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2 HISTÓRIA E FILOSOFIA DA CIÊNCIA: ENSINO E APRENDIZAGEM

2.4 Aprendizagem significativa: conceitos básicos e modelo de ensino decorrente

3.1.2 A tradição empirista

O termo Empirismo é muito utilizado nas discussões relacionadas ao processo de construção da Ciência, estando relacionado ao pressuposto de que a fonte do conhecimento encontra-se fora do homem, externamente; nesta condição ele deve ser buscado ou descoberto. Chaui (1997) considera que a concepção empirista inicia-se na medicina grega e em Aristóteles, indo até o final do século XIX. O termo Empirismo origina-se da palavra grega “empeiria”, que significa experiência, afirmando que a razão, incluindo seus princípios, procedimentos e idéias é adquirida através da experiência. O conhecimento, portanto, procede da experiência.

Entre os mais importantes representantes do Empirismo tem-se os ingleses Bacon, Hobbes, Locke, Berkeley e Hume. No trabalho do empirista Francis Bacon

(1561-1626) temos uma das principais origens desta doutrina filosófica. Ele divulgou o método experimental indutivo e foi um pioneiro na tentativa de sistematização lógica dos procedimentos científicos. Bacon considerava que, para que o conhecimento pudesse ser colocado a serviço do homem, deveria estar fundamentado em fatos, numa ampla base de observação. Neste período, a atitude científica tomava como base que, para se compreender a natureza deveria se consultar a própria natureza e não o que tinha sido escrito por “autoridades”, a exemplo de importantes filósofos gregos que influenciaram a ciência durante o período medieval.

Bacon foi um crítico tanto do método dedutivo e apriorístico característico da Escolástica, quanto da grande atenção dedicada à teoria em detrimento à ‘observação’ que caracterizou os filósofos gregos. Ele considerava a experiência como principal fonte de conhecimento que poderia ser alcançado pela via empírica e não pela especulativa (ANDERY et al., 1988; CHALMERS, 1995).

Só há e só pode haver duas vias para a investigação e para a descoberta da verdade. Uma, que consiste no saltar-se das sensações e das coisas particulares aos axiomas gerais e, a seguir, descobrirem-se os axiomas intermediários a partir desses princípios e da sua inamovível verdade. Esta é a que ora se segue. A outra, que recolhe os axiomas dos dados dos sentidos e particulares, ascendendo contínua e gradualmente até alcançar, em último lugar, os princípios de máxima generalidade. Este é o verdadeiro caminho, porém ainda não instaurado (BACON, 1984, p.16).

No trecho anteriormente citado, Bacon compara o método que costumava ser utilizado nas ciências com a sua nova proposta metodológica, conhecida como método indutivo, o que justifica o fato dele ser geralmente associado ao empirismo-indutivismo. A indução pressupõe o raciocínio indutivo que parte de um conjunto de fatos particulares para uma conclusão geral, ou seja, vai dos fatos à lei. Nesta visão, toma-se

como ponto de partida a observação, para a posterior elaboração de hipóteses seguida de experimentos, que levarão às conclusões. Segundo Chalmers (1995), as afirmações obtidas ou as “proposições de observações” formam a base a partir da qual as leis e teorias devem ser derivadas.

Para outro empirista, John Locke (1632-1704), nada existe no espírito sem passar antes pelos sentidos. A alma, no momento do nascimento, é como uma “tábula rasa”, um grande vazio. A experiência sensível constitui a fonte de todo o conhecimento possível, sendo capaz de suprir a mente com novos conhecimentos, tendo a reflexão um importante papel a desempenhar neste processo (ANDERY et al., 1988).

