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TESES ETIOLÓGICAS E MODELOS TERAPÊUTICOS DESENVOLVIDOS 1 Questões contextuais

DESENVOLVIDOS AO LONGO DO SÉCULO

2. TESES ETIOLÓGICAS E MODELOS TERAPÊUTICOS DESENVOLVIDOS 1 Questões contextuais

O homossexual subvertia igualmente os vaiores de honra masculinos, confundia as identidades de género, perturbava os códigos que geriam as relações entre os dois sexos, recusava a instituição familiar - pilar do Estado Novo

Susana Bastos, O Estado Novo e os seus Vadios

Como se acabou de referir no capítulo anterior, o papel dos médicos no estudo da sexualidade, a partir do final do século XIX e durante quase todo o século XX, passou a estar associado a uma preocupação com o controlo de questões sociais consideradas perturbadoras da conformidade social, de que são exemplo a prostituição, o divórcio, as doenças sexualmente transmissíveis, a contracepção e os chamados desvios sexuais. O pressuposto de que um maior conhecimento facilitaria o acesso a soluções para estes problemas levou a que os estudos sobre sexualidade se desenvolvessem fundamentalmente numa perspectiva de prevenção. Os discursos científicos diversificam-se, fazendo suporte a uma intervenção política e sanitária no campo da sexualidade.

O crescimento e o anonimato das grandes cidades, o acesso ao mercado de trabalho tanto para os homens como para as mulheres, a crescente consciência por parte das mulheres do papel secundário que lhes era atribuído e da sua subjugação ao homem, foram, entre outros factores, responsáveis pela ameaça feita, no final do século XIX, ao modelo que sustinha a organização familiar baseada em aspectos económicos e de dependência da mulher. Estas mudanças criaram novas oportunidades para se poder viver fora da ordem social conjugal ou familiar, o que permitiu a emergência de novas formas de expressão sexual. Este novo contexto social, de separação entre o espaço familiar e o espaço laboral, possibilitou que os homens e as mulheres passassem a encontrar garantias mínimas de sobrevivência fora do quadro da família heterossexual e, ao mesmo tempo, que a casa passasse a ser investida de uma carga afectiva82. O

82 Recorde-se a este respeito que Edward Shorter (1977), no seu livro O nascimento da família moderna dedica um capítulo aos "homens e mulheres na sociedade tradicional", onde pretende

exactamente mostrar que o casamento popular dos séculos anteriores era, em geral, desprovido de afecto tendo como elementos de coesão a propriedade e a linhagem, e que o isolamento afectivo era obtido'pela rigorosa demarcação existente entre as tarefas e os papéis atribuídos a cada sexo. Shorter acrescenta que a questão da felicidade não era sequer colocada. Mulheres e homens entregavam-se à

modelo dicotómico dos papéis sexuais entrou em crise e ameaçou de tal forma a ordem social familiar que se tornou imperativa a emergência de uma nova organização para um novo equilíbrio.

A tentativa de autonomização da mulher foi percebida como uma ameaça ao desejo heterossexual, posição claramente ilustrada na leitura feita por Adelino Silva, em 1885, na sua dissertação inaugural em Medicina. Este médico atribuía o sentimento de desejo da mulher pelo homem à necessidade de dependência daquela por este, e questionava a educação moderna, afirmando que "a mulher educada à moderna é um ser complexo de pouca innocencia, quasi sem pudor, ingenuidade. [D]e frescura e timidez só conhece os nomes (...). [A] mulher prejudica-se e afasta-se do seu sexo", advertia Adelino Silva, prognosticando: "subtraia-se a mulher ao jugo do homem, emancipe-se e passa a supprir as suas necessidades por si mesma, o amor pelo sexo diferente desapparecer- lhe-ha" (p. 285)83.

Como consequência das alterações sociais e das novas exigências das mulheres, alteraram-se os códigos que geriam a sexualidade feminina, o papel do homem e as relações entre os dois sexos, de forma a preservar o modelo social cujo núcleo é o casamento heterossexual. Como reacção ao declínio do casamento por necessidade económica da mulher, e simultaneamente devido ao medo do contágio da homossexualidade, assistiu-se a um ataque às instituições de um só sexo e aos relacionamentos entre o mesmo sexo84; o conceito de masculinidade passou a integrar a rejeição da homossexualidade e a promoção da heterossocialização; a bibliografia mais diversa preocupou-se em ressexualizar a mulher, ao mesmo tempo que defendia a maternidade e o papel de equilíbrio afectivo que a família nuclear permitia; finalmente, alguns manuais de casamento chegavam mesmo, com o objectivo de preservar a coesão familiar, a enfatizar a necessidade de o homem se envolver na dinâmica da casa.

tarefa de corresponder aos papéis que lhe eram atribuídos pela comunidade e não havia sequer a tentação de partilhar tarefas sob pena de ficarem sujeitos à ridicularização como punição.

