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Eu vim para que todos tenham vida e tenham vida plenamente: a vida na mulher e a vida

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CAPÍTULO III: GÊNERO E MULHER NA IGREJA CATÓLICA: A

3.4. Eu vim para que todos tenham vida e tenham vida plenamente: a vida na mulher e a vida

“As análises de gênero têm evidenciado que a distribuição do poder religioso é desigual e se baseia em uma concepção objetivada, portanto, naturalizada, das diferenças sexuais que, no âmbito religioso são sacralizadas” (SOUZA, 2015 p. 27). Na hierarquia do poder religioso masculino é possível constatar a sacralidade como algo realmente natural, já no próprio fundamento do ministério sacerdotal, o qual não é permitido às mulheres, bem como todas as autoridades religiosas conferidas aos homens, oriundas das interpretações masculinas dos textos sagrados, assim como as criações de normas por esse colégio de homens religiosos, a uma sociedade de múltiplos gêneros.

Portanto, no contexto dos tempos bíblicos, ouvir e acolher que, Jesus veio para dar vida e vida em abundância é ainda hoje, facilmente assimilado por todos, tendo em vista que sua mensagem seria a libertação de um estado de opressão. Porém, podemos dar outro sentido, ou ainda outro enfoque, possibilitando que a libertação da vida passa por todos, inclusive pelas mulheres. Dar mais vida a essa expressão é pensarmos nas milhares de mulheres que dão vida diariamente.

A Mulher veio para que todos tenham vida e tenham vida plenamente. Se há um sexo que pode dizer com toda propriedade, eu vim para que tenham vida e a tenham plenamente é o sexo feminino. No seu espaço privado, no corpo, após a penetração do sexo masculino, a mulher, fisiologicamente, é capaz de gerar sozinha a vida mais complexa, singular, potente, e

criativa entre as criaturas da terra. A partir desse ponto, a sua atitude privada, que acontece no escuro do ventre, logo se torna pública, pois o corpo da mulher se transforma. Aquele que está no privado em um dado momento vem a público e é mais um na história da humanidade. Se faz importante perceber o quanto a vida na mulher e a vida das mulheres, são importantes nesse processo todo.

Dar sua vida a vida do outro fez parte do povoamento e do processo civilizatório. A construção da história passa por esse processo de gerar vidas, de cuidar, de fazer crescer e multiplicar. Essa construção social, tem o tecido e a arte feminina, mas tem também as dores de tantas que foram abusadas, violentadas e obrigadas a gerar. Entre dores e sombras, entre alegrias e luz, a vida nas mulheres e a vida das mulheres sempre foi ao outro e pelo outro.

As escolhas profissionais, as escolhas pessoais, ou familiar, cada pessoa é capaz de decidir, especialmente, a mulher, uma vez que é ela a sofrer alterações no corpo e na vida futura, muito mais que ao homem. Dar vida ou oferecer vida, com qualidade, se faz necessário em sociedade, sob um conjunto de normas, o que não significa vivê-las em excesso. Legalismos e moralismos não devem prevalecer ou ultrapassar os direitos humanos, pois isso altera a liberdade, tanto no âmbito individual quanto no coletivo.

A linguagem utilizada nos documentos pontifícios da Igreja Católica e seu conjunto de processos simbólicos, inseridos nos ritos, dentro ou fora do espaço religioso, legitimam a contínua construção do legalismo dogmático, legitimam o controle dos corpos femininos. A começar que são os homens, os corpos masculinos, que decidem sobre a continuidade ou a interrupção da vida nas mulheres. Deveria haver liberdade às mulheres que pensam de maneira diferente, ou vivem realidades muito diferentes umas das outras. Sendo assim aquela que vem não deveria sofrer tamanho controle; viver plenamente compreende muitas fases da vida: vida e morte, alegria e tristeza, vitória e derrota, escuridão e luz. Não há um modelo perfeito de mulher para mulher. As mulheres se reconhecem em suas imperfeições, por isso lutam para serem muitas, pois são singulares.

Essa busca pelo estágio da perfeição e santidade é construção masculina, é uma lógica repressiva e excludente de vidas, expressa na forma da linguagem perfeita, de um Deus perfeito e de ordem perfeita. A construção da teologia cristã é desencarnada da realidade humana, não há perfeição entre nós, não há um único modelo, há imperfeições que lutam para acertar e há modelos que buscam resistir as fraquezas humanas e os limites impostos aos fatores sócio- político, econômico, cultural e religioso que a humanidade criou.

