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4.3 EFICÁCIA DAS DECISÕES DO JULGAMENTO DO STF

4.3.1 A transcendência da coisa julgada

A coisa julgada é um efeito jurídico. Para compreender a coisa julgada, é preciso partir da premissa de que a decisão é fonte de norma jurídica.209 Em sentido lato, a decisão judicial tomada à luz de um caso concreto gera o precedente, cujo elemento normativo pode servir como diretriz para o julgamento posterior de casos análogos. O precedente é composto, tanto pelas circunstâncias de fato que embasam a controvérsia, como pela tese ou o princípio jurídico assentado na motivação do processo decisório, quanto pela argumentação jurídica em torno da questão. Em sentido estrito, o precedente pode ser definido como sendo a própria ratio

decidendi, que são os fundamentos jurídicos que sustentam a decisão, a opção hermenêutica

adotada na sentença, constitui a essência da tese jurídica suficiente para decidir o caso concreto.210

Um precedente, para regular casos futuros, deve esclarecer as circunstâncias concretas sobre as quais a resolução da questão de direito opera. Como a decisão de uma Corte Suprema tem o seu significado impresso na ratio decidendi, a deliberação capaz de dar-lhe origem deve enfrentar, de maneira adequada, todos os fundamentos que importam para o alcance da solução do recurso.211 Nesse sentido, Marinoni explicita:

Precedente não se confunde com decisão ou com justificativa. A decisão é a resolução de um caso, cuja justificativa pode ou não dar origem a uma ratio decidendi e, por

208 ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. 4. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 31.

209 DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 12. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017. v. 2. p. 585. 210 DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 12. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017. v. 2. p. 505-506. 211 MARINONI, L. G.; ARENHART, S. C.; MITIDIERO, D. Julgamento colegiado e precedente. Revista de Processo. v. 264, p. 357-394, 2017. Revista dos Tribunais Online. Disponível em:

<http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/resultList/document?&src=rl&srguid=i0ad82d9a0000015c5659 4a36289bd8e7&docguid=I6e429ca0c66311e6a945010000000000&hitguid=I6e429ca0c66311e6a945010000000 000&spos=1&epos=1&td=1&context=32&crumb-action=append&crumb-

label=Documento&isDocFG=false&isFromMultiSumm=&startChunk=1&endChunk=1>. Acesso em: 25 maio 2017. Acesso restrito via meu pergamum.

conseguinte, a um precedente. Note-se que a justificativa, mesmo quando contém a ratio, pode tratar de outros aspectos do caso. Não há dúvida de que não há precedente sem ratio decidendi, mas o precedente é mais do que a ratio. É certo que a parte do precedente que importa, enquanto regra que regulará os casos futuros, é a ratio decidendi. [...] A ratio decidendi, embora derivada da justificativa, requer condições que a tornam peculiar. Uma justificativa apenas gera ratio decidendi nos julgados das Cortes Supremas e, nesses casos, quando realmente consiste no fundamento determinante da decisão, prestigiado pela unanimidade ou pela maioria dos membros do colegiado. Embora a justificativa seja o resultado de um raciocínio que deve considerar a fase pré-decisória e a proclamação do resultado, e que, assim, deve retratar os fundamentos que realmente conduziram à decisão e foram efetivamente discutidos por todos os membros do colegiado, a justificativa, enquanto discurso, sempre será objeto de análise por aqueles que têm interesse especialmente na autoridade e na eficácia vinculante da ratio decidendi. Nos julgamentos subsequentes interessados na aplicação do precedente, haverá sempre debate sobre a existência de uma efetiva ratio decidendi, bem como de seus exatos significado e alcance.212

Zavascki afirma que as decisões do STF sobre constitucionalidade de normas, mesmo quando tomadas incidentalmente no julgamento do caso concreto, exercem uma força expansiva, uma vez que representam a palavra do guardião da Constituição sobre a legitimidade ou não de um preceito de natureza genérica, apto a incidir sobre situações análogas. Importante dar a devida dimensão aos precedentes no âmbito do controle difuso, como forma de preservar os princípios constitucionais da segurança jurídica e da igualdade perante a lei. No Brasil, o sistema normativo tem sido modificado nos últimos anos com a finalidade de conferir, cada vez em maior extensão e profundidade, força vinculante aos precedentes das Cortes Superiores, principalmente aos produzidos pelo STF no âmbito da jurisdição constitucional.

A causa constitucional debatida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de recurso extraordinário, em sede de repercussão geral, apresenta relevância e transcendência, nos termos do artigo 1.035, caput, § 1º, do CPC, “considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos do processo”.213

Marinoni, Arenhart, e Mitidiero comentam que basta a causa debatida ser relevante sob um desses pontos de vista, econômico, político, social ou jurídico, não é necessário que o seja de todos. Eventuais questões envolvendo a frontal violação de direitos fundamentais,

212 MARINONI, L. G.; ARENHART, S. C.; MITIDIERO, D. Julgamento colegiado e precedente. Revista de Processo. v. 264, p. 357-394, 2017. Revista dos Tribunais Online. Disponível em:

<http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/resultList/document?&src=rl&srguid=i0ad82d9a0000015c5659 4a36289bd8e7&docguid=I6e429ca0c66311e6a945010000000000&hitguid=I6e429ca0c66311e6a945010000000 000&spos=1&epos=1&td=1&context=32&crumb-action=append&crumb-

label=Documento&isDocFG=false&isFromMultiSumm=&startChunk=1&endChunk=1>. Acesso em: 25 maio 2017. Acesso restrito via meu pergamum.

213 BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015. Disponível em:

materiais ou processuais, tendo em conta a dimensão objetiva desses, apresentam a princípio transcendência.214

Ante o exposto, a partir do estudo sobre a transcendência da coisa julgada pode-se compreender que a decisão de uma Corte Superior gera precedente, apto para regular os julgamentos de casos futuros. O precedente é composto tanto pelas circunstâncias que embasam a controvérsia, como pela tese ou o princípio jurídico que fundamenta a motivação do processo decisório, quanto pela argumentação jurídica em torno da questão. No sentido estrito, o precedente é a ratio decidendi, que são os fundamentos jurídicos que solidificam a decisão. Assim, o precedente compõe as razões que a Corte Suprema utiliza como fundamento jurídico no julgamento de determinado recurso.

As decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, pela sua posição hierárquica no Poder Judiciário como órgão de cúpula, geram efeitos que ultrapassam a coisa julgada, ou seja, formam precedentes para efeito de julgamento de recursos pelos demais tribunais brasileiros. Como se verifica, a decisão do julgamento do recurso extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, forma precedente para todos os órgãos jurisdicionais.

Em continuidade, passa-se ao próximo assunto de desenvolvimento desta pesquisa, que trata da mutação constitucional.