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Trajetória da Educação Física Escolar – Breve Histórico

CAPÍTULO 1 ESCOLA E AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA

1.2 Trajetória da Educação Física Escolar – Breve Histórico

A Educação Física no Brasil tem sua história marcada desde a época do Império. No intuito de assegurar os objetivos da expansão e ocupação do território, em 1814 foram lançados os fundamentos de o ensino militar com a criação da Academia Real Militar/ARM constituída basicamente por lusitanos e alguns imigrantes. Em linhas gerais o

conhecimento histórico sobre a Educação Física, tem mostrado que os movimentos ginásticos europeus chegaram ao Brasil através destas organizações rudimentares das forças militares.

Rui Barbosa já em 1882, em sua “Reforma do Ensino”, aconselhava sessões regulares de ginástica na escola, assegurando que traria benefícios orgânicos, morais, educativos e higiênicos para alunos de ambos os sexos.

De acordo com Soares (1994), em 1907 chegou ao Brasil a ginástica francesa, sendo implantada oficialmente as Forças Armadas/FA em 21 de abril de 1921, através do Decreto nº 14784 e em 1929 o Ministério da Guerra/MG elaborou um anteprojeto de lei assegurando a prática da Educação Física para todos os cidadãos brasileiros, colocando em evidência o modelo francês de ginástica em todo o território nacional, principalmente nas escolas. Perez Gallardo (2004, p. 17) afirma que:

Com a criação da primeira escola de formação de instrutores de Educação Física (Escola de Educação Física da Força Policial do Estado de São Paulo, 1907) e logo após, em 1922, com a criação do Centro Militar de Educação Física, passou-se a contratar militares para serem professores/instrutores de ginásticas nas escolas. [...] Temos assim, uma Educação Física militarista, onde se destaca o adestramento físico como maneira de preparar o aluno ao cumprimento dos seus deveres para a defesa da nação [..].

Realizamos uma retrospectiva na história da Educação Física no Brasil, com o objetivo de mostrar a importância dessa disciplina para o país. Como ponto de partida, estabelecemos a década de 1930, pois esta época marcou o inicio de nossa industrialização. O Estado Novo instituído no governo de Getúlio Vargas proporcionou o desenvolvimento da economia, antes centrada no setor agrário e rural, para o setor industrial e urbano, ocasionando mudanças significativas no modo de vida social, político e econômico do país.

A Educação Física contribuiu significativamente para que essas mudanças pudessem alcançar seu apogeu, auxiliando na reconstrução da eugenia, através do aperfeiçoamento físico e mental da nação, na formação moral de corpos dóceis (FOUCAULT, 2001a), no processo de industrialização e também com o propósito de realizar uma educação do corpo e da mente do aluno, tendo uma grande semelhança com o surgimento da escola e do processo que marcou a implantação da formação educacional, mantendo novamente o Estado (PONCE, 2005) à frente das reformas como o criador e mantenedor da Educação Física,

principalmente para as classes populares, pois a intenção era preparar os alunos para o mercado de trabalho e o cidadão para atuar nas forças armadas.

O Brasil seguiu o exemplo de outros países, como a França, (FOUCAULT, 1979) que desde o século XIX já propunha no currículo da Educação Física no campo da educação o uso do corpo para a força de trabalho. Perez Gallardo (2004, p. 16) afirma que o “final do século XIX e o inicio do século XX foram marcados por uma transição da sociedade brasileira: de uma formação social escravista para uma formação social capitalista”.

De acordo com Sarup (1980) o crescimento das atividades físicas e lúdicas no século XIX e no inicio do século XX, ocorreu devido ao crescimento urbano motivado pelo processo de industrialização, em conexão com as políticas públicas estabelecidas pelo Estado. Nesta época as teorias de Taylor e Ford para aumentar a produção da indústria, através da produtividade, associada ao devido uso do tempo, do movimento, da força, do ritmo, da velocidade, da carga, e da motivação, tudo sob a centralização do conhecimento e do poder de um administrador, com o objetivo de se conseguir maior produtividade na indústria, teve grande repercussão na Educação Física.

De acordo com Ramos (1995); Brasil (1987); Castellani Filho (1988); Ghiraldelli Junior (1992) e Grando (1992), a Educação Física sempre esteve fortemente atrelada às influências político-governamentais. Para eles há uma grande ligação entre o modo como se realiza a produção no taylorismo e a atuação do professor de Educação Física. Portanto, quando ele corrige os erros de seus alunos, exerce função idêntica do administrador de empresa que gerencia seus subordinados, exigindo maior produção e ritmo, estabelecendo uma intima relação entre o trabalho intelectual e manual, associando a produção estabelecida numa indústria com o processo desenvolvido na escola, pois nos dois casos há manipulação do ser humano com a finalidade de se obter maior produtividade. A diferença é que na escola os administradores e professores são os detentores do poder. Perez Gallardo (2004, p. 19) afirma que:

Na Escola, ou seja, no sistema oficial de ensino, a Educação Física destinava-se aos cuidados da preparação de mão-de-obra adestrada e capitalista.

“Essa maneira mecânica-utilitarista de pensar o corpo (do trabalhador), como homem- máquina, o operário-robô de fácil condicionamento, serviu como base de sustentação ideológica do pensamento burguês na Educação Física.

