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Uma incursão pela Filosofia da Matemática e a explicitação do que é investigado

Capitulo II. A trajetória de investigação: trazendo o diálogo com os autores.

2.2. Um percurso histórico na busca da elucidação das figuras e compreensão do sentido dos diagramas

2.2.3. Uma incursão pela Filosofia da Matemática e a explicitação do que é investigado

Nosso primeiro contato em Filosofia da Matemática foi com a obra “The Shaping of Deduction in Greek Mathematics” (Netz10, 1999), onde buscamos compreender o sentido que as palavras figura e diagrama poderiam assumir. Já de início, entendemos que essa mudança não se refere apenas à nomenclatura. Figuras e diagramas assumem concepções diferentes.

Na leitura de Netz pudemos ir além do que nos disse Hogben, já que ele trabalha o sentido da palavra. Ele nos diz que nossa palavra diagrama deriva do grego diagramma cujo principal significado é "figuras marcadas por linhas".

Os gregos usavam os diagramas em diferentes contextos e com diferentes sentidos.

Platão usa freqüentemente o termo Diagramma como prestigio para provas matemáticas ou como acompanhando o rigor matemático.

Aristóteles usa diagrammata (o plural de diagramma) praticamente como sinônimo de matemática ou como significando "uma proposição matemática". Sócrates usava com seus jovens alunos de geometria, não os ininteligíveis diagrammata, e, com isso, podemos pensar que eles seriam muito mais do que hoje entendemos por diagramas.

A palavra diagramma, segundo Netz, nunca era usada pelos gregos no sentido de "diagram" (figura). Quando eles queriam enfatizar que as proposições estavam relacionadas a "diagram" (figuras), eles as caracterizavam por "dia grammõn", por meio de linhas, em oposição a outra opção "di arithmõn", por meio de números.

Pappus, diz Netz, usa diagramma como um simples equivalente da nossa proposição. Em alguns casos, quando ele refere-se ao diagram (figura) na proposição, ele usa hupographe, um derivado da palavra Katagraphe, melhor traduzida por "desenhado". No entanto, nenhuma dessas palavras tem o sentido de diagrama, tal qual os gregos a utilizavam. A palavra diagrama era reservada para significar "aquilo que uma proposição é". Diagramma é, para os gregos, um metônimo de proposição. Isto é tão forte que, quando queremos fazer uma referência ao diagrama, que não a proposição, temos que usar um outro termo mais específico.

Voltamo-nos, mais uma vez, para nossa intenção investigativa e interrogamos; qual o nosso desejo ao questionar o significado epistemológico dos diagramas na construção do conhecimento matemático?

Não queremos estudar se existe a possibilidade de as figuras, ou imagens, serem utilizadas como provas de teoremas ou se esses teoremas têm uma demonstração geométrica ou visual, pois isto já está discutido, de modo suficiente, na literatura. Além disso, a própria leitura de Netz nos deixa claro que os diagramas, como concebidos e utilizados pelos gregos, não são provas no sentido

que hoje as conhecemos, tais como foram estabelecidas pelo formalismo11. Eles

não eram usados, pelos gregos, como provas de afirmações, pois eles eram as afirmações.

Vimos, no movimento desta investigação, a questão inicial tomando forma e se organizando. Nosso interesse caminha na direção de saber se há um tipo de "pensamento visual" que tenha o significado de descoberta tanto quanto acreditamos que tem o significado de ilustração. Buscamos investigar o significado epistemológico dos diagramas na produção do conhecimento matemático. Para isto, sentimos a necessidade de compreender qual é a epistemologia condizente com o rigor exigido no contexto histórico em que nos situamos ao admitirmos que há um significado epistemológico para os diagramas.

Perguntamos pelos modos segundo os quais o conhecimento geométrico foi produzido e o significado que os diagramas tinham no cenário das produções matemáticas. Questionando o significado epistemológico dos diagramas, interrogamos o modo de nos abrirmos à compreensão dos objetos matemáticos. Como os diagramas podem auxiliar no conhecimento dos objetos matemáticos?

Ou seja, ao perguntar pelo significado epistemológico, interrogamos se há e, se houver, qual é a ligação entre essa vivência da figura, que, a princípio entendemos como intuitiva, e o conceito geométrico, que vemos como uma objetividade matemática12.

Olhamos para o panorama atual e nos deparamos com uma forma de expressão da produção matemática que elimina a evidência da experiência sensível e perguntamos pela concepção existente na época, quando os diagramas eram constitutivos do conhecimento matemático, especialmente no contexto da geometria. Vimos, nas primeiras leituras, que a concepção não era muito distinta. O sensível, o mecânico e o manipulável também não eram considerados na

11 As provas, a que nos referimos, são as que seguem a regras estabelecidas pelo formalismo, são as oriundas

do método axiomático que estuda uma teoria escolhendo “um certo número de noções e de proposições primitivas, suficientes para sobre elas edificar a teoria, aceitando-se outras idéias ou outras proposições só mediante, respectivamente a, definições e demonstrações; ... deixando-se de lado os significados intuitivos dos conceitos primitivos” (Newton Costa, 1992, p. 49).

12 Bicudo, M. A. V. em seu artigo “Fenomenologia e Matemática” esclarece que, segundo Husserl, “a

objetivação, ou o processo de tornar uma idéia objetiva, é uma questão de método fundado em dados pré- científicos da experiência. /.../ O conhecimento científico tem seu solo originador no mundo da experiência real, o mundo da sensibilidade../.../ É nesse solo variante de experiências diversas e mutáveis que a objetividade se enraíza” (Bicudo, 2005, p. 20)

produção do conhecimento, mas havia uma exceção para as construções com régua e compasso. Como essa exceção era trabalhada? Quais frutos ela deu?

As discussões atuais sobre os diagramas, em sua maioria13, aparecem

ligadas às explicitações da gênese da demonstração e do "lugar" que ela ocupa na Matemática, ou os tomam como válidos apenas do ponto de vista de uma representação ou ilustração.

Nosso desejo, embora se relacione à demonstração, não a considera isoladamente, pois interrogando o significado epistemológico dos diagramas na construção do conhecimento geométrico buscamos compreender, “como” e “se” eles foram relevantes na construção desse conhecimento, perguntando pelo o que o diagrama é e como ele é o que é.

2.3. Os diagramas: ilustrações de uma compreensão inicial

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