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A compra do olho

• Livro

Ele entra.

Traz um olho de vidro nas mãos. Esse olho já viu de tudo. Ele diz. Esse olho tem história. De tudo, ele não viu. Penso eu. Não viu a bunda, isso ele não viu. Pego o olho, analiso. É incrível. É perfeito. Injetado. Quero o olho pra mim. A bunda e o olho. Lembro daquela capa de disco. Acho que era do Tom Zé. A bunda e o olho.

O olho do cu. Chuto.

Quero o olho pra mim. Será o meu amuleto. Ela bate e entra. Ela ainda não sabe que não gosto de ser interrompido. Ela sua, cansada. Traz um pacote. Mais de quatro quilos calculo. Areia, cimento e pedrinhas. Coloca ali no cantinho.

Peço desculpas ao homem do olho. Ele diz não se importar. Explico o cheiro e o problema. Ele finge interessado ficar. Ela sai. E então.

Não aceita. Diz que o olho vale mais. Esse olho já viu de tudo. De tudo sei que não viu.

Digo que dei o máximo que posso dar. Ele levanta e agradece. Espera, me ouço falar. Dobro. Ainda é pouco. Ele diz. Ele sabe que o olho me encanta. Ainda o seguro nas mãos.

Quanto? Pergunto. Tanto, ele chuta. Tanto não posso dar.

Então fica pra próxima. Ele diz estendendo a mão. Não devolvo. É o meu amuleto. Abro a gaveta e pago. Você sabe negociar.

Guardo o olho no bolso. Ele sai.

Mesmo com ele no bolso, continuo a alisar. (p.36-37).

“Ele entra”. Como a maior parte das negociações, o trecho se inicia com a entrada do cliente. A descrição do ato repetidas vezes em diferentes capítulos explicita a observação contínua do protagonista.

Então começam o diálogo. Não apenas as frases são entrecortadas, mas também a própria introdução das falas, pontuadas separadamente do que é

pronunciado pelos personagens: “Esse olho já viu de tudo. Ele diz. Esse olho tem história. De tudo, ele não viu. Penso eu” (p.36).

A pontuação do texto cria uma ruptura no ritmo da cena ao mesmo tempo em que encadeia as ações rapidamente, como se cada pequeno trecho fosse uma peça de um quebra cabeças.

Além disso, as ações, falas e introduções são entremeadas pelos fluxos de consciência do protagonista, que relaciona diversas referências com o diálogo que estabelece e com as ideias que lhe vão surgindo:

Pego o olho, analiso. É incrível. É perfeito. Injetado. Quero o olho pra mim. A bunda e o olho. Lembro daquela capa de disco. Acho que era do Tom Zé. A bunda e o olho.

O olho do cu. Chuto (p.36).

Como em todo o livro, não há nomes para os personagens nem mesmo quantificação dos valores tratados. O personagem principal se refere uma única vez ao interlocutor como “o homem do olho”. Essa ausência de referências causa o afastamento e uma suspensão da possível concretude dos fatos. O leitor parece transitar por uma espécie de limbo que é constituído pelo universo imaginário do protagonista.

Entra em cena a secretária da loja. Mais uma vez, referida apenas como “ela”. A compreensão da história a partir dessas “não referências” é possibilitada pelo encadeamento do que acontece, pelo preenchimento que o leitor cria por entre esses espaços vazios em que os elementos não lhe são explícitos: “Ela bate e entra. Ela ainda não sabe que não gosto de ser interrompido. Ela sua, cansada. Traz um pacote. Mais de quatro quilos calculo. Areia, cimento e pedrinhas” (p. 36). O leitor sabe de quem se trata por acompanhar as ações dessas figuras pela história.

A negociação também é construída por períodos extremamente curtos. O autor estabelece a cadência por rimas. As frases são criadas como pequenos

versos: “Peço desculpas ao homem do olho. Ele diz não se importar. Explico o cheiro e o problema. Ele finge interessado ficar. Ela sai. E então.

Não aceita. Diz que o olho vale mais. Esse olho já viu de tudo” (p. 36). Ao final do trecho, uma suspensão da sequência (“E então”), mais uma vez assinalada por um ponto final, até o cliente negar a expectativa do protagonista.

