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5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.4 Caracterização dos alunos em função dos testes neuropsicológicos

5.4.1 Teste das Figuras Complexas de Rey – Figura A

Nesse teste a atividade perceptiva visual e a memória visual são avaliadas em duas fases, de cópia e de reprodução de memória. Para avaliar os resultados da cópia da figura e da reprodução de memória, são consideradas três variáveis: 1. Tipo de construção da figura; 2. Precisão e riqueza da cópia e da reprodução de memória; e 3. Rapidez do trabalho. Considera- se, para efeito de comparação, o universo amostral utilizado para normatização do teste no Brasil que compreendeu um total de 280 indivíduos. Dos resultados obtidos pelo estudo que realizou a normatização do teste no Brasil, serão utilizados os resultados obtidos pelo grupo de 40 indivíduos com faixa etária entre 15 e 52 anos, dada a similaridade com o grupo amostral da pesquisa que compreendeu um universo de 60 indivíduos com faixa etária entre 16 e 52 anos. Portanto, serão adotados os resultados de validação obtidos pela amostragem brasileira para realizar a comparação com os grupos da pesquisa.

Deve-se ter prudência na interpretação dos resultados desse teste uma vez que as atividades avaliadas são fortemente influenciadas pela capacidade de planejamento, seleção da ação, seleção de objetivos adequados e controle executivo do comportamento, que podem interferir nos resultados (MALLOY-DINIZ, 2010). A atividade perceptiva visual avaliada por esse instrumento é de natureza analítica e organizadora, estando a memória visual diretamente ligada a essa percepção. Considerando que essas atividades dependem da inteligibilidade dos dados percebidos, essa, pode tornar a elaboração perceptiva insuficiente por falta de conhecimentos ou método, possibilitando a identificação de sujeitos limitados por insuficiência de instrução e exercício (REY, 1999).

O Teste da Figura Complexa de Rey – Figura A (REY, 1999), foi aplicado de forma individual em toda a amostra. Em um primeiro momento, foi realizada a avaliação da

percepção através da cópia da figura. O procedimento consistiu na mostra de um cartão com a figura e a seguinte orientação: “observe esse desenho com atenção, para copiá-lo em seguida nessa folha; não é necessário fazer uma cópia exata; entretanto, preste atenção às proporções e, sobretudo, aos detalhes, para não esquecer nada. Não precisa ter pressa. Comece com esse lápis”. Num segundo momento realizou-se a avaliação da memória. Nesse momento, solicitou-se ao aluno, após 3 minutos cronometrados a partir do final da execução da atividade de cópia da figura, que desenhasse a figura da atividade anterior baseado apenas na lembrança, na memória da figura. Deve-se ressaltar que é utilizado um cronômetro nas duas fases do teste, acionado no momento em que o sujeito começa o trabalho e desligado quando ele considera ter terminado. Realiza-se a aferição do tempo transcorrido nas duas fases do teste, além do controle do tempo de intervalo entre as duas fases de aplicação do teste.A avaliação das duas fases, de cópia e de reprodução de memória, segue os critérios estabelecidos pelas variáveis e a mesma pontuação nas duas fases.

Distinguida por Osterrieth (REY, 1999) a variável relacionada ao tipo de construção da figura está baseada na forma como o indivíduo realiza o desenho. Essa variável considera a forma de realização do desenho classificando-o do mais ao menos racional,fundamentando-se simultaneamente nos hábitos intelectuais, na rapidez da construção e na precisão do resultado. A classificação apresenta os seguintes tipos de construção da figura: tipo I – construção a partir da armação; tipo II – detalhes incluídos na armação; tipo III – contorno geral; tipo IV – justaposição de detalhes; tipo V – detalhes sobre fundo confuso; tipo VI – redução a um esquema familiar;tipo VII – garatuja.

A variável relacionada à precisão e riqueza da cópia e da reprodução de memória considera a pontuação obtida. Essa pontuação, definida por Osterrieth (REY, 1999) está baseada nas unidades copiadas/reproduzidas. A figura é dividida em 18 partes que recebem pontuação conforme os critérios de correção, deformação ou incompletude, considerando se as unidades são reconhecíveis, irreconhecíveis ou ausentes, e ainda se estão bem ou mal situadas. Essas unidades recebem uma pontuação máxima de dois pontos por unidade, que em função das 18 partes a serem observadas na cópia e na reprodução de memória da figura podem atingir o valor máximo de 36 pontos.

