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Antes de tratar sobre a concorrência desleal, há necessidade em abordar a explicação do tema Trade Dress.

O conceito de trade dress surgiu nos Estados Unidos. Já no Brasil, a doutrina o define como "conjunto-imagem" ou "roupagem externa" ou ainda

"embalagem" do produto ou bem. Trata-se, portanto, da percepção visual externada por um determinado bem no mercado consumidor, de forma suficientemente peculiar e distintiva, e que, por isso, goza de proteção jurídica autônoma e independente dos preceitos da Propriedade Intelectual. Infelizmente o tema não decorre de previsão legal expressa, pelo que a sua violação está ligada à construção doutrinária e jurisprudencial, e a sua conclusão decorrerá de exame do caso concreto.

Historicamente, a jurisprudência nacional em torno do tema se mostrava extremamente pulverizada, o que fazia com que a pretensão jurídica de tutela ao trade dress fosse, muitas vezes, equiparada a um jogo de sorte e azar, pois o fator dependia justamente do caso a caso.

Trade dress pode ser definido como uma forma de apresentação, composta principalmente por elementos visuais (mas que comporta elementos de outra natureza), que pode ser aposta a uma variada gama de objetos e que irá permitir ao consumidor identificar a origem do produto ou serviço por ela assinalada.

Para tal a noção de trade dress está inevitavelmente associada a um complexo de elementos, que, quando combinados, formam um todo distintivo capaz de gerar apresentação apta a permitir que o consumidor identifique determinada empresa, produto ou serviço.

Neste sentido o trade dress consiste num conjunto de características sejam elas cores, forma, embalagem, configuração do produto, frases, disposição, estilização e tamanho de letras, gráficos, desenhos, emblemas, brasões, texturas e enfeites ou ornamentos, capazes de identificar determinado produto ou diferenciá-lo dos demais pelo simples conjunto-imagem.

Complementando, a definição acima vale menção ao conceito de José Carlos Tinoco Soares:

(...) ‘Trade dress’ e/ou ‘Conjunto-Imagem’, para nós é a exteriorização do objeto, do produto ou sua embalagem, é a maneira peculiar pela qual se apresenta e se torna conhecido. É pura e simplesmente a ‘vestimenta’, e/ou o ‘uniforme’, isto é, um traço peculiar, uma roupagem ou a maneira particular de alguma coisa se apresentar ao mercado consumidor ou diante dos usuários com habitualidade. Na generalidade da expressão ‘alguma coisa’ pode-se incluir mas, logicamente, não limitar Às marcas figurativas ou mistas; tridimensionais; a todos os objetos que foram ou não suscetíveis de patentes, mas que se apresentam mediante uma forma de exteriorização característica; a toda e qualquer forma de produto ou de sua embalagem, desde que constituída de características particulares; a toda e qualquer decoração interna ou externa de estabelecimentos; a toda e qualquer publicidade desde que elaborada e apresentada com particularidades a torne conhecida como procedente de uma determinada origem. Por todos esses e muitos outros elementos e componentes, o

‘trade dress’ nada mais é do que aquilo que já denominamos, desde há muito, ou seja, o CONJUNTO- IMAGEM”23.

Portanto o trade dress é uma forma de apresentação de um produto ou serviço que normalmente é utilizada em embalagens de produtos, no layout de estabelecimentos, mas que também pode ser encontrada em sites da internet e nas formas mais inusitadas de apresentação e divulgação de um produto ou serviço. Vale ainda observar que essa forma de apresentação consiste no resultado do conjunto de uma série de elementos comuns, que reunidos em um único objeto, ganharão (em tese) uma apresentação única e distintiva, ou seja, sinais visualmente perceptível que vão caracterizar um produto ou serviço, embora não tenha previsão legal no ordenamento jurídico ele é protegido através da repressão da concorrência desleal.

