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TRAJETÓRIA DA LÍNGUA PORTUGUESA EM ELE

No documento Identidade brasileira tipo exportação (páginas 59-65)

2 MÉTODOS E ABORDAGENS EM ELE

2.1 TRAJETÓRIA DA LÍNGUA PORTUGUESA EM ELE

Na última seção, descrevemos as transformações metodológicas pelas quais o ensino de língua estrangeira passou. Como não poderia ser diferente, o ensino de PL2 e de PLE também se desenvolveu ao longo do tempo. Sendo assim, nesta seção, temos como objetivo apresentar os períodos da história do ensino de língua portuguesa modalidade brasileira.

O ensino de Português a estrangeiros não é uma área de estudo relativamente nova. As últimas décadas testemunharam um crescimento da abordagem comunicativa e do trabalho de competência e desempenho no mundo. Na Europa, a necessidade e o deslocamento favorável entre cidadãos de diversos países colocaram a nossa língua como recurso cultural há muitos séculos. O que é novo e se encontra ainda em formação é o ensino da língua portuguesa modalidade brasileira e cultura do Brasil, tanto como segunda língua em território nacional quanto como língua estrangeira em diversas universidades no mundo. A esse respeito, Almeida Filho conclui que:

Nesses sessenta anos decorridos é que se esboça a história recente do ensino de Português como língua estrangeira em ambiente de imersão nas universidades do País. O ensino de Português como segunda língua, esse tem uma história muito mais longa de quase cinco séculos, no esforço de religiosos principalmente pelo ensino de Português a membros das nações indígenas. Esse é, sem dúvida, um capítulo de crucial importância [...] (ALMEIDA FILHO, 1992, p.12)

A instrução sobre cultura brasileira no Brasil e no exterior deverá ganhar força e se consolidar como área de pesquisa com programas de pós-graduação em LA a médio prazo, na opinião de Almeida Filho (2008, p. 35). Pesquisadores e parceiros na produção de conhecimento teórico relevante de natureza aplicada para desenvolvimento e expansão do ensino da língua serão requisitados e propagarão suas descobertas na formação teórica em construção.

Língua Portuguesa para Estrangeiros (CELPE-Bras), a expansão de

publicações como a revista eletrônica Siriguela e a formação da Sociedade

Internacional de Português Língua Estrangeira (SIPLE), em 1991, vêm

ampliando o mercado de instrumentalização e capacitação educacional em língua portuguesa.

A colonização do Brasil por Portugal, após o seu descobrimento em 1500, marcou início do primeiro processo de aquisição e aprendizagem, bilateral, de língua estrangeira no país dominado: tanto os índios aprendiam a língua portuguesa quanto os portugueses aprendiam a língua dos índios, o Tupinambá16. Vale ressaltar que, de início, os portugueses eram a minoria

diante da população indígena. Reflexos condicionados formaram os primeiros resultados do que, depois, se tornou base para a teoria da aquisição de linguagem em PL2 para as gerações seguintes. Estamos querendo dizer que o contato com o povo dominado foi a base empírica para o ensino do Português no Brasil. “O estudo da língua pelos jesuítas constitui um meio para se conseguir a conversão dos índios.” (NUNES, 1996, p. 141). Com relação ao primeiro período da gramatização do Português modalidade brasileira, o autor afirma:

A Arte, de José de Anchieta foi a primeira gramática feita no Brasil e apresenta uma importância fundamental na história da gramatização das línguas indígenas brasileiras. (p. 139) Essa produção esteve diretamente relacionada aos interesses de colonização: unidade política da colônia, civilização dos índios, mediação de conflitos. (NUNES, 1996, p. 141, grifo do autor)

Nunes (1996, p. 138) ainda nos explica que o estabelecimento da Língua Portuguesa como língua do Brasil, como processo de apagamento de outras línguas, vem do século XVIII, quando o Governo Português obrigou o ensino da língua portuguesa nas escolas e estabeleceu que a língua do Brasil era o Português. Isto se produz inicialmente por uma carta régia, datada de 1727, de D. João V, que mandava os jesuítas ensinarem Português aos índios nas suas

16 Tronco Tupi. Disponível em: <http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/linguas/linguas-

escolas. E depois por um ato do Marquês de Pombal, que expulsa os jesuítas em 1757 e oficializa o ensino do Português no Brasil.

O segundo período vai da segunda metade do século XIX até fins dos anos 30, com a fundação da Faculdade de Letras no Brasil. A Gramática Portuguesa de Julio Ribeiro (1881) corresponde a um distanciamento da influência direta de Portugal. Funda-se a Academia Brasileira de Letras com a finalidade de cuidar da cultura da língua e da literatura nacional.

O terceiro período, fundamentalmente ligado a questões relacionadas a um padrão literário e ao ensino, inicia-se nos anos 30 e segue até meados da década de 60, quando o Conselho Federal de Educação torna a Linguística disciplina obrigatória no Brasil, para os cursos de Letras. Princípios de

Linguística Geral, de Mattoso Câmara, é de 1941 e já traz a influência para a

sua primeira gramática descritiva científica, a Estrutura da Língua Portuguesa, com registros, ainda, sobre línguas indígenas do Brasil.

O quarto período é pontuado por uma discussão teórica e descritiva fortemente política e militante. A partir de 1965 até os dias de hoje, trabalhos de Semântica, Sociolinguística, Linguística Histórica, Análise do Discurso e também trabalhos gramaticais analisam a especificidade da língua portuguesa modalidade brasileira.

