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2.4 CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS ACHADOS DA PESQUISA DOCUMENTAL

2.4.2 Tendências das MAC/MT em Conferências

A pesquisa documental se desenvolveu em três etapas, conforme descrito no item Percurso Metodológico. Na primeira etapa, os seguintes temas foram destacados: Modelo Assistencial; Organização da atenção à saúde; Ação integral à saúde; Política de recursos humanos; Política de desenvolvimento científico e tecnológico; Medicamentos e assistência farmacêutica; Gestão de recursos em saúde; Financiamento da saúde; Intersetorialidade das ações de saúde; Comunicação e informação em saúde. Após seguidas leituras do material, destacou-se os seguintes temas aglutinadores: Modelo Assistencial; Organização da atenção à saúde; Política de recursos humanos; Inserção de praticantes tradicionais; Política de desenvolvimento científico e tecnológico; Medicamentos e assistência farmacêutica; Financiamento da saúde. Por fim, após conceituar cada tema aglutinador, chegou-se a duas categorias de análise: Mudança no Modelo Assistencial e Organização da Atenção à Saúde.

Mudança no Modelo Assistencial constituiu uma categoria em que a incorporação das MAC/MT ao sistema de saúde viria possibilitar a escolha democrático do usuário sobre

diferentes opções terapêuticas inseridas no SUS, ela também aproxima a ação dos sujeitos por subverter a lógica do sistema organizado verticalmente a partir de uma profissão hegemônica, busca amplia acesso do usuário e romper com um modelo exclusivo e excludente, baseado no saber e prática médica hegemônica. Essa categoria reconhece ainda que inserção das MAC/MT no sistema de saúde, com sua visão integradora e holística, permite ampliar e redirecionar o modelo de atenção no País, contribuindo na redefinição do paradigma adotado.

Organização da Atenção à Saúde foi a outra categoria resultante da análise, e por meio dela, reconhece-se uma tendência de apresentar as MAC/MT para a política de saúde seguindo a lógica assistencial do modelo vigente, isto é, submetida a uma ordem hierarquizada, fragmentada, e desprovida de posicionamento crítico e popular. As propostas desse núcleo não questionaram a fundo o modelo de atenção, em geral, elas se restringiram a adentrar no campo da saúde, adaptar-se a ele, seguindo suas regras, inclusive reforçando a manutenção da hierarquia médica sobre as demais profissões de saúde.

Nos aspectos quantitativos, o trabalho analítico indicou que a categoria Mudança no Modelo Assistencial associou propostas da ‘Política de Recursos Humanos’, Inserção de praticantes tradicionais22’ e ‘Desenvolvimento Científico e Tecnológico’ e aquelas que

avançaram pela intersetorialidade a partir da articulação com políticas de Meio Ambiente, Segurança Alimentar e Nutricional. Ao final, essa categoria assimilou trinta e duas propostas e quatro moções de apoio aprovadas. Ela representou a tendência predominante de MAC/PIC nos relatórios de conferências analisados. Em relação à categoria Organização da Atenção à Saúde foram identificadas treze deliberações e duas moções no período entre a 11ª CNS e a 14ª CNS. Esta categoria absorveu a ampla maioria de propostas de “Medicamentos e Assistência Farmacêutica”,

A origem da categoria Mudança no Modelo Assistencial foi identificado na 8ª CNS quando se propôs introduzir as prática alternativas de assistência à saúde, como direito de escolha do usuário sobre a assistência à saúde, assim como incorporar agentes populares de saúde como pessoal para trabalhar em educação para a saúde e cuidados primários. Em conferências seguintes, a necessidade de uma profunda mudança do modelo assistencial de saúde praticado no país foi apresentada. Dessas discussões, o modelo de saúde deveria superar o caráter assistencialista, centrado na figura do médico e da medicalização, tensionando-se

22 Em relação ao reconhecimento e valorização de praticantes tradicionais, foram apresentadas propostas de sensibilizar profissionais de saúde quanto a diversidade cultural representada pelos afrodescendentes e pelos indígenas, reconhecer suas crenças, saberes, tradições e recursos terapêuticos. Incluíram praticantes de curas religiosas de diferentes matrizes religiosas. Quanto a recursos humanos, defenderam o reconhecimento profissional de parteiras, pajés, xamãs e pastorais da criança; a integração das práticas tradicionais indígenas, de curandeiros, parteiras e pajés nas equipes multidisciplinares de saúde indígena.

das conveniências do mercado farmacológico e tecnológico. O novo modelo deveria estar centrado em saúde, organizado de forma efetiva pelos princípios da universalidade, equidade, resolutividade e integralidade da atenção. Já a categoria Organização da Atenção à Saúde pode ser identificada em propostas que defendiam como critério para incorporar MAC/MT no SUS, o seu reconhecimento pela profissão médica. De forma geral, as propostas relacionadas a essa categoria não trouxeram questionamentos sobre o modelo de atenção vigente e outras vezes, até o reforçaram em seus aspectos corporativos.