83 Note-se, ainda a este propósito, a referência de Juliet Gardiner (1988) a uma teoria popular, existente no

final do século XIX, a qual, numa perspectiva de conservação de energia, defendia que, caso a mulher dispersasse a sua energia em objectivos masculinos, como por exemplo actividades competitivas intelectuais, a sua fisiologia poderia tornar-se bloqueada de uma forma definitiva, começando pela falta de menstruação e culminando com a atrofia da capacidade reprodutiva e a evolução para uma raça semelhante a "formigas assexuadas".

84 Egas Moniz (1906) é, entre os médicos portugueses, exemplo de um dos grandes defensores das

instituições mistas:

acho condenável o afastamento dos sexos nas escolas, pela forma severa que geralmente se faz e de que resulta serem as primeiras sensações sexuaes experimentadas com indivíduos do mesmo sexo (...). Esta separação de sexos (...) ainda hoje é a razão porque esta psychopathia tão intensamente se tem desenvolvido entre muçulmanos (p.184).

Nos anos 20, o encontro heterossexual tornou-se o padrão dominante da cultura jovem, substituindo as actividades de grupo do mesmo sexo, até então prevalecentes (Chauncey, 1989). Tornava-se cada vez mais difícil para os homens considerarem-se heterossexuais se tivessem qualquer contacto sexual com outros homens, mesmo se limitassem o seu comportamento ao "papel masculino". O mundo passou a dividir-se dicotomicamente entre homossexuais e heterossexuais, como se de dois mundos completamente distintos se tratasse85.

Pela mesma época, graças em grande medida à actividade de grupos sufragistas, foram fomentados os casamentos com companheirismo, valorizando-se a amizade sexual, a aceitação do divórcio e o controlo dos nascimentos, de forma a facilitar alguma igualdade às mulheres dentro do casamento. O antigo modelo vitoriano de recato e desinteresse sexual da mulher seria apontado como o responsável pelas dificuldades que observavam no casamento, particularmente pelo afastamento entre homens e mulheres. O efeito destas últimas alterações referidas, e particularmente a tentativa de confinar a mulher ao espaço doméstico, prolongar-se-á até aos anos 50. A ideia dominante de que o casamento, a casa e a dependência eram as condições apropriadas às mulheres sobreviveu aos desafios da guerra, sendo diversos os discursos que, ainda naquela década, referiam os malefícios psicológicos que uma mulher casada e com filhos, que trabalhasse fora de casa, poderia provocar nos seus filhos (Nogueira, 1996).

Por outro lado, a pressão sobre a família, fruto da necessidade de limitar a sua dimensão devido às novas exigências sociais, criou várias implicações a nível da sexualidade e da reprodução: permitiu separar a sexualidade das questões da reprodução e do parentesco, dando origem ao que Giddens (1995) chama "sexualidade plástica", facilitou a autonomia sexual da mulher e abriu caminho para o florescimento da homossexualidade feminina e masculina. Os anos do pós-guerra e a reconversão a uma economia de tempo de paz estimularam os esforços para o restabelecimento da vida familiar tradicional: o regresso dos veteranos implicava a necessidade de postos de trabalho que tinham sido ocupados pelas mulheres que, por sua vez, eram agora estimuladas a casar e a investir na maternidade.

85 Todavia Chauncey (1998) considera que, relativamente às classes mais desfavorecidas, é só a partir

dos anos 30, e particularmente depois da Segunda Guerra Mundial, que a heterossexualidade exclusiva se torna a condição da normalidade masculina.

