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4.2 As leis da mecˆanica dos buracos negros

4.2.4 Terceira Lei

Tem a terceira lei um an´alogo na f´ısica dos buracos negros, a saber, a superf´ıcie de gravidade do horizonte n˜ao pode ser reduzida a zero em um n´umero finito de passos. A validade dessa lei ´e sugerida pelas investiga¸c˜oes das ´orbitas de part´ıculas de teste em torno de um buraco negro rotativo carregado. Uma formula¸c˜ao precisa dessa lei foi dada e mostrou-se em algumas premissas por Israel [26].

Uma ideia do significado da terceira lei pode ser adquirida pensando-se em como viol´a-la. Assim,um buraco negro n˜ao rotativo k decresce quando adiciona-se massa, ent˜ao o buraco negro tem calor espec´ıfico negativo. Mas, seria necess´aria uma quantidade infinita de massa para reduzir k a zero. Um buraco negro rotativo geral com momento angular J e carga Q tem uma superf´ıcie de gravidade e uma ´area do horizonte de eventos dada por k = 4πμ/A com A = 4π[2M (M + μ) − Q2] e com μ = (M2− Q2− J2/M2)1/2.

Tem-se um buraco negro extremo quando μ = 0. Para um buraco negro extremo, k desvanece e A = 4π(2M2−Q2) ou seja, um buraco negro extremo tem “temperatura” zero,

mas “entropia” n˜ao nula. Se M2 < Q2 + J2/M2, em seguida, o espa¸co-tempo tem uma

singularidade nua e n˜ao ´e um buraco negro em tudo. Assim, se a superf´ıcie da gravidade pode ser reduzida a zero, seria apenas infinintesimalmente longe de criar uma singularidade nua, violando a Censura C´osmica. Para reduzir a superf´ıcie de gravidade a zero, pode-se tentar injetar uma quantidade suficiente de carga ou momento angular para o buraco. Pode-se supor que se tente jogar uma carga q de massa m em um buraco negro carregado, n˜ao rotativo, de massa M e de carga Q < M , tentando fazer Q + q = M + m, para que a atra¸c˜ao gravitacional seja mais forte que a repuls˜ao eletrost´atica deve-se escolher mM > qQ, ent˜ao q/m < M/Q. Mas, essa desigualdade garante que Q + q < M + m. Da mesma forma ao se tentar injetar suficiente momento angular orbital para um buraco negro rotativo, deve-se achar que a part´ıcula simplesmente perde o buraco. Ao tentar-se soltar uma part´ıcula girat´oria ao logo do eixo de um buraco negro rotativo da mesma maneira deve-se imaginar que existe uma for¸ca gravitacional spin-spin que ´e repulsiva e apenas forte o suficiente para imped´ı-lo de reduzir k a zero. Ao se tentar soltar uma part´ıcula eletricamente carregada dentro de um buraco negro rotativo ao longo do eixo, h´a alguns presumivelmente tipos de “auto-for¸cas” na carga que as repelem do buraco.

O comportamento n˜ao decrescente da ´area de um buraco negro seria muito seme- lhante ao da entropia.

Uma afirma¸c˜ao adequada acerca desta ideia ´e conhecida como a segunda lei da termodinˆamica, que estabelece que a entropia de um sistema isolado sempre aumenta e que, quando dois sistemas s˜ao somados, a entropia do sistema combinado ´e maior do que a soma das entropias dos sistemas originais.

A segunda lei da termodinˆamica tem um atributo diferente do de outras leis cien- t´ıficas, pois ela n˜ao se aplica a todos os casos, apenas `a maioria deles. No entanto, uma maneira de se violar a segunda lei seria atirando-se qualquer mat´eria com alguma entropia no interior do buraco negro. Pode-se naturalmente afirmar que toda a entropia, incluindo aquela de dentro do buraco negro, n˜ao caiu nele - mas, dado que n˜ao h´a jeito de se olhar para dentro do buraco negro, n˜ao se pode ver quanta entropia tem a mat´eria ali contida [41].

Dessa forma, a segunda lei da mecˆanica dos buracos negros est´a associada ao teorema da ´area da Relatividade Geral, obtido no contexto cl´assico4 [34] e primeiramente

demonstrado por Hawking [7, 33]. Esta lei afirma que a ´area de um buraco negro nunca pode diminuir por nenhum processo f´ısico, ou seja, δA ≥ 0.

Se dois buracos negros se fundissem, a ´area final do horizonte de eventos resultante ser´a maior ou igual `a soma das duas ´areas iniciais. Este resultado estabelece uma estreita analogia entre a ´area do horizonte de eventos e o conceito de entropia, a menos de fatores dimensionais. Isso foi primeiramente identificado e sugerido por Bekenstein [47].

A primeira lei da mecˆanica dos buracos negros ´e uma identidade relacionando as mudan¸cas infinitesimais de massa, M , momento angular J, e ´area A de um buraco negro estacion´ario quando levemente perturbado. A partir da equa¸c˜ao (3.7), em que AKN = (M, J, Q), pode-se obter a fun¸c˜ao M = M (AKN, J, Q), cujas varia¸c˜oes em primeira

ordem dos parˆametros AKN, J e Q resultam em

δM = ∂M ∂A  J,Q δA + ∂M ∂J  A,Q δj + ∂M ∂Q  A,J δQ (4.19) omitindo-se a referˆencia KN em A [36].