O “homem do olho” é enfático. Suas ações são curtas e não há hesitação. Ele nega as ofertas, se levanta para sair, não parece interessado em entrar no jogo, em se render às propostas do protagonista.

Nessa cena não há brincadeiras e ironias direcionadas ao seu interlocutor. O comprador faz novamente uma proposta e acaba se rendendo ao que o cliente pede. O olho lhe causou um impacto e suscitou diversas relações com sua história, com suas criações imaginárias. Ele se tornará seu amuleto, seu parceiro, testemunha de tudo o que vê e vive.

Mais à frente o personagem o transformará no “olho de seu pai”, o pai que nunca teve, seu “pai Frankstein”.

• Filme

A sequência se inicia com a externa do “homem do olho”. A câmera o enquadra em plano americano. Virado para o lado oposto à loja, ele fuma, se vira e prossegue em direção à porta com o cigarro na boca. Há um corte e o enquadramento passa a mostrar toda a fachada.

Essa mesma movimentação é feita pelo segurança em outro momento do filme.

O personagem usa calça e jaqueta jeans em mesmo tom azul escuro.

Em seguida, uma cena interna em que a secretária deposita os sacos de cimento do banheirinho e sai da sala de Lourenço enquanto ele pede para que ela não faça barulho com o salto. Aqui houve uma inversão da ordem da cena e o acréscimo dessa última fala, inexistente no livro.

Ao invés de optar pela narração over para demonstrar o aborrecimento de Lourenço, Heitor Dhalia construiu a cena somente entre esses dois personagens para depois trabalhar a dramaticidade da negociação apenas com o protagonista e o “homem do olho”.

O homem chega. A câmera o enquadra num contraplano de Lourenço já próximo à sua mesa. Ele dá passos largos, duros. Se aproxima com a cara fechada, enfia a mão no bolso da calça e tira algo com o punho cerrado. Um corte. A câmera enquadra apenas a mão do personagem, que se abre e mostra o olho.

Quadro 135 - 30min55s Quadro 136 - 31min01s

Mais um corte e Lourenço olha para o olho, o pega e pede para que seu interlocutor se sente. Pede desculpas pelo cheiro e chuta: “Cinquenta?”.

Em contraplano, o “homem do olho” diz o mesmo texto que no livro: “É pouco. Esse olho vale mais”. A câmera o focaliza em close: “Esse olho já viu de tudo”.

O enquadramento evidencia sua feição. Ele usa um brinco de argola dourada na orelha esquerda. Sua pele enrugada traz textura e gravidade. Por debaixo da gola da jaqueta fechada, a gola de uma camisa também azul escuro fechada (quadro 139). Seus movimentos são severos, enérgicos em contraposição à hesitação de Lourenço, que dobra a oferta: “Cem?”.

O vendedor nega: “Ainda é pouco”. Ao ser questionado, lhe dá seu valor: “Quatrocentos”. O personagem principal recusa, seu interlocutor se levanta e estende a mão para pegar o olho e ir embora, mas Lourenço se rende. Abre as caixinhas onde guarda o dinheiro e entrega o que lhe foi pedido.

Em pé à sua frente, o homem ainda grave parece satisfeito. Estende a mão para pegar o dinheiro e a fecha energicamente, pondo o dinheiro no bolso da calça.

Lourenço diz: “Você sabe negociar”. O homem sai sem dizer nada.

Sozinho na sala, o personagem analisa o olho: “Não. De tudo esse olho ainda não viu. Ele ainda não viu a bunda”. Ao invés do fluxo de consciência, optou-se pela fala do personagem em cena, ao invés de uma possível voz over durante a negociação. No livro mesmo, não existe diferenciação entre essas duas expressões.

A cena ocorre como na obra literária. O acontecimento é quase o mesmo. Porém, no filme há quantificação, tratam-se de valores precisos. Ainda assim, a moeda nunca é citada, apenas o número. Existe uma certa referência, mas que não precisa época, data.

O enquadramento em close capta a gola da jaqueta e da camisa, mas corta da imagem parte da testa do personagem, prolongando aquilo que não está em

cena. Dessa forma, tem-se a impressão de que a cabeça seja maior do que de fato é (quadro 139).