Assim, elementos de uso comum, como cores, formatos de embalagens ou estabelecimentos, imagens, formas de atendimento ao cliente etc., quando aglutinados e dispostos de determinada maneira, ganharão uma apresentação capaz de permitir que o consumidor a reconheça e identifique que os produtos ou serviços assinalados por aquela mesma apresentação visual são da mesma origem.

Luiz Edgard Montaury Pimenta e Marianna Furtado de Mendonça explicitam melhor essa relação entre o trade dress e o público consumidor:

23TINOCO SOARES, José Carlos.“Concorrência Desleal Vs. Trade Dress ou Conjunto-Imagem”

- São Paulo: Edição Tinoco Soares, São Paulo, 2004, p. 213.

‘’O conjunto-imagem normalmente reúne características tão singulares que consegue identificar o público-consumidor, de forma imediata, a qual produto ou estabelecimento o mesmo se refere. Tais características mantêm tamanha relação entre produtos/serviços e clientela que é capaz de exercer forte influência no público, fazendo com que os consumidores associam, até de forma inconsciente, a qualidade dos produtos e serviços a tais características’’.24

A jurisprudência, contudo, tem se encarregado de combater eventuais violações ao conjunto-imagem. A referida proteção tem sido garantia fundamentada no artigo 5º, inciso XXIX, da Constituição Federal:

‘’a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País’’

A violação ao trade dress é configurada quando uma empresa/marca diversa copia ou imita os signos distintivos de outra empresa, produto ou serviço, com o objetivo de obter vantagem em relação ao público consumidor.

Para que se configure a imitação, não é necessário que seja feito uma cópia fiel ou muito parecida, bastando a capacidade de o produto gerar confusão ao consumidor médio, induzindo-o a erro, faz-se à forte identidade entre as características e qualidade do produto e da marca contrafator”

Em dezembro de 2018, a quarta turma do STJ julgou o REsp. 1778.910/SP, e sob a relatoria da min. Maria Isabel Gallotti, concluiu que o conjunto-imagem é complexo e formado por diversos elementos. Dados a ausência de tipificação legal e o fato de não ser passível de registro, a ocorrência de imitação e a conclusão pela concorrência desleal deve ser feita caso a caso. Imprescindível, para tanto, o auxílio de perito que possa avaliar aspectos de mercado, hábitos de consumo, técnicas de propaganda e marketing, o grau de atenção do consumidor comum ou típico do produto em questão, a época em que o produto foi lançado no mercado, bem como outros elementos que confiram identidade à apresentação do produto

24MONTAURY, Luiz Edgard e MENDONÇA, Marianna Furtado.Trade Dress e a Tutela dos Websites, Revista da ABPI nº 100, de mai/jun de 2009. pg.20

ou serviço".

No acórdão, a ministra faz remissão às "sutilezas que podem separar a concorrência desleal da legítima prática competitiva, e cita o acórdão da Terceira Turma da Corte proferido em caso paradigmático (REsp 1591.294/PR)25, em que o ministro Marco Aurélio Bellizze ressalta que:

‘’(...) para se caracterizar uma atitude anticompetitiva ou desleal e imprescindível que a situação concreta demonstra um comportamento imprevisível aos olhos do mercado, o que não se pode reconhecer quando se utiliza elementos comuns, partilhados por uma multiplicidade de concorrentes no mesmo nicho do mercado.’’

Como constou no REsp. 1.353-451/MG26:

Por não ser sujeito a registro - ato atributivo do direito de exploração exclusiva - sua proteção não pode servir para ampliar direito que seria devido mediante registro, de modo que não será suficiente o confronto de marca a marca para caracterizar a similaridade notória e presumir o risco de confusão.

Vale dizer, a jurisprudência do STJ tem repetidamente entendido que, para o exame de violação ao trade dress, não basta a demonstração de similaridade notória e a presunção do risco de confusão do consumidor.

26BRASIL. Resp. Nº 1.353.451/MG, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma do STJ, por unanimidade, Brasília, 19 de setembro de 2017.

25 BRASIL.Resp. Nº 1.591.294/PR, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma do STJ, por unanimidade, Brasília, 06 de março de 2018.

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