• Nenhum resultado encontrado

 s1 e s2 gaussianas: A aplicação da contrapositiva não permite obter condições sobre os coeficientes de M .

Para concluir esse exemplo, deve-se notar que a aplicação do teorema de Darmois– Skitovich a esse problema de BSS permitiu a verificação de situações em que a separabilidade das fontes é possível via imposição de independência espacial à saída do sistema separador. Em particular, a separação é garantida, a menos de ambiguidades, se no máximo uma fonte for gaussiana. Adicionalmente, nada pode ser dito se ambas as fontes forem gaussianas — eventualmente, elas podem ser separadas por imposição de independência, mas nem

sempre isso pode ser garantido. C

Os resultados para N = 2, obtidos no exemplo considerado, podem ser estendidos para quando há N > 2 fontes. Nesse contexto mais geral, as condições teóricas que o modelo de mistura deve satisfazer para que a separação adequada de fontes possa ocorrer são dadas pelo teorema de separabilidade das fontes. Trata-se de um resultado importante em BSS, demonstrado pela primeira vez por Comon (1994).

5.3 Teorema de separabilidade das fontes

No teorema de separabilidade das fontes, são apresentadas condições adicionais que o modelo de sistema misturador linear e instantâneo, com fontes iid e mutuamente independentes no espaço, deve satisfazer para que a imposição de independência sobre o vetor de fontes estimadas permita obter a adequada recuperação das fontes. Inicialmente, tomando-se por base o Teorema 5.3 aplicado ao modelo particular de separação de fontes aqui considerado, obtém-se o lema intermediário apresentado a seguir (COMON, 1992). Lema 5.3 (Comon, 1992). Seja s o vetor aleatório de fontes não constantes e mutuamente independentes e seja y o vetor aleatório de fontes estimadas, ambos com N elementos, tais que y = M s sendo M ∈ RN ×N a matriz de resposta combinada. Supõe-se, adicionalmente, que as variáveis aleatórias em y são independentes em pares. Se a i-ésima coluna da matriz M possuir pelo menos dois elementos não nulos, então si é uma variável aleatória constante ou gaussiana.

Demonstração. Seja mk,i = [M ]k,i, com k, i = 1, 2, . . . , N . Supõe-se que M possui, na

sua i-ésima coluna, dois elementos não nulos nas linhas k1 e k2, com k1 6= k2 — i.e.,

mk1,imk2,i 6= 0. Pode-se aplicar o Teorema 5.3 apenas às linhas k1 e k2, visto que yk1

e yk2 são independentes por hipótese. Sendo assim, si é variável aleatória constante ou

gaussiana.

O Lema 5.3 é uma variante do teorema de Darmois–Skitovich (Teorema 5.3). Agora, com base nos Lemas 5.2 e 5.3, é possível demonstrar o teorema de separabilidade das fontes baseando-se em Comon (1994).

Teorema 5.4 (Comon, 1994). Seja s o vetor aleatório de fontes não constantes e mutua- mente independentes, das quais no máximo uma é gaussiana, e seja y o vetor aleatório de fontes estimadas, ambos com N elementos, tais que y = M s sendo M ∈ RN ×N a matriz inversível de resposta combinada. As seguintes proposições são equivalentes:

(i) As fontes estimadas em y são independentes em pares. (ii) As fontes estimadas emy são mutuamente independentes.

(iii) M = ΛP , em que Λ ∈ RN ×N é matriz diagonal inversível e P ∈ RN ×N é matriz de permutação.

Demonstração.

 (iii) ⇒ (ii): Se M = ΛP , então cada um dos elementos de y corresponde a apenas um dos elementos de s multiplicado por um escalar real não nulo. Além disso,

quaisquer elementos distintos de y não correspondem a um mesmo elemento de s multiplicado por um escalar qualquer. Como as fontes em s são mutuamente

independentes, tem-se que as fontes estimadas em y também são mutuamente

independentes.

 (ii) ⇒ (i): Como as fontes estimadas em y são mutuamente independentes, então elas também são independentes em pares, conforme a demonstração da Proposição 2.1.  (i) ⇒ (iii): Apresenta-se, aqui, uma prova por contradição. Sejam as fontes estima- das em y independentes em pares e seja M 6= ΛP com N ≥ 2. Como M 6= ΛP ,

mas possui a fatoração dada pela Equação (5.11) do Lema 5.2 por ser inversível, essa matriz necessariamente possui dois elementos distintos não nulos em pelo menos duas colunas distintas. Aplicando-se o Teorema 5.3 às duas fontes correspondentes a essas duas colunas, tem-se que s possui pelo menos duas fontes gaussianas. Trata-se

de uma contradição com a hipótese original do teorema, de que no máximo uma das componentes de s é gaussiana.

Esse teorema garante que, sob certas condições, o princípio de separação baseado em imposição de independência espacial à saída do sistema separador é capaz de separar adequadamente as fontes. Em particular, essa estratégia é sempre válida seM for inversível

e no máximo uma das fontes for gaussiana e nenhuma delas for constante. Esse resultado está de acordo com o que foi obtido no Exemplo 5.3 para o caso particular de N = 2.

Além disso, o Teorema 5.4 estabelece que as fontes podem ser separadas a menos de am- biguidades de escala ou permutação, representadas pelas matrizesΛ e P , respectivamente.

5.4. Conclusões 115

e instantâneas com fontes iid e mutuamente independentes no espaço. Essas limitações apenas podem ser evitadas se hipóteses adicionais forem incluídas no modelo estatístico das fontes (COMON, 1992; CARDOSO, 1998; HYVÄRINEN; OJA, 2000). .