Informações sobre o material didático, mais especificamente o levantamento sobre livros didáticos e o mercado editorial de PL2 e PLE, têm como objetivo fornecer-nos a base para descrevermos as diversas esferas relacionadas ao ELE. Conforme explicitado no Capítulo 1, acreditamos que metodologias, abordagens e material didático, apesar de não serem as categorias de análise propriamente adotadas nesta dissertação, são os fundamentos para compreendermos e descrevermos os procedimentos da sala de aula que nos levam a aprender uma nova cultura e absorver as diferenças: essas sim, categorias de análise. Portanto, a seguir, trazemos os livros didáticos produzidos durante a história do ensino de Português a estrangeiros como parte do processo e da fundamentação teórica.

Em 1966, o livro Modern Portuguese: A Reference Grammar, em uma tradução livre, Português Moderno: Uma Gramática de Referência, de Mário Perini, foi subsidiado pela Modern Language Association of America (MLA) sob a liderança do pioneiro linguista aplicado brasileiro Gomes de Matos. Na década seguinte, a tradução como estratégia de ensino de língua estrangeira foi descartada e uma produção nacional para um público de alunos estrangeiros no Brasil em ambiente de imersão foi iniciada. Ilustramos tal momento editorial com o livro Português 1 publicado pela Berlitz. Estudiosos se voltaram para a busca e criação de material didático de qualidade, com abordagem behaviorista, vigente na época, a fim de garantir o ensino do Português brasileiro e atender a crescente demanda do ensino de Português para falantes de outras línguas, principalmente nos países latino-americanos nos anos 80.

Almeida Filho (1992, p.12) investigou a nomenclatura nocional-funcional aplicada ao ensino de PL2. Nela, os aprendizes passaram a ser o centro do processo de ensino-aprendizagem e menor ênfase foi sendo empregada à forma. A sintaxe, a morfologia e a fonologia passam a exercer o papel de instrumentos a serviço da intenção daquele que interage com a língua. Assim, como na hipótese da análise contrastiva exposta no capítulo 1, foi concedida maior tolerância ao erro. A associação à realidade do aluno só seria concretizada com a prática seguida da identificação pela gramática.

Os conceitos de comunicação e competência comunicativa17 formulados na

década de 80 trouxeram mudança e uma visão contemporânea de ensino: a língua como um instrumento de comunicação em um determinado contexto social. A forma e a estrutura da língua cederam espaço à formação do aluno em si. Houve uma elaboração de livros didáticos que defendiam os conceitos da Abordagem Comunicativa a partir da nocional-funcional, tais como o manual de abordagem situacional Falando... Lendo... Escrevendo... Português: um

curso para estrangeiros (LIMA & IUNES, 1981); Tudo bem (RAMALHETE,

1984) com textos autênticos relevantes, Avenida Brasil (LIMA et al., 1991) e

17 Cf. Chomsky, 1965.

seus temas culturais e Fala Brasil (COUNDRY & FONTÃO, 1989) com amostras do Português corrente no Brasil.

A grande explosão de livros didáticos, com uma ampla diversificação dos públicos-alvos, dos níveis proficiência e de materiais aconteceu na década de 90. Aprendendo Português do Brasil (LAROCA et al., 1993), Bem-Vindo: A

língua portuguesa no mundo da comunicação (PONCE et al., 1999) e Panorama Brasil (PONCE et al., 2006) foram alguns dos livros didáticos criados

que visavam sensibilizar o aluno quanto a diversos aspectos da língua desde o início de sua aprendizagem. A partir desse momento, no âmbito acadêmico, alguns pesquisadores começaram a elaborar pequenas unidades de ensino ancoradas em pressupostos teóricos da abordagem comunicativa de ensino. Essas sugestões de atividades não chegaram a constituir um livro didático específico, mas estão disponíveis em artigos escritos sobre o ensino de PLE, como por exemplo, em Mello et al. (2002), Silva (2002), Alvarez (2002), Fontes (2002), pesquisadores da Universidade de Brasília, e Sternfeld (1997).

Os autores passaram a investigar e a propor a elaboração de livros didáticos pautados em conteúdos históricos e culturais, enfatizando a relação língua e cultura e instaurando uma nova tendência na área. Eles trabalham com a noção de cultura entendida como “comportamentos, atitudes, regras implícitas e suas interpretações e percepções pelos indivíduos” (FONTES, 2002, p. 176), considerando o conhecimento, as ideias e crenças, assim como “a maneira como eles existem na vida social de um grupo ou nação, referência à totalidade de características de uma realidade social” (MENDES, 2002, p. 191).

Esses são alguns dos materiais desenvolvidos para o ensino de PL2 e de PLE que foram, aqui, apresentados para demonstrar os pressupostos que nortearam a produção didática para teorização e aplicação. Nem os métodos nem o material didático serão nossas categorias de análise. Eles são aqui expostos, contudo, porque ambos representam papéis imprescindíveis para que o processo de ensino-aprendizagem aconteça, ou seja, para que, de fato, uma segunda cultura ou uma cultura estrangeira seja aprendida. Portanto,

utilizaremos as fases da aula, as habilidades de ensino e as classificações de tarefas para analisarmos a aquisição de nova cultura.

Passaremos a estudar o processo de aprendizagem e de aquisição de língua estrangeira com o objetivo de abordar o escopo do aprendiz. Acreditamos que a mudança do foco para o aluno, por ora, é primordial para focarmos em uma visão global e eficiente do processo.

Para respondermos às questões levantadas no início deste trabalho sobre aquisição de segunda cultura, mais especificamente, sobre o aprendizado da cultura e identidade brasileiras no processo de ensino e aprendizagem, vemos como imprescindível o alinhamento entre as linhas de ensino expostas anteriormente e as reflexões sobre aprendizagem. Na próxima seção, deter- nos-emos na descrição das características de absorção, retenção e produção de informação por parte do aprendiz de PL2 e de PLE.

No documento Identidade brasileira tipo exportação (páginas 59-65)