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A tríade estratégica do pensar e agir citadino – estética, diálogo e civilidade

6 DINÂMICA URBANA, PICHAÇÃO E PRÁTICAS ORGANIZATIVAS

6.2 A tríade estratégica do pensar e agir citadino – estética, diálogo e civilidade

6.2.1 Tons de despiche – cidade de tinta

A orientação estética e cívica pela qual a cidade é conduzida baseia-se, sobretudo, no ideário sustentado pelo programa Movimento Respeito por BH para organizar a cidade e cumprir o Código de Posturas, dentre outras legislações que se referem ao meio ambiente, ao direito à paisagem e às políticas municipais anti-pichação. Vinculado ao programa municipal, o combate à pichação adota em uma de suas vertentes de ação a função de restauração e limpeza de lugares públicos e monumentos tombados, visando além da educação patrimonial, o controle e ordenamento do espaço urbano segundo as concepções do planejamento estratégico para a cidade.

Segundo consta nos documentos públicos, o despiche constitui ação de “limpeza do patrimônio pichado em articulação e alinhamento entre os vários parceiros do projeto [...] e as Secretarias de Administração Regionais Municipais, que elegem os espaços públicos simbólicos e/ou emblemáticos para a comunidade de cada regional, a serem limpos [...]” (SMSEG, 2013b, p. 3). Na formatação do Projeto de Combate à Pichação essa ação da prefeitura na cidade ocorreu no período de 2010 a 2012 nas nove regionais administrativas, em parceria e mobilização de outros agentes públicos e privados. Atualmente, as ações de limpeza urbana ocorrem exclusivamente por meio da Superintendência de Limpeza Urbana, ligada à Secretaria de Serviços Urbanos.

O foco dessa ação do projeto incluiu, além da restauração patrimonial, a conscientização social para valores estéticos e cívicos em relação aos monumentos e ao meio ambiente físico da cidade. Durante as ações mobilizavam-se os agentes que “vestidos com a camisa do programa”, distribuíam panfletos alusivos ao combate à pichação, executavam o despiche e participavam das atividades, que algumas vezes ocorriam de forma lúdica em aproximação dos equipamentos públicos, como escolas, praças, unidades de atendimento à saúde, conselho tutelar, entre outros. Os fragmentos discursivos (29) e (30) expressam alguns pontos críticos relacionados à ação de despiche:

(029) Porque às vezes [a prefeitura] vai lá e limpa, o outro vai lá e picha, o outro vai lá e limpa. A pichação acaba sendo um trabalho assim de insistência, porque cada vez que você limpa e o outro picha, quer dizer, quem é mais resistente, não é, em limpar ou em pichar? (Túlio)

(030) Nós desafiamos os pichadores: “picha que nós despichamos, só que vocês vão presos e nós não”. Foi um certo desafio. Aí a Guarda Municipal fica atenta porque tá despichado. Isso é um desafio para o pichador aí ele vai pichar e vai preso. Mas, essa não foi nossa intenção, foi a visão do pessoal da Polícia Civil, da Polícia Militar, que estava conosco nesse movimento. Na nossa visão o que que a gente queria mesmo é os monumentos branquinho o monumento da forma como ele é. Porque de certa maneira, de certa forma o pelotão de ciclismo passando ele é muito bonito. E como ele é regular e têm tantos anos, isso já faz parte da paisagem da Pampulha nos sábados de manhã, assim como os monumentos, nós somos monumentos móveis e renováveis. Cada época entra gente nova, sai gente nova. Então nós somos parte daquele cenário e como parte do cenário, não pode depredar esse cenário. (Cleber)

O enunciador do fragmento (029) relata a situação enfrentada pelo programa da PBH. Interdiscursivamente, estabelece-se uma relação de controle e resistência, expressando a

insistência da prefeitura em limpar os lugares pichados e, de outro modo, a resistência dos pichadores em marcar a cidade. Nesse contexto, o enunciador do fragmento (030) aponta a

das ações de despiche. Na sintaxe discursiva picha que nós despichamos só que vocês são

presos e nós não reforça-se a mensagem hegemônica sobre a criminalidade da prática e sua

punição para os infratores. Logo em seguida, o enunciador indica que essa era uma visão dos policiais que participavam da mobilização para limpeza urbana, que a intenção do grupo é ter

os monumentos branquinhos, o monumento da forma como ele é, o que pressupõe o

alinhamento relacionado ao discurso sobre limpeza e estética.