A Guerra Fria levaria, nos EUA, à enfatização da conformidade cultural e à intensificação de esforços de controlo de comportamentos considerados desviantes. A não conformidade - política, social ou sexual - era vista como uma ameaça à segurança nacional e, neste contexto, a homossexualidade tomava-se uma ameaça à ordem pública. Chauncey (1998) refere uma visibilidade de uma organização da homossexualidade em Nova Iorque, antes da guerra, que passou a ser reprimida nos anos 30, 40 a 50, através de medidas rígidas assumidas pelo Estado (e que se estenderam até aos anos 60), de que são exemplo o aumento de prisões por motivos ligados à homossexualidade; a regulamentação de proibições relativas aos bares de servirem homossexuais, regulamentação esta rigorosamente aplicada (de tal forma que vários bares foram fechados por a terem violado); regulamentações que obrigavam à censura da abordagem da temática ligada à homossexualidade em peças de teatro, em filmes, etc. A aplicação destas regulamentações era acompanhada, inspirada e justificada por uma série de campanhas promovidas pela imprensa e pela polícia, que descreviam os homossexuais como desviantes sexuais com tendências assassinas, adicionando à imagem pública tradicional de homem efeminado a imagem de um psicopata perigoso, capaz de cometer os crimes mais horríveis contra as crianças. Estas medidas de intensificação do controlo policial de lugares frequentados por homossexuais, a par de uma transformação dos esquemas de sociabilidade homossexual, no sentido de uma homossociabilidade (à semelhança do que se passara com a heterossexualidade), conduzem, já no pós-guerra, ao surgimento de um grande número de bares de clientela exclusivamente homossexual86.

Todavia, a relativa permissão de abertura destes novos locais leva Chauncey (1998) a interpretar as medidas de controlo implementadas, e acima referidas, como uma

86 A este propósito, Chauncey (1989) refere que Will Finch, em 1951, nas suas cartas íntimas se lamentava

por não existir em Nova Iorque nenhum bar onde os homens homossexuais pudessem ter encontros com homens heterossexuais («queer-man»), e explica que, com a dicotomização da orientação sexual, se substituíram as relações entre homens homossexuais e homens heterossexuais («queer-man») por relacionamentos exclusivos entre homens homossexuais («queer met queer»), sendo estas últimas relações estruturadas pelas diferenças sexuais tradicionais, passando a distinguir-se os homens homossexuais , particularmente na cultura homossexual das classes mais desfavorecidas, entre 'butches' e 'femmes', nomenclatura habitualmente aplicada às mulheres lésbicas. Portugal não é alheio à transformação destes esquemas de relacionamento entre os homossexuais, embora transformações semelhantes tenham tido lugar em períodos de tempo distintos. Um dos informantes de Gameiro (1998) considera que "a «gay liberation» trouxe essa coisa terrível que é a «bicha com bicha» (...), confirmando que o modelo social de homossexualidade predominante no seu tempo [anos 50] desapareceu a partir do momento em que deixou de assentar na divisão bichas/homens" (p.86). Se, em Portugal, o 25 de Abril parece ser um marco para esta transformação, Gameiro refere que já em 1960 a 1970 havia uma co- existência de modelos, embora alguns deles apenas circunscritos a determinadas classes sociais, de que é exemplo o modelo referido como "bicha com bicha", observado inicialmente apenas em níveis sociais elevados.

tentativa de controlar a visibilidade da homossexualidade (e não de a erradicar), temendo as autoridades uma ameaça à ordem pública e aos dispositivos sexuais normais.

Outra alteração observada no interior de grupos homossexuais que então se estabeleceu foi o culto dos indicadores exteriores da masculinização87, o que aumentou a necessidade de controlar os limites da, considerada, normalidade sexual por assim ter criado uma maior dificuldade em distinguir homossexuais de heterossexuais e promovido uma representação dos homossexuais como mais ameaçadores. Como resultado desta ambiguidade de fronteiras entre a 'sexualidade normal' e a 'anormal' - ambiguidade que reflectia uma crise da cultura dominante - o controlo tomava-se, por um lado, mais difícil e, por outro, mais urgente, justificando a necessidade de vigilância policial e médica da vida homossexual.

A legislação de vários países integrava leis demasiado gerais sobre psicopatia sexual: não especificavam actos criminosos nem diferenciavam os comportamentos violentos dos não violentos, nem comportamentos consensuais dos impostos por alguma forma de poder. Nesta falta de especificidade, termos como psicopata, criminoso sexual, perverso e homossexual surgiam sobrepostos. Cabia, habitualmente, ao psiquiatra o papel de "descobrir" o tipo de personalidade ou identidade do criminoso88.

