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UM LUGAR DE ENCONTRO – A METODOLOGIA COMO

4 DA CIDADE COMO OBRA E ESPAÇO DE LUTAS

5.1 UM LUGAR DE ENCONTRO – A METODOLOGIA COMO

Para a realização desta pesquisa, consideramos o projeto que Bakhtin delineia, lá nos anos 1920, como “filosofia do ato”. Buscamos a irrepetibilidade da palavra, sua singularidade, sua

compreensão respondente, não sua interpretação, decifração, como se fosse objeto. Buscamos o acolhimento, a “alteridade como relação de diferença não-indiferente” (PONZIO, 2010, p. 32).

Como cada sujeito ocupa um lugar singular, irrepetível, impenetrável, a pesquisa centrou-se no encontro desses sujeitos. O encontro não homogêneo, não pacificador, mas o encontro do não-lugar, o encontro de alteridades que falam longe do lugar comum, fora da responsabilidade da verdade, da certeza. Esses encontros propuseram a não posse da verdade. Nem o pesquisador nem os participantes da pesquisa a possuem. Exatamente o contrário. Pois se alguém possui a verdade, se coloca em um lugar irretocável, inatingível, o lugar de deus. Não buscamos o discurso ordinário, o lugar comum, o padrão; buscamos o original, não no sentido de inédito, mas como único, dissidente.

Estávamos diante então de um tempo único, mas futuro e passado se encontravam com suas vozes, seus atores, seus anseios e desejos. Tratava-se de um encontro sem álibis, sem máscaras, por se tratar de um não-lugar. Não é um encontro interesseiro, mas interessado. Interessado no outro, na alteridade, na voz do outro. Um encontro onde não há abrigo para a palavra viva, por isso um encontro sem álibi, por isso um encontro onde não se pôde apreender o outro, mas relacionar-se com ele, com seu próprio existir em relação ao eu-outro. Por isso, não falamos em lugar do outro, falar-se-á do lugar único. Pois, como afirma Ponzio (2010, p. 33) “[...] o eu de cada um, como eu não teórico, é o existir em maneira não- substituível e não intercambiável em relação ao outro”.

Então como seria possível a palavra do outro? Por meio da dialogicidade, por meio do encontro. A palavra alude sempre à palavra do outro, mesmo que contra a sua vontade. Por isso, ela nos é importante, essencial. Ela só se dá no encontro. “É o encontro que faz existir a palavra como uma outra palavra” (PONZIO, 2010, p. 39).

Esses encontros se deram com os sujeitos, numa perspectiva exotópica, que segundo Carvalho (2012, p. 4):

[...] aplicada à pesquisa nas Ciências Humanas convida o pesquisador ao movimento de escuta, de possibilitar ao outro o conhecimento do que se pôde observar do seu mundo e das suas concepções, em um processo de reconhecimento e de respeito pela palavra desse sujeito que nos completa na sua alteridade e na sua diferença.

Isso não significou a liberdade de palavra, pois como nos alerta Ponzio (2010), essa escuta não implicou aceitação, concordância com a palavra “do outro”, pois ninguém é “dono da palavra”. Essa escuta implicou tolerância, não a tolerância do sujeito superior aos sujeitos menos importantes, mas uma “tolerância ativa”, tolerância como necessidade, tolerância ao outro no sentido da não indiferença, ou seja, o outro é essencial em sua singularidade, que conflita com as demais por ser irrepetível. É nesse sentido que propomos o encontro, a fim de perceber o que é singular em cada encontro com a palavra do outro e do eu-outro.

Para fins de adequações ao gênero dissertação, detalhamos os “procedimentos” seguidos, ressaltando o caráter provisório desse estudo, pois, a qualquer tempo, “uma pedra no meio do caminho” pode se tornar um “acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas”, como diria Drummond (2013).

Atendendo as formalidades das pesquisas em Ciências Humanas, no primeiro encontro com os professores, apresentamos a pesquisa, seus objetivos, sua metodologia e a opção de aceitar participar ou não da pesquisa. Em seguida, com aqueles que decidiram pela participação, lemos a poesia de Elmo Elton, a fim de encontrar poemas propícios ao trabalho nas disciplinas dos professores que acolheram a pesquisa e tratamos de como poderiam ser trabalhados em sala de aula.

A escolha dos primeiros textos a serem lidos atendeu aos seguintes critérios: 1. Poemas que tinham como cenário a Cidade;

2. Poemas que tinham como tema a Cidade; 3. Poemas que continham personagens citadinos.

A escolha destes poemas possibilitou, posteriormente, a criação dos textos do paradidático, pois foi a partir das primeiras leituras que surgiram as ideias de cada conto ou crônica produzidos.

Os poemas selecionados para o primeiro encontro foram os seguintes: “Uma história praieira”, “Cantiga de uma rendeira”, “De volta à Vitória”, “Vitória! Vitória! Que mar este teu!”, “No cais de Vitória”, “Lavadeiras da Fonte Grande”, “Meu berço querido”, “No Convento da Penha”. Todos esses poemas estão reunidos na coletânea O poeta da Cidade: Elmo Elton: vida e obra (2014). A escolha dessa coletânea se deu pela facilidade ao seu acesso

e por ela ter sido feita justamente contemplando, principalmente, os poemas que têm a cidade de Vitória como tema ou cenário.