Interessante a comparação feita pelo entrevistado, que faz parte do grupo de ciclistas da Lagoa da Pampulha. Para ele o pelotão de ciclismo já faz parte da paisagem da Lagoa, assim como os monumentos. Na fala, ele ainda expressa sua percepção na sintaxe nós somos monumentos

móveis e renováveis. O percurso semântico é o de preservação da história do grupo e do lugar,

que por fazerem parte do cenário urbano não devem ser depredados. A percepção identitária sobre o grupo e o lugar se confundem e se mostra exclusivista, como se somente pudesse fazer parte do cenário da Lagoa uma única representação, a qual se faz consolidada pelos indivíduos que com ela possui algum vínculo. A observação dos lugares despichados indica que o espaço público a ser restaurado possui de algum modo uma representação da cidade que precisa ser reordenada para que se cumpra a visão estratégica.

(031) O local que eles na época entenderam que deveria receber esse despiche, em função de uma série de nuances. Por exemplo, o impacto que a limpeza desse local daria, no contexto da cidade como um todo, a questão de organização, na época estava em construção todo o complexo, dos viadutos da Antônio Carlos, inclusive da Praça do Peixe. Um local degradado, muito degradado. ...Além de ser um espaço que recebe um deslocamento muito grande de pessoas ele é histórico pra cidade. Tanto o IAPI como o Complexo da Lagoinha, ele é datado aí da construção da cidade de Belo Horizonte. Então é um fato aí que vêm da boemia, dos primórdios da cidade de Belo Horizonte, algumas situações históricas na cidade. A proximidade até com o próprio Cemitério do Bonfim. E os bairros nas proximidades que apresentam uma história profunda da própria Regional Noroeste, a rua Itapecerica, com certeza. Enfim então ele por si só é um local emblemático. Ele é um local que carrega um capital histórico muito grande, não só para a regional Noroeste, mas como para a cidade. E principalmente pelo fato que estava totalmente poluído. Observando as fotos dos alunos da época consegue ver que de fato estava muito pichado. (Rogério)

O fragmento discursivo (031) indica alguns percursos semânticos interessantes para a compreensão dos lugares de despiche. O primeiro corresponde ao percurso da reestruturação urbana, dado que a limpeza de um lugar poderia impactar toda a organização da cidade. O segundo percurso expressa a revitalização histórica pelas características do lugar, que por ser

emblemático para a cidade precisa assim ser mantido em ordem. No terceiro percurso para

o que expressa uma perspectiva mais estética do que ambiental (implícito pressuposto). Questionados se os serviços urbanos e as políticas públicas de limpeza da cidade alcançavam os principais lugares da cidade alguns entrevistados trouxeram justificativas que sustentam uma essência urbana que é segregacionista e gentrificadora, conforme os fragmentos a seguir:

(032) O IPTU daqui (Bairro São Luiz, Regional Pampulha) é muito caro, muito, mas não é pouco, não, é muito. Então, a atenção que eles tem com o bairro é muito grande. A prefeitura tem muita atenção com o bairro, tem varrição três vezes por semana, tem coleta de lixo normal, tem coleta seletiva no bairro que a gente conseguiu... com a prefeitura agora, toda quinta-feira é coleta seletiva. (Hilton)

(033) O poder público ele visa maquiar a parte da cidade onde vai ter o trânsito dos turistas, dos governantes, etc., etc., favela nunca é observada. E não é só na pichação, é na estrutura, pavimentação, saneamento básico. As comunidades são abandonadas. (Leandro)

(034) Olha, eu nem sei se limpar a periferia se vai resolver também não, na verdade, de repente melhore, porque quando você melhora a qualidade devida da pessoa, ela se sente melhor. Mas eu acho que esse projeto, tem tanta coisa antes dele para ser feito, sabe, eu acho que ele precisa, sim, limpar a cara da cidade, qual que é a visibilidade da cidade? Nós vamos limpar uma escola, sim, lá na favela, mas que patrimônio que nós temos lá na favela a não ser escola? Eu tenho um monumento dentro de uma favela? Você conhece algum? Pode me dar algum exemplo? Eu também não sei, eu tenho que ir lá arrumar o que é patrimônio público, e o que que é lá? É escola, posto de saúde... (Alessandro)

