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Termos/temas que permanecem com alteração

2 UM BALANÇO DA ERA VARGAS E A PROPOSTA DE PESQUISA

3.3 SISTEMATIZAÇÃO TEMÁTICA – UM CONTEXTO EM MUDANÇA

3.3.3 Termos/temas que permanecem com alteração

No geral essa seção aborda os termos/temas que permanecem, mas com certo grau de alteração. Nessa categoria percebem-se dois subgrupos: a) manutenção do argumento central, mas mudança de função e de relevância; b) permanência com ressignificação.

Aqui se observa um conjunto de termos/temas que se mantêm em seu conceito, mas alteram-se em suas finalidades. Essa reorganização expressa uma mudança de prioridades no interior do Estado. São eles:

a) “produzir, produzir e produzir barato”;

b) intervenção estatal na produção e não na sua comercialização;

c) nacionalização dos recursos naturais e crítica à exportação de matérias primas d) transportes;

e) problema siderúrgico;

f) diversificação agrícola (policultura);

g) industrialização de produtos agrícolas (álcool e borracha);

h) expansão das exportações e equilíbrio da balança de pagamentos;

Os temas deste grupo estão divididos em dois eixos: 1) produção e intervenção e 2) nacionalização dos recursos naturais; transportes; problema siderúrgico; diversificação agrícola; industrialização de produtos agrícolas.

A expressão: “produzir, produzir e produzir barato” encontra-se presente desde a Plataforma Liberal até o final do Estado Novo. Tal forma de pensar estava condicionada ao processo de intervenção do Estado na área da produção. De alguma forma, estes dois aspectos compunham a grande base argumentativa do que viria a ser o projeto econômico varguista. A necessidade de gerar uma produção competitiva no âmbito internacional e ao mesmo tempo capaz de abastecer o mercado interno perpassa todo o primeiro governo Vargas. No entanto, se num momento original esta lógica corresponde a uma argumentação voltada primordialmente para a área agrícola, num segundo momento, este mesmo raciocínio seria utilizado em defesa da produção industrial.

A questão do barateamento da produção vinculada ao intervencionismo estatal, como visto, permanece a mesma em todo o discurso governamental, alterando-se, no entanto, sua justificativa e sua finalidade. Se a produção num primeiro momento é quase sinônimo de agricultura, quando, em outro momento, o governo opera a rotação de sua prioridade da produção agrícola para a produção industrial, desloca-se também o seu propósito. Antes essa lógica – produção e intervenção – servia para defender conjunturalmente a substituição de importações, posteriormente passa se vincular a um projeto mais articulado de desenvolvimento industrial.

Produzir mais e mais barato, a partir de uma intervenção estatal, significava agir em determinadas áreas. Por isso, transporte, siderurgia, diversificação agrícola e nacionalização, componentes de nosso segundo eixo, seriam áreas estratégicas para se atingir esse fim. Da mesma forma, quando desloca a prioridade geral do Estado (da produção agrícola para a produção industrial) a função desses setores passa a se integrar a essa nova prioridade. Isto quer dizer que transporte, siderurgia, diversificação agrícola e nacionalização no início da década estavam em consonância com uma política agrária. Ao movimentar o foco da atuação do governo na economia para a industrialização, esses elementos abarcariam essa nova finalidade. Se tomarmos o significado da siderurgia no começo do governo Vargas, observa-se que ele estava mais próximo da produção de instrumentos voltados à agricultura. Por isso a necessidade de nacionalização das riquezas naturais. Depois disto, o desenvolvimento da siderurgia recebeu um novo tratamento: a necessária superação do atraso brasileiro via industrialização do país. Ferro, carvão e petróleo constituem assim a tríade condicional do desenvolvimento nacional.

Por fim, com as medidas destes dois eixos, o governo almejava atingir uma diversificação produtiva capaz de abastecer o mercado interno, expandir a exportação e equilibrar a balança de pagamentos.

3.3.3.2 Permanência com ressignificação do argumento e da função

A relação entre a mudança de prioridade e os termos utilizados não é perceptível apenas na rotação de suas funções, mas também na alteração do sentido de alguns termos presentes ao longo de todo o período. Abaixo um grupo de temas que já existia e que, no entanto, alterarou o seu conceito, e consequentemente, sua finalidade.

a) problemas econômicos; b) democracia (plasticidade); c) agrarismo e industrialismo.

Havia sempre uma preocupação de diagnosticar o que estava ocorrendo no contexto e traçar estratégias de ação, de acordo com o que ia se definindo como

problema nacional. Antes, este estava relacionado com a estrutura administrativa herdada da Primeira República, cuja resolução se daria por uma política diferente daquela do período anterior. Daí a exigência de uma estrutura política, administrativa, econômica e financeira que contrastasse com a da Primeira República. Num segundo momento, a visualização do que seria o problema nacional vai além da Primeira República. Este estaria localizado agora no passado colonial do país, que forneceu como herança a posição de fornecedor de matérias primas e de produtos agrários. Nesse sentido, a reorganização econômica e política do Brasil não deveria apenas reparar as consequências da Primeira República, mas alterar o modelo econômico brasileiro. Esta mudança de eixo na qual alguns termos foram se ressignificando à medida que o problema e a prioridade do governo se deslocavam traz a tensão entre uma estrutura agrarista e uma estrutura industrialista, termos que expressam a ideia de vocação agrária e vocação industrial. Os demais âmbitos sociais deveriam estar em consonância com esse problema nacional, entendido e formulado como problema econômico. Por sua vez, a democracia e a estrutura política deveriam ser flexíveis o suficiente para se adaptarem a essa movimentação. Por esta razão, o conceito de democracia em 1930 é completamente diferente daquele defendido pelo governo nos anos subsequentes, em especial no Estado Novo. A defesa da democracia política em sua forma liberal encontra- se em discursos dos anos de 1930 e de 1945 apenas, portanto no momento de início e término do governo, sendo que no longo período compreendido entre aquelas duas datas, prevaleceu uma concepção de democracia orgânica baseada nas representações classistas do período constitucional e dos conselhos técnicos do Estado Novo.

A movimentação da prioridade também ocasionou o surgimento de novos termos que aparecem para corresponder a esses novos anseios. Nesse sentido, os termos relacionados à herança da Primeira República vão gradualmente desaparecendo e sendo substituídos por outros que demonstram a rotação da percepção do problema nacional e, consequentemente, a transição do eixo administrativo para a ordem econômica.