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Um pouco de história sobre a probabilidade

Para você, como surgiu a probabilidade?

Você já ouviu falar que a teoria das probabilidades surgiu por causa dos jogos de azar? Leia algumas informações a respeito.

A ideia de acaso surge na Antiguidade, com os jogos de azar e as crenças que existiam na época. Os povos que viviam na Mesopotâmia ou no Egito Antigo relacio- navam a ideia do acaso com o sobrenatural. A relação do acaso com o sobrenatural perdurou ao longo do tempo. Os jogos de azar eram utilizados com objetivos de lazer, mas integravam uma dimensão mística do acaso.

Os primeiros estudos sistemáticos sobre Probabilidade foram elaborados por Girolamo Cardano no século XVI. Alguns autores acreditam que essa demora foi de- corrente do fato que obras científicas que tratassem de uma possível sistematização de jogos de azar não seriam consideradas sérias, já que os jogos não eram vistos com bons olhos pelos sábios.

Além disso, consideram que os primeiros “dados de jogo” não possuíam um balanceamento perfeito e isso impedia que fosse percebida alguma regularidade dos eventos possíveis. Isso ocorria porque eles eram feitos de ossos de animais diferentes. Outra causa do atraso da matematização do acaso está ligada à crença de que não seria prudente intervir no acaso, pois ele se encontrava no domínio divino, uma vez que se acreditava que os acontecimentos na Terra eram dirigidos pelos deu- ses. Os povos atribuíam o resultado do lançamento de um dado à manifestação da vontade dos deuses.

No âmbito da Filosofia, existem três diferenças com relação ao acaso que se entrelaçam: a) o conceito subjetivista pelo qual a imprevisibilidade e a indeterminação do evento casual são atribuídas à ignorância ou à confusão do homem; b) o conceito objetivista que atribui o evento casual à mistura e à interseção das causas; c) a interpreta- ção moderna que considera o acaso como a insuficiência de probabilidades na previsão.

Os estudos de Piaget e Inhelder (1993) sobre a origem da ideia de acaso na criança permitem compreender como se dá o desenvolvimento da noção de pro- babilidade. Esses autores destacam os mesmos estágios definidos pela Filosofia na construção da ideia de acaso pela criança. Eles afirmam que nem tudo que está à nossa volta pode ser previsto de antemão com precisão, mas que, mesmo assim, os indivíduos, ao vivenciarem uma situação, arriscam uma predição na tentativa de compreendê-la e conviver com ela. Eles consideram que esse tipo de atitude leva a crer que o ser humano na idade adulta “possui” uma intuição de probabilidade. Os resultados dos estudos desses autores mostram que: o primeiro estágio de desenvol- vimento da ideia de acaso pela criança (antes dos 7- 8 anos de idade) “se caracteriza pela ausência de operações propriamente ditas, isto é, de composição reversível;

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os raciocínios em jogo permanecem então pré-lógicos e são regulados apenas por sistemas de regulações intuitivas” (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 294). Nesse está- gio, “a criança nem sequer entrevê a possibilidade de um sistema que lhe permita achar, sem esquecer nenhuma, todas as combinações duas a duas, todas as permu- tações, ou todos os arranjos dois a dois realizáveis por meio de alguns elementos” (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 294). Eles afirmam que isso ocorre porque essas são operações multiplicativas particulares e as crianças, nesse estágio, não são capazes de compreender as operações aditivas e multiplicativas mais simples. Segundo eles, durante esse primeiro estágio, a criança não diferencia o possível do necessário. Seu pensamento oscila entre o previsível e o imprevisto, mas nada é para ela nem seguramente previsível, quer dizer, dedutível segundo um elo de necessidade; nem seguramente imprevisível, quer dizer, fortuito (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 294).

De acordo com esses autores, o período seguinte, dos 7-8 a 11-12 anos, marca a transformação da ideia de acaso. Ele “se caracteriza pela construção dos grupamen- tos operatórios de ordem lógica e numérica, porém num plano essencialmente concre- to, ou seja, relativo a objetos manipuláveis representáveis no detalhe de suas relações reais” (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 294). Nessa fase, a descoberta da necessidade dedutiva ou operatória permite à criança conceber o caráter dedutivo de transforma- ções fortuitas isoladas e de diferenciar o necessário do possível. Por outro lado, o en- caixe operatório das partes complementares de um todo leva à disjunção “concreta”. Essa disjunção concreta ocasiona a noção de duplas ou de múltiplas possibilidades, que implica todo julgamento de probabilidade (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 296).

Os autores concluem que é somente no terceiro estágio (após 11-12 anos) que o julgamento de probabilidade se organiza, “por uma espécie de choque em volta da operação sobre o acaso” (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 296). Nessa fase, “há a síntese entre o acaso e as operações, permitindo estas estruturar o campo das dispersões fortuitas em um sistema de probabilidades, por uma espécie de assimila- ção analógica do fortuito ao operatório” (p. 297). Para eles, chegar a esse resultado envolve dois processos correlatos. Por um lado, a construção dos sistemas combina- tórios, a partir de um método que permite efetuar o conjunto das operações possí- veis sobre um pequeno número de elementos. Isso leva o sujeito a executar algumas possibilidades particulares e sem ordenação. Por outro lado, o pensamento formal, que permite a construção de sistemas combinatórios, a descoberta das proporções. Isso leva à lei dos grandes números que aplica as relações de proporcionalidade às operações combinatórias e permite que o sujeito conceba a legitimidade de uma composição probabilística das modificações fortuitas, no sentido de uma dispersão proporcionalmente mais regular e, por conseguinte acessível – na sua totalidade, se- não no detalhe – à previsão racional (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 297).

Segundo esses autores, ao atingir um ponto avançado na evolução individual acerca do acaso, as probabilidades baseadas nos grandes números assinalam “uma espécie de síntese entre a operação e o fortuito – após a antítese, a princípio radical, sentida no início do segundo período, e a não diferenciação própria do primeiro” (PIAGET; INHELDER, 1993, p. 297).

Os estudos desses autores sobre probabilidade permitiram conclusões sobre raciocínio probabilístico associado com ideias de aleatoriedade, espaço amostral, combinações, eventos mais ou menos prováveis, distribuição de probabilidades e lei dos grandes nú- meros, entre outras.