Nesse mesmo encontro, propusemos aos participantes da pesquisa a produção de memórias de leitura, que não foram escritas, talvez por que não insistimos na produção, talvez porque os professores não dominaseem o gênero, ou mesmo porque não se sentiram à vontade para expor sua escrita a um colega docente. A produção desse texto também seria de grande importância quando pensamos na perspectiva dialética de Bakhtin, Amorim (2002, p. 8) afirma que:

O texto interessa-me como lugar de produção e de circulação de conhecimentos, porque penso que a escrita de pesquisa não se reduz a uma simples transcrição de conhecimentos produzidos em situação de campo. Pode-se desse modo interrogar o texto em relação a várias questões, das quais uma, em particular, parece-me importante: a alteridade ou, dito de outra maneira, a relação entre o pesquisador e seu outro, ou melhor, seus outros.

A análise dos textos produzidos pelos professores se daria na perspectiva da Metodologia Narrativa de Pesquisa em Educação (PRADO; SERODIO; PROENÇA; RODRIGUES, 2015). Nessa perspectiva, as produções dos textos escritos são consideradas como dados de pesquisa, pois as produções docentes são relevantes para a construção do conhecimento sobre a sua própria atividade, formação e também para a produção de conhecimentos sobre o ensino e a aprendizagem. Essas “Narrativas Pedagógicas” carregam em si parte das experiências, das vivências, da reflexão, da atuação desses profissionais envolvidos no ato educacional. Para nós, importa a “presença” dos sujeitos no texto, por não buscarmos superficialidade, mas, ao contrário, a “profundidade do conhecimento”; interessam-nos os aspectos “quase biológicos das individualidades” (BAKHTIN, 2010, p. 266). Por isso adotamos a metodologia narrativa de pesquisa, pois esta “parte das relações reais para produzir a concretude de seus enunciados” (SERODIO, PRADO, 2015, p. 100).

Como assumimos uma postura “interessada”, não mais imparcial, como pressupõem as pesquisas de cunho positivista, conhecer esses profissionais nos interessa, saber de onde eles falam nos é importante. Pretendemos resgatar dessas memórias as relações com a literatura e a cidade que os docentes tiveram e/ou têm ao longo de suas vidas. Os escritos produzidos durante a pesquisa, e mesmo antes dela, documentam a prática docente. Tomando as produções como atos de responsabilidade dos sujeitos, deixamos de lado a escrita fortemente marcada pelo estilo academicista para tentar encontrar um estilo que tenha mais a dizer sobre o sujeito, mais sobre sua singularidade, pois como já foi dito anteriormente, nos interessa “a profundidade do estudo”.

A partir deste ponto de vista, não vamos somente produzindo dados segundo categorias para formar um processo investigativo. Trazemos o todo de nossas questões ao lado de nossa emoção-volição e empenho com a pesquisa, e com os ‘nossos’ sujeitos desde quando os acontecimentos são tornados atos na escrita como expressão da vida mesma e nossos (des) encontros. (SERODIO, PRADO, 2015, p. 109).

Em conjunto com a Metodologia Narrativa, esses encontros serão transcritos em notas de campo, conforme as propostas por Bogdan e Biklen (1994, p. 150-172) que, mais tarde, serão analisadas e textualizadas, buscando “[...] dar forma e conteúdo ao acontecimento vivido no campo da pesquisa” e “criar zonas provisoriamente estáveis de pensamento sobre uma dada realidade” (SOUZA & ALBUQUERQUE 2012, p. 116).

Outro recurso a ser utilizado durante o processo de pesquisa são as entrevistas semiestruturadas (Conforme apêndice B) com os docentes a fim de ouvirmos suas vozes. Essas entrevistas terão, conforme Lüdke e André, (1986, p. 33) “[...] caráter de interação, havendo uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde”, podendo também haver conflitos e discordâncias e “abalo de nossas certezas” (SOUZA & ALBUQUERQUE 2012, p. 110). Esse movimento dialógico não pode ser previsto, engessado, segundo Bakhtin: “O sujeito da compreensão não pode excluir a possibilidade de mudança e até de renúncia aos seus pontos de vista e posições já prontos. No ato de compreensão desenvolve-se uma luta cujo resultado é a mudança mútua e o enriquecimento (2010, p.378)”. Interessam-nos as vozes por se tratar de uma pesquisa na perspectiva bakhtiniana, pois pretendemos construir um texto polifônico em que as vozes de nossos pares sejam ouvidas. Entendemos que, quando se trata de pesquisa com sujeitos, o objeto nunca é fechado, nunca está acabado, não há uma verdade inequívoca, há sempre, como afirma Amorim (2002, p. 11), “[...] uma espessura e uma instabilidade que se devem levar em conta e que remetem à própria espessura e instabilidade do objeto e do saber que estão se tecendo no texto”. Nosso objeto, por ser vivo, “não para nunca de se mexer, a cada vez que dele se fala, assim como um caleidoscópio” (2002, p. 11.).

5.2 O TEMPO E O LUGAR DE ENCONTRO – PROPOSTA DE CRONOGRAMA E DE