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Teremos todos a capacidade de criar algo novo e de valor? É algo que se

2.2. O Processo Criativo

2.2.3. Teremos todos a capacidade de criar algo novo e de valor? É algo que se

Para responder a esta pergunta, Bohm (1969) refere que existiu e existe um grupo considerável de cientistas, melhores matemáticos e com maior conhecimento de física do que Einstein. A diferença é que este demonstrou uma excepcional qualidade de originalidade. Segundo este autor, uma das formas de conseguir esta originalidade é a de se estar predisposto a aprender alguma coisa nova, mesmo que isso signifique contrariar conceitos pré-estabelecidos. Bohm deduz que esta faceta é uma característica comum a toda a humanidade, e exemplifica comparando-a com determinadas facetas de crianças nos seus primeiros anos de vida. Vivem constantemente na descoberta de toda a espécie de experiências novas, aprendendo a andar, a falar e a conhecer o seu caminho apenas experimentado e vendo o que acontece. O autor faz também referência ao facto de que a esta forma de aprender, à medida que a criança cresce, vai diminuindo de importância. Na escola, irá aprender novos conhecimentos por meio de repetição, com o objectivo de passar exames. No trabalho, irá ter um desempenho no contexto do qual irá aprender tarefas de uma forma semelhante. Nestas duas últimas fases da vida, o adulto que já foi criança já não tem como impulso principal o envolvimento em actividades que estimulam o acto de aprender e, consequentemente, a capacidade de ver algo de novo e original também abranda. Independentemente do grau de importância do acto de “aprender” nas diferentes fases da nossa vida ele é, segundo Bohm, a base da percepção, cuja principal finalidade é ajudar-nos a distinguir aquilo que é um facto novo daquilo que não o é. O tipo de percepção que é necessário para detectar algo de novo exige também que se esteja atento, desperto, avisado e sensível.

Bohm alerta também para outro comportamento humano que nos afasta do desenvolvimento da percepção e do uso da criatividade: o medo de errar. Cometer erros tende a ser percepcionado culturalmente como indicador de inferioridade; no entanto, toda a aprendizagem envolve tentar e errar. Este receio de cometer erros, aliado à existência de ideias preconcebidas (quaisquer que elas sejam) leva- nos a rotular e a fechar conceitos, impedindo a originalidade de surgir. O autor conclui assim que a capacidade de aprender alguma coisa nova depende mais do nosso estado de espírito do que da existência de faculdades e talentos especiais. É certo que quando a capacidade de aprendermos entra em funcionamento existe também um interesse total e exclusivo naquilo que se está a fazer. E mais uma vez o autor faz relembrar a existência deste mesmo grau de interesse se observarmos, por exemplo uma criança no processo de aprender a andar, processo este que o autor designa por “interesse sincero”. Este interesse sincero é responsável, por sua vez, pelo surgimento de uma energia que nos leva a dedicar-nos com empenho a um determinado desafio. O Bohm não tem dúvidas de que todos os grandes cientistas e artistas tiveram este interesse sincero nos seus trabalhos. Csikszentmihalyi (1996) apresenta uma teoria que difere da do “medo de errar” de Bohm. Segundo este autor, existe outra força que nos motiva, mais poderosa que a nossa necessidade de criar: a força da entropia. De acordo com Csikszentmihalyi, a entropia é um mecanismo de sobrevivência construído no gene da nossa evolução. Dá-nos prazer quando estamos confortáveis, quando relaxamos, quando nos sentimos bem sem gastarmos energia. Sem este mecanismo, facilmente o ser humano desapareceria; não se poderia controlar o nosso dispêndio de energia. É por isso que, segundo este autor, relaxamos confortavelmente no sofá - porque esta força conservadora é muito forte. Quando não há demandas exteriores, a entropia entra em acção e se não nos apercebemos daquilo que está a acontecer, toma conta do nosso corpo e da nossa mente. Ao nível deste tipo de impulso, as nossas orientações motivacionais tendem a inclinar-se, em momentos diversos, ora para uma fase de propensão para o menor esforço possível ora para uma fase de exigência com o trabalho criativo. Ainda segundo Csikszentmihalyi, na maioria dos indivíduos observa-se que a entropia e o prazer do conforto prevalecem sobre o desafio da descoberta. Mas apesar de ser mais evidente a prevalência da entropia, todos respondemos a

estes lados, porque ambos fazem parte da nossa herança genética.

Mais recentemente, De Bono (2009) refere que se a criatividade de ideias é uma competência e todos temos capacidade de a aprender, de a praticar e de a aplicar, como acontece com qualquer outra habilidade (como praticar ténis, fazer esqui ou cozinhar), então ela pode ser estimulada. Este autor acredita que algumas pessoas serão sempre melhores em determinadas habilidades do que outras. No entanto, todos podemos adquirir um nível usável dessa habilidade. De Bono defende que a criatividade de ideias pode ser ensinada e “usada” formalmente, como a matemática.