A última variável está relacionada à duração do trabalho. Essa variável tem como objetivo avaliar se um trabalho completo e bom, ou ruim e incompleto foi executado lenta ou rapidamente. Distinguindo no processo de cópia da figura: a cópia claramente inferior, executada em tempo geralmente longo, em tempo anormalmente curto, em tempo longo, às vezes muito longo ou em tempo curto; e a cópia claramente superior, observada através de

uma cópia precisa e rica ou de uma cópia pouco precisa. No processo de construção da figura reproduzida de memória distingue o processo de cópia normal ou superior, mas com reprodução de memória claramente insuficiente ou, o processo de cópia claramente inferior, associado a uma reprodução muito pobre (REY, 1999).

A variável relacionada ao tipo de construção da cópia da figura apresenta um predomínio do tipo I no grupo de surdos (45%), que apresentou ainda os tipos: II (20%), III (5%), IV (27,5%) e V (2,5%).E um predomínio do tipo III no grupo de ouvintes (35%), observando-se também os tipos: I (25%), II (10%) e o tipo IV (30%). O resultado apresentado pelo grupo dos surdos é semelhante ao resultado obtido pelo estudo de Osterrieth (REY, 1999), que destaca o tipo I – „desenho que começa pelo retângulo central, que serve de armação para toda a reprodução‟, como reação característica do adulto, apresentando uma frequência máxima de 56%, sendo dominante somente nessa idade. O resultado apresentado pelo grupo dos ouvintes, com predominância do tipo III, que é a reprodução do “contorno geral no qual se colocam depois todos os detalhes” foi considerada pelo estudo de Osterrieth (REY, 1999) como uma reação que não é dominante em nenhuma idade, mas se mantém ao longo de toda a evolução, na qualidade de tipo acessório. Destaca-se ainda o aparecimento do tipo IV de construção da cópia da figura, observada como segundo tipo mais frequente na produção dos dois grupos. Nesse tipo, classificado como justaposição de detalhes, observa-se um maior trabalho na execução da tarefa, uma vez que a figura é desenhada como se o indivíduo estivesse montando um quebra-cabeça, parte por parte, sem um elemento diretor da reprodução. Entretanto, o conjunto termina de forma coerente, mais ou menos bem, sendo reconhecível, podendo estar perfeitamente realizado. A utilização desse tipo de construção, segundo estudo de Osterrieth (REY, 1999) é mais frequente na infância diminuindo consideravelmente até a idade adulta, quando atinge seu mínimo. Na pesquisa, entretanto, esse tipo de construção apareceu com frequência considerada alta nos dois grupos, uma vez que esse tipo tende a diminuir de maneira bastante regular até a idade adulta. Segundo os resultados obtidos pelo estudo de Osterrieth (REY, 1999) e considerando que os grupos avaliados nessa pesquisa encontram-se na faixa etária entre 16 e 52 anos, esse tipo de construção deveria ter aparecido com frequência menor, uma vez que nessa faixa etária esse tipo atinge a frequência mínima. Entretanto, considera-se esse fato como uma insuficiência ocasional de apreensão perceptiva (REY, 1999), uma vez que esta pode ser influenciada pelas condições de aplicação dos testes, dificuldade de atenção, capacidade de planejamento, seleção da ação, seleção de objetivos adequados e controle executivo do comportamento, que podem interferir sobremaneira nos resultados (MALLOY-DINIZ, 2010), além das condições

de inteligibilidade dos dados percebidos, que pode tornar a elaboração perceptiva insuficiente por falta de conhecimentos ou método, identificando sujeitos limitados por insuficiência de instrução e exercício (REY, 1999).

Considerando o tipo de construção da figura reproduzida de memória, observou-se um predomínio do tipo I no grupo dos surdos (32,5%), que apresentou ainda os tipos II (17,5%), III (2,5%), IV (12,5%) e V (30%). E um predomínio do tipo V no grupo dos ouvintes (45%), que apresentou ainda os tipos I (30%), III (20%) e VI (5%). O resultado obtido pelo grupo dos surdos está semelhante aos resultados obtidos pelo estudo de Osterrieth (REY, 1999) que ao comparar os “tipos” copiados e os reproduzidos, constatou a manutenção do mesmo processo de elaboração, uma vez que no adulto se encontra os tipos de cópia mais evoluídos; tendendo à conservação por ocasião da reprodução de memória. No grupo dos ouvintes, entretanto, foram observadas diferenças de desempenho na realização da atividade de construção da figura nas duas fases, de cópia e de reprodução de memória. O tipo de construção da cópia da figura apresentada pelo grupo de ouvintes evidenciou uma reação considerada como tipo acessório, evidenciada pelo tipo III, enquanto o tipo de construção da figura reproduzida de memória apresentou o tipo V como predominante. Esse tipo, caracterizado por detalhes sobre fundo confuso, evidencia um grafismo pouco ou não estruturado, o que reflete uma reação considerada imatura, considerando a idade do grupo da pesquisa, uma vez que essa reação, segundo o estudo de Osterrieth (REY, 1999) é mais frequente na infância e tem tendência ao desaparecimento. Deve-se ressaltar que houve de forma geral, uma desorganização na elaboração da construção da figura reproduzida de memória nos dois grupos.

