Dias Venturosos
Divaldo Franco /Amélia Rodrigues
que os segurava, até chegarem ao pórtico de Salomão, uma das entradas principais.
E porque o tumulto se avolumasse, inspirado e audaz, Pedro esclareceu:
– Israelitas! Por que vos maravilhais deste homem, ou por que fitais os olhos em nós, como se por nosso poder ou pie- dade o tivéssemos feito andar?! (*)
Pedro conhecia os seus compatriotas, que passavam do júbilo à revolta, da crença exagerada à dúvida cruel, do apoio à pedrada.
Quanto eles viram Jesus fazer!
Aclamaram-no ao entrar na cidade, fazia pouco tempo, e O apuparam logo depois, pedindo para Ele a crucificação.
Mentes ao vento do interesse mais chão, mudavam de direção conforme a força predominante.
Assim, prosseguia com firmeza, os olhos fulgurantes, a voz vigorosa:
– O Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó, o Deus dos nossos antepassados, glorificou seu servo Jesus, a quem vós en- tregastes e negastes perante Pilatos, quando este havia resolvido soltá-lO, mas vós negastes o Santo e Justo, pedindo que se vos desse um homicida.
Era um discurso forte para despertar as consciências anestesiadas pelo mal, para direcionar o pensamento, arran- cando-o da vileza moral.
Sem temor, o apóstolo prosseguiu, enquanto todos pararam para escutá-lo.
Pairava no ar a doce vibração de paz e o suave enlevo da esperança.
– Matastes o autor da vida, a quem Deus ressuscitou en- tre os mortos, do que nós somos testemunhas. Pela fé em seu nome fortaleceu o seu nome a este homem, a quem vedes e co- nheceis. Sim, a fé, que vem por meio de Jesus, deu a este homem saúde perfeita na presença de todos vós.
A verdade, que é luz, apunhalava-os, rasgando-lhes a treva interior para ajudá-los no discernimento.
Atenuando as acusações, explicou com suavidade:
– Agora, irmãos – a palavra era dúlcida e meiga – eu sei que o fizestes por ignorância, como também as vossas autorida- des; mas Deus assim cumpriu o que já dantes anunciara pela boca de todos os profetas: que seu Cristo havia de padecer.
Agora, como o majestoso de uma sinfonia ímpar, Pe- dro propôs:
– Arrependei-vos e convertei-vos, para serem apaga- dos os vossos pecados, de sorte que da presença do Senhor ve- nham tempos de refrigério... tempos de restauração de todas as coisas...
O arrependimento é indispensável para o real desper- tamento do ser. Medida de análise dos atos pelo árbitro da razão que discerne, aponta as falhas e demonstra a gravidade do equívoco, falando à consciência a respeito da insensatez do delito. É o começo da transformação moral, convidando o indivíduo a sair da teimosa atitude de desequilíbrio para alcançar o patamar da harmonia.
Mas não basta por si mesmo; porquanto os danos per- petrados devem ser reparados, e o terreno perdido necessita de ser reconquistado.
O passo imediato já se encontra no ato de arrepen- der-se, que é o sofrer pelo mal que se praticou.
Dias Venturosos
Divaldo Franco /Amélia Rodrigues
Despertar para a conscientização íntima gera dor e amargura pelo desperdício de tempo gasto e pelos prejuí- zos causados a si mesmo e ao próximo. Tal sofrimento, no entanto, é benefício, pois consolida o arrepender-se. Entre- tanto, faz-se urgente a etapa final, que é reparar o mal pro- duzido, recompor o que foi danificado, refazer o caminho percorrido.
Esse esforço exige maior dose de abnegação e de des- prendimento.
O erro é uma experiência malsucedida, natural no processo de crescimento moral das criaturas.
Reabilitar-se é impositivo da evolução, que não pode nem deve ser desconsiderado.
Provavelmente acontecerá que o outro, a vítima, não desculpe, ou não deseje aceitar a justificativa, o pedido de perdão.
Essa postura, porém, somente é negativa para quem a toma, porquanto, o arrependido se desobriga do dever e o outro assume agora o lugar infeliz.
Seguir adiante quem se deseja recuperar, fazendo o bem e reparando o mal onde este se apresente é conquista libertadora.
Isto posto, dá-se a conversão ao bem real, à verdade, ao amor.
Converter-se é aceitar a proposta que antes lhe foi oferecida e esteve recusada com acrimônia, com ferocidade, tornando-se-lhe adversária naquele momento.
É também eficaz metodologia para a reparação. Jesus havia sido negado, traído, abandonado e cruci- ficado pelos que se beneficiaram do seu amor e o desdenha- ram depois.
Havendo retornado da sepultura, prosseguiu aman- do-os, amando-nos a todos, e o demonstrou mediante a ação de caridade, que fere os sentidos físicos e reconforta a alma dorida, curando as mazelas e deformidades do corpo e do Espírito.
Ante a evidência dos fatos, Pedro conclamou os cri- minosos e comparsas do hediondo drama consumado ao arrependimento e à aceitação dos ensinamentos de Jesus, que já os perdoara, pois que volvera para os socorrer e liber- tá-los deles mesmos.
... Para que venham os tempos de refrigério e de res- tauração.
A mensagem-luz voltava à noite das almas. O amor-ação despertava os adormecidos. O calor da alucinação ardia nos seres.
Eram necessários tempos de refrigério, porque novas dores chegariam – preço cruel que o mundo dos sentidos cobra aos Espíritos da emoção.
Logo mais, recomeçariam os tempos de ardência, fa- zendo-se necessário refrigerar aqueles próximos dias, a fim de suportar os outros, os futuros períodos de testemunhos, que precedem os de restauração.
Nota da autora espiritual: (*) Atos – 3:11 a 19
A
igreja dos corações reunia-se todos os dias e todas as noites para comentar os feitos e as palavras do doce e enérgico Rabi, assim como para orar e amar. Os seus membros criaram a primeira comunidade fra- ternal da Humanidade sob a inspiração do Primeiro man-damento.
Os que possuíam algo vendiam, oferecendo o valor aos apóstolos do Mestre, para que fosse repartido entre to- dos os participantes da irmandade.
A pobreza dos bens materiais enriquecia-os com os tesouros da solidariedade e da legítima compreensão dos deveres, que os reuniam no serviço de iluminação de cons- ciências, como de socorro moral e material à viuvez, à or- fandade, às necessidades de toda ordem.
Repartia-se o pão entre todos igualitariamente e com- partia-se a luz que jorrava do Alto em forma de inspiração e amor.
A presença psíquica do Mestre não permitia que O sentissem ausente, o que os vitalizava sobremaneira.
Respirava-se o odor da pureza e da abnegação.
A ampla casa, no caminho entre e Jerusalém e Jope, tornara-se o santuário que acolhia a dor e alçava o indiví-