Heitor Dhalia constrói imagens com uma enorme precisão. Ao se levantar para pegar o olho, a mão do homem, estendida, é enquadrada na mesma posição do objeto, que é segurado por Lourenço (quadro 140). A imagem supõe duplicidade, uma possível transição e a dúvida de com quem o olho ficará.

Quadro 139 - 31min41s Quadro 140 - 31min53s

Quadro 144 - 32min55s Quadro 145 - 32min59s

O figurino do “homem do olho” materializa suas atitudes. Apesar de simples, a roupa tem corte, é estruturada. A cor forte, escura, também reforça a dureza do personagem. Seus passos são largos, seus movimentos, enérgicos. Ele usa um brinco dourado.

A importância desses elementos se evidencia pelos enquadramentos, que deixam explícitas essas composições.

Cliente que oferece caneta de ouro

• Livro

Entro eu. O cimento secou. O cheiro cessou. Já não há mais ralo. Tiro o olho do bolso e beijo. Você fará a sorte voltar.

Ele entra.

Nada tenho que explicar. Traz consigo uma caneta. É de ouro.

Chuto. Ele repete.

É uma caneta maciça de ouro. Então ela não escreve. Ironizo. Claro que escreve, é só pôr a carga.

Mas se é maciça, não há espaço para carga. Ele não entende. Ele desatarraxa e mostra a carga.

Eu não quero. Por quê?

Porque não gostei da sua cara.

Meu senhor, me desculpe minha cara. Não é ela que estou oferecendo.

É a caneta. E olha que essa caneta, além de ser de ouro maciço, tem história.

Não quero nem de graça.

Meu senhor, assim o senhor me ofende. Me desculpe, se minha feição não lhe agrada, mas estou aqui pela caneta. É a caneta o que deve julgar.

Não quero.

Senhor, te suplico. Eu preciso muito do dinheiro por favor, se o sr. preferir me viro de costas. Assim o senhor nem precisa me olhar. Você precisa mesmo do dinheiro?

O senhor nem imagina o quanto.

Então você faria qualquer coisa para conseguir?

Qualquer coisa também não, afinal sou um homem de princípios. E até onde vão seus princípios?

Vão até seus limites. E que limites são esses?

Ah, não sei precisar. Mas o que o senhor sugere que eu faça? Nada. Nada não. Pode se retirar.

O senhor nem vai fazer uma oferta pela caneta? Já fiz mas retiro.

Eu não vou te ajudar.

Olha, filho, a vida dá voltas. Um dia pode ser o senhor a precisar. Você está me ameaçando?

Não, claro que não. Só estou...

Está nada. Você disse que é um homem de bem. E sou. Sou, sim senhor...

Então se um dia eu precisar de você, sei que vai me ajudar. Vai me ajudar mesmo que eu não compre essa merda. Mesmo que eu não goste dessa tua cara. Não é assim que agem os homens de princípio?

O senhor tem razão. Eu não lhe negaria ajuda.

E tem mais uma coisa, como você acha que poderia me ajudar? Como eu disse, a vida dá voltas.

Sabe, eu ia te mostrar uma coisa mas você não merece. Isso é o senhor quem diz.

Vai embora logo, vai.

Só quero dizer uma última coisa ao senhor, se o senhor, me permite.

Não, não permito. Ele sai.

Até a porta se fechar seus olhos permanecem em mim. (p. 40-42).

A cena começa com Lourenço (“Entro eu”). O ralo o incomoda cada vez mais e isso é evidente pelo pensamento encadeado logo em seguida da entrada do cliente: “Ele entra.

Nada tenho que explicar” (p.40).

A tensão aumenta conforme o narrador percebe a seriedade e incompreensão de seu interlocutor para aquilo que diz e ironiza - como no caso da caneta ser de ouro maciço e, portanto, não haver espaço para carga.

Conforme o diálogo avança, o cliente se coloca em uma posição cada vez de maior inferioridade. O protagonista estabelece diversos jogos contra os quais o vendedor não se insurge, tira sarro de sua cara e, ainda assim, ele se desculpa, diz que pode se virar de costas para que o comprador não olhe para seu rosto. Ele se submete a humilhações porque precisa muito do dinheiro. Aí mesmo é que o narrador não lhe ajuda e exerce sobre ele seu sarcasmo e poder sádico.

