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Tradução e interpretação: diferentes processos

3 Tradução e Interpretação: algumas considerações

3.1 Tradução e interpretação: diferentes processos

Para alguns autores, um procedimento complementa o outro, e, de certo modo, submetem-se à mesma tarefa. Consoante leciona Lacerda (2009), tanto a tradução quanto a interpretação objetivam versar os conteúdos de uma dada Língua para outra, buscando trazer, nestes processos, os sentidos pretendidos, sem que eles se percam ou que sejam distorcidos no percurso. Theodor (1976), Silveira (2004), Quadros (2004), dentre outros autores, colocam que, o mais importante numa tradução é não se ater a palavras32. Todavia, o que se propõe como fundamental é retomar aos sentidos propostos pelo locutor/enunciador na Língua/fonte,

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A sigla Ils ou ILS significa Intérprete de Língua de sinais: este termo aparecerá, no decorrer do texto, quando se refere a este profissional.

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e ocupar-se, para que esses sentidos cheguem para o receptor na Língua alvo. (LACERDA, 2009).

Outros pesquisadores argumentam que, os conceitos de tradução e interpretação possuem tarefas distintas. A tradução estaria relacionada à forma escrita. Ao versar, nesta modalidade, de uma Língua para outra, o tradutor teria tempo de ler, refletir sobre as palavras usadas e os sentidos envolvidos, e poderia utilizar material de consulta, buscando uma aproximação de sentidos de maneira mais adequada. Entretanto, quando se refere à interpretação, percebe-se uma ligação entre o transpor de uma Língua para outra, no momento em que acontecem as relações interpessoais33, sempre na perspectiva da simultaneidade, num curto espaço de tempo entre a enunciação34 e o ato de dar ao outro o acesso do que foi dito.

Tendo como base o que foi exposto, entende-se que, ao tratar sobre a modalidade escrita das Línguas, isto se refere à tradução ou ao tradutor. E, por este mesmo viés, ao se falar sobre modalidades orais das Línguas, refere-se à interpretação, ou, ainda, ao profissional intérprete.

A Língua de sinais, que é uma Língua viso-gestual, está envolvida neste processo, possuindo um sistema de escrita que, ainda, não é utilizado por todos os surdos. Ou seja, tem- se a Língua de sinais, uma Língua que não é oral, em que, seu sistema de escrita não é do conhecimento de todos. Apesar dos aspectos ora abordados, sobre a modalidade das Línguas de sinais e da sua maneira de registro, Quadros & Karnopp (2004), inferem que, para a linguística das Línguas de sinais, tanto no Brasil quanto no mundo, existe uma equivalência entre estas e as Línguas orais.

Em linhas gerais, de acordo com Tuxi (2009), “o tradutor intérprete de Língua de sinais pode ser entendido como uma pessoa que traduz e interpreta a Língua de sinais para a Língua falada, e vice-versa, em quaisquer modalidades que se apresentar (oral ou escrita)”.

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Relações interpessoais são todos os contatos entre pessoas. Nesse âmbito, encontra-se um infindável número de variáveis como: sujeitos, circunstâncias, espaços, local, cultura, desenvolvimento tecnológico, educação e época. As relações interpessoais ocorrem em todos os meios, no meio familiar, educacional, social, institucional, profissional; e estão ligadas aos resultados finais de harmonia, avanço, e progressos ou nas estagnações, agressão ou alienamento. (Disponível em: <http://educar-paraobem-estar.blogspot.com.br/p/relacoes-interpessoais.html>. Acesso em: 9 fev. 2013).

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A enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados. A palavra dirige-se a um interlocutor real e variará em função desse: em relação ao grupo social a que ele pertence, aos laços sociais, etc. Não pode haver interlocutor abstrato, pois não se teria linguagem com tal interlocutor, mesmo, no sentido figurado. A enunciação é de natureza social, e, para compreendê-la, é necessário entender que ela acontece, sempre, numa interação. A verdadeira substância da Língua é constituída, para Bakhtin, “pelo fenômeno social da interação verbal, realizada por meio da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui, assim, a realidade fundamental da Língua” (BAKTIN, 1992, p.123).

Entretanto, cotidianamente, os conceitos de traduzir e interpretar são confundidos. Deste modo, é necessário, constantemente, diferenciar estes dois conceitos, elucidando a atuação dos profissionais que exercem citadas atividades.