A teologia cristã sempre desprezou o corpo feminino e enalteceu a razão masculina como a sabedoria suprema do mundo. Segundo Gebara (2017b) as teólogas feministas cristãs, acreditam que há uma desordem nesse sentido, por isso estariam buscando uma nova ordem social de relações. Essa desordem estaria levando às injustiças e até uma espécie de crueldade por parte do cristianismo. “Poderíamos nos perguntar pelas razões da divisão no seio da própria tradição cristã, divisão entre mulheres e homens, entre pobres e ricos e, igualmente, divisões a partir de maneiras diferentes de ver a vida e o cristianismo” (GEBARA, 2017b p. 133). Para a autora, o que poderia causar isso é que o cristianismo, por residir sua unicidade em Jesus Cristo, parte do princípio não histórico de Jesus, mas de alguém que está além da história, com uma personalidade masculina fixa e imutável, ou seja, pensam o cristianismo como um bloco monolítico, “e não como cristianismos, isto é, como uma multiplicidade de interpretações sobre a tradição de Jesus”. (GEBARA, 2017b p. 134)

Para Fiorenza (2009 p. 29)

Ao apresentar às mulheres [...] a imagem de Maria, virgem perpétua e mãe tristonha, homens da igreja estão pregando um modelo de feminilidade que as mulheres comuns não podem imitar. Maria [...] completamente dessexualizada e como símbolo de obediência humilde, serve para inculcar a dependência, a subordinação e a inferioridade de mulheres.

Se a construção iconográfica de Maria e a construção social cristã não fosse tão enrijecida, fechada, tão moralista, fixada no gênero masculino, viver a igualdade na diversidade poderia ser possível.

O ladrão vem só para roubar, matar e destruir. Eu vim para que tenham a vida e a tenham em abundância (Jo 10,10). Quem seria o ladrão que rouba a vida, das mulheres, dos

negros, dos índios, dos gays, dos pobres, que mata e destrói? Tentar responder essa questão é a cada dia mais importante, mas para tal, cabe reflexão e mudança, para que possamos superar essa desigualdade entre homens e mulheres. Buscar a raiz dos problemas, criando nova hermenêutica, para avançarmos com justiça, dignidade e igualdade entre as pessoas é fundamentalmente necessário, é uma questão de sobrevivência coletiva e planetária. É preciso superar o que chama Gebara de conflitos feministas com a religião cristã.

Minhas crenças cristãs, no caso, são sempre julgadas no ‘para além do vivido’, no para além da ordem temporal e contextual que me envolve, e julgadas por uma Vontade superior a todas as vontades. E, mais que isso, acredita-se que o fundamento dessa crença ultrapassa o humano e, por essa razão, o humano que captou e expressou a irrupção desse transcendente nada mais tem a fazer senão dobrar os joelhos e calar a razão diante de tal grandeza intuída. O conflito das feministas com a Igreja Católica em relação aos problemas da natalidade e da maternidade como escolha e não como destino gira em torno destas duas lógicas. A primeira insiste numa espécie de natureza humana fixa e a segunda insiste num processo de contínua criação e transformação. (GEBARA, 2017b p. 135)

Portanto, se o humano foi capaz de captar esse Ser, esse fenômeno que se encerrou sobre

a humanidade, estaria agora condicionado a permanecer nesse evento, congelado, fixo, separado das dores, das realidades humanas? A opção que a Igreja oferece às mulheres se enquadra nesse evento que faz a racionalidade curvar-se a um dogmatismo que representa uma impossibilidade de vida plena em nossos dias. Não é possível que se continue a insistir, que seja o corpo masculino, tão somente a ditar as regras aos corpos femininos. Não é possível, que no espaço político, econômico, e religioso, sejam somente os corpos masculinos a ter voz e vez para decidir sobre a sociedade.