Outro importante representante do empirismo foi o filósofo escocês David Hume (1711-1776), que se destacou por argumentar contra a indução. A relação de Hume com o empirismo é observada em sua preocupação em discutir e criticar a fonte do conhecimento humano que, para ele, encontrava-se na percepção. A sua principal tese era que toda percepção da mente se resolve em dois tipos distintos: impressões e idéias (HUME, 1962 apud ANDERY et al., 1988, p.316). As impressões representam os objetos imediatos do conhecimento adquirido através da experiência, percebidos e internalizados. As impressões são as nossas sensações quando vivenciamos algo. As idéias baseiam-se e provêm das impressões, mas não devem ser confundidas umas com as outras porque são menos vivas. Elas representam os objetos que temos conhecimento através da atividade mental, são os nossos pensamentos. Para Hume, qualquer pensamento tem na sua base uma impressão (ANDERY et al., 1988).

Podemos, pois, dividir aqui todas as percepções da mente em duas classes ou espécies, as quais se distinguem pelos seus diferentes graus de força ou vivacidade. As menos fortes ou vivazes são comumente denominadas pensamentos ou idéias. A outra espécie

não tem nome em nossa língua, como em muitas outras, suponho que por não ser necessário para nenhum fim que não fosse filosófico incluí-las sob um termo ou designação geral. Tomemos, pois, uma pequena liberdade e chamemo-las impressões, usando a palavra num sentido algo diferente do usual. Pelo termo impressão entendo todas as nossas percepções mais vivazes, quando ouvimos, vemos, sentimos, amamos, odiamos, desejamos ou queremos. E as impressões distinguem-se das idéias, que são as impressões menos vivazes das quais temos consciência quando refletimos sobre qualquer dessas sensações ou movimentos acima mencionados (HUME, 1973, p. 138).

Para Andery e outros (1988), uma dificuldade relacionada com esta tese referia- se à conexão racional entre as impressões, sem as quais leis científicas universais não podiam ser aceitas. Este problema permaneceu sem solução até o século XX, quando a lógica simbólica se desenvolveu.

A crença no indutivismo está relacionada à observação dos fenômenos, constantemente presente no trabalho científico. Aceita-se que o conhecimento surge de observação desinteressada da natureza. Um dos maiores problemas é a sua justificação que, simultaneamente, parte da indução como premissa e admite que a constatação de regularidades possibilitaria a elaboração posterior de leis e teorias.

De modo geral, as epistemologias tradicionais do tipo empirista-indutivista consideram que o conhecimento deriva direta ou indiretamente da experiência sensível através da observação. O método científico possibilita a obtenção de um conhecimento certo e seguro, não existindo espaço para a especulação, a imaginação, a intuição e a criatividade. As teorias não são inventadas ou construídas, mas descobertas a partir da manipulação e apropriação dos dados empíricos.

Distintas visões de empirismo surgiram ao longo do tempo, no entanto, talvez uma das características mais nítidas preconizadas por tais concepções consista na crítica diante de concepções metafísicas veiculadas em seu tempo. As argumentações elaboradas pelos empiristas, contrariamente às pretensões metafísicas, priorizavam

dois pontos: a existência de certos limites à demanda de explicações e a não admissão de explicações “postulacionais” (BUENO, 1999). Concepções mais sofisticadas sobre o empirismo foram formuladas posteriormente, a exemplo do empirismo construtivo de Van Frassen. Esta concepção considera que as teorias são modelos e representam mais do que instrumentos, quando a elas se atribui valor real. Para o empirismo construtivo é fundamental que haja distinção entre verdade e adequação empírica. Em relação a este assunto, Dutra (1998) apresenta a seguinte explicação:

[...] as teorias precisam dar conta dos fenômenos, daquilo que observamos, e para tanto postulam entidades inobserváveis, como no caso de uma teoria atômica que explica as qualidades aparentes diferentes de duas substâncias com base na hipótese de que elas possuem números atômicos diferentes. Mas sendo empiricamente adequada, uma teoria não precisa ser também verdadeira. Não é preciso que ela faça um relato exato do mundo, inclusive e principalmente de seus aspectos inobserváveis, e nem é preciso que se acredite que as entidades inobserváveis postuladas pela teoria existem (DUTRA, 1998, p.35).

O empirismo construtivo reconhece a importância a ser dada à interpretação de cada teoria científica e dos componentes teóricos da ciência para que se possa ter uma melhor compreensão do conhecimento científico.