Os homens condenados por ofensas sexuais cumpriam as suas sentenças nos departamentos de doenças mentais das prisões ou nos departamentos prisionais de instituições para doentes mentais89. Uma vez hospitalizado, o psicopata recebia tratamento de acordo com as tendências terapêuticas da época: metrazol, choque

insulínico ou electrochoque, injecções hormonais, esterilização, terapia de grupo e, nalguns casos, lobotomia frontal. A partir de meados dos anos 30, com o desenvolvimento da endocrinologia e da genética, a hipótese do congenitalismo como explicação da homossexualidade foi novamente retomada, numa perspectiva de

87 Até então, a exuberância e alguma distinção na maneira de vestir e de pentear permitia distinguir os

homens homossexuais dos heterossexuais.

88 De referir que, em 1952, a edição do Manual de Diagnóstico e Estatística das Doenças Mentais (DSM)

apresentava os desvios sexuais indiferenciadamente. Apenas em 1968, na 28° edição surgem subcategorias de que são exemplo a homossexualidade, o fetichismo, a pedofilia ou o travestismo (Suppe,

1987).

89 Em Portugal, durante o Estado Novo, integravam-se nas mesmas instituições - designadas por Mitras -

todos aqueles cujos comportamentos ou situações sociais fossem considerados um "perigo moral" para a sociedade: "menores abandonados, mendigos loucos, todos os que de algum modo participavam no mundo da prostituição" (Gameiro, 1998, p.80), sendo possível encontrar processos de homossexuais que haviam sido apanhados pela então chamada polícia de costumes.

correcção: a homossexualidade seria uma condição fisiológica inata, causada por cromossomas defeituosos ou por valores hormonais alterados, que se pretendia corrigir. A comunidade psiquiátrica via cada vez mais reforçada a sua autoridade. Já durante a guerra o seu estatuto havia sido reconhecido pelo papel que fora atribuído aos médicos psiquiatras no recrutamento de soldados e no diagnóstico de delinquentes militares. Agora, nos anos posteriores à guerra, vários estados, nos EUA, reconheciam a necessidade de investigação e forneciam fundos para o desenvolvimento de estudos psiquiátricos sobre abusadores sexuais. As medidas de prevenção estabelecidas contemplavam: a criação de instituições psiquiátricas especializadas para os homens condenados por crimes sexuais, o despiste psiquiátrico de potenciais psicopatas nas escolas e o desenvolvimento da educação sexual na promoção de uma vida familiar mais saudável.

Paralelamente aos aspectos sociais e económicos referidos desenvolveram-se, no seio das ciências médicas e psicológicas, teorias explicativas da homossexualidade que acompanharam as descobertas que se realizaram em diferentes áreas - psiquiatria, psicanálise, endocrinologia, genética:

Medicai and psychiatrie thinking about homossexuality had proliferated wildly, dividing and subdividing into myriad conflicting schools and viewpoints as doctors struggled to map out and colonize the newly defined territories of human sexual behavior. (Carlston, 1997, p. 177)

Foi no contexto social apresentado, de pressão para a conformidade, que, em 1948, nos Estados Unidos da América, foram publicados os estudos de Alfred Kinsey sobre o comportamento sexual do homem e sobre as fronteiras da sexualidade, o que provocou um aceso debate público. Segundo Freedman (1989), estes estudos conduziram a um crescente interesse pela temática da psicopatia, por revelarem a vasta prática de actos sexuais não procriativos, realizados dentro e fora do casamento. A crença mais divulgada - tal como no final do século XIX - era que os homossexuais procuravam jovens e que a sedução na adolescência e na infância seria o mais comum factor ambiental, explicativo do desenvolvimento desta orientação. A homossexualidade era então representada como estando associada a comportamentos violentos e especificamente relacionada com a coerção de menores para actividades sexuais ilícitas.

A literatura emergente na época sobre psicopatia sexual ajudou, por um lado, a quebrar velhos tabus, ao despoletar a discussão sabr^ o que era considerado desvio sexual e

encorajou a reavaliação do comportamento heterossexual através da divulgação de informação sobre práticas sexuais até então silenciadas nos discursos oficiais. Por outro lado, o discurso da psicopatia, para além de ter ajudado a redefinir as fronteiras da sexualidade, dita normal, pode ter contribuído para o liberalismo sexual dos anos 60; Freedman aponta pelo menos três caminhos abertos por este processo de discussão.