A dominação masculina por indivíduos ou pelas instituições às mulheres e nas mulheres, também ocorrem de forma velada, camuflada, cheia de elogios e presentes. Só depois é que se revela a dominação, seja pelo matrimônio, pela maternidade ou pela virgindade. Há muitas outras formas de se fazer escolhas e porque os homens insistem em uma tal perfeição? As mulheres não precisam ser perfeitas, devem sentir-se livres para acertar e errar, perder e ganhar, rir e chorar, casar ou ser solteira, ter filhos ou não e, não continuarem enredadas por palavras que não as levem a lugar algum.

Quando dizemos que a mulher é aquela que recebe amor, para, por sua vez, amar, não entendemos só ou antes de tudo a relação esponsal específica do matrimônio. Entendemos algo mais universal, fundado no próprio fato de ser mulher no conjunto das relações interpessoais, que nas formas mais diversas estruturam a convivência e a colaboração entre as pessoas, homens e mulheres. Neste contexto, amplo e diversificado, a mulher representa um valor particular como pessoa humana e, ao mesmo tempo, como pessoa concreta, pelo fato da sua feminilidade. Isto se refere a todas as mulheres e a cada uma delas, independentemente do contexto cultural em que

cada uma se encontra e das suas características espirituais, psíquicas e corporais, como, por exemplo, a idade, a instrução, a saúde, o trabalho, o fato de ser casada ou solteira. (JP II, MD pp. 107-107)

Para quem essas palavras são úteis? Uma mulher abandonada pelo companheiro, sem seus pais e grávida sem querer, a que isso lhe serve? A uma mulher jovem, pobre, estudante numa universidade federal, que estuda e trabalha para se sustentar, é estuprada, sob a acusação de ter bebido na balada, em que isso muda sua situação? A uma família de classe média baixa, cujo marido está desempregado, que cuida dos três filhos, pagam aluguel, em que isso lhe ajuda? Poder-se-ia dar uma infinidade de exemplos desumanos e indignos, pelos quais passam uma enorme parcela de mulheres no mundo. A humanidade custa a aprender o valor de cada ser humano, da natureza, como irá vivenciar esse amor e dar esse amor a uma mulher da maneira como fala a Igreja?

O homem mata, luta para conquistar, tudo é conquista, até uma mulher pode ser uma conquista na roda de amigos. O ser desejante58 que é o humano, nos atravessa, de cima a baixo e de baixo para cima, é o limite humano. Nesse sentido as mulheres devem continuar percebendo que essa lógica masculina não deve ser a lógica feminina e fazer, na prática o contrário a isso. Homens para serem poderosos e respeitados, criam normas e regras duras, castigam, escravizam, prendem, exploram, dominam. As mulheres devem seguir renunciando isso, se não, de nada valerá o esforço de pensar algo diferente do que já foi pensado.

Pensar e questionar deve ser a forma de obter respostas, para bem entender o que espera, ou que sugere a Igreja, quando diz aguardar o gênio feminino conforme a visão de João Paulo II e seus pontífices subsequentes. A Igreja Católica espera a manifestação do gênio mulher segundo seus preceitos, explicitados no documento de João Paulo II em Mulieris Dignitatem (1988) e em sua Carta Às Mulheres (1995), que, resumindo, deverá a mulher seguir o modelo de Maria, o qual está condicionada a se colocar como serva obediente à Palavra de Deus59. Não

58 O desejo no mundo moderno é constantemente motivado pelo capitalismo, pois é necessário consumir para

alimentar o sistema; essa é uma vertente dessa estrutura que mata e sacrifica por causa de. Outra forma de pensar a origem da violência seria a lógica do ser desejante como característica originária, para tanto pode-se ler René Girard, A violência e o sagrado.

59 “A Igreja vê, em Maria, a máxima expressão do <gênio feminino> e encontra n’Ela uma fonte incessante de

inspiração. Maria definiu-se <serva do Senhor> (cf. Lc 1,38). É por obediência à Palavra de Deus que Ela acolheu a sua vocação privilegiada, mas nada fácil, de esposa e mãe da família de Nazaré”. (Carta Às Mulheres, p. 7)

tem como não enfatizar que, a palavra de Deus é a teologia dos homens, por isso é de caráter unilateral, é falha, ainda mais por tratar-se somente do pensamento masculino.

