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3. A escrita de uma cidade que sente

3.1. Um pouco de história: o jornal O Povo

Antes de seguir, é preciso indicar com mais detalhes sobre o que estamos falando. Objeto de estudo desta pesquisa, o jornal O Povo é o mais antigo periódico cearense em circulação no Estado, prestes a completar 83 anos. Criado por Demócrito Rocha, a primeira edição circulou em 7 de janeiro de 1928 e, no editorial daquele dia, intitulado “Falando ao povo”, dizia que “o povo necessita de mais gritos que o estimulem, de mais vozes que lhe falem ao sentimento”, segundo texto da jornalista Ana Mary C. Cavalcante no Especial O

Povo 80 anos, lançado pela empresa de comunicação em 2009. Assim, O Povo nasce prometendo ser uma nova voz popular – o que o próprio nome do jornal consegue indicar.

No começo, eram apenas 16 páginas. A partir da modernização das máquinas, o jornal ganhou seção de classificados, começou a cobrar pela publicação de pequenos anúncios, cresceu. Com a morte de Demócrito Rocha, em 1943, o antigo redator, repórter, noticiarista e diagramador d’O Povo, Paulo Sarasate, assumiu a presidência da empresa, permanecendo ali até a morte, em 1968. Depois, vieram Creuza Rocha (1968-1974), Albanisa Sarasate (1974- 1985) e Demócrito Dummar (1985-2008), neto do fundador. Atualmente, o jornal O Povo é presidido por Luciana Dummar, a primeira dos quatro filhos de Demócrito Dummar.

A estrutura da redação do jornal O Povo está dividida em cinco núcleos. Há o Núcleo de Cultura e Entretenimento; de Cotidiano, que reúne as editorias Fortaleza, Ceará, Gol e o caderno dominical Ciência e Saúde; de Conjuntura, com as editorias de Política, Brasil e Mundo e as páginas Espiritualidade e Página 2; de Negócios, com as editorias de Economia, Turismo, Emprego e Veículos; e o Núcleo de Coberturas Especiais.

Após diversas transformações gráficas e editoriais, desde a fundação, em 5 de janeiro de 1997, o jornal estreou o Projeto Século XXI. Com a aproximação do novo século, foram realizadas mudanças gráficas e editoriais que representavam uma adaptação da publicação às novas tecnologias nascentes e às exigências do leitor. Em 1998, o projeto foi revisto e

o jornal traçou claramente as linhas que até hoje o norteiam: a de humanizar, cada vez mais, suas reportagens, e a de fazer de suas páginas um espaço em que o leitor se veja como participante (...). A partir da perspectiva do jornal como agente social, a quantidade de campanhas veiculadas ou promovidas pelo jornal é intensificada, como maneira de promover debates e engajar a comunidade na busca por melhorias sociais, políticas e culturais (Edição Especial O Povo 80 anos, 2008, p. 106).

Entre as metas da publicação, “ser um jornal com foco centrado, essencialmente, na vida de Fortaleza” (idem).

Essas são características importantes na análise que nos propusemos a fazer. Unem-se os objetivos e podemos perceber a preocupação editorial com a humanização de uma cidade. Cumprindo com a meta apresentada no lançamento do Projeto Século XXI, Fortaleza está sempre em destaque nas páginas do jornal O Povo. Como o veículo é cearense e circula

predominantemente na capital do Estado, os problemas e as situações cotidianas da cidade estão diariamente presentes no conteúdo da maioria das editorias. É importante destacar que a ligação do jornal com a cidade chega ao ápice em 13 de abril, dia do aniversário, normalmente “comemorado” com projetos especiais. Nessa data, a vida de Fortaleza é destrinchada, os fortalezenses ganham voz e são convidados a comemorar a data sentindo a cidade escrita. Em 2007, o caderno cultural d’O Povo, o Vida & Arte, circulou sob o título Os

7 pecados da capital. Em sete reportagens, sete jornalistas relacionaram os sete pecados

capitais instituídos pelos católicos a situações típicas de Fortaleza. Em 2008, os 282 anos da cidade foram lembrados ao longo do jornal em textos que destacavam as particularidades do fortalezense. Em 2009, houve o especial aqui estudado e, em 2010, foi lançada a revista

Fortaleza do futuro, publicação que mostrou dados do desenvolvimento urbano da capital.

Além disso, quando não há comemoração de aniversário em vista, personagens do cotidiano da cidade e lugares normalmente pouco divulgados são enfocados na publicação. Um exemplo é a reportagem Fortaleza inédita, de 17 de agosto de 2008. No texto, um exemplar de domingo do Vida & Arte, seis bairros pouco conhecidos da cidade foram vividos por seis repórteres. O especial, inclusive, venceu, em 2008, o prêmio Edson Queiroz, oferecido pela Associação Cearense de Imprensa (ACI).

Pelos projetos especiais, tão valorizados pelo jornal – tanto que há um núcleo específico para produção de grandes reportagens e cadernos temáticos, o Núcleo de Coberturas Especiais –, O Povo já foi premiado diversas vezes. Foram 12 prêmios Esso11, uma das mais conceituadas premiações do jornalismo brasileiro, que completa 55 anos em 2010. Os jornalistas Cláudio Ribeiro e Demitri Túlio, repórteres especiais d’O Povo, receberam, cada um, seis Esso. (cf. Edição Especial O Povo 80 anos, 2008).

Percebe-se, dessa maneira, uma preocupação da empresa em produzir conteúdo diferenciado. O jornal, mesmo seguindo as leis de mercado, lutando pelo furo jornalístico, acompanhando os fatos da cidade e do Estado, abre espaço para coberturas especiais, como é

Fortaleza – Sentidos da cidade. Em entrevista feita para esta pesquisa, a coordenadora da

publicação e, à época, editora-assistente do Núcleo de Cultura e Entretenimento do jornal, jornalista Regina Ribeiro, diz que, no segundo semestre de cada ano, todos os editores da empresa se reúnem e apresentam projetos jornalísticos para o ano seguinte. A única exigência da chefia é de que sejam propostos projetos que possam “ser comercializados, viáveis

comercialmente” (RIBEIRO, Regina. Depoimento [out. 2010]. Entrevistador: Mariana Lazari da Silva e Silva. Fortaleza, 2010. Entrevista concedida para elaboração de monografia). Alguns são executados e outros não. Fortaleza – Sentidos da cidade foi o escolhido para a comemoração dos 283 anos da cidade.