A interdiscursividade presente no fragmento (032) relaciona o pagamento de imposto com procedimentos de limpeza em um dos bairros que pertence a uma área nobre da Regional Pampulha. O implícito subentendido é de que quanto maior o valor do imposto mais atenção a prefeitura dispensa na infraestrutura e nos serviços urbanos do bairro. De outro modo, no texto (033) o percurso semântico é de segregação, que remete à manutenção da limpeza na cidade para eventos e pessoas importantes, como a Copa do Mundo 2014, que receberá turistas e

governantes de vários países. Para tanto, o governo atua maquiando a cidade, excluindo o

contexto da favela, onde não haverá trânsito de tais pessoas (implícito pressuposto). Essa percepção esboça uma realidade importante referente à dinâmica urbana de Belo Horizonte.

No texto (034), o enunciador indica explicitamente a necessidade de limpar a cidade. Sugestivamente, ele indaga acerca do patrimônio ou monumento existente nas favelas. Reconhece-se que o patrimônio da favela são as escolas e postos de saúde e que monumentos públicos não são dispostos nesse tipo de lugar. O implícito subentendido é que a história da cidade somente é representada e preservada em outros lugares, que não nas favelas, que têm como bem alguns equipamentos de saúde e educação. Complementando esse discurso, observa- se que na organização urbana planejada pela gestão municipal a limpeza das pichações não

ocorre na cidade como um todo, sugerindo que o espaço urbano tem lugares mais importantes que outros, nos quais também é mais importante manter uma ordenação visual.

(035) Claro que a gente vê uma tentativa de preservação em áreas mais nobres, você vê, por exemplo, uma preocupação muito grande com a Praça da Liberdade, a igrejinha da Pampulha, você vê alguns prédios urbanos, alguns equipamentos urbanos, eles são mais vigiados, outros nem tanto. ...O nosso mapeamento que está sendo feito atualmente, existe um mapeamento pra identificar nas regionais quais são os próprios, que a gente chama de os próprios municipais, os equipamentos municipais que encontram-se pichados, monumentos, prédios e pontes e viadutos. A partir desse controle que está sendo feito agora e que não tinha, nós estamos identificando quem é o pichador da região, a marca que está lá, qual o registro que está lá, o custo do trabalho dessa limpeza, tá certo? ...Então, hoje, em Belo Horizonte, a ideia, primeiro, é que a pichação não seja o único obstáculo de natureza visual que possa, de repente, incomodar não só o cidadão como também a administração. (Túlio)

A interdiscursividade no fragmento (035) se faz presente na indicação de alguns lugares da cidade que são mais vigiados enquanto outros nem tanto. Um percurso semântico importante expresso pela sintaxe discursiva existe um mapeamento pra identificar nas regionais quais são

os próprios sugere o controle adotado pelo município junto às regionais para identificação do pichador da região, da marca que está lá e do custo do trabalho de limpeza. O implícito

pressuposto é de que o registro permite que a municipalidade tenha um controle até mesmo para poder apresentar respostas à sociedade quanto aos gastos públicos e organizar suas formas de atuação e ordenamento da limpeza urbana. Embora fique implícita a existência de outros fatores que também reflitam o problema relacionado à paisagem urbana, a principal ideologia defendida no texto remete à pichação como um obstáculo de natureza visual, que incomoda o

cidadão e a administração, mensagem que reflete o discurso hegemônico na sociedade.

No fragmento (036) também identifica-se que a função visual atrela-se ao discurso da prefeitura contra o picho. Por meio da interdiscursividade, o enunciador aponta o percurso semântico da arborização da cidade, sugerindo a mudança de conceitos expressos pelo excesso de gradil e uma retomada do ideário de representação paisagística pressuposta pela plantação de mudas e

jardins, que por sua vez faz rememorar uma acepção já conhecida de Belo Horizonte como Cidade Jardim. Retomando Sánchez (2001), as ações de despiche expressam características da

dinâmica urbana criada para a cidade-mercadoria, em que uma imagem-síntese modula os projetos que se tem para a cidade. Nas unidades discursivas constata-se uma contradição na fala do enunciador, que inicialmente sugere que a concepção contra o gradil na cidade reflete um pensamento do governo ou da sociedade de Belo Horizonte e, posteriormente, assume uma proposição pessoal (um conceito de gradil nos incomoda muito e isso é uma coisa pessoal). No

discurso confunde-se o apelo identitário particular ao sujeito, que também se sustenta por determinada coletividade, com a organização paisagística da cidade.