A teologia cristã, particularmente a católica romana, escolheu majoritariamente este segundo caminho, isto é, o de buscar ajuda nos santos, em Jesus Cristo, em Deus como seres dotados de forças sobre humanas. Esse caminho, embora compreensível diante da miséria humana, tem sérias consequências na articulação dos reais problemas da História, assim como na evolução de nossas crenças e de nossas políticas. E esse caminho tem sido reforçado por uma estrutura de poder hierárquico masculino, considerado sagrado, e está de tal forma arraigado na cultura cristã patriarcal que tentar modificá-lo, para muitos, significa quase trair a fé. (GEBARA, 2017b p. 138)

Ao que parece, grande parte das mulheres modernas não se veem contempladas nesses discursos, bem como nos documentos pontifícios, muito menos desejam seguir apenas um modelo de mulher. Não se pode esquecer que a própria vida, em todas as suas instâncias, é múltipla, há inúmeras variações entre uma teoria e a prática experimentada, portanto, não se trata de uma negação à Maria, mas sim de negar a construção que se faz a partir dela, oferecendo às mulheres de hoje, tão somente o matrimônio, e a maternidade. Contudo, não se trata de negar as escolhas do matrimônio e da maternidade, nem da escolha celibatária ou virginal, mas sim de dizer que as escolhas devam ser livres e as oportunidades dentro dessa estrutura hierárquica deva ser oferecida a todas as pessoas, sem distinção de gênero, raça ou classe social. Na verdade, o que fica claro com os estudos apresentados por teólogas feministas, é que, o que a Igreja tem dito sobre a mulher, não é tudo que ela é ou pode vir a ser. Nesse sentido, o termo

gênio feminino se aplicaria em outra perspectiva, muito mais ampla, transversal e multicultural,

levando a um outro momento histórico, o que na história das mulheres, possibilitaria um novo espaço, em todo tempo e em todo lugar.

A partir disso, subverter à Palavra, não é tarefa fácil, muito menos rápida. Ousar que as mulheres possam dizer: eu vim para que tenham vida e tenham vida plenamente, certamente, fere o discurso hegemônico, sedimentado pela escolha divina, de que somente o sexo masculino foi escolhido por Deus, foi desejado ao ministério sacerdotal do serviço pelo reino, e foi assim marcado pelo selo sagrado. A construção do sagrado pelos ritos, mitos, teologias, dogmas e liturgias desemboca em uma dinâmica da vida pública, contrário ao construído para as mulheres, que destinada ao cuidado, a mantém na vida privada, sacralizada na maternidade.

Na tentativa de conter a mulher, esse caminho de ontem é ainda o de hoje. As mulheres não recebem os mesmos destaques em suas ações, assim como recebem os homens em seus feitos. Eles se auto promovem, eles se auto anunciam criadores de suas ações e fazem memória de suas conquistas ao longo de toda história. Sacralizam-se e sagram quem eles querem. Monumentos e museus contam as vitórias dos homens, parece que: fazei isso em minha

memória, tomou dimensões bastantes desvirtuadas dos primórdios do cristianismo.

Fica evidente uma negação constante à mulher, haja visto com Maria, sua memória não é retratada como subversiva, o que não auxilia a conquista do espaço feminino na Igreja Católica, bem como a participação feminina, mais igualitária em sociedade.

Estamos percebendo o ópio misturado ao Evangelho de Jesus. Mesmo com boa fé, mesmo acreditando no bem que estávamos fazendo, estávamos e estamos reforçando um sistema que nos exclui e explora. De repente nossos olhos estão se abrindo e percebemos a falsidade no interior dos belos discursos nos quais acreditávamos terem vindo dos céus através das bocas clericais. (GEBARA, 2018a n.p.)

As mulheres estariam cada vez mais afirmando, eu vim para viver a vida na sua inteireza, na plenitude, com abundância de oportunidades, fora do domínio violento e marginalizador que a sociedade masculina, hierárquica determinou. Lutando para libertar-se do ladrão que rouba os sonhos e a sua história. Resistindo ao que matam no direito de falar, de fazer e de ser. Enfrentando o que vem para destruir, as ideias, o valor, a pluralidade, as formas variadas de ver e de entender a vida. Assim, poderão dizer: que nada nos perturbe, que nada nos seduza, que nada nos engane. Que cada mulher consiga perceber, que na lógica masculina, no sistema capitalista e mercantilista, seu valor não se resume ao cifrão monetário, que a sua inteligência está na sabedoria, assegurada pela experiência feminina e pelos espaços educacionais que hoje são ocupados por muitas mulheres. Que a dominação masculina não cegue os olhos, não convença os ouvidos e não as levem para o mesmo caminho, da exploração ao próximo, da conquista pela guerra, da ganância que sufoca, mas que seja possível o reinar ao amor e não ao poder pelo poder.

