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Trabalho docente e as novas tecnologias

Por muitos anos, a “Instituição Escola” manteve uma posição acima das questões ordinárias que norteavam o cotidiano das pessoas. Julgava-se que os pilares que sustentavam essa Instituição não poderiam ser abalados e, com isso, seu prestígio por muito tempo se manteve intacto, apesar das diversas revoluções observadas na História da Humanidade com o intuito de buscar mudanças e renovações.

Porém, nos dias de hoje, essa situação de acomodação está sendo muito questionada e sofrendo pressões que clamam por mudanças e alterações desse paradigma vigente. Com o advento das novas tecnologias, e, principalmente, das novas formas de comunicação de massa, o homem moderno ampliou enormemente suas possibilidades de aquisição de informação e também de conhecimento científico.

Se, por um lado, a educação no mundo contemporâneo ganhou importância e passou a ser mais valorizada, por outro, também entrou em um rigoroso processo avaliativo e a “Escola” deixou de ser o principal meio de informação para as novas gerações, passando a concorrer com uma gama de outros meios comunicacionais, como a Internet, a televisão, filmes, entre inúmeros outros transmissores de informações, que cada dia mais vêm concorrendo para a

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disseminação de conhecimento, papel que há muito tempo tem sido de responsabilidade exclusiva da instituição “Escola”.

Como lembra Cardoso (2001:221), “a educação nunca foi tão valorizada como agora (...), os conceitos de escola como local de aprendizado, mestre como fonte do saber, aluno como objeto do aprendizado e as tradicionais disciplinas, nunca foram tão questionados”.

Vivemos um momento de discussão de valores, redefinição de papéis, em que a figura do professor tornou-se alvo de muitas opiniões e ou críticas em relação ao sucesso ou não na aplicação de políticas educacionais.

A Escola do futuro recebe uma nova conceitualização que segundo Brunner (2004:34) é exposta da seguinte maneira:

Educação é mais do que apenas a transmissão de conhecimentos e a aquisição de competências valorizadas no mercado. Envolve valores, forja o caráter, oferece orientações, cria um horizonte de sentidos compartilhados, em suma, introduz as pessoas numa ordem moral. Por isso mesmo, também deve dar conta das transformações que experimenta o contexto cultural...

Observamos que um novo conceito de Escola pressupõe um novo conceito também de professor, profissional esse que deverá ser capaz de colocar em prática as inúmeras mudanças sugeridas por uma Revolução Tecnológica que rapidamente se instaurou no cotidiano das pessoas: um professor atualizado e consciente de seu papel nesse novo modelo de educação. Mas, perguntamo-nos: “Qual será o perfil desse profissional?”; “Como seria a formação desse professor capacitado a trabalhar com as NTIC?”

Érnica (2004:108)coloca que o trabalho do professor atualmente pode ser entendido como “um processo de organização do meio social no qual se dará o aprendizado dos alunos”. O autor esclarece que isso ocorre no quadro de uma

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atividade social mais ampla e no contexto de uma instituição social voltada especificamente para desenvolver esse trabalho, sendo que uma quantidade muito grande de discursos (prescrições diretas ou indiretas) contribui para configurar a situação de trabalho desse professor, o que, segundo o autor, gera uma série de tensões e necessidade de negociação de sentidos. A esse respeito, Érnica (2004:109) ainda define esse novo professor sendo:

Um determinado agente [que] realiza um conjunto de ações que têm por objetivo transformar em uma direção socialmente desejada o conjunto de processos psíquicos de outro agente – isto é, seus modos de pensar, falar, de perceber, de fazer – por meio da mediação de um conjunto complexo de ferramentas sócio- historicamente construído, que permitiria a transformação dos processos naturais de desenvolvimento.

O trabalho do professor e as relações que ele mantém com o universo do conhecimento humano, recentemente, têm se configurado como tema para o desenvolvimento de muitos trabalhos de pesquisa que visam a compreender esse delicado processo. Saujat (2004), a esse respeito, acrescenta que a eficácia das práticas educacionais tem se apresentado como uma preocupação tanto para a pesquisa em educação como para as políticas escolares, ou ainda para a formação de professores.

O autor também observa que, no panorama dessas pesquisas sobre o ensino podemos observar as abordagens recenseadas focando ora o professor eficaz na relação entre processo-produto (comportamento dos professores visto como processo e aprendizagem dos alunos como produto) - aqui o professor é apresentado como um “ator racional”, ora como sujeito cognitivo ou como prático reflexivo (estudo sobre o modo como refletem), ou ainda segundo um enfoque mais recente, que

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prioriza as práticas do professor em contexto, buscando fugir de uma visão a-histórica de estudos anteriores.