Sua submissão se demonstra mesmo pelo pronome de tratamento pelo qual se refere ao protagonista: senhor.

Ao contrário da maior parte do livro, neste trecho os períodos são um pouco mais longos, mas mesmo assim continuam curtos.

As ideias do protagonista são concatenadas de forma breve e em contraposição com o que disse anteriormente. Ele propõe e retira a proposta, diz e desdiz, contradiz as falas de seu interlocutor, tentando confundi-lo,

surpreendendo-o a cada frase, cortando suas tentativas de explicação. O esforço do vendedor de o sensibilizar com sua condição apenas o torna mais duro até o desfecho da cena em que o homem sai da sala sem ao menos poder lhe dizer “uma última coisa”.

• Filme

“É de ouro”, inicia o vendedor tal qual no livro. A cena é aberta com um close da caneta. O diálogo acontece de forma bastante parecida como na obra literária, havendo, porém, mais uma vez, valores em jogo. Lourenço lhe oferece “vinte, máximo”, ao que o homem retruca “mas é de ouro”. O personagem principal retira a oferta e assim a cena transcorre.

A construção do personagem se dá de forma bastante característica. Trata- se de um homem na faixa dos cinquenta a sessenta anos. Seus cabelos são pintados de castanho e possuem uma parte de raiz branca. Ele usa uma calça bege clara (que só é possível notar quando se levanta para sair), uma camisa bege escura da qual apenas se vê uma parte da gola por baixo da blusa de lã larga em tonalidades que variam do bege ao cinza e com motivo geométrico: uma linha mais escura (preta ou cinza) a divide na horizontal mas de forma irregular, com espécies de degraus. Na manga, existem fios puxados. Ele usa uma aliança de ouro na mão esquerda: é casado.

Sua testa se franze todo o tempo numa expressão de desespero e submissão. Seus ombros se mantêm tensos, erguidos, enquanto seus cotovelos se apoiam por sobre a mesa. Sua voz é levemente rouca, expressa angústia.

Diferentemente do “homem do olho”, a roupa do homem da caneta não é estruturada. É uma blusa simples, sem molde preciso. A combinação desses diversos elementos dizem sobre o personagem, colaboram com sua construção para expressar sua situação de submissão a Lourenço.

Quadro 145 - 37min28s Quadro 146 - 38min25s

Última parte / Sequência final

• Livro

Ela entra. Ela treme.

A cada dia, mais. Balanga.

Traz um saco.

Um desses sacos de embrulho, de papel pardo. Desses que não se vê mais.

Agora tudo se embrulha em sacolinhas de plástico.

Essas sacolinhas fazem um barulho irritante. As de plástico. Esses sacos não.

Ela enfia a mão dentro dele. Agora até o saco treme.

Ela conserva a mão mergulhada. Fala criatura, o que trazes pra mim? Eu trouxe uma coisa que é do senhor.

Ah, é?

É. Trouxe a única verdade. Não brinca?

Ela aponta o saco pra mim. O saco treme.

A cabeça balanga.

A mão trêmula está dentro do saco. Eu trago a sua verdade.

Adivinho o que o saco guarda.

Eu trouxe uma coisa que só serve em você. Abaixe isso!

Não posso.

Então o saco faz BUM. E o BUM é tão alto que dói. O BUM rasga o fundo do saco. O BUM me rasga também. O BUM sempre diz a verdade. O saco rasgado revela sua mão. Em sua mão tem fumaça. A fumaça que sai pelo cano. Mas não pelo cano do ralo. Pelo cano da arma.

Ela treme. Eu também.

Tem um buraco no teto. Tem um furo em mim. É uma dor grave.

Quando encosto o queixo no peito, eu vejo. O paletó se tinge de mim.

Meu coração agora bate pra fora. Espalhando o meu sangue por tudo. Bate fora do peito.

E aí ouço um novo BUM. O cheiro do ralo.

Esse era o nome do livro que eu nunca escrevi. Tudo passa por meus pensamentos.

Penso em tudo que um dia comprei.

Penso em todas as coisas que me colecionaram. A morte é dura.