Quanto à variável relacionada à precisão e riqueza da cópia e da reprodução de memória a ênfase é dada à pontuação das unidades da figura, que tem valor máximo de 36 pontos. O resultado observado quanto à precisão e riqueza da cópia da figura no grupo dos surdos evidenciou um valor de 32,6 ± 4,3 na avaliação da atividade perceptiva visual. Esse resultado está semelhante aos obtidos pelo estudo da normatização do teste em amostra brasileira, cujo valor obtido foi de 33,3 ± 2,8. Com isso pode-se avaliar que não houve discrepância entre os resultados desta pesquisa e os da normatização do teste no Brasil, estando os valores obtidos pelos alunos surdos inferiores em 2,1%, o que pode ser considerado desprezível.

Na avaliação do desempenho da reprodução da figura de memória, considerando a variável riqueza e precisão da figura, o resultado obtido pelo grupo dos surdos foi de 16,9 ± 6,7, enquanto o resultado obtido pela normatização do teste foi de 18,8 ±7,2. Comparando-se apenas os valores absolutos entre o valor obtido pelos alunos surdos e os indivíduos da

validação, observa-se uma nítida diminuição do valor esperado da ordem de 10%. Outro fato a ser destacado é a discrepância obtida entre os alunos com um desvio padrão de 6,7, correspondendo uma variação dos valores da ordem de 40% com relação ao valor médio, o que está de acordo com o desvio elevado obtido no estudo de validação.

Ressalta-se ainda que a avaliação da percepção e da memória nesse teste permite realizar uma comparação de desempenho caracterizada de acordo com os resultados da normatização por uma redução nos valores obtidos da ordem de 43%, considerando o desempenho mais elevado na percepção e o mais reduzido na memória. Quando se compara esse tipo de redução de sinal aos obtidos com os alunos surdos, observa-se uma redução da ordem de 48%, o que também colabora com a similaridade dos resultados.

Para o grupo dos ouvintes, obteve-se um valor de 33,6 ±2,3, na cópia da figura (percepção), semelhante ao valor obtido pelo estudo de validação do teste no Brasil, que foi de 33,3 ±2,8. Isto indica que esses alunos possuem percepção semelhante aos indivíduos do padrão. No caso da avaliação da reprodução da figura de memória, o resultado obtido pelo grupo dos ouvintes foi de 14,9 ±7,1 enquanto que os do padrão foram de 18,8 ±7,2. Observa- se neste caso uma discrepância entre os resultados obtidos e os do padrão tendo em vista que o valor obtido nesta pesquisa foi inferior da ordem de 21%. Outro aspecto a ser considerado foi o valor inferior obtido quando se compara os resultados da avaliação da atividade perceptiva e da memória, cujo padrão apresentou uma redução de 43% e neste grupo da pesquisa o valor foi de 55%. Dessa forma, foi possível verificar que os alunos ouvintes apresentaram um desempenho ligeiramente inferior quanto à memória. Ressalta-se ainda, que a variabilidade (desvio padrão) dos resultados obtidos neste teste foi semelhante aos do controle.

Quanto ao tempo utilizado pelos alunos para a construção da cópia da figura, foi possível observar uma média (dada em minutos) em torno de 4,1 para os alunos surdos e 4,2 para os alunos ouvintes. Esses resultados estão próximos dos resultados obtidos no estudo da validação do teste que apresenta uma média de 3,6.

Para a construção da figura reproduzida de memória, o tempo utilizado (dado em minutos) foi de 3,1 para os alunos surdos e 3,3 para os alunos ouvintes. Esse resultado está muito próximo tanto entre os grupos quanto em comparação com os resultados da validação do teste.

Constatou-se que tanto o grupo dos alunos surdos quanto o grupo dos alunos ouvintes apresentou um processo de construção de cópia da figura considerado como médio superior. Entretanto, a construção da figura reproduzida de memória, caracterizou-se por um processo

inferior, verificado através da observação da diminuição de desempenho e desorganização dos tipos de construção da figura e do decréscimo dos escores obtidos considerando a variável relacionada à precisão e riqueza da figura. Esse resultado está compatível com o resultado do estudo de validação do teste no Brasil que constatou um processo de cópia médio superior associado a uma reprodução de memória claramente inferior (REY, 1999).