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Triangulação 3i: inovação, intuição e insights

A proposta de método: Trends for Journalism (T4J)

9. Vinícius da Rocha Barros

3.3.1 Triangulação 3i: inovação, intuição e insights

A triangulação 3i é a etapa em que cruzaremos as informações já conclusivas das 145

tendências identificadas com um processo intuitivo para conexão de insights com foco para inovação no jornalismo. Para isso, iremos confrontar os dados finais das duas primeiras etapas com tendências já identificadas por diferentes órgãos especializados — Trends Observer, Trendwatching, Fjord , Science of the Time, JWT Intelligence/Innovation 146

Group , Faith Popcorn e Box1824. A intenção é reforçar por meio da perspectiva 147

conceitual de jornalismo de inovação alguns insights reflexionados intuitivamente. Inicialmente iremos trabalhar com uma visão associada às tendências com especial atenção à inovação, também empregando conexões de cunho intuitivo na geração de estratégias. A ideia, é basear-se nas experiências como pesquisadora de tendências para adicionar uma camada suplementar, com lampejos aos fundamentos qualitativos e quantitativos adquiridos durante as fases anteriores. Optamos por trazer essa etapa justamente antes do fechamento das tendências para que tenhamos um período de "afastamento" temporal do levantamento de dados e da aplicação das fases iniciais, bem como a perspectiva externa do painel de especialistas.

Concordamos com Els Dragt (2017) quanto ao forte elo entre tendência e inovação:

A nomeação "Three Is" é trazida na proposta de William Higham (2009), quando o autor explica sua 145

proposição acerca do trend marketing e consumer trend. Para Higham, a identificação das tendências é o processo inicial seguido de mais dois "Is", configurando: "Identification> Interpretation> Implementation". A nossa proposta, no entanto, tem outra abordagem, em que a resposta final de nossos estudos será mais abrangente.

A Fjord é uma consultoria de design e inovação que aplica abordagem de pesquisa centrada no ser 146

humano com metodologias para tornar os sistemas complexos em simples e atraentes. Fundada em 2001, a Fjord possui uma equipe diversificada de mais de mil especialistas em design e inovação em 28 estúdios, incluindo Atlanta, Auckland, Austin, Berlim, Chicago, Copenhague, Dubai, Dublin, Helsinque, Hong Kong, Istambul, Joanesburgo, Londres, Los Angeles, Madri, Melbourne, Milão, Nova York, Paris, São Francisco, São Paulo , Seattle, Cingapura, Estocolmo, Sydney, Toronto, Washington, DC e Zurique. A Fjord faz parte da Accenture Interactive, consultoria de marketing digital para alta performance. Mais em: <www.fjordnet.com>.

J. Walter Thompson Intelligence é um braço da J. Walter Thompson Company focada em pesquisa 147

aplicada, com métodos de pesquisas desenvolvidos para áreas de inovação e análises de dados. O Innovation Group, por sua vez é centrado na pesquisa sobre mudanças culturais com o objetivo de convertê-las oportunidades de negócios. Mais em: <https://www.jwtintelligence.com/about>

"enquanto a pesquisa de tendências trata da detecção e compreensão da mudança, um processo de inovação visa criar mudanças. O resultado da pesquisa de tendências é um poderoso ponto de partida para a inovação." (DRAGT, 2017, p. 138, tradução nossa) . 148

A origem do termo triangulação remonta às técnicas de navegação, em que a ideia de uma área unindo três pontos vinha a ser um método para fixar uma posição (COX & HASSARD, 2005), depois sendo apropriadas para a pesquisa em ciências sociais. Donatella Porta e Michael Keating (2008) afirmam que a triangulação diz respeito ao uso de diferentes métodos de pesquisa para complementar um ao outro. Nesse sentido, alertam os autores, vale atentar para metodologias muito díspares, privilegiando áreas afins que partilham procedimentos e perspectivas. O processo nomeado triangulação adotado em nossa pesquisa tem principal influxo na perspectiva empreendida por Martin Raymond (2010), quando trata da triangulação cultural que tem por fim descrever um processo reunindo três métodos de investigação e de análise (qualitativa, quantitativa e intuitiva) para chegar a conclusões similares ou até mesmo iguais. Nilsen Marcondes e Elisa Brisola (2014) destacam que a Análise por Triangulação de Métodos reforça a importância do diálogo entre dados empíricos, autores e contexto geral proporcionando um contínuo movimento dialético (MARCONDES & BRISOLA, 2014).