Os coeficientes associados `as varia¸c˜oes de J e Q s˜ao definidos da seguinte maneira:

Ω = ∂M ∂J  A,Q = 4πj A , (4.20)

e Φ = ∂M ∂Q  A,J = 4πQr+ A . (4.21)

O estudo do movimento de part´ıculas testes carregadas nas proximidades de um buraco negro de KN atesta que Φ ´e o potencial el´etrico do horizonte do buraco negro, enquanto Ω ´e a frequˆencia angular uniforme com a qual part´ıculas “caindo” em dire¸c˜ao ao buraco negro s˜ao arrastadas pelo horizonte, sendo uma boa defini¸c˜ao da frequˆencia rotacional do buraco negro. O coeficiente associado `a varia¸c˜ao de A pode ser escrito como

k 8π =  ∂M ∂A  J,Q = r+− M 2A . (4.22)

A quantidade k ´e denominada de gravidade superficial e possui uma interpreta¸c˜ao direta. Para um buraco negro de Schwarzschild, k ´e o valor limite da for¸ca que deve ser exercida no infinito para manter uma part´ıcula de massa unit´aria sobre o horizonte de eventos. Nominalmente este valor ´e 1/4M [36, 51].

As defini¸c˜oes acima permitem reescrever a equa¸c˜ao (4.19) como: [50],

δM = k

8πδA + ΩδJ + ΦδQ. (4.23)

O aspecto desta equa¸c˜ao ´e inteiramente similar ao da primeira lei da termodi- nˆamica, a qual afirma que varia¸c˜oes infinitesimais na energia, E, entropia, S, e outros parˆametros de estado extensivos de um sistema, entre estados de equil´ıbrio t´ermico con- t´ıguos deste sistema, ´e dado por

δE = T δS +

i

X(i)δx(i), (4.24)

em que, T ´e a temperatura do sistema e δx(i) representa a varia¸c˜ao do i-´esimo parˆametro

de estado extensivo (excluindo S), enquanto que X(i) ≡ ∂E/∂x(i) ´e o i-´esimo parˆametro

intensivo (excluindo T ) [36].

Os termos ΩδJ e ΦδQ, que aparecem na equa¸c˜ao (4.23), caracterizam o trabalho feito sobre o buraco negro por um agente externo cuja a¸c˜ao tem por finalidade aumentar o momento angular e a carga do buraco negro pelas quantidades δJ e δQ, respectivamente. Esses elementos de trabalho s˜ao bem conhecidos de sistemas mecˆanicos cujo potencial el´etrico ´e Φ e a frequˆencia angular ´e Ω [21, 36].

A lei zero da mecˆanica dos buracos negros refere-se a gravidade superficial, que deve permanecer constante sobre todo o horizonte de eventos de um buraco negro estacion´ario. Este resultado ´e estritamente an´alogo `a zero-´esima lei da termodinˆamica, a qual afirma que a temperatura deve ser uniforme sobre um corpo em equil´ıbrio t´ermico [36].

As leis da mecˆanica dos buracos negros em Relatividade Geral, como enunci- adas acima, s˜ao not´aveis an´alogos matem´aticos das leis da termodinˆamica usual, emb- ora diferenciem-se pela natureza de argumentos normalmente utilizados para valid´a-las. Contudo, h´a algumas caracter´ısticas gerais em comum entre elas. Por exemplo, a val- idade das leis da mecˆanica dos buracos negros n˜ao depende da forma detalhada das equa¸c˜oes de Einstein, assim como a validade das leis da termodinˆamica usual n˜ao de- pende do entendimento da dinˆamica microsc´opica do particular sistema. Al´em disso, os teoremas de unicidade dos buracos negros estabelecem que um buraco negro estacion´ario, isto ´e, “em equil´ıbrio”, ´e caracterizado por um pequeno n´umero de parˆametros (M, J, Q) assim como os parˆametros de estado da termodinˆamica usual [36]. Comparando-se as zero-´esima, primeira e segunda leis da termodinˆamica com as correspondentes leis da mecˆanica dos buracos negros encontra-se que as quantidades an´alogas s˜ao, respectiva- mente: E ↔ M, T ↔ ak, e S ↔ A/8πα, onde α ´e uma constante indeterminada. Mesmo no contexto da Relatividade Geral, uma indica¸c˜ao de que essa conex˜ao possa ser envolvida por um significado f´ısico mais profundo surge do fato de que E e M representam a mesma grandeza f´ısica: a energia total do respectivo sistema [36].

Por outro lado, segundo a mesma Relatividade Geral, a temperatura f´ısica do bu- raco negro deveria ser nula, sendo notando que classicamente um buraco negro n˜ao pode estar em equil´ıbrio com a radia¸c˜ao de corpo negro, para qualquer outra temperatura diferente de zero, pois nenhuma radia¸c˜ao poderia ser emitida a partir dele. Consequente- mente, isso tamb´em poderia sugerir que a defini¸c˜ao da entropia de um buraco negro a partir da ´area do horizonte de eventos seria algo puramente formal [36].

Mas este panorama modifica-se radicalmente ao estudar-se a natureza dos buracos negros utilizando a Mecˆanica Quˆantica [36].

Uma aten¸c˜ao especial ´e dedicada `a terceira lei da termodinˆamica, tamb´em conhe- cida como teorema de Planck-Nernst. Esta lei afirma que a entropia tende a zero, S → 0, quando a temperatura for zero T → 0 para qualquer sistema, em princ´ıpio [52]. O an´al- ogo desta lei falha na mecˆanica de buracos negros, j´a que existem buracos negros externos

M2 = j2 + Q2 de ´area finita que possuem k = 0. Entretanto, mesmo em termodinˆamica

usual, a terceira lei n˜ao ´e considerada uma lei fundamental. Apesar de ser verificada em- piricamente para uma variedade de sistemas, ainda assim ´e poss´ıvel encontrar viola¸c˜oes a ela tanto no cen´ario cl´assico (g´as ideal) quanto no cen´ario quˆantico (Sistemas cujo estado fundamental ´e altamente degenerado) [21, 36].

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