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Universalização versus massificação de um serviço de telecomunicações

4. EXAME DAS ALTERNATIVAS PARA MASSIFICAÇÃO DA BANDA

4.1. Participação do Poder Público como prestador de serviço

4.1.3. Universalização versus massificação de um serviço de telecomunicações

Como visto anteriormente, o novo modelo estabelecido pela LGT funda-se em dois princípios fundamentais: a introdução da competição na exploração dos serviços e a universalização do acesso aos serviços básicos. Busca-se com isso aumentar e melhorar a oferta de serviço no país.

Figura 4.1 - Pilares da reestruturação advinda pela LGT.

A competição funciona como poderoso estimulante à busca de soluções inovadoras para o melhor atendimento à demanda, para a redução de custos e para a

melhoria da qualidade. Contudo, se por um lado ela fomenta a inovação e a redução dos

custos, por outro lado as empresas operando sob a lógica concorrencial buscarão maximizar seu lucro, ofertando o serviço apenas naquelas localidades mais lucrativas, prática conhecida como cream-skimming.

Como contrapeso, a universalização atua para propiciar a todo e qualquer interessado o acesso aos serviços essenciais de telecomunicações. A universalização é instrumento pelo qual se busca prover o serviço de telecomunicação a grupos de consumidores e regiões que de outra forma seriam excluídos deste mercado. Trata-se de uma política pública redistributiva com o objetivo de garantir o acesso a serviços

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essenciais ou de utilidade pública e, como visto anteriormente, sua escolha remete ao plano político.

Do ponto de vista social e ético, reconhece-se a importância dos serviços de telecomunicações como instrumentos para obtenção de cidadania e participação social, atuando como um importante fator de promoção da qualidade de vida. Com o advento da Internet o uso da rede ganhou ainda mais importância, deixando seu caráter eminentemente comunicativo ao agregar aspectos educacionais, informativos e culturais.

A universalização atua, portanto, como política de redistribuição através de preços ao invés de utilizar outros meios tais como imposto ou a redistribuição direta. Nesse sentido, ao definir uma política de universalização do serviço, o Governo deverá avaliar a forma de financiamento dessa política para atingir seu resultado, qual seja, o provimento do acesso à internet em banda larga a todas as pessoas independente de sua localização ou posição econômica.

Há ao menos duas formas de financiamento de metas de universalização: (i) o subsídio cruzado; e (ii) transferências diretas. O primeiro, subsídio cruzado, significa que os indivíduos de custo baixo subsidiam os de custo alto. Pode ser também realizado entre produtos no caso da oferta de multiprodutos. No modelo brasileiro, a prática de subsídios cruzados foi permitida excepcionalmente até a instituição do fundo para financiar a universalização, o FUST. Dessa forma, permitia-se o subsídio entre modalidades de serviços de telecomunicações (e.g. STFC Local e LDN) ou entre segmentos de usuários.

A segunda alternativa, transferência direta, refere-se à transferência de recursos públicos diretamente ao concessionário para cobrir os custos incorridos da universalização. A LGT prevê que a transferência de recursos somente poderá ocorrer para cobrir a parcela do custo exclusivamente atribuível ao cumprimento das obrigações de universalização de prestadora de serviço de telecomunicações, que não possa ser recuperada com a exploração eficiente do serviço (art. 81, LGT).

Ambas as formas de financiamento podem gerar distorções sobre os preços de mercado, resultando em perdas de eficiência. Adicionalmente, o método de financiamento adotado deverá ser competitivamente neutro de forma a não oferecer vantagem indevida ao incumbente ou aos potenciais entrantes.

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No caso do subsídio cruzado ele pode sinalizar erroneamente ao mercado os níveis de preço, i.e., a incumbente ao cobrar mais em um serviço poderá fornecer a falsa impressão ao mercado que o entrante é mais eficiente, quando na verdade o preço está elevado para financiar o subsídio. Alternativamente, se nenhum entrante consegue competir com o preço do incumbente, isto pode querer dizer que este é mais eficiente que os outros, porém pode ser também que o incumbente esteja realizando subsídios cruzados, de forma que o preço cobrado esteja abaixo do custo real. Outro argumento contra o uso de subsídios cruzados é a dificuldade em fazer com que ele incida somente nos grupos desejados, prejudicando o resultado esperado.

Em relação às transferências diretas, estas não podem interferir na própria natureza da estrutura do mercado. Um financiamento mal desenhado pode gerar obstáculos à entrada, bem como levar a uma excessiva entrada de firmas no setor, fazendo com que firmas pouco eficientes operem em alguns nichos de mercados. Pode, ainda, fazer com que o incumbente tenha vantagem competitiva em relação aos demais, fortalecendo sua posição dominante em prol do recebimento de verbas públicas para financiar o cumprimento de metas de universalização.

