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3. MATERIAIS E MÉTODOS

4.6 Tratamento isotérmico

Os tratamentos isotérmicos tiveram como finalidade a produção de metais semissólidos com específicas frações líquidas e microestruturas globulares, para que então fosse possível avaliar da evolução dos seus parâmetros morfológicos e poder correlacioná-los com as propriedades reológicas das ligas.

A figura 4.23 exibe curvas de temperatura obtidas a partir do reaquecimento ao estado semissólido e tratamento isotérmico das ligas do sistema Ti-Cu-Fe estudadas nesse trabalho. Como pode ser observado, executou-se praticamente o mesmo procedimento de aquecimento para todas as condições de tratamentos. A taxa de aquecimento adotada no início do tratamento foi de aproximadamente 430 °C/min até que fosse atingida a temperatura de 900 °C, a partir de então a taxa foi reduzida na medida em que a temperatura alvo se aproximava. Essa redução da taxa de aquecimento objetivou a homogeneização da temperatura em todo volume da amostra de modo que permitisse um maior controle da temperatura durante os ensaios e evitasse que a temperatura alvo fosse ultrapassada.

Figura 4.23 Curvas de aquecimento dos tratamentos isotérmicos

A típica microestrutura desenvolvida a partir dos reaquecimentos e tratamentos isotérmicos à temperatura de 1010 °C das amostras está exibida na figura 4.24. Como pode ser visto, a microestrutura é composta por glóbulos da fase primária Ti-β envolta por uma matriz que supostamente encontrava-se líquida no estado semissólido, a qual é constituída por

partículas das fases Ti-α (região mais escura) e Ti(Cu,Fe) (região mais clara) distribuídas em uma matriz da fase Ti2Cu. Verifica-se que a adição do Fe ao sistema binário Ti-Cu promoveu a estabilização da fase Ti-β nos glóbulos da fase primária após o resfriamento rápido a partir do estado semissólido. A presença de tais fases foi confirmada mediante análise realizada nos difratogramas de raios X exibidos na figura 4.25. A baixa fração volumétrica da fase Ti-α pode ter dificultado a sua detecção pelo equipamento de DRX, de modo que nas ligas #1 e #4 não foram identificados picos referentes a essa fase.

Figura 4.24 Típica microestrutura desenvolvida nas ligas estudadas a partir do

reaquecimentos e tratamento isotérmico à temperatura de 1010 °. Micrografias obtidas a partir do MEV mediante detector de elétrons retroespalhados.

Micrografias das amostras que foram submetidas ao tratamento isotérmico mediante os tempos de 0, 60, 300 e 600 s e então resfriadas rapidamente estão exibidas na figura 4.26. As variações entre as qualidades das imagens e entre as cores referentes aos glóbulos da fase primária e a fase que supostamente apresentava-se líquida no estado semissólido são atribuídas às diferentes formas como as amostras reagiram aos diferentes tempos de ataque químico de suas superfícies. Para melhor visualização de ambas as fases, a figura 4.27 exibe a binarização das micrografias apresentadas na figura 4.26, na qual os glóbulos da fase primária estão representados pela cor preta e a fase que supostamente apresentava-se líquida no estado semissólido está representada pela cor branca.

Figura 4.25 Difratogramas de raios X das amostras tratadas isotermicamente e resfriadas rapidamente a partir do estado semissólido.

É válido mencionar que durante o rápido resfriamento realizado ao fim dos ensaios, as reações entre as partículas da fase primária e a fase líquida continuam a ocorrer, de modo que a taxa de resfriamento aplicada não é capaz de promover a completa retenção da microestrutura presente no estado semissólido.Tzimas e Zavaliangos (2000) avaliaram a exatidão do cálculo das frações líquidas de semissólidos de ligas de Al realizado mediante análise de imagens de amostras que foram resfriadas rapidamente a partir do estado semissólido. Os resultados obtidos por Tzimas e Zavaliangos (2000) demonstraram que, para as ligas estudadas, a taxa aplicada no rápido resfriamento das amostras exerce forte influência sobre a retenção das microestruturas do estado semissólido, de modo que reduzidas taxas podem provocar uma significativa subestimação no cálculo das frações líquidas. Entretanto, estudos demonstraram que a depender da técnica de resfriamento rápido utilizada e/ou das características microestruturais das ligas estudadas, é possível que a medição das frações líquidas realizada por meio de análises de imagens de amostras que foram resfriadas rapidamente a partir do estado semissólido apresentem valores coerentes com aqueles obtidos por via simulações termodinâmicas e análises térmicas (VAN BOGGELEN et al., 2003; OMAR et al., 2005; MOHAMMADI et al. 2011; WANNASIN et al., 2008; GEBELIN et al., 1999). Campo e colaboradores (2017, no prelo) realizaram estudo da microestrutura de ligas do sistema Ti-Cu mediante análise de

imagens de amostras resfriadas rapidamente em água a partir do estado semissólido. Os autores verificaram que os valores das frações líquidas calculados apresentaram-se próximos aos valores previstos mediante as simulações termodinâmicas na condição de equilíbrio. Partindo do princípio que as ligas estudadas no presente trabalho apresentam microestruturas similares às ligas do sistema binário Ti-Cu, admitiu-se que as mesmas possuiam semelhante capacidade de retenção da microestrutura do estado semissólido durante o resfriamento rápido em água. Todavia, reconhecendo-se as limitações e possíveis erros presentes na técnica utilizada no presente trabalho, as frações líquidas calculadas a partir das análises de imagens serão consideradas como uma estimativa das reais frações líquidas presentes no estado semissólido.

Observa-se mediante as figuras 4.26 e 4.27 a baixa fração líquida desenvolvida na liga #1 em todas as condições do ensaio. Tal resultado é indício de que as simulações termodinâmicas (vide figura 4.3) não foram capazes de traduzir comportamento de fusão ligas estudadas, visto que as frações líquidas previstas mediante as simulações divergem significativamente da estimativa obtida a partir dos resultados experimentais. Entretanto, pode- se constatar por meio das microestruturas das demais ligas que o ensaio foi desenvolvido no estado semissólido e que as ligas não atingiram sua completa fusão, dada a diferença apresentada entre essas microestruturas e aquelas referentes à condição de fundidas (vide figura 4.7). Nota-se ainda, como esperado, que as ligas com maiores teores de Cu apresentaram maiores frações líquidas e menores glóbulos. Ademais, verifica-se que as ligas com maiores teores de Cu apresentam na condição 0 s uma maior densidade de partículas, a qual é reduzida com o aumento do tempo de tratamento térmico em decorrência dos mecanismos de coalescência e Ostwald ripening.

A figura 4.28 e a tabela 4.6 exibem dados referentes às estimativas das frações líquidas, diâmetro equivalente médio e circularidade média mensurados a partir da análise das micrografias obtidas nos tratamentos isotérmicos. Mediante tais dados torna-se possível a realização de uma avaliação quantitativa da evolução dos parâmetros morfológicos das ligas estudadas. As linhas tracejadas interligando os pontos dos gráficos foram adicionadas com a finalidade de facilitar a visualização das variações dos valores dos parâmetros de cada liga nas diferentes condições do ensaio (0 s, 60 s, 300 s e 600 s).

As frações líquidas estimadas por meio das análises de imagens (figura 4.28c) mostram bruscas variações crescentes e decrescentes de líquido partindo da condição 0 s para 60 s nas

ligas #3, #4 e #5. Tais variações podem ter ocorrido devido a limitações técnicas do método utilizado para o controle de temperatura e em decorrência do processo de formação de líquido ainda não ter sido concluído. Durante o aquecimento, a temperatura alvo pode ter sido ultrapassada em uma área da amostra distante do termopar, de modo que conduziu ao desenvolvimento de uma fração líquida superior à esperada para a temperatura alvo na condição de 0 s, o que justificaria as variações decrescentes de fL entre as condições 0 s e 60 s. Por outro lado, as variações crescentes de fL entre essas condições podem ter sido causadas devido ao processo de formação de líquido ainda não ter sido concluído. Entretanto, nota-se em todas as ligas, que entre as condições 60 s, 300 s e 600 s houve pequenas variações de frações líquidas, indicando que elas tendem se estabilizar. A maior variação de fL entre essas condições ocorre na liga #2, com valor de aproximadamente 4%. Tal resultado demonstra que de fato as ligas selecionadas apresentam baixa S* e podem ser processadas de forma controlável.

Observa-se ainda mediante a figura 4.28c e a tabela 4.6, as baixas frações líquidas desenvolvidas pelas ligas #1, #2 e #3 quando comparadas àquelas previstas para tais ligas mediante as simulações termodinâmicas. De acordo com as simulações termodinâmicas (vide figura 4.3), as frações líquidas a serem desenvolvidas após o PTA pelas ligas #1, #2 e #3 deveriam ser superiores a respectivamente 20, 30 e 40%, enquanto que as maiores frações líquidas estimadas para tais ligas mediante os tratamentos isotérmicos foram respectivamente 2,6, 15,5 e 26,0%. A figura 4.28d apresenta uma estimativa da curva de fração líquida versus teor de Cu, do intervalo de 18Cu a 28Cu, referente as ligas do sistema Ti-Cu-4Fe quando aquecidas à 1010 °C, a qual foi obtida mediante o valor médio das fL desenvolvidas pelas ligas #1, #2, #3, #4, #5 e #6 nas condições de maior estabilidade (60 s, 300 s e 600 s). De acordo com as simulações termodinâmicas, as temperaturas referentes ao PTA de todas as ligas estudadas nesse trabalho seriam superiores a 1010 °C. Tais divergências apresentam-se como indícios que as simulações termodinâmicas não traduzem satisfatoriamente o comportamento de fusão das ligas analisadas. Porém, esse resultado deve ser analisado com cuidado, pois as simulações termodinâmicas mensuram as frações líquidas em termos de fração mássica, enquanto as frações líquidas obtidas a partir de análise de imagem são baseadas em frações volumétricas. A conversão de fração mássica para volumétrica é possível quando as densidades das fases líquidas e sólidas são conhecidas, entretanto esses dados não são conhecidos para as ligas estudadas. Contudo, acredita-se que a diferença em valores absolutos entre essas frações não deva ser significante. Trabalhos baseados em ligas de Al e Al-Cu indicam que essa diferença gira em torno de respectivamente 2% e 3% (LIU, ATKINSON e JONES, 2005; LIMODIN et

al., 2007). Em decorrência da baixa fração líquida desenvolvida pela liga #1, não foi possível identificar a presença dos glóbulos, o que impossibilitou o cálculo de diâmetro médio e circularidade média das partículas referentes a essa liga.

Os valores do diâmetro equivalente médio (figura 4.28a) mensurados nas ligas #2, #3, #4, #5 e #6 demonstram o desenvolvimento de uma microestrutura refinada. O menor valor foi encontrado na liga #6 em 0 s (26,0 µm) e o maior na liga #2 em 600 s (74,2 µm). De acordo com Hirt e Kopp (2009), a matéria-prima para o processo de tixoconformação deve apresentar valores de diâmetro equivalente médio dos glóbulos inferiores a 100 µm. Constata-se que todas as ligas analisadas atendem a tal recomendação da literatura. Observa-se ainda as ligas estudadas não apresentaram crescimento significativo de partículas mesmo depois de longo tratamento isotérmico (600 s), indicando que essas ligas podem ser processadas com maior flexibilidade e de forma controlável.

O parâmetro de circularidade quantifica o nível de similaridade dos glóbulos do semissólido com uma partícula perfeitamente redonda. Um semissólido detentor de partículas sólidas com elevada circularidade apresenta menor resistência à deformação, o que consequentemente facilita a sua conformação. A literatura recomenda que, para garantir uma boa conformabilidade, o metal a ser processado via tixoconformação deve apresentar glóbulos cuja circularidade média seja maior que 0,6 (HIRT e KOPP, 2009). A figura 4.28b exibe os valores de circularidade média das ligas #2, #3, #4, #5 e #6, a partir da qual percebe-se a tendência do aumento da circularidade média entre as condições 0 s para 600 s em todas ligas. Tal fenômeno decorre da tendência das partículas em reduzirem suas áreas superficiais para atingirem menores valores de energia livre. O menor valor de circularidade foi encontrado na liga #3 em 0s (0,68) e o maior na liga #6 em 600 s (0,82). Dessa forma constata-se que todas as ligas analisadas apresentam valores de circularidade dentro do intervalo sugerido pela literatura.

Figura 4.26 Microestrutura das ligas #1, #2, #3, #4, #5, e #6 após o tratamento isotérmico a 1010 °C por 0, 60, 300 e 600 s.

Figura 4.27 Imagens binarizadas das micrografias das ligas #1, #2, #3, #4, #5, e #6 após o tratamento isotérmico a 1010 °C por 0, 60, 300 e 600 s.

Figura 4.28 Análise quantitativa da evolução dos parâmetros morfológicos referente ao estado semissólido das ligas estudadas quando mantidas a 1010 ºC durante os tempos de 0s,

60 s, 300 s e 600 s. (a) Diâmetro médio equivalente, (b) Circularidade média, (c) Fração líquida e (d) Fração Líquida média (apresentadas nos tempos de 60 s, 300 s e 600 s) versus

teor de Cu das ligas estudadas.

Diante dos resultados obtidos a partir da análise dos parâmetros morfológicos das pastas metálicas das ligas estudadas, verifica-se o elevado potencial que as ligas #2, #3, #4, #5 e #6 possuem para serem aplicadas ao processo de tixoconformação, com ressalva às baixas frações líquidas desenvolvidas pelas ligas #2 e #3, que encontram-se fora do intervalo estabelecido pelo critério adotado nesse trabalho (30% ≤ fL ≤ 50%).

A figura 4.29 apresenta os resultados obtidos por Campo et al. (2017, no prelo) referentes ao estudo dos parâmetros morfológicos do semissólido de ligas selecionadas a partir

do sistema Ti-Cu (Ti-25Cu, Ti-27Cu e Ti-29Cu). Os critérios adotados para a seleção das ligas do sistema Ti-Cu foram análogos aos adotados no presente trabalho. As ligas foram aquecidas à temperatura de 1035 °C e semelhantemente, mantidas nessa temperatura durante os tempos de 0 s, 60 s, 300 s e 600 s antes de serem resfriadas rapidamente. Percebe-se semelhança entre os valores de fração líquida, diâmetro equivalente e circularidade encontrados para as ligas Ti- 25Cu, Ti-27Cu e Ti-29Cu e aqueles respectivamente encontrados nas ligas #4 (Ti-24Cu-4Fe) #5 (Ti-26Cu-4Fe) e #6 (Ti-28Cu-4Fe). Tal equivalência indica que a adição do ferro não promoveu variação significativa nos parâmetros morfológicos do semissólido. Portanto, é possível que a adição de outros elementos possa promover a otimização das propriedades mecânicas da liga sem comprometer significativamente a sua tixoconformabilidade.

Tabela 4.6 Análise quantitativa da evolução dos parâmetros morfológicos referente ao estado semissólido das ligas estudadas quando mantidas a 1010 ºC durante os tempos de 0s, 60 s, 300 s e 600 s.

Ligas Tempo (s) Circularidade média Deq. médio (µm) Fração líquida

#1

0 ―― ―― 2,6 ± 1,2 60 ―― ―― 2,1 ± 0,7 300 ―― ―― 1,7 ± 2,0 600 ―― ―― 1,3 ± 0,7

#2

0 0,69 ± 0,02 60,2 ± 5,8 15,5 ± 3,8 60 0,71 ± 0,03 61,2 ± 6,0 14,8 ± 1,8 300 0,72 ± 0,02 65,9 ± 8,1 13,1 ± 2,1 600 0,72 ± 0,02 74,2 ± 10,5 10,5 ± 4,6

#3

0 0,68 ± 0,02 49,5 ± 3,0 20,2 ± 5,9 60 0,68 ± 0,03 49,8 ± 3,7 24,7 ± 4,1 300 0,72 ± 0,02 53,8 ± 6,3 24,4 ± 8,4 600 0,75 ± 0,02 53,9 ± 4,1 26,0 ± 3,5

#4

0 0,69 ± 0,03 38,6 ± 2,8 36,2 ± 3,0 60 0,70 ± 0,02 42,0 ± 3,3 31,1 ± 3,8 300 0,71 ± 0,03 48,4 ± 2,0 31,4 ± 3,4 600 0,75 ± 0,02 48,6 ± 1,8 31,9 ± 7,2

#5

0 0,73 ± 0,01 35,4 ± 3,0 38,0 ± 1,8 60 0,73 ± 0,01 37,0 ± 4,0 41,1 ± 1,7 300 0,79 ± 0,01 37,4 ± 2,6 42,3 ± 6,3 600 0,79 ± 0,01 39,6 ± 3,1 40,8 ± 4,4

#6

0 0,77 ± 0,01 26,0 ± 1,5 52,9 ± 1,8 60 0,77 ± 0,01 27,5 ± 2,0 51,6 ± 3,0 300 0,80 ± 0,01 31,7 ± 0,9 48,2 ± 4,3 600 0,82 ± 0,01 34,2 ± 1,4 47,9 ± 1,7

Figura 4.29 Análise quantitativa da evolução dos parâmetros morfológicos referente ao estado semissólido das ligas Ti-25Cu, Ti-27Cu e Ti-29Cu quando mantidas à 1035 ºC durante os tempos de 0s, 60 s, 300 s e 600 s. (a) Diâmetro médio equivalente, (b) Circularidade média,

(c) Fração líquida. (CAMPO et al., 2017, no prelo).

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