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Tipos de metáforas da vida cotidiana

A partir da Teoria da Metáfora Conceptual contemporânea, torna-se importante investigar e compreender os vários tipos de metáforas existentes e utilizadas nas diversas comunidades lingüísticas. Assim sendo, Lakoff e Johnson (1980/2002) decidem estudar os vários tipos de metáforas por meio de enunciados ilustrativos em inglês (não empíricos) da vida cotidiana.

Nessa seção, serão apresentados os tipos de metáforas presentes na vida cotidiana, segundo o que Lakoff e Johnson (1980/2002) nos propõem em sua obra.

1) Metáforas Orientacionais: São aquelas que “organizam todo um sistema de conceitos em relação a um outro e que estruturam esses conceitos linearmente; isto é, são aquelas estruturadas com orientação espacial a um conceito do tipo: para cima – para baixo, dentro – fora, frente – trás, em cima de – fora de (on-off), fundo – raso, central – periférico.” (Lakoff &

Johnson, 1980/2002:59-60).

As metáforas orientacionais dão a um conceito uma orientação espacial, como é o caso de:

FELICIDADE É PARA CIMA e TRISTEZA É PARA BAIXO, segundo Lakoff e Johnson (1980/2002). O que Lakoff e Johnson (1980/2002) nos dizem é que existe uma sistematicidade externa geral ligando as várias metáforas de espacialização, fato que gera coerência entre elas. Assim, tudo que indica COISAS BOAS é PARA CIMA, e tudo que se refere às COISAS RUINS dá uma orientação PARA BAIXO. E tais conceitos nos levam às seguintes expressões lingüísticas, apresentadas em inglês por Lakoff e Johnson (1980) e traduzidas para a língua portuguesa por Zanotto et al, (2002):

‘Estou me sentindo para cima.’ (I’m feeling up)

‘Você está de alto astral.’ (You’re in high spirits.)

‘Estou deprimido.’ (I’m depressed.)

‘Ele está mesmo para baixo estes dias.’ (He’s really low these days.)

Tais orientações metafóricas não são arbitrárias, visto que têm uma base na nossa experiência física e cultural. Embora as oposições binárias para cima – para baixo, dentro – fora etc., sejam físicas em sua natureza, as metáforas orientacionais baseadas nelas podem variar de uma cultura para outra. Por exemplo, em algumas culturas, o futuro está diante de nós (como na cultura brasileira), enquanto que em outras, está atrás de nós.

2) Metáforas Ontológicas: São aquelas que “nos permitem compreender nossas experiências em termos de objetos e substâncias, e dessa maneira, selecionar partes de nossa experiência e tratá-las como entidades discretas ou substâncias de uma espécie uniforme. Uma vez que podemos identificar nossas experiências como entidades ou substâncias, podemos referir-nos a elas, categorizá-las, agrupá-las e quantificá-las – e, dessa forma, raciocinar sobre elas.”

(Lakoff & Johnson 1980/2002:75-76).

Segundo Lakoff e Johnson (1980/2002), as metáforas ontológicas servem a vários propósitos e as diferenças que existem entre elas refletem os diferentes fins. Consideremos a experiência de aumento de preços, que pode ser vista metaforicamente como uma entidade por meio do substantivo inflação. A metáfora ontológica INFLAÇÃO É UMA ENTIDADE fornece um meio de nos referirmos à experiência, como é possível observar nos exemplos em inglês de Lakoff e Johnson (1980), traduzidos para o português por Zanotto et al (2002:76):

‘A inflação está abaixando o nosso padrão de vida.’ (Inflation is lowering our standard of living.)

‘Precisamos combater a inflação.’ (We need to combat inflation.)

Tomamos atitudes em relação à maneira como lidamos com a inflação, por exemplo, e a tratamos como uma entidade a partir do momento em que precisamos compreendê-la e fazer uso

da mesma em nosso cotidiano de uma forma mais racional. Observemos a seguinte citação de Lakoff e Johnson (1980/2002:77):

‘Conceber a inflação como uma entidade, faz com que possamos nos referir a ela, quantificá-la, identificar um aspecto particular dela, vê-la como uma causa, agir em relação a ela, e talvez, até mesmo, acreditar que nós a compreendemos. As metáforas ontológicas como essa são necessárias para tentar lidar racionalmente com nossas experiências.’

(Lakoff & Johnson, 1980 apud Zanotto et al, 2002:77)

As metáforas ontológicas subdividem-se em:

a) Metáforas de Recipientes b) Metáforas de Personificação

a) Metáforas de Recipientes: São aquelas metáforas “usadas para que possamos compreender eventos, ações, atividades e estados, sendo que eventos e ações são metaforicamente conceptualizados como objetos, atividades como substâncias, estados como recipientes. Uma corrida, por exemplo, é um evento, que é visto como uma entidade discreta. A corrida existe no tempo e no espaço e tem demarcações bem definidas. Assim, nós a vemos como um OBJETO RECIPIENTE, tendo dentro de si participantes (que são objetos), eventos como o início e o fim (que são objetos metafóricos) e a atividade de correr (que é uma substância metafórica).” (Lakoff &

Johnson, 1980/2002:83).

