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3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS PARA O ESTUDO DA INTERTEXTUALIDADE E

3.2 A Intertextualidade

3.2.2 Textualidade: a interação autor, texto, leitor

Não vamos pôr em discussão exaustiva o conceito de textualidade; vamos mostrar o suficiente para que fique claro que o cerne da questão implica esse termo, haja vista sua competência, que é permitir o acesso aos sentidos que um texto pode oferecer.

Para nossos fins, expomos uma síntese da evolução do conceito de textualidade para delinear o eixo central da pesquisa – a construção de sentidos pela retomada de textos.

Uma das fontes teóricas mais comuns na entrada do conceito de textualidade é Beaugrande e Dressler (2016). Para eles, “Do ponto de vista da linguística do texto, é um lugar comum afirmar que o que faz que um texto seja um texto não é sua gramaticalidade, senão sua textualidade”27. (BEAUGRANDE; DRESSLER, 2016, p.

11). Para sustentar o que afirmam, anunciam um conjunto de critérios ou normas que consolidam a lógica estrutural e discursiva do texto, “Baseando-se na ideia de que os comunicadores produzem e recebem textos seguindo intencionalmente uns

26 “Ideologema. Os ideologemas funcionam como os topoi aristotélicos, constituindo os princípios

responsáveis pela coesão e coerência do discurso social e cultural, o que nos garante ao mesmo tempo a compreensão da própria ideologia do discurso. Nas teorias de Mikhail Bakhtin sobre a narrativa, o ideologema designa aqueles termos ou expressões que induzem a uma determinada ideologia”. (IDEOLOGEMA..., 2009).

27 “Desde el punto de vista de la lingüística del texto, es un lugar común afirmar que lo que hace que

planos28 cujo cumprimento lhes permitirá alcançar as metas desejadas [...]”.29

(BEAUGRANDE; DRESSLER, 2016, p. 12).

No cenário brasileiro, a partir do conceito de texto como um acontecimento, Marcuschi (2008) fala sobre o processo de construção do texto (textualização) referindo-se aos critérios de textualidade como normas complementares, interativas, entendendo-as como meios de abordagem do conteúdo textual. Ao analisar os critérios gerais da textualidade, esse autor assim se pronuncia sobre a dinâmica de interligação entre eles:

(1) em primeiro lugar, [encontramos] os três grandes pilares da textualidade que são um produtor (autor), um leitor (receptor) e um texto30 (o evento).

Nosso interesse centra-se aqui, no texto enquanto processo (um acontecimento) e não um produto acabado;

(2) em segundo lugar, há dois lados a observar: (a) o acesso cognitivo pelo aspecto mais estritamente linguístico representado pelos critérios da cotextualização (o intratexto), que exige por sua vez e de modo particular os conhecimentos linguísticos e as regras envolvidos no sistema, bem como sua operacionalidade e (b) o acesso cognitivo pelo aspecto contextual (situacional, social, histórico, cognitivo, enciclopédico) exigindo mais especificamente conhecimentos de mundo e outros (sociointerativos); (c) em terceiro lugar, os critérios da textualização aqui dispostos em dois conjuntos, mas imbricados [...]. (MARCUSCHI, 2008, p. 96).

Com esse raciocínio, Marcuschi (2008) desvincula a textualidade31 de uma

possível dependência material do texto, restrita à superfície, como se esse conceito se prestasse apenas para explicar a organização formal e a vincula a outros fatores (contextuais) que elevam o receptor a status de “coautor” do processo. Consequentemente, o conceito mostra a relação autor-texto-leitor como evento, como uma totalidade (interna e externa) num diálogo coerente com o projeto de interpretação que exige habilidade com o sistema da língua, a situacionalidade e os conhecimentos de mundo, associadamente.

Cada qual com seu papel, essas normas, em interação, sinalizam o movimento lógico do texto e oferecem os recursos necessários ao leitor para que ele possa contribuir com a construção de sentidos previstos na leitura. Como diz

28 “De entre los siete criterios de textualidad aludidos, hay dos de tipo lingüístico (cohesión y coherencia),

dos psicolingüísticos (intencionalidad y aceptabilidad), dos sociolingüística (situacionalidad e

intertextualidad) y uno de tipo computacional (infomatividad); los tres principios comunicativos son eficacia, efectividad y adecuación”. (BEAUGRANDE; DRESSLER, 2016, p. 12).

29 “Basándose en la idea de que los comunicadores producen y reciben textos siguiendo

intencionadamente unos planes cuyo cumplimiento les permitirá alcanzar las metas deseadas [...]”.

30 “O texto é um evento comunicativo em que convergem ações linguísticas, sociais e cognitivas”.

(MARCUSCHI, 2008, p. 72).

Marcuschi (2008, p. 97), “[...] as sete condições de textualidade [...] não constituem princípios de formação textual e sim critérios de acesso à produção de sentido”. Como se vê, o acesso aos sentidos não se dá critério por critério, de forma autônoma, mas a partir de uma atuação em conjunto.

Compreendendo-se coesão e coerência como aspectos orientados pelo texto, intencionalidade e aceitabilidade orientados pelo aspecto psicológico, informatividade orientada pelo aspecto computacional e situacionalidade e intertextualidade pelos aspectos sociodiscursivos (MARCUSCHI, 2008, p. 133), interativamente todos se imbricam.

Bem próximo de Marcuschi, Koch e Travaglia (2011, p. 27-28) entendem que A textualidade ou a textura é o que faz de uma sequência linguística um texto e não uma sequência ou um amontoado aleatório de frases ou palavras. A sequência é percebida como texto quando aquele que a recebe é capaz de percebê-la como uma unidade significativa global. Portanto, tendo em vista o conceito que se tem de coerência, podemos dizer que é ela que dá origem à textualidade [...].

Lembramos, contudo, que essa definição de textualidade vai além do que ela propriamente mostra à primeira vista. Ela compõe um campo mais vasto do entendimento do texto, a coerência32. Compreendida a textualidade como fruto da

coerência, recurso voltado não só para a “amarração” textual, mas, sobretudo, para a criação de sentidos, adiante passamos a compreender de forma mais detalhada um de seus critérios ou normas, a intertextualidade, essa espécie de “comunhão de discursos” (MARCUSCHI, 2008, p. 132), em sua função argumentativa (KOCH; ELIAS, 2016; CHARAUDEAU, 2008), procedimento de que os jornalistas de divulgação se servem muito em seus propósitos discursivos.

Na seção que segue, aprofundamos a noção de intertextualidade sob a perspectiva de alguns teóricos, os quais (cada um com sua parcela de contribuição) estão relacionados com o foco da nossa pesquisa.

32 “O estudo da coerência poderia ser visto como uma teoria do sentido do texto (seja ele uma frase ou

um livro todo, não importa a dimensão), dentro de um ponto de vista de que o usuário da língua tem competência textual e/ou comunicativa e que a língua só funciona na comunicação, na interlocução, com todos os seus componentes (sintáticos, semânticos, pragmáticos, socioculturais etc.). Estamos entendendo sentido como a atualização seletiva no texto de significados virtuais das expressões linguísticas”. (KOCH; TRAVAGLIA, 2011, p. 15).