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5 INVESTIGAÇÕES A RESPEITO DE CONCEPÇÕES

5.3 O Conhecimento e as Correntes Filosóficas

5.3.4 Teoria da Flexibilidade Cognitiva

A Teoria da Flexibilidade Cognitiva (TFC), proposta por Rand Spiro, professor de psicologia educacional, e seus colaboradores Richard Coulson, Paul Feltovich e D.K. Anderson na década de 1980, é uma resposta às dificuldades de aquisição de conhecimentos em

situações características de complexidade de conteúdo e irregularidade de situações de aplicação. Apesar de terem como base o construtivismo, os autores pretendem ir além da prática construtivista corrente na educação em geral. Como exemplo, citam que a compreensão de um texto não está presente apenas na informação linguística e lógica codificada naquele texto, mas envolve também a construção do significado. Esta construção de significado vai necessitar da combinação da informação presente no texto com informações contidas fora do texto, principalmente nos conhecimentos prévios, conforme proposto por Ausubel, para então poder formar-se uma representação completa e adequada do significado do texto (SPIRO et al, 1991).

Para os autores, a interpretação dominante do construtivismo tem se baseado na recuperação de conteúdos organizados de conhecimentos, a partir da memória, para alimentar qualquer informação apresentada que deva ser entendida, ou qualquer indicação de um problema que deva ser resolvido. Partindo da premissa de que o conhecimento deverá ser usado em muitas situações diferentes, que não poderão ser apresentadas imediatamente ao aprendiz, propõem que a ênfase deve ser dada na recuperação de estruturas intactas de conhecimento capazes de sustentar a construção de novas compreensões. Porém, ao invés de recuperar na memória a “receita” tradicional de como pensar e agir, a qual muitas vezes se revela inapropriada, é preciso agrupar, a partir de várias fontes de conhecimento, um conjunto específico de representações mentais preexistentes que possam servir para a compreensão e resolução de determinado problema. Esse agrupamento de informações é necessário devido ao fato de que muitas áreas de conhecimento têm uma quantidade muito grande de procedimentos para uma única situação, armazenados previamente nas estruturas cognitivas e capazes de cobrir de forma suficiente todos os casos que terão necessidade daquele saber (SPIRO et al,1 991).

Spiro e colaboradores (1991) também consideram que existe um ponto em comum no fracasso de vários sistemas educacionais, o qual reside no ensino simplificado e desconectado da realidade. Portanto, em contraposição, os autores propõem uma teoria construtivista de ensino que venha colocar ênfase na complexidade das situações encontradas no dia a dia e no reconhecimento da existência de padrões de fracasso escolar, capazes de fornecer pistas para a resolução dos problemas e adoção de medidas profiláticas.

A TFC, segundo Greene (2006), surgiu como resposta à percepção de que as tradicionais teorias de aprendizagem, além de não serem eficazes, não eram capazes de explicar como acontece a aprendizagem de conteúdos complexos em situações de estágios avançados de aquisição de conhecimento, em que a aplicação deste conhecimento acontece de forma irregular.

Assim, essa teoria serve perfeitamente para o ensino e aprendizagem em áreas onde é necessário compreender e sintetizar uma grande quantidade de informação complexa e onde não existem “respostas corretas” para as questões. Situações características de complexidade de conteúdo e irregularidade de situações de aplicação são caracterizados por casos em que a aplicação do conhecimento tipicamente envolve uma interação simultânea de múltiplas estruturas com amplas aplicações conceituais, cada uma das quais é por sua vez individualmente complexa. Além disso, nesses casos, o padrão de incidência conceitual e interação varia substancialmente a cada situação do mesmo tipo, caracterizando uma irregularidade. Como exemplo, Spiro et al (1991) apresentam uma situação de patologia cardiovascular, na qual está implicada uma interação complexa de conceitos básicos de várias disciplinas das Ciências da Saúde, e na qual diferentes pacientes podem apresentar variados graus de alterações patológicas. Essas características também estão presentes em outras áreas de estudo, como a Matemática e a Física, a História, e em todas as situações que envolvem aplicação prática de conhecimentos.

O processo pelo qual alguém adquire a capacidade de transitar por estes domínios complexos e irregulares foi denominado flexibilidade cognitiva (FC). A FC é definida como a capacidade de reestruturar de forma espontânea o próprio conhecimento para responder às necessidades das situações de mudança, tanto em função da forma como o conhecimento é representado, como dos processos que operam nas representações mentais realizadas, pois o conhecimento que deve ser usado de múltiplas formas precisa ser também representado de várias maneiras diferentes (SPIRO et al, 1991). A TFC preocupa-se portanto com a transferência e com a aplicação do conhecimento em situações diferentes daquelas originalmente apresentadas, estando orientada não para a memorização, mas sim para a interligação de conceitos em níveis avançados (YOKAICHIYA, 2005).

Carvalho (2002) registra que a TFC considera a existência de três níveis na aquisição de conhecimentos: o inicial, ou introdutório, o avançado e o nível de especialização, possível de ser alcançado por meio de uma prática intensa e de muita experiência no campo de trabalho em questão. A aprendizagem a nível avançado envolve o desenvolvimento da capacidade de adequar o conhecimento conceitual e adaptá-lo para a utilização em novas situações.

Além disso, Greene (2006) esclarece que havendo maiores dificuldades em relação à complexidade de conteúdo e à irregularidade de situações de aplicação do conhecimento, os objetivos a serem alcançados serão a passagem: a) da familiaridade superficial com o conteúdo para o domínio de importantes aspectos de complexidade conceitual; b) da reprodução do conhecimento para a aplicação do conhecimento.

De forma resumida, é possível inferir que na TFC a compreensão é construída a partir da utilização de conhecimento prévio para ir além da informação propriamente dita e do conhecimento prévio que é trazido à tona para ser então construído, ao invés de recuperado intacto da memória para ser aplicado caso por caso. Consequentemente, a TFC busca sanar os aspectos mal estruturados do conhecimento e que trazem problemas para a aquisição posterior de novos conhecimentos. A TFC pode então ser definida como uma teoria que integra aprendizagem, representação mental e instrução programada (REZENDE, 2001).

A TFC está ligada a uma teoria de acesso aleatório (Random Acess Instruction), a qual se relaciona com a construção de ambientes de ensino não lineares no computador, e os materiais nele inseridos são denominados de hipertextos de flexibilidade cognitiva (BONGESTABS, 2003).

Portanto, com base nas considerações de que o computador e os ambientes são essenciais para que aconteça a flexibilização do conhecimento, os aspectos ligados à construção de materiais didáticos baseados na TFC e nas TIC serão abordados no trabalho juntamente com o tema da criação das disciplinas de Bioquímica em ambiente virtual.

5.4 O uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC)