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Tratamento cirúrgico

No documento Clínica de animais de companhia (páginas 92-95)

III. Monografia Hipertiroidismo Felino

8. Terapêutica

8.6 Tratamento cirúrgico

A abordagem cirúrgica é uma das opções terapêuticas. Embora seja um tratamento definitivo, com benefícios devido à sua eficácia, simplicidade, rapidez e baixo custo, podem advir consequências da tiroidectomia, que incluem o surgimento de hipoparatiroidismo, hipotiroidismo, Síndrome de Horner e lesões no nervo laríngeo recorrente 125,134.

77 A tiroidectomia está desaconselhada em animais em que foi detetado tecido tiroideu ectópico ao nível do tórax ou com diagnóstico de carcinoma tiroideu já metastizado 119.

8.6.1 Cuidados pré-cirúrgicos

De forma a minimizar a ocorrência de complicações pré e pós cirúrgicas, deve ser feita uma avaliação cuidada antes da realização da cirurgia, e se necessário uma estabilização de forma a minimizar os riscos anestésicos 125.A avaliação prévia do animal deve incluir a realização do exame físico e meios complementares de diagnóstico como hemograma, perfil bioquímico, úteis na deteção de doença renal e distúrbios eletrolíticos. Se houver manifestações clínicas sugestivas de doença cardíaca concomitante, a radiografia torácica, eletrocardiografia e ecocardiografia são exames fundamentais para deteção de ICC e arritmias cardíacas 125,163. Uma avaliação cuidada da localização das lesões tiroideias e a sua extensão pode trazer benefícios na programação cirúrgica e facilitar a escolha da técnica mais adequada 125. A cintigrafia fornece informação adequada acerca da localização do tecido funcional, incluindo tecido tiroideu ectópico 119,125. Se não for possível a cintigrafia, a ecografia tiroideia pode ajudar nesta avaliação, permitindo avaliar o tamanho dos lobos e aparência do parênquima 120,164. O controlo pré-cirúrgico de doenças concomitantes é imperativo para diminuir o risco anestésico. Pode ser realizado tratamento com ß- bloqueadores, de forma a controlar taquicardia e arritmias supraventriculares, podendo estes fármacos também ser benéficos no controlo dos níveis hormonais em animais não tolerantes a drogas anti-tiroideias 125,163.

O controlo do hipertiroidismo, propriamente dito, deve ser realizado pré-cirurgicamente, com recurso ao metimazol, um a dois meses antes da cirurgia, de forma a atingir o estado de eutiroidismo e minimizar a sintomatologia 119,125.

8.6.2 Protocolo anestésico

O protocolo anestésico deve ser adaptado às necessidades de cada paciente, tendo em conta os efeitos adversos e benefícios de cada fármaco. Os gatos sujeitos a esta intervenção cirúrgica são sobretudo geriátricos, com doenças concomitantes, devendo ser tido em consideração o sistema renal e cardiovascular, e as drogas com menor impacto sobre estes sistemas. Deve ter-se em conta que o aumento da taxa metabólica aumenta a absorção, distribuição, concentração tecidular e inativação de agentes anestésicos 92,125.

Os agentes anestésicos que estimulem ou potenciem a atividade adrenérgica, capaz de induzir taquicardia e arritmias, não devem ser usados 134.

8.6.3 Técnicas cirúrgicas

Existem duas abordagens cirúrgicas possíveis a extracapsular e a subcapsular.

Na técnica extracapsular o lóbulo afetado e a cápsula correspondente são removidos na íntegra. Deve ser realizada a ligadura das artérias tiroideias craniais de forma a garantir a irrigação das glândulas paratiroideias. Variações nesta técnica permitem preservar a glândula paratiroide através da sua dissecção e separação da glândula tiroide, prevenindo a hipocalcémia pós cirúrgica 92,120,164.Esta técnica é útil sobretudo na doença unilateral 164.

78 A técnica intracapsular envolve a incisão prévia na cápsula tiroideia na sua porção ventral e posterior dissecção do parênquima tiroideu para sua remoção, preservando a cápsula. A separação do parênquima tiroideu da sua cápsula deve ser feita até ao local onde se encontra a glândula paratiroide, para que esta possa ser mantida 92,164.

Se em qualquer destas técnicas a glândula paratiroide for removida acidentalmente, deve ser transplantada para a musculatura abdominal e integrada em local onde possa sofrer revascularização, de forma a continuar a exercer as suas funções secretoras 92. Quando este procedimento é realizado não previne a ocorrência de hipocalcemia no pós-operatório, mas previne a longo prazo a necessidade de tratamento do hipoparatiroidismo 119,120,125.

8.6.4 Complicações pós cirúrgicas: Hipoparatiroidismo

A principal complicação que pode advir da tiroidectomia é a hipocalcémia resultante do hipoparatiroidismo iatrogénico 92,119,120,125,164.

As glândulas paratiróides são responsáveis pela secreção de paratormona (PTH do inglês

Parathyroid hormone), sob estímulo da concentração do cálcio sérico. A principal função do PTH é manter a concentração plasmática do cálcio dentro de uma pequena margem de variação, pela sua ação no osso e nos rins 165.

A hipocalcémia tem sido reportada em cerca de 82% dos gatos sujeitos a tiroidectomia, com variações dependendo da técnica aplicada. Este distúrbio pode ser transitório devido ao edema local e depleção de cálcio ionizado causado pelo hipertiroidismo 120,125.

A hipocalcémia leve e transitória (7 a 9 mg/dL) deve ser diferenciada da causada pelo hipoparatiroidismo iatrogénico resultante da cirurgia. Estudo realizado em 86 gatos sujeitos a tiroidectomia, em que foi usada uma variação da técnica extracapsular, revelou que apenas cinco gatos necessitaram que lhe fosse instituído tratamento para controlo da hipocalcémia 125. Em gatos sujeitos a tiroidectomia bilateral é comum o surgimento de hipocalcémia leve, no entanto, o tratamento pode não ser necessário enquanto não ocorrer sintomatologia. O hipoparatiroidismo raramente é permanente, podendo ocorrer normalização dos valores nos primeiros meses após a cirurgia 120,125.

Se detetadas concentrações séricas <7 mg/dl, os animais devem ser vigiados a fim de detetar sintomatologia 125. Os sinais clínicos de hipocalcémia incluem letargia,anorexia, relutância em movimentar-se, espasmos faciais, tremores musculares, cólicas, tetania e convulsões 119. O tratamento da hipocalcémia inclui a suplementação oral com vitamina D, existindo várias formulações disponíveis, sendo a dose recomendada a de 0,02 a 0,03 μg/kg/dia durante dois a quatro dias, e dose de manutenção de 0,005 a 0,015 μg/kg/dia até obtenção de normocalcémia. A administração parenteral de gluconato de cálcio a 10% IV lenta, na dose de 0,5 a 1,5 ml/Kg, faz parte do protocolo de controlo da hipocalcémia. É importante monitorizar os níveis de cálcio total e cálcio ionizado e vigiar a ocorrência de bradicardia, e se detetada deve ser de imediato interrompida 125.

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No documento Clínica de animais de companhia (páginas 92-95)