Observa-se uma negligência em relação a uma análise capaz de analisar o ensino como trabalho sob uma abordagem ergonômica. Saujat (2004:19), a esse respeito afirma: “ser o ensino o trabalho mais estudado atualmente”, entretanto, o autor também acrescenta que: “ainda não sabemos quase nada do ensino como trabalho”.

Nota-se que a questão é bastante ampla e ainda precisa de muitos olhares. Olhares esses, capazes de compreender as diversas instâncias envolvidas quando o assunto em discussão é a eficácia das práticas educacionais.

Além das questões que envolvem o trabalho do professor, também à formação de professores, se apresenta com dificuldades aparentes. Atualmente a formação desses profissionais tem recebido uma atenção especial e passa por um processo de contestação em virtude das novas exigências apresentadas a esse grupo de trabalhadores. A esse respeito Almeida (2000b: 111) acrescenta que um ponto importante na formação de professores na atualidade a ser observado é:

É preciso valorizar os saberes e as práticas dos professores e trabalhar os aspectos teóricos e conceituais implícitos. Muitas vezes desconhecidos por eles, além de instituir conexões entre o saber pedagógico e o saber científico.

É possível constatar que são muitas as opiniões a respeito de como estudar a formação do professor, ou até mesmo em relação ao perfil que deverá ser assumido por esse profissional na atualidade. Entretanto, todas parecem concordar que o conceito de professor, usado no passado, como o detentor absoluto de conhecimento, aquele ser supremo que magnanimamente distribuía seu conhecimento a seus alunos, não cabe mais nesta nova realidade. Segundo Valente (1993:6):

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o professor precisa deixar de ser o repassador de conhecimento – o computador pode fazer isso e o faz muito mais eficientemente do que o professor – e passar a ser o criador de ambientes de aprendizagem e o facilitador do processo de desenvolvimento intelectual do aluno.

Nesse momento de transição, encontramos o professor em uma situação nada cômoda, buscando o seu lugar nesse emaranhado de indicações, prescrições e caminhos a serem seguidos.

De um lado, as instituições governamentais atribuem ao professor o ônus pelo fracasso observado no sistema educacional, responsabilizando-o até mesmo por esferas que não estão sob seu alcance. De outro lado, observamos, por parte das instituições de Ensino Superior, a apresentação de um processo de formação deficiente que não é capaz de preparar esse professor para enfrentar tantas inovações.

Retornando nosso olhar aos aspectos que envolvem às avaliações que o trabalho do professor vem recebendo atualmente Amigues (2004:38), destaca que “os valores desse trabalho não são atribuídos pelas próprias pessoas que exercem o ofício, mas por pessoas que se acham fora dele; e geralmente as ações dos professores são submetidas a críticas repetitivas”. O autor coloca que essas críticas alegam que aquilo que o professor faz não corresponde ao que deveria ter sido feito, que esse profissional se utiliza de meios diferentes dos que deveria usar, entre outras coisas.

Com isso, é necessário, a nosso ver, um aprofundado processo de reflexão em torno das questões que envolvem a problemática e a correta distribuição das responsabilidades, não podendo o professor arcar sozinho com todo o déficit desse processo.

É preciso ter consciência de que o universo de trabalho do professor na atualidade vai muito além do trabalho que ele realiza em sala de aula e que este é um processo que se apresenta de forma complexa e de difícil constatação.

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Recorremos, para a análise deste aspecto, aos conceitos da Ergonomia Francesa, quando esta faz a distinção entre trabalho prescrito e trabalho realizado. Ainda a compreensão do conceito de trabalho real desenvolvido por Clot (1999) e Faïta, Fernandez & Scheller (2001), se fará necessária para melhor estudar esse ofício. Também recorremos ao que apresenta Lousada (2004) a respeito do assunto.

Acreditamos que um estudo mais aprofundado nos conceitos de trabalho prescrito, realizado e real nos levará a analisar melhor a amplitude dos afazeres de um professor e as principais dificuldades enfrentadas por ele na tentativa de cumprir uma tarefa prescrita, uma vez que, a todo o momento esse trabalho pode sofrer as mais diversas interferências.

Estes aspectos serão apresentados em nosso próximo capítulo.

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