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Capítulo 2 – Revisão Bibliográfica

2.2 Teoria dos Contratos e Incentivos e a economia da saúde

Como vimos anteriormente, o mercado de saúde envolve a interação entre seis

agentes: (i) autoridade de saúde; (ii) serviço de saúde público; (iii) provedores de

serviços de saúde; (iv) indústria de saúde suplementar e seguradoras; (v) pacientes

e assegurados e (vi) o setor farmacêutico; que detêm níveis diferentes de

informação. Assim, devido à assimetria de informação

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, entre cada um dos grupos

surge o problema de agência. Iremos nos concentrar nesta discussão principalmente

entre três grupos de agentes: os provedores de serviços de saúde (i.e. médicos e

hospitais); a indústria de saúde suplementar e seguradoras e os pacientes e

segurados. O conhecimento sobre cada um dos grupos é importante para

compreender os seus comportamentos e decisões.

A teoria microeconômica nos revela que, baseado nos benefícios e nos custos das

escolhas de cada um, os agentes irão assumir a alocação de seus recursos para

atingir os seus objetivos (FELDSTEIN, 2011). Portanto, como exposto por LAFFONT

& MARTIMORT (2002), é relevante estudar os incentivos oferecidos a cada agente

para que atinjam os seus objetivos/resultados considerando interesses distintos ou

até mesmo conflitantes.

A informação é assimétrica quando uma das partes tem mais informação do que a

outra. Desta forma, a parte menos informada normalmente contrata a parte mais

informada para tomar decisões em seu nome, situação esta que conhecemos como

relação de agência ou principal-agente.

Na análise de assimetria de informação, distinguem-se três tipos de problema: (i)

risco moral, no qual a assimetria de informação ocorre após a assinatura do

contrato; (ii) seleção adversa, na qual a assimetria de informação ocorre antes da

assinatura do contrato; e (iii) signaling, no qual a parte mais informada tem incentivo

em revelar informações privadas antes de assinar o contrato.

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Assimetria de informação é quando os agentes têm níveis de informação diferentes. É importante notar que

informação perfeita é sempre simétrica e que informação imperfeita é assimétrica somente se houver níveis de

informação diferente entre os agentes.

2.2.1 Mercado de saúde e assimetria de informação

Em uma situação de risco moral, a assimetria de informação surge logo após que o

contrato é assinado porque o principal não tem como controlar a ação do agente. O

risco moral acontece quando, por exemplo, o indivíduo contrata um plano de saúde

ou seguro-saúde e resolve aumentar o uso dos serviços médicos, pois os valores de

reembolso podem chegar a 100% do valor da consulta, e o preço cheio “out-of-

pocket” da consulta para o paciente beneficiário é reduzido, acarretando uma

demanda maior por serviços de saúde. Por outro lado, alguns serviços médicos,

como o uso do serviço de UTI, têm demanda vertical na qual pouco importa o preço

da UTI, a demanda não irá variar em função do preço. Neste caso não podemos

falar em risco moral por parte do paciente beneficiário. Assim sendo, a demanda por

serviço de saúde pode ser influenciada por um fator que chamamos de utilização

excessiva (FELDSTEIN, 2011).

No caso de seleção adversa, podemos considerar como exemplo uma seguradora

que por não ter a informação sobre o estado de saúde de um cliente potencial

comercializa seu seguro-saúde a um preço determinado pela média do nível de

saúde de uma população. Nesta situação, como há apenas um contrato sendo

oferecido, somente os indivíduos com estado de saúde abaixo da média da

população irão contratar, acarretando perdas para a seguradora, pois a receita da

seguradora não será suficiente para cobrir as despesas desses clientes.

A fim de reduzir a desvantagem na informação, as seguradoras procuram oferecer

um menu de contratos para, assim, selecionar os proponentes conforme os seus

riscos.

A análise das situações de risco moral e seleção adversa nos mostra que a parte

mais informada irá utilizar sua informação privada para seu interesse. Entretanto, há

situações nas quais a parte mais informada não tem como se beneficiar da

vantagem de informação. Neste caso, a parte mais informada terá o incentivo em

revelar sua informação privada se o ganho de utilidade for superior ao custo de

revelar esta informação. Este fenômeno é conhecido como signaling.

2.2.2 Serviços médicos e Supply-induced Demand

A atuação médica como fornecedora de serviço de saúde tem tido uma relevância

importante nas discussões sobre a relação de agência existente entre médicos e

pacientes. O médico tem o papel de: (i) provedor de serviços de saúde; e de (ii)

conselheiro quanto à conduta a ser seguida pelo paciente, ou seja, o médico

determina quais os serviços de saúde que serão demandados pelo paciente. Esta

particularidade tem sido o foco do debate sobre se o médico como agente

“imperfeito” utiliza-se da vantagem de informação sobre o estado de saúde do

paciente para garantir maior volume de serviço, conhecido com Supplier-induced

Demand (ou SID).

Segundo FELDSTEIN (2011), a quantidade demandada de serviço de saúde que um

médico pode induzir é, por hipótese, o trade-off entre o aumento de receita e a

desutilidade de prover assistência à saúde desnecessária. O médico como agente

racional tem como objetivo maximizar sua utilidade. Considerando que sua utilidade

aumenta conforme sua renda e a prática moral de sua conduta, podemos supor que

a demanda deverá ser induzida quando o custo adicional de oferecer mais serviços

médicos (considerado como desutilidade devida à conduta imperfeita do agente) é

inferior ao valor adicional de renda. Portanto, é óbvio que a situação de SID tem

mais propensão a ocorrer quando há um declínio na remuneração dos serviços

médicos ou uma redução na demanda por estes serviços. Assim, tendo em vista que

há um comportamento por parte do profissional médico em determinar um valor-

meta para a sua renda, o aumento de médicos atuando em uma área geográfica irá

certamente aumentar a SID (PHELPS, 2003).

Ademais, a existência de um sistema de saúde que ofereça ampla cobertura de

saúde para os beneficiários permite que não haja por parte do paciente nenhum

incentivo em resistir à demanda induzida pelo médico para o seu tratamento.

Concluindo, a demanda por serviço de saúde em uma situação de assimetria de

informação pode ser influenciada por diversos fatores monetários e não-monetários,

acarretando situações de utilização excessiva por parte dos beneficiários e de

incentivo de induzir a demanda por parte do prestador médico.

Capítulo 3 – Apresentação do setor de saúde suplementar brasileiro e sua