A publicação da PNPIC-SUS indicou uma opção política do Estado brasileiro pela abertura e reconhecimento de práticas e modelos terapêuticos, no entanto, passados quinze anos de sua publicação, quais seriam efetivamente os interesses do Estado e as possibilidades da política? Que impactos a política de saúde quer produzir? E quanto aos atores que militam em prol do avanço dessa política, que caminho vislumbram para ela?

E, ademais, qual seria o espaço no interior dessa política para os praticantes tradicionais de saúde? No texto da política brasileira, a afinidade entre os temas se apresentou na descrição de uma diretriz que propôs articulação com a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígena. Observa-se que de fato essa diretriz não ocorreu de forma espontânea, a PNPIC-SUS reconheceu os sistemas médicos complexos, como a Homeopatia, a Medicina Antroposófica, MTC-Acupuntura, além de recursos terapêuticos, como o Termalismo e a Fitoterapia. No entanto, o espaço para a inserção e contribuição dos agentes populares de cura não foi especificada ou mesmo garantida. A presença indígena nas políticas sociais no Brasil vem se caracterizando mais como “[...] zona de contato em que ocorre o encontro colonial entre povos indígenas e os agentes do Estado-nação responsáveis pela implantação das políticas de saúde” (FERREIRA, 2013, p.205). Nesse sentido, consideramos que a política tem distinguido praticantes de MT de praticantes de MAC/PICs.

Por meio do registro da diversidade de temas com que as MAC/PICs dialogaram ao longo desses anos pode-se inferir que sua presença no campo da saúde não se esgota enquanto práticas oferecidas em ambulatórios de saúde, nos diferentes níveis de atenção. Nota-se que alguns objetivos da PNPIC, voltam-se ora para interesses clínicos como: prevenção de agravos, promoção e recuperação de saúde, ora indicam para um interesse maior sobre o sistema de saúde e sobre a organização dos processos de cuidado na sociedade: aumentar resolutividade do SUS, o uso racional das ações e os recursos de saúde, o desenvolvimento sustentável das comunidades, o estímulo ao controle social e a promoção de cidadania.

Por fim, o resultado positivo das discussões sobre MAC/MT em conferências de saúde, no período estudado, indica uma contínua mobilização de agentes interessados no

avanço e ampliação da política pública. A trajetórias de discussões sobre MAC/MT, inaugurada na 8ª CNS, deve ser reconhecida também como parte do processo social e também político que marcou os espaço em conferências de saúde no país. Por outro lado, entre a década de 1980 e o início dos anos 2000, as práticas alternativas de saúde adquiriram estima técnica e acadêmica, e o reconhecimento social de diversos grupos, intelectuais da saúde coletiva, profissionais de saúde, gestores, usuários de serviços e da população em geral. A mudança da direção política e ideológica anunciada com a ascensão do primeiro governo de esquerda, após a constituinte de 1988, oportunizou o avanço de pautas populares e outras pautas desvinculadas das correntes mais tradicionais e hegemônicas da sociedade brasileira. Destas pautas que ficamos mais inclinados a reconhecer a publicação da PNPIC-SUS.

A etapa da pesquisa documental reconheceu a atualidade do tema das MAC/MT/PICs e apontou para o acontecimento da 15ª CNS, em dezembro de 2015, objeto de discussão do próximo capítulo. Os documentos orientadores dessa conferência indicaram que a discussão sobre o tema das PICs continuou presente nos debates, do nível municipal à etapa nacional, atualizando as discussões e as disputas em torno do ‘campo’. A presente pesquisa se voltou exclusivamente para a análise das propostas de conferências nacionais de saúde, porém, sabe- se que elas tem origem nas discussões e deliberações locais e municipais que foram aprovadas e relacionadas como propostas prioritárias pelas conferências estaduais de saúde.

CAPITULO III

A CONSTITUIÇÃO DO ESPAÇO DAS PICs NA 15ª CNS

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