A Morte cura.

A Morte cura e machuca. A morte dói.

Eu sou dor. Dói.

Dói muito. Tudo é dor.

Tudo é dor no nada.

Penso no olho de meu pai. Penso em dar um último beijo.

Beijaria cada uma das coisas que eu julguei ter tido. Sinto que perco tudo.

Tudo o que nunca foi meu. E então eu me perco em mim. Nesse mim que nunca foi eu.

Beijaria a bunda, como se fosse a única. Pai. Desta vez, não perdoe!

Não há luz. Era tudo mentira.

Deste lado ninguém espera por mim. Ninguém me guia.

Pois o caminho não dá para errar. Caio.

O caminho é a queda. A queda me traga. Como um ralo

O silêncio é a língua que eu falo. E então tudo o que não existe surge. Enquanto o que existe se apaga. Eu não quero ir.

Mas o abismo me engole. Eu não quero ir.

Eu queria ficar (p. 177-180).

É no desfecho que o mundo se rebela contra ele e lhe devolve aquilo que vinha cultivando em suas relações. A opressão e a humilhação a que submeteu muitas pessoas fez com que uma delas buscasse a solução de seu problema pela morte do opressor.

Existe aí, mais uma vez, o deslocamento das ações, a culpabilização do outro por sua própria situação. No caso, uma drogada que recorria constantemente ao dono da loja para conseguir dinheiro para comprar drogas e que poderia resolver essa situação específica simplesmente não retornando àquele lugar. No entanto, ela opta por matá-lo. Sua revolta se vira contra a figura

que, supostamente, a colocou naquela condição, eliminando de si mesma a responsabilidade.

A cena se inicia mais uma vez com o fluxo de pensamento do personagem. Ele descreve as ações da viciada subjetivamente, observando que treme, narrando seus atos. Novamente se dirige a ela com desprezo: “Fala criatura, o que trazes pra mim?” (p.178).

A narração concomitante ao acontecimento permite com que o leitor acompanhe o sofrimento do protagonista. Ele narra ação a ação, o que acontece, o que sente.

Nesse último momento, ele parece assumir sua posição fetichista (“Penso em tudo que um dia comprei. Penso em todas as coisas que me colecionaram”, p.179) e o deslocamento que realiza de si para os objetos:

Beijaria cada uma das coisas que eu julguei ter tido. Sinto que perco tudo.

Tudo o que nunca foi meu. E então eu me perco em mim.

Nesse mim que nunca foi eu (p. 179).

• Filme

A viciada entra na loja de Lourenço com um saco de pão na mão e diz que tem algo que pertence a ele. Os tiros que dá perfuram o saco e deixam à mostra o cano da arma.

A camiseta cavada e larga evidencia o colo e os braços magros, esqueléticos, enfatizando sua condição física degradada. Seu corte de cabelo durante todo o filme é assimétrico.

De costas, vemos Lourenço se curvar. Ele coloca a mão sobre o peito e vê sangue. A viciada atira novamente e sai.

Após ser atingido, Lourenço se joga da cadeira, rasteja até o banheirinho e cheira o ralo, onde a garçonete (agora secretária da loja) tenta socorrê-lo.

Os quadros finais do filme são compostos justamente pelas imagens dos elementos que permeiam o universo de Lourenço: o olho, a fachada da loja (quando a voz over do personagem diz “e então, ninguém entra e nem sai”) e, finalmente, a bunda.

Estabelece-se, nesse ponto, a parábola de significação entre esses “objetos” ou locais. Todos são portais pelos quais os personagens adentram o universo de Lourenço ou pelos quais ele próprio se lança.

O olho permanece ali, testemunha tudo. A porta agora está fechada, “ninguém entra, ninguém sai”.

A bunda serve como simbolização de que o esgoto do mundo, o cheiro do ralo, vem de nós, de nosso interior, simbólica ou literalmente.

Quadro 147 - 1h32min50s Quadro 148 - 1h33min08s

Quadro 151 - 1h33min52s Quadro 152 - 1h34min06s

Quadro 153 - 1h34min17s Quadro 154 - 1h34min21s

Quadro 155 - 1h34min31s Quadro 156 -1h34min33s

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