Cito os seguintes enunciados a respeito de uma corrida, segundo Lakoff e Johnson (1980) em inglês, traduzidos por Zanotto et al (2002:83) para o português:

‘Você está na corrida no Domingo?’ (Are you in the race on Sunday?) (Corrida como

OBJETO RECIPIENTE)

‘Você vai à corrida?’ (Are you going to the race?) (Corrida como OBJETO)

‘Você viu a corrida?’ (Did you see the race?) (Corrida como OBJETO)

Atividades de um modo geral são vistas metaforicamente como SUBSTÂNCIAS e, conseqüentemente, como RECIPIENTES:

‘Como Jerry escapou de lavar as janelas?’ (How did Jerry get out of washing the windows?)

Além disso, “as atividades são vistas como recipientes para ações e para outras atividades que as constituem. Elas são percebidas como recipientes para a energia e os materiais que elas exigem e para os seus derivados (por exemplo, satisfação), que podem ser vistos como estando dentro delas ou saindo delas” (Lakoff & Johnson, 1980/2002:84):

‘Eu coloco muita energia na lavagem de janelas.’ (I put a lot of energy into washing the windows.)

‘Há muita satisfação na lavagem de janelas.’ (There is a lot of satisfaction in washing windows.)

Muitos outros estados podem também ser conceptualizados como recipientes. Lakoff e Johnson (1980) citam alguns enunciados em inglês e Zanotto et al (2002:85) traduzem os mesmos enunciados para a língua portuguesa:

‘Ele está em estado de amor.’/ ‘Ele está apaixonado.’ (He’s in love.)

‘Estamos fora de perigo agora.’ (We’re out of trouble now.)

b) Metáforas de Personificação: São aquelas que “nos permitem compreender uma grande variedade de experiências concernentes a entidades não-humanas em termos de

motivações, características e atividades humanas”, segundo Lakoff e Johnson (1980) em inglês, com tradução de Zanotto et al (2002:87) para o português. Exemplos:

‘Este fato ataca as teorias clássicas.’ (This fact argues against the standard theories.)

‘A vida me trapaceou.’ (Life has cheated me.)

A personificação é, segundo Lakoff e Johnson (1980/2002), “uma categoria geral que cobre uma enorme gama de metáforas, cada uma selecionando aspectos diferentes de uma pessoa ou modos diferentes de considerá-la” (Lakoff & Johnson, 1980/2002:88-89).

Nesse sentido, todo esse conjunto de metáforas que diz respeito à personificação permite-nos compreender as experiências de permite-nosso cotidiano a partir de características e ações humanas.

Segundo Lakoff e Johnson (1980/2002), portanto, é possível conceber algo abstrato como a inflação por meio de características humanas quando estamos passando por crises econômicas, por exemplo. Dessa forma, conseguimos entender de modo racional que a INFLAÇÃO É UM ADVERSÁRIO e que a mesma leva nosso dinheiro embora, faz-nos perder dinheiro, etc.

No entanto, ao falarmos que ‘A inflação roubou minhas economias’, não estamos fazendo uso da personificação, mas de uma entidade que é utilizada para que possamos nos referir a outra associada a ela. Esse processo é chamado de metonímia, segundo Lakoff e Johnson (1980/2002:91-92).

Lakoff e Johnson (1980/2002) também citam os conceitos metonímicos que emergem de correlações, em nossa experiência, entre duas entidades físicas (PARTE PELO TODO, OBJETO PELO USUÁRIO), ou entre uma entidade física e algo metaforicamente conceptualizado como uma entidade física (LUGAR PELO EVENTO, INSTITUIÇÃO PELA PESSOA RESPONSÁVEL).

Observemos alguns exemplos estudados por Lakoff e Johnson (1980) e traduzidos por Zanotto et al (2002:92):

‘Ele gosta de ler o Marquês de Sade.’ (= o que o Marquês escreveu) (He likes to read the Marquis de Sade.)

‘Ele está na dança.’/ ‘Ele dança.’ (= na profissão da dança) (He’s in dance.)

‘O acrílico invadiu o mundo da arte.’ (= o uso de tinta acrílica) (Acrylic has taken over the art world.)

‘O Times ainda não chegou à coletiva.’ (= o repórter da Times) (The Times hasn’t arrived at the press conference yet.)

‘Mrs. Grundy faz cara feia para jeans.’ (= o vestir jeans) (Mrs. Grundy frowns on blue jeans.)

‘Novos limpadores de pára-brisa o deixarão satisfeito.’ (= o fato de ter limpadores de pára-brisa novos) (New windshield wipers will satisfy him.)

Nesta seção, foi apresentada a definição de vários tipos de metáforas conceptuais estudadas por Lakoff e Johnson (1980).

A seguir, será apresentada uma retrospectiva sobre os estudos que têm por base a Teoria da Metáfora Conceptual e a Lingüística de Corpus como suporte argumentativo para a realização desta pesquisa.

1.3 Retrospectiva dos Estudos com base na Teoria da Metáfora Conceptual e na