento, quer essas formas sejam necessariamente inerentes às coisas em si, quer somente à nossa intuição das coisas137.

(...) o tempo não é real como objeto. Mas, se eu mesmo ou um outro ente me pudesse perceber sem esta condição da sensibilidade, estas mesmas determinações que nós nos representamos atualmente como mudanças nos dariam um conhecimento em que não se encontrará mais a representação do tempo, nem, por conseguinte, a de mudança, não existiriam. Sua realidade empírica permanece, pois, como condição de todas as nossas experiências. Mas a realidade absoluta não se pode, segundo vimos, conceder ao tempo.

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Se existe uma noção de substituição, existe, naturalmente, um caminho a ser percorrido no tempo. Toda mudança implica em um percurso temporal. É inconcebível pela mente humana uma realidade material sem tempo (o que é diferente de uma multilateralidade do tempo, i.e., paralelismo, imaginação, reversão etc.). No universo da matemática e da lógica existe coexistência e interdependência, ou seja, sincronicidade, mas a mente humana compreende os elementos em ordem cronológica, pois necessita de ações para compreender (estudo, pensamento, fala etc.)139.

A geometria, por exemplo, concebe uma noção a priori do espaço, mas um espaço sem fluxo de matéria, o que implica na não aplicabilidade do tempo, pois todos os objetos podem ser simultâneos metafisicamente considerados. Na inteligibilidade da fala ou do desenho humano, necessariamente uma reta será pressuposta para desenhar um quadrado, existe uma certa causalidade causada pela matéria e pela limitação humana em conceber um universo geométrico de uma só vez. Conceber uma multiplicidade acerca do mesmo objeto também não é possível, e.g. uma figura desenhada em um plano cartesiano com coordenadas irá pressupor a constituição do plano na representação.

O estudo praxeológico se distingue do lógico na medida que o primeiro pressupõe as categorias de tempo e causalidade, embora ambos sejam apriorísticos e dedutivos. A praxeologia

137 KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. 5ª Ed. Trad.: Manuela Pinto e Alexandre Morujão. Lisboa: Fundação

Calouste Gulbenkian, 2001, p.44.

138 Ibidem, p.43.

139 Não obstante, é preciso não confundir a ordem temporal na qual o conhecimento é adquirido com a simultaneidade

lógica de todas as partes que integram um sistema dedutivo apriorístico. Em tal sistema, as noções de anterioridade e consequência são apenas metafóricas, pois não se referem ao sistema, mas sim à nossa própria ação intelectiva. O sistema lógico em si não implica as noções de tempo nem de causalidade. Há uma correspondência funcional entre seus elementos, mas não há nem causa, nem efeito. MISES, op.cit., p.133.

depende das noções de antes e depois, cedo e tarde, para seu sistema. Pressupõe-se o fluxo de circulação da matéria, o que independentemente da experiência ocorre e concebe a realidade externa, é um a priori.

Embora a lógica, a matemática e a praxeologia não sejam derivadas da experiência, elas não são feitas arbitrariamente, mas impostas sobre nós pelo mundo em que vivemos e agimos e que queremos estudar. Elas não são vazias, sem sentido e não são meramente verbais. Elas são - para o homem - as leis mais gerais do universo, e sem elas nenhum conhecimento seria acessível ao homem.140

A ação é sempre voltada ao futuro, nunca pode influenciar no presente, que vira passado em cada milionésimo de nano segundo que passa. Toda perspectiva de mudança de estado é voltada ao futuro.

De forma mais contemplativa, o presente é um ponto ideal entre passado e futuro, mas não existe continuamente. Na praxeologia essa realidade é diferente, existiria, segundo Mises, um momento de iminência da ação em que não se pode dizer que esta se encontra no passado nem no futuro. O presente diz respeito ao momento no qual até então era muito cedo, mas no futuro será muito tarde.

Na teoria praxeológica, o presente seria o momento de continuação das condições e oportunidades oferecidas à ação. Não diz respeito com o tempo astronômico ou com os métodos de medição de passagem de tempo. O presente compreenderia todo o tempo que ainda possibilite uma ação.

O presente se estende, conforme a ação que se tenha em vista, até a Idade Média, até o século XIX, até o ano ou mês passado, até ontem e até o minuto ou fração de segundo que acabou de passar. Quando alguém diz: “hoje em dia já não se adora Zeus”, está referindo- se a um presente distinto daquele que o motorista do carro tem em mente quando pensa:

agora ainda é cedo para fazer a curva.

Como o futuro é incerto, permanece sempre indefinida e vaga a sua parcela que podemos considerar como agora, ou seja, como presente. Alguém que tivesse dito em 1913: “atualmente, agora, a liberdade de pensamento na Europa é incontestável” não imaginava que esse presente muito cedo viria a ser o passado141.

O tempo, como uma decorrência da matéria, é escasso, ou seja, quando se afirma que o tempo passa para o homem significa que ele precisa alocá-lo de acordo com suas preferências e

140 Tradução livre e adaptada de: “Although logic, mathematics, and praxeology are not derived from experience, they

are not arbitrarily made, but imposed upon us by the world in which we live and act and which we want to study. They are not empty, not meaningless, and not merely verbal. They are —for man—the most general laws of the universe, and without them no knowledge would be accessible to man.” Idem, 2006, p. 14.

fins pretendidos. Os objetivos ditos de primeira ordem, os valores e demais pensamentos-norte abstratos guiarão ações de ordem inferior rumo aos macroobjetivos imaginados.

O tempo tem a característica peculiar de ser irreversível e unilateral, a economia de tempo é completamente diferente da economia de bens econômicos. As finalidades são incompatíveis temporalmente entre si. Ainda que o homem tenha tudo que deseja, o tempo permitirá que cada finalidade ou cada ação seja perseguida de uma vez, a noção de mais cedo e mais tarde continuaria existindo.

Ações nunca ocorrem ao mesmo tempo, ações necessariamente ocorrerão mais cedo ou mais tarde quando consideradas comparativamente, pela própria natureza escassa dos meios. Finalidades distintas e múltiplas podem ser buscadas através da mesma ação.

A consciência humana pressupõe a existência de um tempo em que as relações físicas se desdobram, ou seja, que a matéria se rearranja, que fenômenos acontecem, que a luz se move e assim em diante. Uma das grandes diferenças entre um humano e um animal irracional é a capacidade da consciência do primeiro se descolar da mera causalidade temporal inevitável, o que possibilita um humano estabelecer prioridades e compromissos futuros, ou mesmo criar um relógio que define uma métrica para a passagem do tempo. Os demais animais não conseguem se desvincular deste aspecto da realidade, por isso um cachorro, um gato ou um lagarto de milhares de anos atrás faz, essencialmente, as mesmas coisas que um espécime atual, enquanto os seres humanos construíram veículos voadores, prédios de 800 metros de altura, foram ao espaço sideral e muito mais.