(036) A gente está fazendo um trabalho de jardinar Belo Horizonte inteira. Aquele trabalho de voltar com Belo Horizonte a ser aquela cidade jardim. Estamos fazendo o trabalho e pensando na licitação do paisagismo de Belo Horizonte, contratando mudas, pro sujeito não ficar repondo aquilo ali. Mudar esse conceito, um conceito de gradil nos incomoda muito, mas é uma coisa difícil, Belo Horizonte pensa muito em gradil. Por grade para tudo. A gente tem que tentar quebrar esse paradigma do gradil, isso é uma coisa pessoal, aí já não sou eu falando pela instituição, eu faço parte de um grupo que pensa assim. Na Copa das Confederações, a Praça da Liberdade tava toda gradeada. Gente, essa Praça nunca teve gradil, agora tá cheia de grade, que isso? Turista vai subir em cima da grama? E se subir também? Será que a grama não é um espaço para, a grama não faz parte desse contexto? Todo mundo senta. Eu estive em Londres que eu não conhecia, estive em setembro, primeira vez que eu estive lá, as praças todas, todo mundo sentado na grama, tomando sol. Cuida dela lá depois, não sei. Não pode é jogar uma bola, não sei, bom senso. Então, nós estamos tentando trabalhar Belo Horizonte para seja uma cidade agradável, uma cidade pedestre, revitalizando as avenidas, lutando pelos passeios. (Túlio)

O autor do discurso ainda cita um exemplo que decorreu de um grande evento esportivo na cidade, nos meses de junho e julho de 2014, quando um dos ícones culturais da cidade, a Praça da Liberdade, foi rodeada por grades. A interdiscursividade permite uma expressão relacional entre liberdade e cuidado, em que se combate a forma de ordenamento feita na praça no período da Copa das Confederações. O discurso remete à figura do turista, silenciando a possibilidade de um residente também utilizar a praça. Ao questionar se o turista vai subir na grama, subentende-se que o entrevistado acredita que o estrangeiro teria consciência da permissividade de acesso. O enunciador continua com outra indagação que inclui a grama no contexto que faz

parte da praça, sendo, portanto, compreensível sua ocupação, sem conferir um cuidado posterior (implícito pressuposto). Os léxicos todo mundo senta e bom senso corroboram e

talvez explicitem esse pensamento do entrevistado, que sugere uma comparação às vivências no espaço público na cidade de Londres.

Na contiguidade da fala expressa-se uma nova ideia para a cidade, cujos percursos abordam o discurso da qualidade de vida para as pessoas e requalificação de lugares, conforme a construção sintática cidade agradável, uma cidade pedestre, revitalizando as avenidas, lutando

pelos passeios. Outras formas de interpretação da atuação da prefeitura na orientação estética e

cívica para a cidade e os sujeitos são expressas nos discursos (037) e (038):

(037) É uma visão histórica, uma visão de preservação do patrimônio, porque a guarda municipal, que é o operador, a guarda uma das missões dela é a de preservação do patrimônio. E principalmente resgatar a história desse patrimônio. Porque, de repente, as pessoas passam na Praça Sete, mas não sabem o que é o obelisco. (Raquel)

(038) Uma questão que me deixa realmente chateada, dentro não do movimento, mas o pessoal que faz questão de não entender ou então levar a interpretação para outro lugar, que não é o nosso, a questão da higienização. Não é que é uma política higienista. Uma coisa é você acordar, sair da sua casa, e na porta da sua casa você encontrar um morador em situação de rua, que passou a noite ali, fez suas necessidades biológicas ali, que fez inclusive suas refeições ali e deixou tudo sujo, então assim, e aí? A prefeitura recebe muito telefonema pedindo para retirar, como se realmente fosse um entulho, aquele morador em situação de rua ali, mas é complicado. (Raquel)

O discurso (037) aponta para a visão histórica da cidade através da preservação do patrimônio. O implícito pressuposto é de que o resgate ou manutenção do passado possa provocar um sentimento de respeito e identificação nas pessoas, com os monumentos e espaços públicos. Já o fragmento (038) indica que existem pessoas fora do programa que fazem questão de não

entender ou então levar a interpretação para outro lugar. A falta de entendimento ou a má

interpretação é expressa pelo discurso de higienização da cidade, que, segundo o entrevistado, não corresponde com os objetivos do projeto. Para reforçar o posicionamento ideológico, segue-se com o percurso semântico sobre morador em situação de rua em Belo Horizonte, cuja sociedade demanda do poder público uma solução.

