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Para Lüdke e André (2011), um mesmo objeto pode ser interpretado de diferentes formas por pessoas distintas, tendo o seu referencial particular como fator preponderante para estabelecer significados. A realidade pode ser vista sob diferentes perspectivas, não havendo uma única que seja verdadeira, assim serão fornecidos vários elementos para que o próprio leitor elabore sua opinião, além da conclusão exposta pelo pesquisador. Neste momento, o referencial foucauldiano atuará sobremaneira, já que o sentido proferido aos resultados pelo leitor estará intimamente relacionado com suas vivências, experiências e inquietações (FOUCAULT, 2008).

A Análise do Discurso (AD) foi utilizada neste estudo na tentativa de compreender o modo de funcionamento, os princípios de organização e as formas de produção social do sentido. É papel da análise do discurso descrever o sentido dos relatos, por meio dos objetos, dos tipos de enunciação, os conceitos, os temas e as teorias (CAPELLE; GOSLING, 2004).

Houve apropriação dos sentidos dos dados examinados atenciosamente para que pudessem ser interpretados. No referencial metodológico da AD, não há uma ditadura de método, de caminho a ser seguido. O mesmo é formado por um conjunto de conhecimentos, conceitos, técnicas e concepções sobre o discurso e o sujeito, herdados de diferentes disciplinas. Sendo assim, a ferramenta fundamental deste tipo de pesquisa é a capacidade interpretativa do investigador (CORNELSEN, 2009).

Para Carneiro (2011), utilizar a AD implica em abandonar a ideia de que somente a linguagem traz em si suas verdades, sendo o foco pretendido encontrar o sentido do dito, transcendendo o escrito e alcançando seu significado através de um estudo sobre o contexto e as circunstâncias que o formularam.

Foucault (2008) aborda a necessidade de se ver, no discurso, algo além de seus signos e códigos textuais. Para tanto, o autor argumenta que é preciso não mais tratar os discursos como conjuntos de signos, mas como práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam. Na AD, consideramos o homem na sua história, os seus processos e condições da linguagem, além de se analisar a relação que se estabelece entre a língua e os sujeitos que a falam e as situações de produção do que é dito (ORLANDI, 2009).

Embora um olhar mais genérico sobre o discurso possa parecer pouca coisa, há que se considerar que as interdições que o atingem revelam sua intrínseca relação com o desejo e o poder. Nesse sentido, o discurso ultrapassa a barreira daquilo que manifesta ou oculta o desejo e atinge também o que é objeto do desejo. Ele não se restringe à tradução de lutas ou de sistemas de dominação, mas abrange questões que envolvem aquilo “por que se luta, pelo que se luta, o do qual nós queremos apoderar” (FOUCAULT, 2009, p.10).

O posicionamento ocupado nos discursos pelos sujeitos que se interagem envolve relações de poder, que afetam o cotidiano das pessoas, sendo a linguagem, um veículo de manifestação de forças e exercício desse poder. Uma preocupação foucaultiana é o que constitui o sujeito, por meio da relação na qual ele se constitui e se reconhece, sendo que, a subjetividade está relacionada aos jogos de poder estabelecidos pela linguagem, para a busca do conhecimento (FOUCAULT, 1979).

A partir das definições já realizadas, utilizou-se a análise do discurso como um processo de produção de sentidos, considerando os sujeitos, os discursos, os objetos do discurso, as estratégias de posicionamento, os procedimentos argumentativos, a memória, o interdiscurso, as continuidades e as rupturas. Esse processo pressupôs duas etapas, sendo a primeira, a exposição dos conceitos linguísticos, e a segunda, a explicação da maneira como este tipo de análise pode explorá-los (VELLOSO, 2011).

A prática do discurso está vinculada a elementos como: emissor, receptor, código, referente e mensagem. O processo de comunicação se legitima ao passo que o emissor transmite uma mensagem clara ou informação em código, que se refere a algo do seu cotidiano a um

receptor. Porém, a prática da AD ultrapassa a simples transferência de informação e desconsidera que haja separação ou distanciamento entre emissor e receptor, rompendo com o estabelecido de que exista uma sequência rígida na qual o primeiro fala e o segundo decodifica. Dessa maneira, o método de AD sugere que o processo de significação acontece simultaneamente para ambos, em sucessivos processos de identificação do sujeito, de argumentação de subjetivação e de construção da realidade, dentre outros. Daí o discurso poder ser definido como “efeitos de sentidos entre locutores” (ORLANDI, 2009, p.21).

Conforme propõe Minayo (2010), a operacionalização dos dados foi realizada em três etapas distintas: ordenação, classificação dos dados e análise final. A ordenação dos dados se referiu à transcrição das entrevistas gravadas em áudio, bem como a releitura do material produzido, a organização metódica dos dados obtidos por meio dos relatos e observação. Quanto à classificação dos dados, incluiu leitura profunda e exaustiva por repetidas vezes dos textos transcritos, para que se apreendesse os tópicos de relevância e a constituição dos dados de comunicações. E, por fim, a análise final dos dados se constituiu como o encontro da excentricidade do objeto pela prova do vivido com as relações essenciais, no que coube este desafio, única e exclusivamente ao pesquisador.

O presente estudo buscou analisar os discursos considerando a condição social no qual ele foi produzido, o(s) seu(s) contexto(s) ideológico(s), o cenário e personagens diretamente envolvidos, citados, bem como aqueles referenciados de maneira indireta. Foi observado como estes personagens se fundem, como as relações são estabelecidas, sendo possível perceber as estratégias de persuasão elaboradas pelos autores na prática do discurso. Seguindo a proposta de Faria e Linhares (1993), o tratamento dos dados abarcou além de identificar os personagens, o conceito lexical, a natureza do vocabulário formado, e a partir disso selecionar ideias postas e pressupostas pelo dito e o não dito, nos possibilitando conhecer elementos silenciados pelos participantes fortemente imbricados nos aspectos ideológicos que permearam os discursos.

Embora a análise do discurso seja um método qualitativo que valorize a interpretação de textos, observou-se que sua validade e confiabilidade são diferenciadas quando comparada a outras pesquisas tradicionais, uma vez que seus eventos e fenômenos estão implícitos em textos e não há um único significado para um texto. Assim, é importante considerar que a confiabilidade e validade nesta análise se baseiam na força e na lógica dos argumentos utilizados, bem como na sua coerência (ERASGA, 2012; JORGENSEN; PHILLIPS, 2002). Desta forma, nesta análise, desenvolvemos uma compreensão crítica por meio do discurso de

como as relações de poder influenciam na configuração das práticas de saúde de médicos e enfermeiros de um Centro de Terapia Intensiva.