Se as instituições religiosas cerceiam que as mulheres brotem outra vez, depois outra e outra, porque às mulheres oferecerem a vida e vida em abundância. Que a normatividade seja superada, retirando o estado fixo em que a Igreja enxerga as mulheres, valorizando suas

escolhas, sejam: na família, no trabalho, dentro ou fora do lar, na maternidade ou fora dela, no matrimônio ou, simplesmente, na união de dois, na virgindade ou no ministério sacerdotal. Que o movimento feminista seja na direção dos quatro fundamentos oferecidos por Gebara (2017a pp. 22-44) respeitando as dimensões de que somos seres viventes, seres misturados, seres em

mutação e seres mortais, o que só vem reforçar que a unicidade em Maria não pode ser a partir

desse único modelo de mulher, mas seja única e exclusivamente pelo fato de serem mulheres. Com as mulheres, os quatro fundamentos gebarianos, promovem a vida, aqui e agora, maior que a promoção futura do céu.

Lembrar e aprender sejam os verbos que nos façam seguir como seres misturados, plurais, mas, únicos, onde essa singularidade forme um vasto campo para os estudos de gênero. Aprender que estamos em constante processo de mutação é o que dinamiza a história, devendo alterar sempre a teologia, a antropologia e a filosofia. É um contínuo fazer, um não fixar em normas rígidas, que mais paralisam do que mobilizam ao bem, ao amor, a inclusão, a adoção, a valorização do outro. Por fim, absorver o conceito de mortais, como condição de finitude, na história que passou e na história do hoje pode ser um caminho. Muitas realidades escapam, tomando formas diferentes que a de ontem e quando se vê já morreu. O que evidencia há necessidade de pensar em outras formas de se relacionar e de construir socialmente as nossas representações sociais.

A representação social da mulher na Igreja Católica se apresenta, muito diferente das representações sociais das mulheres de hoje. Portanto, é válido não se esquecer, de que: “a Igreja exprime e serve uma civilização patriarcal na qual é conveniente que a mulher permaneça anexada ao homem. É fazendo-se escrava dócil que ela se torna também uma santa abençoada”. (BEAUVOIR, 2016 p. 236)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Somos não mais imagem e nem semelhança de... Somos o que a vida nos permitiu ser em sua espantosa complexidade, somos o que pudemos fazer do que fizeram de nós na interdependência entre as diferentes gerações, situações e elementos. (GEBARA, 2017b p. 120)

Chegando ao final desse trabalho, muitas questões ficam em aberto quando nos deparamos com a linguagem dos documentos pontifícios e as realidades enfrentadas por milhares de mulheres no mundo todo. Essa linguagem estabelece confronto direto com o modelo e a vida de uma mulher, Maria de Nazaré, de um feminino perfeito e imaculado que na visão da Igreja Católica deve ser imitado. Esse modelo exclusivo não possibilita o diálogo com as demais mulheres inseridas nas mais variadas condições e situações, o que acaba por insistir em regular e normatizar o corpo feminino, ignorando sua pluralidade.

O Papa João Paulo II preocupou-se com a família, proclamando-a célula da sociedade. Alguns elementos importantes são destacados por ele, como: igualdade, reciprocidade, complementaridade, no entanto não foram suficientes para instaurar a verdadeira equidade, na relação homem e mulher. Ao matrimônio, situação mais importante em que o casal é chamado a vivenciar, sua ênfase à unidade dos dois, é ineficaz, pois há ainda hoje dominação, submissão e marginalização das mulheres, inclusive no âmbito eclesial. O enfoque dado à mulher, em seus documentos é: a mulher é para o cuidado do outro, sua atenção está para o homem, como desígnio de Deus; a educação dos filhos está mais para a mulher que para o homem, apesar de dizer que deve o homem assumir a paternidade com responsabilidade e em conjunto com a mulher. Insiste, em todos os documentos que a vocação e a dignidade da mulher passa pela

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