Ante os problemas apresentados acima em relação à universalização de serviços em mercados competitivos, surge a discussão se o acesso à Internet de alta velocidade deve ser caracterizado como serviço público de telecomunicações que, nos termos da LGT, a própria União deverá assegurar sua continuidade e universalização. Dada as perdas de eficiência decorrentes de uma política pública redistributiva, questiona-se se a melhor opção seria maximizar os níveis de penetração do acesso (massificar) ao invés de buscar garanti-lo a todo e qualquer interessado, independente de sua localização (universalizar).

A massificação pode ser entendida como a disseminação do acesso de serviço de telecomunicações por meio de incentivos e alavancas, regulatórias e legais, sem, contudo, garantir o acesso a todo interessado. Trata-se de uma via indireta para se maximizar a oferta do serviço via mercado e obrigações regulatórias. A principal diferença em relação à universalização refere-se à prestação do serviço em regime privado, não exigindo das empresas ofertantes do serviço o ônus do cumprimento de metas de universalização e a reversibilidade dos bens associados à prestação do mesmo. Outra grande diferença refere-se à titularidade da prestação do serviço, enquanto na prestação em

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regime público a titularidade é da União que delega a um concessionário a gestão da rede, no regime privado essa titularidade é da empresa ofertante, atuando sob a lógica capitalista. O ponto fundamental a ser avaliado é quais os benefícios conquistados e os respectivos custos associados em se adotar a prestação do serviço de acesso em banda larga em regime público, quando comparado à massificação do acesso via ações regulatórias cumuladas com políticas públicas complementares de inclusão digital, considerando a limitação orçamentária estatal. À exemplo do que aconteceu no leilão das faixas de terceira geração do celular, existem alternativas regulatórias e legais que permitem a expansão da rede a limites consideráveis a custos mais reduzidos para o Governo.

Nesta seção, não se discute a importância da Banda Larga para a sociedade brasileira e sim quais as formas de atingir esse objetivo. A depender dos custos da universalização, não seria melhor atender determinadas classes com programas de transferência direta de renda, semelhante ao que ocorre no Programa Bolsa Família?

Uma importante ferramenta para tentar medir a eficiência de políticas públicas é a análise custo-benefício que consiste em comparar os custos totais esperados com os benefícios totais esperados de um ou mais projetos ou regulamentos para decidir qual a melhor opção. Tipicamente é usada para avaliar soluções para problemas sociais que não são resolvidos pelo mercado. Estes projetos geralmente têm as seguintes características:

i. Envolvem gastos públicos, geralmente investimentos. Estes projetos tendem a ser financiados através de impostos, embora possam também ser pagos pelos usuários. ii. Existem múltiplos objetivos de política, muitas vezes parcialmente conflitantes,

requerendo trade-offs. O formulador de política quer soluções que maximizem todos os objetivos da melhor maneira possível.

iii. Pelo menos um dos objetivos envolve a provisão de um bem público não provido pelo mercado, como menos crime, menos risco, meio ambiente mais limpo.

iv. O uso eficiente dos recursos públicos é desejado dado que os recursos são escassos e há numerosos usos alternativos.

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Apesar de suas limitações, a análise de custo-benefício serve como parâmetro de avaliação na construção de políticas públicas, além de trazer informações úteis e relevantes ao processo de decisão. Fatores sociais e éticos deverão ser adicionalmente avaliados para compor a decisão de universalizar o serviço.

Geralmente, as políticas redistributivas possuem ganhos menores quando próxima de atingir seu objetivo, ao passo que o custo de implementá-la cresce exponencialmente em relação ao grau de atendimento. A curva abaixo ilustra comparativamente as duas curvas, de forma que a partir de determinado ponto (nível ótimo) o custo de atender mais uma pessoa supera o benefício de se atendê-la.

Figura 4.2 - Benefício versus custo total da implantação de uma política redistributiva.

A universalização é uma política pública que possui custos e benefícios esperados que devem ser avaliados conjuntamente com outras alternativas para se atingir determinado grau de inclusão social no país, levando em conta a restrição orçamentária do governo.

Por exemplo, a universalização do acesso não resulta, necessariamente, na universalização do serviço, i.e., mesmo se conseguindo garantir o acesso em banda larga a todo e qualquer interessado, o uso do serviço será limitado por diversos fatores, entre eles:

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níveis de alfabetização da população, custo dos terminais (Computador, Notebook, etc.), preço a ser pago pelo acesso, existência de energia elétrica na localidade.