• O ajustamento a um sistema sexual no qual os actos não procriativos deixam de ser considerados anormais;

• O estabelecimento de uma fronteira clara entre homossexuais e heterossexuais, sendo os primeiros considerados violentos abusadores de crianças,

• A definição da violação, agora encarada não apenas como uma aberração psicológica do homem, mas como um acto no qual tanto a mulher como a criança contribuíam para a sua própria vitimização.

Os estudos de Kinsey foram, ainda, utilizados como argumento pelos críticos liberais que durante os anos 50 a 60 propunham a revisão das leis então existentes sobre psicopatia, por permitirem defender que as variações sexuais eram muito comuns entre os casais "normais". Quer psiquiatras, quer advogados defendiam que o conceito era demasiado vago e controverso para fazer parte da lei. Bowman e Engle - um exemplo destes críticos - defendiam a existência de perversões sérias que requeriam tratamento psiquiátrico, mas declaravam que a sexualidade saudável podia incluir actos heterossexuais não procriativos (Freedman, 1989). Afirmavam que era necessário diferenciar entre os actos perigosos do "psicopata" e as aceitáveis práticas de masturbação antes do casamento, bem como a prática de actos considerados não naturais, como o sexo oral e o sexo anal, se realizados em privado e entre adultos que o consentiam.

No Reino Unido, em 1957, uma comissão governamental publicou um relatório - o Wolfenden Report - que recomendava a despenalização do comportamento homossexual90. A razão apresentada por esta comissão para a despenalização era o

90 De notar que, dois anos antes, a British Medical Association havia apresentado um relatório a esta

comissão, explicando os seus pontos de vista sobre homossexualidade e prostituição. Nesse relatório, o seguinte trecho é ilustrativo da leitura que então a classe médica britânica detinha da homossexualidade:

The attempts to suppress homosexual activity by law can only be one factor in diminishing this problem. The public opinion against homosexual practice is a greater safeguard and this can be achieved by promoting in the minds, motives and wills of the people the desire for clean and unselfish living (...) If this behaviour is multiplied on a national scale, the problem to society is apparent for widespread irresponsibility and selfishness can only demoralise and weaken the nature. What is needed is responsible citizenship where concern for the nation's welfare and the needs of others takes priority over self-interest and self-indulgence.

("Memorandum on homosexuality drawn up by a special committee of the British Medical Association", citado por Bancroft, 1989, pp. 312).

facto de a homossexualidade não satisfazer três condições fundamentais aplicadas ao conceito de doença: ter uma causa definida, ter uma patologia demonstrável e originar sintomas anormais. Embora várias causas tivessem sido sugeridas, nenhuma estava estabelecida. As sugestões sobre patologia mental eram entendidas pelos membros desta comissão como meras construções teóricas, não existindo factos, e quando surgiam sintomas eram mais facilmente entendidos como o resultado de estigmatização do que intrínsecos à condição. Em 1967, o Parlamento Britânico legalizou o comportamento homossexual entre pessoas com mais de 21 anos.

Nos anos 60, como resultado de um processo de revolução em saúde mental, questionado que começa a ser o papel da psiquiatria no controle dos comportamentos sociais91, os psiquiatras e os políticos ponderaram sobre o significado da sexualidade, uns questionando a legislação sobre psicopatia sexual e outros questionando o tratamento da homossexualidade. Durante o final da década de 60 até à primeira parte da década de 80, observa-se um período de maior liberalismo, que permitiu o desenvolvimento de novos significados da homossexualidade (tema que será objecto dos próximos pontos deste capítulo) e uma quase total ausência de estudos biológicos. Na segunda metade da década de 80, verifica-se de novo uma procura da inscrição da orientação sexual no corpo92. Este voltar ao corpo é interpretado por alguns autores (Allen, 1997; Teny, 1997) como o resultado de factores culturais políticos e económicos, ocorridos entre os anos 70 e 90, de que são exemplo os significados atribuídos à SIDA, as indústrias médica e de seguros e o crescente conservadorismo das políticas governamentais.

Em meados dos anos 80, com o surgimento da SIDA, a sexualidade é vista novamente como uma ameaça, emergindo um posicionamento mais conservador, que por sua vez reacende o debate de ideias. Os comportamentos sexuais e, particularmente, as práticas homossexuais vêm para a arena pública devido ao estigma inicial com que a doença foi divulgada, surgindo associada ao então considerado "grupo de risco" - o dos homossexuais. Terry (1997) atribui ainda à SIDA a reacção face aos homossexuais,

91 A este propósito, Bayer (1987) refere que os psiquiatras tentaram articular uma teoria de saúde mental