A intuição pode ser compreendida em pelo menos três perspectivas: instintiva, especializada e estratégica, de acordo com Raymond (2010). Ele retoma alguns aspectos da ciência cognitiva, como a tecnologia de ressonância magnética (RM) que permite visualizar o impacto neurológico dos processos mentais no cérebro. Por meio dessa técnica, segundo o autor, é possível compreender melhor o percurso pelo qual o cérebro passa para chegar às conclusões a que chega, demonstrando o pensamento intuitivo. Até há poucos anos os hemisférios direito e esquerdo do encéfalo eram considerados como responsáveis por diferentes habilidades, como identificado na pesquisa do neuropsicólogo reconhecido pelo Nobel em medicina, em 1981, Roger Sperry. Esse estudo indica que perfis distintos de pessoas usam mais um lado do cérebro do que outro - o esquerdo para atividades mais lógicas e o direito para tarefas mais criativas. Anos mais tarde, no entanto, o neurocientista

No original: "While trend research is about detecting and understanding change, an innovation process is 148

aimed at creating change. The output of trend research is a powerful starting point for innovation." (DRAGT, 2017, p. 138)

Eric Kandel comprovou por meio de tomografia axial computadorizada que o cérebro usa seus dois lados para realizar tanto tarefas majoritariamente objetivas como funções predominantemente imaginativas, vinculando ambos os hemisférios que estão necessariamente interconectados (RAYMOND, 2010). Assim, Raymond (2010, p. 70) defende a ideia de que o pensamento intuitivo deve ser compreendido como um conjunto integral, numa espécie de trama que recebe o nome de "memória de mosaico". Com esse argumento, o autor então compara o processo de identificação de uma tendência - conectando sinais e procurando uma força ou motivação em uma narrativa que os una e os justifique - à própria estrutura do raciocínio intuitivo, ao citar o neurocientista Barry Gordon e Lisa Berger (2003).

A intuição instintiva ou visceral é aquela que é ligada ao senso de proteção, comumente acionando um arquivo de memória em situações de alerta. Caso a situação não seja inédita, o perfil instintivo tende a experienciar uma sensação incomum:

"(...) em outras palavras, [esta sensação] alerta para uma anomalia ou algo novo, diferente e desconhecido até agora em sua gama de experiências arquivadas. Assim, um captador intuitivo, com uma ampla bagagem de experiências ou sinais, pode usar deste mecanismo de alerta para perceber antecipadamente que algo novo e iminente já se vislumbra (RAYMOND, 2010, p. 75, tradução nossa) . 149

Já a intuição de especialista ou especializada é aquela que resulta de anos de trabalho e experiência nesta área. Nesse ponto, destaca-se a importância de se focar em um setor específico, enquanto dialoga com outros especialistas, somando conhecimentos adquiridos aos vivenciados, criando uma capacidade mais assertiva de inferir projeções em uma determinada área. E, por fim, a intuição estratégica, como conceito, tem origem nos estudos do professor William Duggan (2007), em que a intuição estratégica sugere ser a projeção seletiva dos acontecimentos passados formando uma nova combinação que pode ou não se ajustar aos objetivos anteriores. Para Raymond (2010), um contexto de experiências prévias combinado ao que sabemos sobre o presente, a fim de visualizar um futuro, é quando se formam, presumivelmente, os insights na combinação destes dois

No original: "(...) en otras palabras, las alerta ante una anomalía o cualquier cosa nueva, diferente y