Para o pesquisador Frishberg (1990), dois pontos básicos diferem a tradução da interpretação. O autor descreve que, a tradução pertine à tradução de mensagem escrita de uma Língua para a outra. Em contrapartida, a interpretação refere-se ao ato de interpretar, de forma imediata, uma mensagem produzida de uma Língua para a outra. Na interpretação, a Língua pode ser oral ou sinalizada. Em suma, uma interpretação é configurada pelo fator tempo, pois, esta é feita de forma imediata e ao vivo.

A diferença entre tradução e interpretação pode ser percebida de maneira nítida, através do quadro comparativo entre as duas modalidades, apresentado por Tuxi (2009), conforme observa-se no quadro 1.

Quadro 1 - Comparativo entre Tradutores e Intérpretes.

TRADUTORES INTÉRPRETES

- podem checar seu trabalho consigo mesmo ou com assistente de tradução, pois, têm o texto, permanentemente, à sua disposição; - podem se reportar, constantemente, ao texto fonte para traduzir, tendo a opção de poder retornar às partes já traduzidas, em qualquer tempo, visto que, o texto e a tradução são escritos;

- podem fazer uso de materiais, tais como, dicionários diversos, revendo a tradução, constantemente, e fazendo correções;

- não são pressionados pelo tempo, na busca do sentido linguístico para a equivalência da mensagem;

- dificilmente, ou nunca, encontram-se com o autor do texto/fonte para dirimir dúvidas, de qualquer tipo.

- tomam decisões mais rápidas em relação ao significado do texto, sem, às vezes, saber a intenção do autor ou o significado, antecipadamente;

- têm a opção de perguntar, diretamente, à fonte, quando imagina que cometeu erros ou quer esclarecer uma informação, antecipadamente;

- não podem voltar atrás em partes do discurso, e, raramente, podem incorporar feedback de outros, ou rever o trabalho, antes do conhecimento do público; - não podem fazer uso de materiais, como dicionários;

- são limitados pelo fator tempo, na busca pelo sentido equivalente da mensagem.

Fonte: TUXI (2009, p.13 apud COKELY, 1992, p. 16).

Partindo desta diferenciação, proposta por Tuxi (2009, apud COKELY, 1992), torna-se evidente que, a atuação do intérprete é imediata e solitária, dependendo, de forma exclusiva, daquele momento, sem nenhuma possibilidade de correção antes do receptor tomar

posse da mensagem. Posteriormente, distinguir-se-á a interpretação consecutiva da interpretação simultânea.

Uma das principais diferenças entre a figura do tradutor e a do intérprete é que, este último é uma figura visível (TUXI, 2009, p.14), pois a interpretação demanda a presença física de um intérprete. E, na Língua de sinais é necessária a expressão de pontos, como a entonação e a postura, no momento da sinalização.

O ILS viabiliza a comunicação entre os surdos e os ouvintes, identificando-se com o orador, exprimindo-se na primeira pessoa, sinalizando e representando suas ideias e convicções, buscando imprimir-lhe similar intensidade e mesmas sutilezas que as dos enunciados em português oral (TUXI, 2009, p. 14 apud ROSA, 2006, p. 80).

O intérprete quase sempre mede as relações entre surdos e ouvintes, envolvendo a fala e a sinalização, em tempo real. Nessa tarefa, não há possibilidade de pausa, reelaboração de frases mais apropriadas, tanto na sinalização quanto na versão-voz do que está sendo dito, tornando o trabalho bastante cansativo, quando se estende por mais de uma hora.

Plazas, (2000), “descreve a posição do intérprete como de potencial conflito, na qual o intérprete deve trabalhar sob pressão de tempo, tensão mental e possível fadiga, enquanto toma decisões rápidas.” 35.

A partir desta visão, reflete-se sobre a atuação dos intérpretes de Libras em ambientes educacionais, onde não há possibilidade de substituição durante a interpretação das aulas. Passa-se a refletir, ainda, que, após duas ou três horas de interpretação, o nível da sinalização, ou seja, a sua qualidade tende a diminuir gradativamente, o que pode levar o aluno surdo a ser prejudicado, dificultando a sua compreensão no todo ou em parte do conteúdo, que está sendo repassado, através do intérprete.