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3. O VALE DO JEQUITINHONHA E O MERCADO MUNICIPAL DE ARAÇUAÍ

3.2. A CIDADE DE ARAÇUAÍ

3.2.2. UM BREVE HISTÓRICO DA CIDADE

A região hoje conhecida como município de Araçuaí foi habitada por muito tempo, segundo Jardim (1998), por índios Tocoió e Botocudo, ramos dos Tapuia já misturados com os Aimoré. A região do Vale do Jequitinhonha, assim como todo o norte e nordeste de Minas Gerais, começou a ser “desbravado” por bandeiras em busca de riquezas minerais e a caça de índios. Com o passar do tempo a região se tornou habitada pelos bandeirantes que abandonaram as bandeiras para se fixarem definitivamente no Vale e por índios subjugados, iniciando-se a construção de dinâmicas e relações sociais, culturais e econômicas locais.

Um lugar foi de enorme importância nesse momento histórico, o encontro dos rios Jequitinhonha e Araçuaí. A Barra do Pontal, hoje conhecido como Itira, foi um local onde uma população começou a se instalar devida à estratégica localização, tendo em vista o transporte de produtos por via fluvial. Muitos canoeiros por ali passavam transportando cargas vindas da Bahia para os comercializarem na região e no retorno levarem a produção local. A canoa era a forma de escoamento da produção da região e ali se iniciava uma intensa movimentação e circulação de pessoas e produtos.

Existem algumas divergências acerca de diferentes versões da história de Araçuaí a partir dai. Entre os anos de 1830 e 1840, por conflitos com o padre do

Pontal, Padre Carlos Pereira Freire de Moura23, prostitutas são expulsas e se transferem rio acima para a confluência entre o córrego Calhau e o rio Araçuaí. Segundo Jardim (1998:103), “após algum tempo, foram surgindo os primeiros casebres e desenvolvendo-se um comércio de comidas, bebidas e diversões, onde os canoeiros passaram a pernoitar”

Elas se instalaram numa região onde já havia a fazenda de uma negra conhecida como Luciana Teixeira. Segundo consta, esta doa parte de suas terras para a instalação do meretrício. Outros defendem que a Luciana Teixeira sempre lá esteve e não teve relacionamento com as prostitutas. Já alguns chegam a dizer haver indícios de que Luciana tenha sido uma prostituta que coordenou o meretrício no local. A versão mais aceita é a de que ela tenha doado parte de sua fazenda para as prostitutas, assim como para muitos outros que lá se instalaram.

O certo é que deste novo local de povoamento surgiu a cidade de Araçuaí. A Barra do Pontal, povoamento inicial, com o tempo se tornou secundária e parte da cidade. O viajante francês Saint-Hilaire, passava pela região em 1817, hospedou-se na fazenda de Luciana e relata em suas anotações suas impressões. Assim como outros viajantes que na mesma época por ali passaram, não relataram a presença de nenhum povoamento no local, o que reforça a hipótese de que o povoamento se desenvolveu na região após o deslocamento das prostitutas e a conseqüente maior movimentação de canoeiros.

Pousei na casa de Boa Vista, talvez a mais agradavelmente situada de todas as que até esse momento vira. É construída sobre o cume de uma colina isolada embaixo da qual deslizam com lentidão as águas límpidas do Araçuaí (SAINT- HILAIRE apud JARDIM, 1998:103).

Depois de deixar a sua casa (Boa Vista), atravessei o Ribeirão de Clahao em que se encontram pedras preciosas e se lança no Araçuaí (SAINT-HILAIRE apud JARDIM, 1998:103).

Do povoamento se formou uma vila, declarada como cidade no dia 21 de setembro de 187124. De acordo com Saint-Hilaire, o nome Araçuaí significa rio

23 Este padre “embrenhou-se naqueles ermos por estar implicado na conspiração dos Inconfidentes. O Pe. Carlos é o mesmo que mais tarde foi nomeado bispo de Mariana, mas que antes de ser sagrado morreu na viagem”(www.aracuai.gov.br)

24 “Em 1851, a paróquia do Calhau foi desmembrada do município de Minas Novas e em 1853 elevada a vila, conservando o nome Calhau. Pela Lei 803, de 03 de julho de 1857, foi a paróquia

das araras grandes. “Ara= ave; açu= grande; i= rio” (JARDIM, 1998:105). Há outras versões para o nome, mas esta é mais aceita pelos historiadores.

Fatos que marcaram a memória da população de Araçuaí foram as três devastadoras enchentes ocorridas na cidade. No ano de 1919, ocorreu a primeira, que veio de forma inesperada e atingiu uma enorme quantidade de moradores da cidade, em especial aqueles que viviam na beira do rio Araçuaí na chamada parte baixa da cidade. A cidade começava a ser reconstruída, com ajudas diversas. Nesse momento o município já podia ser considerado o grande pólo cultural e econômico regional. O comércio, principalmente através das canoas, fazia de Araçuaí um lugar de negócios, passagem e encontros.

As canoas subiam e desciam trazendo novidades e até móveis, pianos, baixelas, sedas, brocados e outras mercadorias encomendadas ou adquiridas das mãos dos mascates que ai aportavam. (...) As canoas eram o único meio de transporte, a não ser o lombo dos cavalos. E Araçuaí era a metrópole para onde convergiam os que queriam fazer negócios. Era o pólo cultural do sertão (JARDIM, 1998:114).

Em 1928 ocorreu uma segunda grande enchente, terminando de destruir o que ainda havia resistido e aquilo que havia sido recuperado. Segundo Jardim (1998:114), “foram construídos mercado, prefeitura e outros prédios públicos, só que na região inundável. Apenas o bonito grupo escolar e cadeia haviam sido edificados numa encosta, ficando a salva da enchente”25.

Em 1979, ocorreu uma terceira enchente. Em função desta, foi construída a barragem do córrego do Calhauzinho com o intuito de controlar o nível de água dos rios no período de cheias. O trauma foi tão intenso que continua vivo no imaginário da população, e alguns quarteirões da parte baixa da cidade continuam inabitados desde a última enchente.

dezembro de 1865. A 21 de setembro de 1871, pela Lei 1.780, a Vila foi elevada a cidade, com o nome Araçuaí” (JARDIM, 1998:106)

Figura 27: cartão postal da cidade de Araçuaí