A interdiscursividade presente no texto (039) revela uma interpretação do seu enunciador acerca do discurso hegemônico e contra hegemônico relacionado à educação patrimonial, a fim de sustentar sua oposição à compreensão dessa temática. A estratégia discursiva explicita um

conceito de educação patrimonial não compartilhado pelos pichadores, que acham que o patrimônio público é feio, sujo, horroroso, que não comunica com ninguém. Nisso apreende-se

a refração de sentidos de acordo com os referenciais dos próprios pichadores, no texto expresso interdiscursivamente pela entrevistada. O quadro contextual de produção desse discurso indica aspectos de defesa e não de combate à pichação na cidade.

(039) E se assim, se a educação patrimonial, por exemplo, é igual o pessoal falou comigo lá no dia que eu apresentei numa mesa de educação patrimonial, que eles me disseram assim: “educação patrimonial é você se envolver com o patrimônio e construir sua identidade”. Bom, os pixadores estão fazendo isso, né, com isso que eles fazem: “a gente acha feio, sujo, horroroso, que não comunica com ninguém, que não é nada disso”. (Luciana)

A perspectiva higienista para a cidade é inerente à educação patrimonial e também se expressa por outros entrevistados que expõem suas percepções acerca da cidade limpa.

(040) Entendo limpeza enquanto controle, disposição dos dejetos, eu entendo limpeza enquanto saneamento, eu entendo limpeza enquanto despoluição, ou seja, controle de

poluição, exatamente por isso nós defendemos o ciclismo, eu entendo como limpeza o controle do barulho, do ruído urbano, eu entendo limpeza enquanto paisagem urbana. (Cleber)

(041) Eu entendo um formato de uma cidade mais agradável, quando eu falo na limpeza, aí eu quero até fazer um recorte, que são espaços públicos, porque eu acho que a limpeza dentro das nossas casas isso é mais do que obrigação, de você ter uma assiduidade nessa atividade doméstica. Mas no espaço público, às vezes, você embola uma bala que está chupando e joga o papel no chão. Se nós formos contrabalancear alguém que tem a coragem, não sei se eu poderia utilizar esse termo coragem, mas de chegar e pichar um espaço público, essa pessoa, no meu entendimento, é como se ela estivesse fazendo isso dentro da casa dela. Quando eu tô falando em limpeza, a minha ideia é de um lugar mais agradável para que todos possam morar, é um respeito pelo que é de todos. (Rogério)

No fragmento (040) a estrutura sintática permeia uma estratégia discursiva que associa a limpeza da cidade ao controle, disposição de dejetos, saneamento e despoluição, que se resume ao controle da poluição e à paisagem urbana. Já no texto (041) há uma ideia muito interessante que se constrói em torno da limpeza interna ou particular das casas em comparação com a limpeza dos espaços públicos. Para esse enunciador, cidade limpa refere-se ao cuidado e zelo

com os espaços públicos pela sociedade. O implícito subentendido é de que, ao picharem

determinados lugares da cidade, os pichadores estariam desrespeitando a cidade, entendida como a própria casa ou lugar de moradia de todos.

Todavia, o fragmento (042) expõe um relato da ideia de um pichador reconhecido na cidade, apresentada por outro pichador. A interdiscursividade sugere uma discussão relacionada aos limites do bem público e privado. A questão também pode se estender para a discussão acerca das intervenções individuais e coletivas no espaço público as quais expressam as formas de comunicação da dinâmica urbana. O mesmo enunciador afirma em outro trecho que a pichação

instaura um conflito e que ninguém se ilude achando que a pichação tá embelezando tudo, a cidade. O implícito pressuposto é de que até mesmo os pichadores não veem beleza na