Por fim, segundo o Teorema 5.4, não é necessário recuperar a independência espacial mútua das fontes para separá-las — apenas a recuperação de independência em pares já é suficiente.

5.4 Conclusões

Desde o início dos anos 1980, várias soluções interessantes vêm sendo propostas para resolver o problema de BSS com modelo de sistema misturador linear e instantâneo e com fontes iid. Muitas dessas soluções são baseadas em princípios de extração de componentes independentes. Os limites teóricos e os princípios de funcionamento dessas soluções foram esclarecidos por Comon (1994), graças ao teorema de Darmois–Skitovich (DARMOIS, 1953). Esse teorema estabelece a relação muito pouco evidente entre independência estatística e não gaussianidade de variáveis aleatórias. Até a atualidade, o teorema de Darmois–Skitovich é assunto de pesquisa em processamento de sinais e estatística (THEIS, 2004; MAZUR, 2013). Em separação cega de fontes, esse teorema já foi estendido de diferentes formas visando a sua posterior aplicação à obtenção de condições de separabilidade em problemas envolvendo fontes complexas (ERIKSSON; KOIVUNEN, 2006) ou tipos particulares de misturas não lineares (TALEB; JUTTEN, 1999; ERIKSSON; KOIVUNEN, 2002; JUTTEN; BABAIE-ZADEH; HOSSEINI, 2004; ERIKSSON; KOIVUNEN, 2005), por exemplo.

É oportuno recordar, nesse momento, que ao longo desse capítulo foi considerado o problema de BSS com modelo de sistema misturador linear e instantâneo e com fontes iid e mutuamente independentes no espaço. Conforme visto por meio de exemplos ao longo do capítulo, o teorema de Darmois–Skitovich, quando trazido para esse contexto, permitiu compreender sob que hipóteses as fontes iid e mutuamente independentes no espaço podem ser separadas via imposição de independência à saída do sistema separador. Em suma, a condição suficiente para a separação é que no máximo uma das fontes mutuamente independentes seja gaussiana. Conforme se verificou no Exemplo 5.3, entretanto, essa condição não é necessária.

A obtenção de condições de separabilidade para fontes iid e mutuamente independentes no espaço, a partir do teorema de separabilidade das fontes, inspirou uma ramificação no conjunto de técnicas de separação cega de fontes para misturas lineares e instantâneas. Basicamente, houve uma subdivisão em duas vertentes distintas:

(i) Separação de fontes iid, independentes e não gaussianas. Essas técnicas são baseadas em uso de estatísticas de ordem superior para a imposição de independência estatística à saída do sistema separador — visto que variáveis aleatórias não gaussianas não são conjuntamente descritas de forma completa apenas com estatísticas até a ordem

dois. As condições de separabilidade, para essas técnicas, são dadas pelo Teorema 5.4 apresentado na Seção 5.3. Na literatura, esse conjunto de técnicas é denominado análise de componentes independentes (ICA).

(ii) Separação de fontes não iid, independentes e gaussianas. Existe um conjunto de técnicas voltado à separação cega de fontes que são gaussianas; em alguns casos práticos, esse tipo de problema pode ocorrer (ABED-MERAIM; XIANG; HUA, 2000; PHAM; CARDOSO, 2001; COMON; JUTTEN, 2010). De acordo com o teorema de separabilidade das fontes, se as fontes forem iid, independentes e gaussianas, então não se garante a sua correta separação por imposição de independência. Entretanto, abandonando-se a hipótese de fontes iid, é possível separar fontes conjuntamente gaussianas. O segredo está em considerar a autoestrutura temporal dos processos estocásticos gaussianos correspondentes às fontes, ao contrário do que é feito sob a hipótese de fontes iid, em que essa estrutura é ignorada (HYVÄRINEN, 2013). Para processos estocásticos gaussianos, a caracterização estatística é simplificada pois pode ser feita de forma completa até a ordem dois (i.e., com funções de autocovariância ou autocorrelação, modelos temporais, etc.). Além disso, a imposição de independência espacial também pode ser feita apenas considerando-se estatísticas até a ordem dois, dada a gaussianidade dos processos. Sendo assim, o conjunto de técnicas dedicado a esse problema, em particular, é conhecido como separação de fontes baseada em estatísticas de ordem dois. A questão da separabilidade das fontes, nesse contexto, é discutida por Tong e Liu (1990), Abed-Meraim, Xiang e Hua (2000).

Neste trabalho, enfoque é dado ao primeiro caso (i.e., ao modelo de sistema misturador linear e instantâneo, com fontes iid, mutuamente independentes no espaço e não gaussianas). De acordo com o teorema de separabilidade apresentado na Seção 5.3 (Teorema 5.4), pode- se prever que os métodos de separação nesse contexto devem envolver, inevitavelmente, algum sistema separador que imponha independência estatística em sua saída. Porém, dependendo do método de separação considerado, esse tipo de imposição pode aparecer de forma implícita.

No capítulo a seguir, abordam-se métodos baseados em propriedades algébricas de cumulantes para a realização da separação cega de fontes por imposição de independência. Trata-se de uma abordagem do problema de separação que pode ser compreendida como uma extensão à ordem superior de métodos clássicos em processamento estatístico de sinais baseados em estatísticas de segunda ordem. A abordagem dada ao longo desse capítulo às condições de separabilidade das fontes se provará muito útil para a interpretação e o entendimento dos métodos de separação abordados nos próximos dois capítulos.

117