Segundo Boden (2004), a criatividade é a habilidade de conseguir criar ideias ou artefactos novos, surpreendentes e valiosos. Na definição de “ideias” incluem-se conceitos, poemas, composições musicais, teorias científicas, receitas de culinária, anedotas, entre outras. Deste modo, a criatividade faz parte de todos os aspectos da nossa vida. A autora afirma que a criatividade não é um “talento” especial, mas sim um aspecto da inteligência humana que faz parte da mesma, como o pensamento, a percepção, a memória e a auto-critica; por isso não é restrito a uma determinada elite: todos somos criativos até um determinado nível.

Csikszentmihalyi (1996) afirma que talvez exista uma predisposição genética para que determinadas habilidades se destaquem em certos indivíduos. Faz sentido que pessoas que possuem mais sensibilidade à cor e à luz possam mais tarde vir a desenvolver habilidades na pintura, ou aqueles que nascem com “ouvido” para a música venham a dominar com maior facilidade um instrumento musical. Possuir talento numa determinada área de especialização pode despontar ainda mais vontade de aprender competências nessa área e, consequentemente, levar as pessoas a obter resultados inovadores. No entanto, existem outros inúmeros casos de grandes cientistas que nunca revelaram, na sua infância, qualquer tipo de talento para os seus futuros desempenhos. Segundo este autor, não se pode afirmar que a existência de matéria inovadora observada num determinado individuo seja derivada de uma predisposição genética, mas existe de facto um “sensor” especial que leva cada individuo a interessar-se por um determinado domínio desde muito cedo. Este interesse genuíno é seguramente, entre outros, um ingrediente da criatividade. Segundo Csikszentmihalyi, sem uma boa dose de curiosidade, sem a tentativa de descoberta e o interesse em saber como os fenómenos acontecem é difícil reconhecer um problema interessante.

Ter abertura a novas experiências e uma atenção fluida que constantemente processa acontecimentos à nossa volta, são grandes vantagens para reconhecer potencial inovador.

Lawson (1997) refere que se a criatividade fosse uma habilidade especial ou um “dom”, então muito provavelmente uma pessoa criativa sê-lo-ia em diversas actividades e não apenas naquela onde revelou talento criativo. É difícil encontrar pessoas cuja capacidade criativa se distingue em mais que uma ou duas áreas. A criatividade, segundo este autor, não é só resultado de habilidade especial ou talento; ela tem uma relação contextual significativa – o contexto no qual a pessoa percepciona o problema e estabelece o processo de resolução é essencial. Lawson (1997) refere que a experiência adquirida e a familiaridade são factores vitais e determinam o grau de resposta criativa a um determinado problema. Também sobre o contexto envolvente mas numa outra perspectiva, Amabile (2005) refere que este não é apenas uma componente que pode influenciar o processo criativo, mas também uma parte integrante deste. Esta autora deduz, a partir das suas investigações, que as pessoas tendem a ser mais criativas quando são motivadas pelo interesse, pelo prazer, pela satisfação e pelo desafio no seu próprio trabalho e não por pressões externas, sejam elas positivas ou negativas. Considera também que, para existir trabalho criativo, terão necessariamente de existir três elementos: (a) capacidade relevante específica (domínio do conhecimento numa determinada área); (b) capacidade criativa ou processo de pensamento criativo (forma pessoal de pensar os problemas e de os resolver, nos quais se incluem técnicas para produzir ideias novas112); e (c) elemento motivacional ou motivação intrínseca (desafio pessoal, prazer, satisfação pelo próprio trabalho e não por factores externos). A autora revela inclusive que o elemento motivacional tem mais relevância no processo criativo do que a inclinação natural ou talento que um determinado indivíduo possa ter para uma determinada área. O envolvimento e o ambiente social em que o indivíduo está inserido podem provocar alterações na motivação intrínseca desse indivíduo e anular qualquer processo criativo, mesmo que exista talento.

Podemos então concluir que qualquer pessoa pode ser criativa, ou, como designa Csikszentmihalyi, ter uma personalidade criativa. Devemos então ambicionar

12 Como agarrar os problemas pelo “avesso”, apresentar novas perspectivas, ter capacidade para tolerar a ambiguidade, ser capaz de jogar com ideias diferentes.

melhorar a capacidade criativa que todos possuímos. No entanto, se quisermos aprofundar a temática, deveremos necessariamente compreender como funcionam os processos a ela associados.