A Educação Física em quase todos os outros países se desenvolveu sob duas vertentes: a médica-higienista e a militar. O Brasil seguiu o exemplo destes países, pois com este conceito acreditava-se que haveria uma contribuição para a saúde, associada à higiene e formação do caráter, sendo amplamente aceito pela sociedade e principalmente pela escola.

Nas décadas de 1930 e 1940, de acordo com Bercito (1991) e Faria Junior (1987), com a consolidação do Estado Autoritário, na era Vargas, a Educação Física ocupou destaque preponderante, pois era proposta a idéia de “Nação Forte”, cujo objetivo era formar laços de patriotismo e acelerar o progresso geral do país. Foram estabelecidas políticas públicas para a prática de Educação Física, como instrumento de soerguimento do Estado e do povo brasileiro e uma forma de preparar o trabalhador nos moldes tayloristas com o objetivo de controle e domesticação para o serviço da indústria.

Desde 1939, quando foi instituída a primeira escola civil de formação no Brasil, o profissional em Educação Física ocupa lugar de destaque. (OLIVEIRA, 1994). Várias mudanças já ocorreram nestes 69 anos de história, sendo que as mais significativas aconteceram a partir da década de 1980, após a queda do regime militar, que abordaremos mais à frente.

A Constituição de 1934 pressionou e obrigou o Estado para que criasse políticas públicas e gratuidade de ensino. Já a Carta Magna de 1937, escrita pelo Estado Novo, tirou esses direitos desobrigando o Estado de fornecer educação pública e gratuita às classes populares, determinando a obrigatoriedade da Educação Física, elaborada no Plano Nacional de Educação, em todas as escolas, no ensino primário e secundário, de tal forma que o estabelecimento que não seguisse esta legislação seria impedido de funcionar. Perez Gallardo (2004, p. 18) fazendo um comentário sobre as aulas de Educação Física ministradas nesse período, afirma que:

As aulas começaram a ser preparadas, separando-se meninos de meninas, pois para cada sexo os objetivos eram diferentes: homens produtivos, fortes e futuros militares; mulheres feminis e reprodutoras de filhos, futuras donas de casa. Evidentemente, esse entendimento não valia para os filhos da classe dominante, que viam a Educação Física como lazer, preenchimento do ócio e do tempo livre.

A Educação Física Escolar passou a ocupar destaque significativo assegurando à mesma condições de especializar e treinar mão-de-obra tão necessária para o crescimento da indústria e possibilitando o desenvolvimento econômico e político da nação. No entanto, com o

fim da II Guerra Mundial, surge a Educação Física Esportiva, passando a exercer o papel de práticas desportivas de rendimento e a psicomotricidade que busca, através de jogos de movimento e exercícios o desenvolvimento integral do corpo. Conforme Perez Gallardo (2004, p. 18) afirma,

Ao submeter o aluno às mesmas coações que sofre o operário-robô, apoiando-se nos estudos da biomecânica, a Educação Física lança mão, com forte influência norte- americana, de uma forma (atividade) em franca expansão após a Segunda Guerra, capaz de promover o desenvolvimento do homem necessário ao capitalismo emergente: a prática físico-esportiva. A fase pós-guerra foi propícia para o esporte, pois estavam em desenvolvimento as indústrias com a conseqüente urbanização da população e dos meios de comunicação de massa. [...]

“Na prática esportiva aprendem a vencer através do esforço pessoal e a conviver com vitórias e derrotas, como melhores e piores, vencedores e derrotados, possuidores de aptidão ou inaptos.

Até a década de 1980 a Educação Física não tinha apresentado nenhum discurso que não estivesse voltado para a ação positivista de ensino. Nesta década, com a crise na chamada “ciência moderna”, devido a uma nova reorganização dos pressupostos defendidos até então, travou-se também um grande conflito na identidade da Educação Física. O discurso do corpo e do movimento deu lugar a um corpo que passa a ser visto como manifestação da humanidade e não mais uma parte de um todo com funções dicotomizadas e diferenciadas. Todas as dimensões do ser humano passam a ser o interesse de estudo da Educação Física. (MEDINA, 1983).

Esta crise de identidade proporcionou uma quantidade enorme de pesquisas elaboradas pelos profissionais da área de Educação Física apresentadas e discutidas em congressos, encontros, seminários, dissertações e teses. Na realidade a legislação tem se pautado sempre nas concepções históricas. Nossa primeira LDB, de nº 4.024, promulgada em 20 de dezembro de 1961, já afirmava no artigo 22 que “será obrigatória a prática da Educação Física em todos os níveis e ramos de escolarização, com predominância esportiva no ensino superior”. De fato ela contemplava a obrigatoriedade da Educação Física nas escolas primárias e de ensino médios e esportiva no ensino superior, mas os pressupostos ainda continuavam centrados no modelo de industrialização concebidos na década de 1930, pois seu objetivo era capacitar o cidadão para usar sua força física para o trabalho. (CASTELLANI FILHO, 1997).

Já a LDB 5.692/71, no artigo 7, confirmou a obrigatoriedade da Educação Física nos estabelecimentos de 1º e 2º graus, mas se voltou para um ensino pautado em regras que

haviam sido estabelecidas em escolas militares, voltadas para a prática do desporto e que foram confirmadas no Decreto Federal de nº 69.450/71, de 1º de novembro de 1971, que conferia à Educação Física um caráter de “atividade” sendo uma “referência fundamental para orientar o planejamento, controle e avaliação da Educação Física, desportiva e recreativa, no nível dos estabelecimentos de ensino”.