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desconocida hasta el momento en su abanico de experiencias archivadas. Así, un captador intuitivo, con un amplio bagaje de experiencias o piezas, puede valerse de este mecanismo de alerta para darse cuenta de que a lo lejos se vislumbra algo nuevo e inminente." (RAYMOND, 2010, p. 75)

conhecimentos. Neste sentido, o autor reitera: "(...) temos de entender que, para produzir esses lampejos de perspicácia [insights], precisamos primeiro desenvolver, aguçar e ouvir três elementos: a consciência do passado, a consciência do pensamento e a capacidade de neutralizar a lógica." (RAYMOND, 2010, p.78, tradução nossa). 150

Nesse sentido, faz-se necessário complementar, ainda que brevemente, o que Raymond (2010) define como consciência do passado, consciência do pensamento e neutralização da lógica. Podemos relacionar por meio do que o autor descreve o contexto em que a pesquisa de tendências deve se dar. É recomendável que se avalie pesquisas já realizadas e sinais já identificados no passado a fim de se compreender novos sinais emergentes. A consciência do passado deve ser trabalhada em parceria com especialistas, inovadores ou adotantes iniciais para enriquecer a perspectiva prévia das áreas de foco de estudo. Num constante exercício de buscar uma macro visão do que vem acontecendo há algum tempo, o captador de tendências "(...) tenta capturar uma 'atmosfera' do que aconteceu e da realidade, formando assim uma ideia sólida do aspecto visual, emocional, situacional e factual do que aconteceu antes, levando em consideração seu próprio ponto de vista e o de outras pessoas". (RAYMOND, 2010, p. 83, tradução nossa). A consciência 151

de pensamento, por sua vez, tem o berço num conceito antigo concebido por seguidores de Buda como algo que os ajudava a deixar as crenças de lado e separar a sua mente de todo e qualquer preconceito diante de uma situação nova ou diferente. Nesse sentido, a ideia da consciência de pensamento soa inversamente proporcional à consciência do passado, pois é uma habilidade que sugere deixar de lado o que se aprendeu em experiências anteriores e focar nos acontecimentos do presente sem ideias pré-concebidas.

O objetivo é neutralizar o ponto de entrada de novos sinais, sem já antecipar a inclusão ou exclusão dessa nova perspectiva, o que também é conceituado como análise transcultural. O autor faz referência a esse processo de reunir sinais e fazer o jogo intuitivo como um "tanque de fermentação", em que os insights têm mais possibilidade de se

No original: "(...) tenemos que comprender que para que puedam producirse estos destellos de perspicacia 150

primero tenemos que desarrollar, agudizar y escuchar tres elementos: la conciencia del pasado, la conciencia del pensamiento y la capacidad de neutralizar la lógica" (RAYMOND, 2010, p. 78).

No original: "(...) intenta captar una 'atmosfera' de lo sucedido así como la realidad. De este modo se 151

forma una sólida idea del aspecto visual, emocional, situacional y factual de lo que ha ocurrido antes, teniendo en cuenta su propio punto de vista y el de otras personas" (RAYMOND, 2010, p. 83).

revelar, semelhante ao que propomos como um todo na nossa fase de triangulação 3i. Neste "ambiente" devemos inserir estudos de caso relevantes, dados, estatísticas, entrevistas e conversas com inovadores e adotantes iniciais, experiências de especialistas, reflexões de nossos cadernos, artigos de autores pertinentes, entre outros materiais complementares. E, por fim, a neutralização da lógica é entendida como uma fase de "afastamento" do que já foi encontrado (fermentado e destilado, mantendo a metáfora do tanque de fermentação do autor), em que se deve racionalizar o conteúdo. Segundo Raymond (2010), todo o conteúdo amadurece na rede neural por padrão do sensor, dando soluções globais ou pensamentos mais abrangentes.

Importante destacar que trazemos novamente a inovação para este ponto, pois a abordagem sociocultural e abrangente da natureza das tendências, (incluindo as tendências de setor) pode gerar uma certa incongruência com a visão inovadora dentro da área jornalística. Nessa fase, também retomaremos a conceituação de jornalismo de inovação apresentada no primeiro capítulo para traçar estratégias mais alinhadas às empresas que fazem parte do estudo e seus micro-contextos (jornalismo tradicional e nativo digital).